Discurso durante a 11ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Homenagem ao Presidente Juscelino Kubitschek de Oliveira, pela passagem dos 50 anos de sua posse como Presidente da República dos Estados Unidos do Brasil.

Autor
Heráclito Fortes (PFL - Partido da Frente Liberal/PI)
Nome completo: Heráclito de Sousa Fortes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Homenagem ao Presidente Juscelino Kubitschek de Oliveira, pela passagem dos 50 anos de sua posse como Presidente da República dos Estados Unidos do Brasil.
Publicação
Publicação no DSF de 01/02/2006 - Página 2548
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM, JUSCELINO KUBITSCHEK, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, ELOGIO, VIDA PUBLICA.

O SR. HERÁCLITO FORTES (PFL - PI. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Renan Calheiros; D. Falcão, Arcebispo de Brasília hoje, de Teresina ontem, figura por quem tenho o maior apreço; Governadores Marconi Perillo, de Goiás, e Roriz, de Brasília; Drª Anna Christina Kubitschek, que representa a família Kubitschek nesta solenidade; Srs. Ministros de Tribunal que aqui se encontram presentes à Mesa; minhas senhoras; meus senhores; Senadores; brasileiros, somente o atrevimento e a audácia, Senador Antonio Carlos Magalhães, me colocariam nesta tribuna agora, pelos que já falaram sobre Juscelino e por aqueles que ainda irão falar.

Na quinta-feira passada, o Paulo Otávio me desafiou aqui no plenário a me inscrever para esta sessão. E fui o quinto. Não vi a lista toda. Mas a audácia, que talvez tenha sido do que mais Juscelino impregnou a minha geração, proporciona-me o sentimento de que sou igual a todos quando é para evocar JK nesta Casa. Quando JK elegeu-se Presidente da República, eu tinha apenas quatro anos. Portanto, tinha muito pouco discernimento do que era certo e do que era errado. Não tive na infância aquelas grandes paixões por jogador de futebol ou por cantores da época. A minha grande primeira paixão foi exatamente Juscelino, pelo que representava em termos de renovação e de esperança para o Brasil. Não tínhamos televisão e tínhamos que nos conformar com as revistas, jornais e, eventualmente, com aqueles jornais na preliminar dos cinemas domingueiros a que assistíamos. E aquele sorriso aberto que tomava a página toda me foi contaminando de maneira tal que, sem nenhuma vergonha de dizer, aos 55 anos de idade, a única música que canto do começo ao fim é o Hino do PSD. Não consegui aprender outra.

E vejam os senhores o magnetismo que esse homem exerceu. Quando esses Partidos foram extintos, eu tinha 14 anos. Roberto Carlos veio depois. Até invejo não saber de cor, Sr. Presidente, nenhuma das músicas nem de Roberto Carlos, nem de nenhum outro cantor. Contudo, o Hino do PSD eu sei de cor.

Foi exatamente isso que contaminou a todos nós. E o mais impressionante no Juscelino era reverter os fatos. Jacareacanga é um símbolo. Mas a capacidade que Juscelino tinha de, no dia-a-dia, nas pequenas coisas, reverter a adversidade e trazê-la para o seu lado era fantástica. Fez isso com os humoristas, com os cantores, com os colunistas - não é Gilberto? -, com todo mundo. O Juca Chaves quis satirizá-lo e o consagrou como o “Presidente Bossa Nova” e por aí adiante.

Sr. Presidente, nos anos da construção de Brasília, eu morava em Teresina e vivi ali o lado bom e o lado mau. O lado bom era a esperança da construção da nova capital; o lado ruim era que, à medida que aquele sonho se transformava em realidade, íamos perdendo os amigos, que vinham com as famílias tentar a vida nesta Brasília. E quantos eu vim reencontrar aqui homem feito, com a vida definida, muitos anos depois.

Meu caro Senador Antonio Carlos, a força de Juscelino, para mim, foi tão forte, que eu preferi torcer naquela época, aos 8 anos de idade, pelo imóvel e estático Lott e sua espada a me contaminar pela vassoura que assolou o Brasil naquele tempo. E um dos meus divertimentos era sair tomando vassoura de quem as tinha para ver se, já àquela época, eu e um grupo de amigos conseguíamos eliminá-las do País. Que nada! Elas eram em quantidade infinitamente maior do que as espadas. A vassoura, meu caro Embaixador Paulo Tarso, criou-me um problema psicológico tão grande, que a maior alegria que eu tive, aos 9 anos, foi quando minha avó comprou um aspirador de pó. Eu achava, naquele momento, que era chegada a hora de me livrar da famigerada vassoura. E, ao mesmo tempo, cantar o avanço de JK tecnológico, trazendo o aspirador de pó para a indústria brasileira.

Eu tive a felicidade de ter três encontros com Juscelino. Quando eu falo em encontros é o de apertar as mãos, olhar nos olhos e falar. A primeira vez que ele foi ao Piauí, como Presidente, foi para inaugurar uma ponte ligando Teresina ao Bairro Jóquei Clube. Hoje tudo faz parte do centro urbano da capital. A ponte velha de madeira tinha caído havia anos, e as promessas de construção eram tantas, que Juscelino a fez em tempo recorde e foi lá inaugurá-la. Não o vi de perto.

Depois, quando já não era Presidente da República, ele foi receber um título de cidadão piauiense, já na Revolução. Eu nunca vi nas ruas uma multidão espontânea de agradecimento por um lado, e, por outro, de exigência que ele voltasse. Era o começo do JK-65. Alguns trabalhadores tinham ajudado na construção de Brasília e os outros queriam, na etapa seguinte, continuar trabalhando com Juscelino para ver o desenvolvimento da Nação.

O terceiro encontro, o segundo em que tive oportunidade de estar com ele, foi no Rio de Janeiro, levado pelo meu amigo Hugo Napoleão - ele não está aqui; já o procurei inclusive para abraçá-lo -, que também era seu amigo e companheiro de Diretoria do Denasa. Juscelino tinha uma reunião em seguida e prometeu apenas me cumprimentar. Entrei na sala, e mais uma vez a audácia funcionou. Estou vendo a imagem dele como se fosse agora: um chinelão preto, um sapato no canto da sala. Ele perguntou o meu nome e o que eu queria. E eu disse exatamente que estava ali cumprindo o desejo de toda a minha geração, que era cumprimentar o fundador de Brasília. Esse aperto de mão se transformou numa conversa de quase 30 minutos, em que tive a oportunidade de ouvir dele as angústias pela proibição de visitar Brasília, que ele construiu.

Na última vez, por coincidência, fui ao Hotel Eron. No fim de noite de uma quinta-feira, ele estava lá, dentre outras pessoas, com a Vera Brandt. Conversamos. Depois, ele desceu até a Boate do Hotel Eron e dançou com a Vera. Diz ela que foram muitas danças. Essa eu tenho certeza porque testemunhei e foi a última. Na quinta-feira houve o acidente.

Prestei atenção em tudo o que Juscelino disse naquele dia, mas uma coisa me impressionou: ele recomendou a uma amiga comum minha e do Paulo, que era secretária do Adolpho Bloch, apontando para o Conjunto Nacional: “Minha filha, amanhã, vá àquele Conjunto e compre três cuecas e três camisas para mim. Não quero coisa cara. Cueca tipo Torre”. Eu tinha a impressão de que “tipo Torre”, uma fábrica antiga, era para mostrar que se referia à tradicional samba-canção. Mas o fato de um homem que governou o Brasil, a quem todos atribuíam fortunas e fortunas, ter tido o cuidado de recomendar que seu pedido viesse carregado de compras modestas, para mim, foi um dos momentos mais marcantes em toda a minha convivência com Juscelino.

Senador Renan Calheiros, eu vi, como toda Brasília viu, o sepultamento dele, e algo me comoveu. De funcionários públicos brasileiros, eu vi lá Paulo de Tarso com a Lúcia, Antonio Carlos Magalhães e Severo Gomes. Desculpem-me os outros se lá estavam, mas esses eu tenho certeza de que vi no campanário da igreja, esperando a chegada de Juscelino. Não adianta falar sobre isso. Brasília toda conhece o que foi aquela dor.

Mas o impressionante de tudo isso, Senador Mão Santa, é que estamos aqui cinqüenta anos depois de sua posse, e parece que foi hoje. A sensação que se tem é de que Juscelino não foi, está aqui, com a sua digital, o seu exemplo, o seu otimismo, impregnando o Brasil. O seu exemplo, às vezes, é usado até de maneira errada, demagógica, indevida, mas é um exemplo incontestável nesta Nação.

Quatro anos atrás, chamei a atenção do Paulo Octávio para um fato interessante. Eu vi, em uma galeria de Brasília - salvo engano, Visual -, um quadro pintado por um mineiro chamado Bracher Júnior, tio do atual Bracher, da década de 1940, em que aparece Juscelino desbravando estradas. Uma pintura fantástica que não sei por onde anda. Mas penso, Governador Roriz, que, se ainda estiver nessa galeria, esse quadro deve ser resgatado para Brasília, porque é o lugar onde ele deve ficar.

Por último e por fim, quero dizer que, no ano passado, por indicação de Aécio Neves, tive a felicidade de receber a Medalha Juscelino Kubitscheck, em Diamantina. E lá, convivendo com amigos antigos, com a história, com a cidade, tive a mesma sensação que estamos tendo agora, da sua presença neste recinto.

Diamantina respira, canta, por meio da Vesperata, o seu filho ilustre. Aconselho a quem não teve oportunidade de ir a Diamantina que vá àquela cidade ver como cresceu e onde nasceu JK. Hoje a minissérie da Globo permite que se veja, sem tanto esforço e sem tanto sacrifício, o que estou dizendo aqui, mas é pouco. Vale a pena ir a Diamantina, conhecer suas ladeiras, seu calçamento íngreme, e ver, cinqüenta anos depois, um pouco da história do grande homem que é homenageado nesta Casa, que é homenageado pelo Brasil. Aliás, tenho certeza, Paulo Octávio, de que outros cinqüenta, outros duzentos, outros quinhentos nós iremos comemorar. Juscelino, para o Brasil, é eterno; para Brasília, meu caro Roriz, nem se fala. (Palmas.)

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 01/02/2006 - Página 2548