Discurso durante a 40ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Considerações a respeito da cartilha de homenagem aos negros. Análise de projeto de lei em tramitação na Câmara dos Deputados, que retira direitos dos trabalhadores das micro e pequenas empresas.

Autor
Paulo Paim (PT - Partido dos Trabalhadores/RS)
Nome completo: Paulo Renato Paim
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DISCRIMINAÇÃO RACIAL. POLITICA SALARIAL. MICROEMPRESA, PEQUENA EMPRESA.:
  • Considerações a respeito da cartilha de homenagem aos negros. Análise de projeto de lei em tramitação na Câmara dos Deputados, que retira direitos dos trabalhadores das micro e pequenas empresas.
Aparteantes
Alberto Silva.
Publicação
Publicação no DSF de 11/02/2006 - Página 4541
Assunto
Outros > DISCRIMINAÇÃO RACIAL. POLITICA SALARIAL. MICROEMPRESA, PEQUENA EMPRESA.
Indexação
  • COMENTARIO, DOCUMENTO, HOMENAGEM, NEGRO, GOVERNO FEDERAL, EXCLUSÃO, VULTO HISTORICO, POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), IMPORTANCIA, LUTA, COMBATE, DISCRIMINAÇÃO RACIAL, REGISTRO, RESISTENCIA, ATUAÇÃO PARLAMENTAR, ORADOR.
  • IMPORTANCIA, ENTREGA, SENADO, PROJETO DE LEI, REAJUSTE, SALARIO MINIMO, INICIATIVA, EXECUTIVO, EXPECTATIVA, DEBATE, COMISSÃO ESPECIAL.
  • ANALISE, TRAMITAÇÃO, CAMARA DOS DEPUTADOS, PROJETO DE LEI, MICROEMPRESA, PEQUENA EMPRESA, OPOSIÇÃO, ARTIGO, REDUÇÃO, DIREITOS, TRABALHADOR.

O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Mão Santa, eu, de fato, soube dessa cartilha. Eu não queria falar dela, mas V. Exª, que é um homem bem informado e que recebe a mídia nacional, hoje, pela manhã, comentava comigo o que tinha lido na coluna de um jornalista muito respeitado no Rio Grande, por suas posições muito firmes e que, eu diria, em grande parte das vezes, discorda do meu ponto de vista sobre alguns temas, mas também concorda em outras áreas.

            Rogério Modesto, hoje, escreve uma coluna em que V. Exª foi o primeiro a me apresentar, embora eu a leia todos os dias, como faço com os artigos de Ana Amélia, Rosane, Burd, enfim, de todos os colunistas do Rio Grande do Sul.

            Senador Mão Santa, sinceramente, não deu para entender esse trabalho que foi feito pela Fundação Palmares, pelo Ministério da Cultura e pelo Ministro Gil. Não quero fazer nenhuma consideração que desmereça o trabalho dessa entidade, que tenho apoiado e com a qual tenho trabalhado.

            Em Porto Alegre, Senador Mão Santa, quando o Quilombo Silva ia ser despejado, eu e V. Exª, um negro e um branco, aprovamos uma missão especial do Senado Federal que, acompanhada pela TV Senado, foi até a Assembléia. Unimo-nos todos para promover o debate sobre um tema tão bonito, como é o do Quilombo Silva, que contou com a participação também do Ministério do Desenvolvimento Agrário. Foi um momento bonito. V. Exª, inclusive, foi muito aplaudido na capital, porque defendia terra para os quilombolas.

Estranhei, confesso, não por mim, Senador Mão Santa, que deixassem de fora os chamados “negros do Rio Grande do Sul”, como o Bispo D. Gílio, que foi lembrado até para ser Papa e é um homem que tem posições firmes e claras, não partidárias, e Deise Nunes, também gaúcha, a primeira negra eleita Miss Brasil. Não dá para aceitar, não dá para entender. Alceu Collares não é do meu Partido, é do PDT, mas já foi considerado, há algumas décadas, e não há como se negar a história, um dos Deputados de maior destaque e foi o primeiro Governador negro eleito do Brasil - e não é considerado um negro ilustre? Deixaram de fora Carlos Santos, do MDB, na época, o primeiro negro a ser eleito Deputado estadual no Rio Grande do Sul e Presidente da Assembléia Legislativa do Estado, e Giba-Giba, um ídolo da música e da cultura brasileira. Sinceramente, não dá para entender.

Quanto a mim, não há problema algum. Todos sabem da minha rebeldia aqui dentro, da minha firmeza de posições. Até entendo todo tipo de retaliação que venho sofrendo nos últimos anos e fico quieto, Senador Cristovam Buarque. Tenho recebido retaliações em cima de retaliações, mas fico quieto, pois devo cumprir o meu mandato, meu compromisso com o meu povo, com o meu Estado e com o meu País.

Sei que muitos não aceitaram a luta pela previdência e V. Exªs, Senadores Cristovam Buarque, Mão Santa e Alberto Silva, foram parceiros. Aprovou-se a PEC Paralela, o que, sei, até hoje muita gente não engoliu e não aceitou, porque estabelecemos uma política de resistência.

Senador Mão Santa, houve, em Brasília, uma grande marcha chamada Zumbi+10. Trabalhei para que houvesse uma única marcha, mas, no mesmo mês, foram realizadas duas marchas da comunidade negra. Eu dizia que a forma de pressionar os poderes constituídos seria uma grande marcha e muita gente não engoliu isso, mas tudo bem.

Quanto ao Estatuto da Igualdade Racial, só Deus e talvez nós saibamos a luta que foi feita para aprová-lo por unanimidade no Senado. Muita gente que não queria sua aprovação dizia: “Lá vai o Paim aprovar o Estatuto da Igualdade Racial”, mas os Senadores o aprovaram por unanimidade - nem precisou passar pelo Plenário -, aceitando o debate realizado nas comissões como uma peça importante que pode avançar mais na Câmara.

Não pense ninguém que foi fácil aprovar o Estatuto do Idoso, mas ele hoje é lei.

O Estatuto da Pessoa com Deficiência poderia ser lei, mas houve obstáculos. Alguém já disse: “Sabe por que não passa, Paim? Porque o projeto é de sua autoria, negro e Senador.”. Mas não tem problema algum.

Quem acompanha a minha luta de mais de 20 anos pelo salário-mínimo - que não é só minha mas também de muita gente - sabe que ela também não é vista com bons olhos no atual momento. Agora, há uma Comissão Mista que vai viajar pelo País para debater não só o salário-mínimo, mas também os benefícios dos aposentados e pensionistas.

O meu caso eu entendo. De fato, em virtude da minha posição de rebeldia, alguns dizem: “Botem o Paim na geladeira.”. Quando há grandes movimentos do Governo no meu Estado, dizem: “Convidem todos, só não convidem o Paim.”. Quando há debate de projetos importantes, fico sabendo disso porque sou amigo dos funcionários da Casa e dos próprios assessores, a orientação é : “Se é do Paim, tirem fora.”. Relatoria de temas que são ligados diretamente à nossa área? “Olhem, para o Paim, não.”

Para mim, não há problema, mas fazer uma cartilha esquecendo esses nomes! Eu diria que não é inteligente, porque dá a impressão de que se trata de um debate muito mais ideológico e partidário, o que não é bom para ninguém.

Sr. Presidente, eu não ia tocar nesse assunto, mas V. Exª me provocou e eu acabei falando um pouco mais.

Agradeço, Senador Mão Santa, pela lembrança desse tema. Eu continuarei o mesmo, defendendo as minha convicções em todos os temas.

Quero, mais uma vez, dizer que foi muito importante o dia de ontem, quando o Ministro Marinho, o Ministro Jaques Wagner e o Ministro Paulo Bernado entregaram ao Presidente da Casa o Projeto do Salário-Mínimo - e não mais uma medida provisória.

Espero que ele seja remetido para a Comissão Especial, Senador Cristovam, de que V. Exª faz parte, que está discutindo o salário-mínimo - e nós estamos lá. Que não achem uma maneira de fazer com que o Projeto não seja encaminhado à Comissão Especial, pois daqui a pouco inventam uma outra forma. Existe uma Comissão Especial debatendo o tema e só falta o Projeto não chegar nela. Espero que isso não aconteça.

Sr. Presidente, foi importante esse ato de ontem, aqui. Quero reafirmar que o Ministro Marinho me comunicou que o Projeto seria entregue e disse que estava atendendo a um pedido da Comissão Especial para que o assunto fosse debatido na Casa.

Sr. Presidente, quero também demonstrar a minha preocupação com outro projeto de lei, em debate na Câmara dos Deputados, que trata das pequenas e microempresas, de cuja Frente Parlamentar faço parte. Preocupei-me muito, principalmente com um artigo que diz que a contribuição das micro e pequenas empresas para o trabalhador, que hoje é de 8%, poderá ser de até 0,5%.

Sinceramente, Sr. Presidente, penso que não é tirando-se pequenos direitos do trabalhador ao ser demitido que se resolverá o problema das micro e pequenas empresas. Quero aprovar esse projeto, mas não mexer em direitos tão pequenos dos trabalhadores. Esse é um gesto tão pequeno que não merece o aval, no meu entendimento, da Câmara e do Senado.

Por que não diminuímos os encargos sobre a folha de pagamento no seu conjunto?

Senador Alberto Silva, Senador Mão Santa, V. Exªs que são estudiosos desse tema e que estão preocupados com o emprego no País, por que não debatemos o fato de que, hoje, somente para a Previdência vão cerca de 40% da folha de pagamento? Por que a gente não desonera, ao invés de ficar brigando por 0,5%, tira esses 40% sobre a folha, que entre empregado, empregador e Cofins dão mais ou menos isso que vai para a Previdência, e não joga sobre um percentual fixo sobre o faturamento? Aí, estaríamos ajudando as pequenas, que faturam menos. Quem fatura mais são as grandes, aquelas que têm cinco mil, dez mil, ou os grandes bancos. Aí, sim, ajudar-se-ia a pequena empresa e não se tirariam os direitos mínimos do trabalhador.

Eu ia fazer um apelo ao Relator desse projeto - se não me engano, é o Deputado Hauly -, para que revisasse essa posição. Vamos fazer um debate maior.

Senador Alberto Silva, concederei, em seguida, o aparte a V. Exª. Podemos fazer tranqüilamente um grande debate. Trabalhemos todos para desonerar a folha! Quem lucra mais? Se o lucro for por percentual... E pode ser o mesmo percentual, não é? É percentual! Se lucrei menos... Dois por cento sobre dez são dois, e 2% sobre cem são vinte. Então, é dez vezes mais do que aquilo que pagaria por mês.

Por isso, Senador Alberto Silva, entendo que esse debate tem de ser ampliado e mais qualificado, de forma a incentivar a que as pessoas tenham direito efetivamente ao posto de trabalho.

Concedo-lhe o aparte, Senador Alberto Silva.

O Sr. Alberto Silva (PMDB - PI) - Senador Paulo Paim, V. Exª toca em assunto da maior importância. Tenho conhecido pessoas que estão nas pequenas e microempresas que dizem não conseguir viver porque a folha de pagamento foi onerada em 40%. V. Exª tem toda razão: deve haver um percentual fixo sobre o faturamento. Quem faturar menos paga menos; quem faturar mais paga mais. Mas, no momento, isso não existe, é pendurado na folha.

O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS) - É tudo sobre a folha.

O Sr. Alberto Silva (PMDB - PI) - V. Exª tem toda razão. Podemos montar aqui um grupo de trabalho. V. Exª já capitaneou a PEC paralela. Sou testemunha disso. Foi V. Exª que a levantou, e o fez de tal maneira, que todos nós apoiamos sua iniciativa, e aquela PEC foi aprovada. Ainda que tenha levado muito tempo na Câmara, foi aprovada aqui até muito rapidamente. Então, Senador Paim, assuma o comando disso! E trabalhemos juntos no sentido de que as coisas aconteçam como V. Exª está sugerindo! Parabéns pela idéia!

O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS) - Muito obrigado, Senador Alberto Silva. É uma iniciativa sobre a qual poderíamos conversar com o Presidente da Casa, sem ter medo do bom debate, qualificado e equilibrado.

Eu falava - e V. Exª concordava - que 40% é da previdência. Se analisarmos a folha - o componente de contribuições, de tributos -, chegaremos a 110%. Quem sabe chegaremos a um entendimento? Retiram-se os 110%, retira tudo - e por que não? -, e se estabelece um percentual fixo. Desse percentual, um tanto vai para a previdência; outro tanto, para a saúde, se assim entender; e outro tanto, para a educação. Esse é um outro debate.

Então, devíamos enfrentar esse debate no Brasil, mas tem de haver ousadia. Às vezes, uso a palavra “coragem”. É preciso ter coragem. Sempre haverá aqueles que vão dizer: “Ah, não! Agora, vão discutir a tributação sobre a folha”. É dos dois lados. E do bom debate ninguém tem de ter medo.

Sr. Presidente, quero também falar um pouquinho aos fiscais do Ministério do Trabalho. Não estou entendendo, Sr. Presidente. Os fiscais do Ministério do Trabalho, agora, em vez de se preocuparem em fazer a devida fiscalização, no sentido de evitar acidentes no trabalho, de melhorar as condições, de estabelecer um diálogo entre empregado e empregador e de apontar caminhos, estão preocupados com a contribuição que os sindicatos recebem dos trabalhadores. Resolveram que trabalhador não pode contribuir para o sindicato, principalmente no Rio Grande do Sul, em especial no Vale dos Sinos. Preocupam-se em só controlar se o trabalhador está contribuindo, mediante a decisão da assembléia. Não querem que eles contribuam.

Estive, ontem, numa reunião com cerca de doze líderes sindicais do Rio Grande do Sul, liderados pelo companheiro Quintino e por outros. Fomos à presença do Ministro do Trabalho e mostramos a S. Exª a situação. Depois, como eu tinha compromisso aqui no Senado - gosto de estar aqui às 16 horas -, retornei. Na conversa que tive como eles, verifiquei que estão, de fato, muito preocupados.

Faço um apelo da tribuna do Senado da República: deixem que trabalhadores e líderes sindicais se entendam com sua contribuição! Esse é o princípio da liberdade e da autonomia sindical. Fiscal do trabalho tem de se preocupar em fiscalizar efetivamente se as condições objetivas para o exercício da função estão asseguradas. Para que multar empresas? Multam as empresas e complicam a vida dos sindicatos, porque as empresas estariam recebendo um percentual do pagamento do trabalhador decidido em assembléia, forçando os trabalhadores a não contribuírem com suas entidades. Há lógica?

Eu, por exemplo, contribuo para o Fundo de Previdência. Essa foi uma opção minha. Eu poderia ou não contribuir. Eu quis contribuir. Agora, o fiscal me proibirá de contribuir? Vou contribuir, porque quero contribuir. Qual é o problema? E a contribuição é descontada em folha. Então, Sr. Presidente, são essas questões que não consigo entender.

Faço aqui um apelo aos fiscais da previdência: façam seu trabalhinho, com todo o respeito! Deixem que os sindicatos, as federações, as confederações e as centrais se entendam mediante decisão da assembléia! Uma vez decidido em assembléia, quem for contrário vá lá e exponha sua posição!

Por isso, cumprimento o movimento sindical gaúcho pela sua firmeza nesse debate que está ocorrendo. Confesso, vim do movimento sindical, e disse-lhes que essa interferência é indevida - eu diria - de um dos Poderes constituídos na vida sindical.

Sr. Presidente, Senador Mão Santa, concluo, dizendo que espero que esse projeto relacionado ao direito dos trabalhadores efetivamente não passe.

Senador Cristovam Buarque, eu, infelizmente, como Deputado Federal, num gesto um pouco ousado - acho até exagerado -, peguei uma folha da Constituição e disse que os Deputados estariam arrancando o coração da Constituição se mutilassem o artigo da ordem social. Isso foi até motivo para que um certo Parlamentar entrasse com uma ação para que eu perdesse o mandato devido a essa minha fala dura e ao gesto que eu fazia. É claro que nada aconteceu. Tive o apoio de todos os Deputados e Senadores, a não ser desse, para que isso não acontecesse.

Mas, se mandarem para cá um projeto como esse, mutilando o direito dos trabalhadores, podem saber que teremos de caminhar com a mesma ousadia, com a mesma firmeza, mas não vamos permitir isso. É diferente se quiserem discutir aquilo que chamo de deslocamento da folha de pagamento para o faturamento, para o lucro, garantindo os direitos hoje assegurados na Constituição. A Carta Magna, que foi construída com muita força, não será mutilada por um projeto de lei.

Termino, Sr. Presidente, com uma frase que não é minha, mas faço questão de dizê-la. Para encerrar, cito uma frase do mestre Paulo Bonavides, que diz: “Fora da Constituição, não há instrumento nem meio que afiance a sobrevivência democrática das instituições”. Esse projeto, inclusive, fere a Constituição. Não é por ser um projeto de lei que se vai mexer no direito dos trabalhadores. Espero que não passe lá, mas, se chegar aqui, vamos fazer um bom debate, na certeza de que ele será derrotado no que se refere a esse artigo.

Concordo, na íntegra, com o projeto que está sendo chamado de Estatuto da Micro e Pequena Empresa, o novo Simples. Mas, quando toca nos direitos dos trabalhadores, dos aposentados e dos pensionistas, saibam que vai haver muita resistência aqui, no Senado da República!

Mais uma vez, Senador Mão Santa, quero render a V. Exª minhas homenagens e meu reconhecimento pela forma como age nesta Casa, com posições muito firmes. Todas as vezes que um colega seu é atingido de forma injusta, V. Exª vem à tribuna e é o primeiro a fazer a defesa. Parabéns a V. Exª, que é um exemplo de Senador não só para o Piauí, mas também para o Brasil!

Muito obrigado, Senador Mão Santa.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/02/2006 - Página 4541