Discurso durante a 15ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre o Bolsa-Família. Solenidade, amanhã, da entrega de 66 casas financiadas para os quilombolas pelo Governo Lula. Expectativas da edição, na próxima semana, da "MP do Bem 2". Comentários ao pronunciamento do Senador José Agripino.

Autor
Ideli Salvatti (PT - Partido dos Trabalhadores/SC)
Nome completo: Ideli Salvatti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. POLITICA SOCIAL. POLITICA HABITACIONAL. POLITICA FISCAL. DIVIDA PUBLICA.:
  • Considerações sobre o Bolsa-Família. Solenidade, amanhã, da entrega de 66 casas financiadas para os quilombolas pelo Governo Lula. Expectativas da edição, na próxima semana, da "MP do Bem 2". Comentários ao pronunciamento do Senador José Agripino.
Aparteantes
Eduardo Suplicy, José Agripino.
Publicação
Publicação no DSF de 03/02/2006 - Página 2973
Assunto
Outros > HOMENAGEM. POLITICA SOCIAL. POLITICA HABITACIONAL. POLITICA FISCAL. DIVIDA PUBLICA.
Indexação
  • HOMENAGEM POSTUMA, MÃE, TASSO JEREISSATI, SENADOR, ESTADO DO CEARA (CE).
  • DEFESA, PROGRAMA, BOLSA FAMILIA, SUPERIORIDADE, TRANSFERENCIA, RENDA, SIMULTANEIDADE, POLITICA HABITACIONAL, REGISTRO, DADOS, CRESCIMENTO, INVESTIMENTO, HABITAÇÃO POPULAR.
  • SAUDAÇÃO, REDUÇÃO, DESIGUALDADE SOCIAL, DADOS, INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATISTICA (IBGE), EFEITO, POLITICA SOCIAL.
  • ELOGIO, GOVERNO FEDERAL, DEMARCAÇÃO, TERRAS, QUILOMBOS, MUNICIPIO, CAMPOS NOVOS (SC), ESTADO DE SANTA CATARINA (SC), ANUNCIO, SOLENIDADE, ENTREGA, FINANCIAMENTO, ASSINATURA, TERMO, COOPERAÇÃO, INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRARIA (INCRA), COOPERATIVA, HABITAÇÃO, ASSENTAMENTO RURAL.
  • ANUNCIO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), REDUÇÃO, TRIBUTAÇÃO, CONSTRUÇÃO CIVIL, INCENTIVO, FINANCIAMENTO, SETOR, CRIAÇÃO, EMPREGO, AUMENTO, PRODUTO INTERNO BRUTO (PIB), ATENDIMENTO, DEMANDA, POPULAÇÃO, BAIXA RENDA.
  • ESCLARECIMENTOS, VANTAGENS, QUITAÇÃO, DIVIDA, FUNDO MONETARIO INTERNACIONAL (FMI), SUPERAVIT, COMPOSIÇÃO, RESERVA, AUSENCIA, RETIRADA, RECURSOS, TESOURO NACIONAL.

            A SRª IDELI SALVATTI (Bloco/PT - SC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, vim rindo porque, como sempre, o Senador Heráclito não perde a oportunidade de fazer sua provocação tradicional.

            Quero iniciar o meu pronunciamento deixando, de forma muito explícita, o nosso pesar pelo falecimento da mãe do Senador Tasso Jereissati, a Srª Maria de Lourdes, que comove a todos nesta quinta-feira. Com certeza, o sentimento de todos nós é de muita solidariedade ao Senador Tasso Jereissati. Passei por esse momento no ano passado e sei o quanto é difícil. Por mais que os médicos nos consolem da situação de saúde, quando perdemos a nossa mãe, é sempre uma perda muito difícil de superar.

            Vim à tribuna preparada para falar a respeito de um assunto. Vou expor o que me traz à tribuna, mas pediria ao Senador Augusto Botelho um pouco de generosidade no tempo, porque, dados os discursos muito longos da Liderança do PFL, há alguns comentários que eu preciso fazer obrigatoriamente sobre o tema. Já peço, portanto, um pouco de gentileza, também avisando ao Senador Alvaro Dias, que assumirá a Presidência, que vou me prolongar um pouco. Primeiro, vou cumprir a minha tarefa de trazer o assunto que preparei para o dia de hoje; depois, vou tecer alguns comentários.

            O debate de terça-feira foi muito interessante. O Senador Leonel Pavan, do meu Estado, fez um contraponto com relação ao Bolsa-Família, dizendo que seria muito mais produtivo e muito mais adequado se, em vez de destinar os recursos que neste ano deverão atender a 11 milhões de famílias com esse programa de transferência de renda - indiscutivelmente, um dos maiores programas de transferência de renda do mundo -, o Governo Lula destinasse esses recursos para a habitação popular. Na hora, infelizmente, eu não estava com os dados em mãos e não pude fazer o aparte, mas me preparei para trazê-los hoje, assim como trarei algumas novidades que acontecerão amanhã no meu Estado.

            No primeiro ano do Governo Lula, o Bolsa-Família atendeu a 3,6 milhões de famílias; no segundo ano, 6,5 milhões; em 2005, 8,7 milhões; para este ano, a previsão é de 11 milhões de famílias. Em termos de recursos, passamos de R$3,4 bilhões no primeiro ano do Governo Lula para R$6,5 bilhões no ano passado. Neste ano, vamos ultrapassar a casa dos R$8,7 bilhões.

            Portanto, é um volume significativo e é um recurso que não está sendo aplicado no programa de transferência de renda em detrimento de outros programas sociais, como é o da habitação. Trago aqui os dados para comprovação. Como professora de Matemática, gosto de gráficos.

            Aqui está o gráfico dos financiamentos, que mostra tudo o que foi investido em habitação de 1998 a 2005. Enquanto o maior volume de recursos aplicados na aquisição e construção de moradia, no período que nos antecedeu, foi de R$2,084 bilhões, em 1998, em seu primeiro ano, o Governo Lula ultrapassou todos os valores envolvidos no financiamento, aquisição e construção de moradia: R$2,217 bilhões. Em 2004, foram investidos R$3 bilhões; em 2005, R$4,7 bilhões.

            Falo isso para desmontar a tese aqui aventada de que seria melhor aplicar em construção e habitação popular do que em Bolsa-Família, Senadora Ana Júlia Carepa. A realidade é que este Governo aplicou muito mais em transferência de renda do que o Governo anterior. Mas muito, muito mais ainda em habitação popular. As duas políticas são de inclusão social e atendem exatamente a essa área que tem muita incidência na qualidade de vida.

            Mais de 80% do déficit habitacional brasileiro é de famílias que ganham até cinco salários mínimos. Portanto, quando se pula, em três anos - no primeiro ano, foram R$2,217 bilhões; no terceiro ano, R$4,7 bilhões - o valor efetivamente aplicado na aquisição, financiamento e construção de moradia, sendo que a ampla maioria foi para moradia popular, estamos fazendo a complementação exatamente dessa lógica, dessa visão que o Governo Lula tem de inclusão social.

            Por isso, não é à toa que a pesquisa do IBGE de amostragem por domicílio apresenta essa queda significativa na desigualdade social. É a conjugação desse tipo de política que faz com que tenhamos essa alavancagem. Estão aqui os dados, exatamente para demonstrar que não é em detrimento de outras áreas não; são exatamente políticas que se complementam para a diminuição da desigualdade social.

            Para continuar nessa linha, amanhã, em Campos Novos, Santa Catarina, vamos ter uma atividade muito importante, muito simbólica, muito emblemática. Campos Novos é uma região do latifúndio. Santa Catarina tem poucos latifúndios, comparativamente com outros Estados. É um Estado de minifúndios, de pequenas propriedades, de agricultura familiar. Mas Campos Novos é uma das regiões do meu Estado que tem o maior percentual de latifúndios. Pois bem, nesse Município, o Governo Lula demarcou uma terra de quilombo, de afro-descendentes, de quilombolas. Trata-se de um Estado, Ana Júlia, normalmente lembrado pelas pessoas como de loiros. Porém, há uma população afro-descendente significativa, há remanescente de quilombo em Santa Catarina, o que foi reconhecido pelo Governo Lula.

            Amanhã, em Campos Novos, serão entregues 66 casas financiadas para os quilombolas. Nessa mesma solenidade, além de reconhecer o direito a terra, o direito a moradia dessa população que, infelizmente, sempre foi discriminada - no Brasil, temos uma dívida social imensa com os afro-descendentes -, será assinado o termo de cooperação do Incra com a Cooperativa Regional de Habitação da Reforma Agrária, para viabilizar a habitação rural em todos os assentamentos de Santa Catarina para três mil famílias de pequenos agricultores familiares.

            Trata-se de habitação não só nesse volume de mais de R$5 bilhões no ano passado, mas de uma habitação voltada também para setores que nunca tiveram direito ao financiamento público, ao investimento público na área da habitação, que são os remanescentes de quilombos e pequenos agricultores. Nunca! Isso lá em Santa Catarina tem uma repercussão imensa, porque é a agricultura familiar que gera empregos, que gera renda, que dá oportunidade, que inclusive contribui com as exportações, mas esse setor nunca tinha tido, de Governo algum, o reconhecimento do direito à habitação com financiamento. Isso é uma realidade em Santa Catarina, e está lá funcionando de forma muito concreta.

            Senadora Ana Júlia Carepa, na próxima semana, provavelmente na terça-feira, o Presidente Lula deve anunciar aquilo que está sendo apelidado de “MP do Bem 2”, um pacote de medidas altamente significativas para a construção civil, que vão desde a desoneração tributária, nos casos em que é preciso beneficiar o setor quando diminuem os lucros, até uma série de medidas para reduzir a carga tributária no setor produtivo, principalmente diminuir a carga tributária dos componentes da chamada “cesta básica do material de construção”. São produtos que terão diminuição da alíquota, exatamente para...

(Interrupção do som.)

            A SRª IDELI SALVATTI (Bloco/PT - SC) - Senador Alvaro, vou pedir aquela gentileza toda que foi dada ao Senador Agripino.

            Alguns produtos terão diminuição na alíquota para incentivar o setor. Considerada a cesta básica dos produtos da construção civil, com alíquotas reduzidas, com financiamentos incentivados, com incentivos para o processamento do financiamento da construção para a população de mais baixa renda, será dado exatamente o incentivo a um dos setores que mais gera emprego, que menos importa e que tem papel significativo na construção e ampliação do Produto Interno Bruto brasileiro.

            Estamos acompanhando a questão, e Santa Catarina foi precursora dessa idéia. Há mais de um ano, venho trazendo este assunto. Houve iniciativas das nossas entidades representativas do comércio e da indústria da construção civil, que vieram ao Senado. Houve audiências, várias audiências com o Ministro Furlan, e toda essa tratativa deverá culminar, nesta terça-feira, nesse pacote de medidas para incentivar a construção civil, principalmente com a desoneração de tributos para atender a população de mais baixa renda, a habitação popular e o sistema conhecido como formiguinha, que é aquele movimento na construção civil em que as pessoas fazem pequenas reformas, o puxadinho, a pintura da casa e que movimenta algo em torno de 70% do setor produtivo na construção civil, seja na indústria, seja no comércio.

            Por isso, queremos saudar essa iniciativa, que acompanharemos atentamente. Vou fazer muita questão, inclusive, de estar na solenidade, porque se trata de uma luta de mais um ano de todo esse setor. Em Santa Catarina, há muita repercussão e muito orgulho por esse desfecho, pois essa luta toda se iniciou no setor produtivo, tanto industrial, quanto comercial, da construção civil catarinense e tomou toda uma dimensão nacional após esse acatamento, por parte do Presidente Lula, das medidas de que teremos conhecimento, na sua amplitude, na próxima semana.

            Senador Alvaro Dias, a respeito das questões aqui debatidas, eu queria falar, em primeiro lugar, sobre a questão do Fundo Monetário Internacional. Como às vezes não consigo entender alguns pontos, queria até pedir uma atenção muito grande do Senador Eduardo Suplicy, que é economista e que de repente poderá me socorrer caso eu cometa, digamos assim, alguma leviandade no que vou falar.

            Quando um País recorre ao Fundo Monetário Internacional, o faz normalmente em situação de risco de insolvência; recorre ao empréstimo porque está ameaçado de quebrar; recorre porque não está tendo condições de se manter principalmente com reservas que lhe dêem garantia de enfrentar qualquer tipo de turbulência econômica. Foi dessa forma que sempre fui ensinada, digamos assim, a entender por que países recorrem ao Fundo Monetário Internacional. Pelo menos foi assim que ocorreu nas três vezes em que, no Governo anterior, se recorreu ao Fundo Monetário Internacional. Ou seja, o País estava à beira de quebrar. E empréstimo do Fundo Monetário Internacional é empréstimo carimbado; é empréstimo que não entra no caixa do Governo; é empréstimo que tem a finalidade única e exclusiva de recompor as reservas, de ficar na reserva, para que exatamente a situação de insolvência, de crise econômica ou de dificuldade econômica gravíssima do País não se acentue pela perda absoluta das reservas.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

            A SRª IDELI SALVATTI (Bloco/PT - SC) - Portanto, quando nos foram entregues as reservas cambiais, tínhamos uma reserva líquida, descontado o dinheiro do FMI que foi emprestado anteriormente exatamente para fazer o socorro econômico, que não chegava a US$14 bilhões, mais o empréstimo do FMI. Ao longo de três anos, tivemos a capacidade de pegar essa reserva líquida de US$14 bilhões e transformá-la em nada mais, nada menos do que US$54 bilhões, mais o que estava reservado e que era do FMI.

            Portanto, essa multiplicação de reservas cambiais líquidas, que não foi pouca coisa, não foi pequena, não foi insignificante, foi exatamente a condição advinda dos superávits...

            (Interrupção do som)

            A SRª IDELI SALVATTI (Bloco/PT - SC) - Obrigada, Senador Alvaro Dias.

            Dos superávits sucessivos. Enquanto no período anterior houve déficit comercial, alcançamos cento e três bilhões de superávit, o que permitiu recompor as reservas. Portanto, os US$15 bilhões pagos ao FMI não saíram do caixa do Tesouro, não são recursos que deixaram de ser aplicados em estradas, em aeroportos, seja lá no que for, porque eram reserva, estavam na reserva, não podiam entrar no caixa.

            Agora, os juros economizados por pagar antecipadamente, estes sim saem do caixa. Então foi quase um bilhão em economia de juros; este sim é que pode ser aplicado naquilo de que precisamos e que tantos reivindicam.

            Por essa razão, é importante travarmos este debate do Fundo Monetário Internacional, até para que não veiculemos situações...

            O Sr. José Agripino (PFL - RN) - V. Exª me permite um aparte, Senadora Ideli Salvatti?

            A SRª IDELI SALVATTI (Bloco/PT - SC) - Já vou conceder, Senador José Agripino.

            Situações que não condizem com a verdade. Saiu das reservas o empréstimo. O dinheiro do FMI saiu de lá, não do caixa. Os US$15 bilhões não saíram do caixa. Se não tivessem sido pagos, não poderiam ter sido aplicados, porque o empréstimo do Fundo Monetário Internacional é carimbado, é com uso exclusivo. Quero entender onde leva esta discussão. Porque hoje temos a possibilidade de dispensar. Hoje, temos reserva - repito - líquida de menos de cinqüenta e quatro bilhões. Portanto, não é qualquer coisa.

            Ouço, com muito prazer, o Senador Agripino. Em seguida, a Senadora Ana Júlia Carepa, que também pediu um aparte, e o Senador Eduardo Suplicy, se o Senador Alvaro Dias me permitir.

            O SR. PRESIDENTE (Alvaro Dias. PSDB - PR) - Pois não, Senadora Ideli Salvatti, peço apenas compreensão em relação aos demais oradores inscritos.

            O Sr. José Agripino (PFL - RN) - Senadora Ideli Salvatti, inicialmente, cumprimento V. Exª pelo esforço que faz para defender o que é sua obrigação, o Governo do qual V. Exª faz parte. É meritório, é justificado. Porém, penso que o raciocínio de V. Exª merece alguns reparos. Quando uma nação paga débito em dólar, ela não pega dólar aqui e paga aqui, ela transforma reais em dólares e, por operações internacionais, faz a transferência em moeda estrangeira, que foi convertida, de reservas que existem no Banco Central, de dólar em real. O Governo brasileiro não tem disponível em real para ter pago a dívida de US$15,5 bilhões com excesso de exportações ou dinheiro que estivesse guardado em dólar. Todo dólar que entra no País, decorrente de exportações, é guardado na conta gráfica, mas é transformado em real, entra no meio circulante. Entra no meio circulante! O que quero dizer a V. Exª é que o Governo brasileiro não tem sobra de reais. Tanto não tem que faz aquele “maravilhoso” superávit primário para pagar débitos, para pagar juros e abater a dívida. Ora, se não há superávits em reais e não há dólares - propriedade dele -, se transformou reais em dólares para pagar dólar ao FMI, é evidente que, já que não tinha disponível, retirou do meio circulante. Foi buscar esse dinheiro no mercado, como faz com todas as operações de financiamento da sua dívida interna, que atingiu R$1 trilhão. E em não tendo tido esse disponível, é evidente que, para pagar os US$15,5 bilhões que comprou do mercado, transformando os reais que tomou emprestado em dólar para pagar o FMI, trocou uma dívida de 4% ao ano por uma outra que, remunerada, dá 17,25% ao ano. Pagou 13% a mais. E aí entra aquilo que coloquei com muita firmeza e com muita pena, com muita dó: jogamos fora do Nordeste US$2 bilhões em investimentos que poderiam ter sido feitos se não fosse esta operação que, na minha opinião, é desnecessária: abater uma dívida de US$15,5 bilhões, que, remunerado, dá 4% para gerar uma dívida de US$15,5 bilhões, transformado em reais, remunerada a 17%, como conta a matéria do UOL. Está na página do UOL de hoje. Era este o reparo que eu gostaria de fazer, cumprimentando V. Exª pela obrigação que tem de fazer a defesa do seu Governo.

            A SRª IDELI SALVATTI (Bloco/PT - SC) - Agradeço o aparte de V. Exª, Senador José Agripino. Não faço defesa por obrigação. Faço por convicção, todas as vezes que ouço afirmativa com a qual não concordo, mesmo não tendo todos os elementos, em um primeiro momento, para fazer o debate à altura que ele merece. Por exemplo, não consigo ouvir as pessoas dizerem - e isso ouço quase todos os dias - que poderíamos ter utilizado os US$15 bilhões do FMI em obras, que poderíamos ter construído não sei quantas casas e quantos aeroportos. O dinheiro do FMI não pode ser utilizado dessa forma, o dinheiro emprestado pelo FMI é para reserva, e só como reserva pode ser aplicado.

            V. Exª fez referência ao fato de transformar em moeda e à questão dos juros. Senador José Agripino, trarei o assunto ao debate novamente em um outro momento, a não ser que o Senador Eduardo Suplicy, economista como tal, possa trazer algum elemento.

            O que trago ao debate é: o que significam os recursos do FMI; em que podem ser utilizados; e a afirmação que reiteradamente temos ouvido a respeito da sua utilização para colocar como se no caixa pudessem ser colocados para gastos correntes, quando isso não é verdade. É uma deturpação até do próprio conceito e aplicabilidade dos recursos do Fundo Monetário Internacional.

            Não sei se o Senador Suplicy deseja fazer um aparte; do contrário, concederei à Senadora Ana Júlia Carepa, e vou terminar.

            O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Senadora Ideli Salvatti, V. Exª coloca um ponto importante no que diz respeito à racionalidade da decisão do Governo de pagar a dívida que o Brasil tinha junto ao Fundo Monetário Internacional, ao mesmo tempo possibilitando uma maior liberdade, autonomia e soberania do Governo brasileiro em relação àquele órgão do qual somos sócios cotistas. Por isso é que existe a possibilidade de o Brasil recorrer a empréstimos do Fundo Monetário Internacional quando isso constitui algo que se torna necessário. O Governo Fernando Henrique Cardoso, durante as crises, sobretudo em torno de 98, 99, enfrentou um problema de dificuldade, de instabilidade financeira muito sério em virtude da crise cambial, e precisou recorrer. Foi feito um empréstimo de grande volume. Durante os três primeiros anos do Governo Lula, Sua Excelência se viu na necessidade de ainda estar se libertando, gradualmente, das exigências de contrapartida que decorriam desse empréstimo, mas avaliou o Ministro da Fazenda, assim como o Presidente Lula, que já era hora de o Brasil se libertar dessa ligação. Com isso, não houve mais a necessidade de pagarmos US$900 milhões de dólares anualmente de juros. Por outro lado, isso significou diminuição de US$15 bilhões de reserva, mas o Brasil ainda tem um volume de reserva considerado saudável. É preciso notar que alguns países como a Índia e, em especial, a China, que se destacam por apresentar extraordinárias taxas de crescimento econômico, têm mantido um nível de reservas ainda bem superior àquilo que o Governo brasileiro conseguiu e aumentou, para resguardar-se mais com respeito a eventuais instabilidades do sistema financeiro internacional. Então, parece-me que essa decisão do Governo Lula inclui-se num conjunto de decisões que propicia, neste quarto ano de gestão, condições muito favoráveis a uma retomada de crescimento econômico acelerada, combinada aos objetivos de estabilidade de preços, promoção das oportunidades de emprego, maior eqüidade social. São todos esses objetivos importantes do Presidente Lula.

            A SRª IDELI SALVATTI (Bloco/PT - SC) - Agradeço a V. Exª, Senador Eduardo Suplicy.

            Ainda trazendo alguns elementos...

            O SR. PRESIDENTE (Alvaro Dias. PSDB - PR) - Senadora, a Presidência está sendo pressionada pelos oradores.

            A SRª IDELI SALVATTI (Bloco/PT - SC) - Já vou concluir, Senador Alvaro Dias, pedindo desculpas à Senadora Ana Júlia.

            O que foi pago ao FMI, ou seja, os US$ 15 bilhões retirados das reservas, volto a dizer, não podia ser aplicado nos gastos correntes. O pagamento da dívida implica economia de juros, juros a menos, juros a menor que vão deixar de ser pagos, esses sim, saídos do caixa das despesas correntes do Governo.

            Além disso, todo este debate travado aqui, a respeito de transformar a moeda, precisa ser cotejado com outras variáveis. O fato de decidirmos pagar ao FMI, de nos livrarmos dessa dependência, teve conseqüências para o risco país, pois diminuiu processos negociais em termos de juros, prazos de pagamento, não só para o Governo, como para as empresas brasileiras, apresentando também resultado significativo.

            Portanto, no momento de confrontar-se se foi efetivamente mais vantajoso ou menos vantajoso, todos os elementos têm que ser analisados. Por isso, achei ruim discutirmos este assunto com tempo reduzido, uma vez que o debate mereceria prazo maior.

            Senador Alvaro Dias, não poderia deixar de dizer que, em relação a impostos e dívidas, apresentados aqui de forma muito contundente na fala de quem me precedeu, temos que relembrar sempre que a dívida no período anterior foi multiplicada por 10 - de perto de 70 bilhões ultrapassou a casa dos 700 bilhões. Quanto a impostos, a carga tributária nos dois governos que nos antecederam, pulou de 26% para, aproximadamente, mais de 36% do PIB. Muitas das contribuições citadas aqui - Cofins, CPMF, Cide - foram todas criadas nos governos anteriores e não no governo atual.

            Sr. Presidente, peço desculpa por ter me alongado.

            O Sr. Heráclito Fortes (PFL - PI) - V. Exª me permite um aparte?

            A SRª IDELI SALVATTI (Bloco/PT - SC) - Não posso conceder, porque eu já neguei um aparte à Senadora Ana Júlia...


Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/02/2006 - Página 2973