Discurso durante a 18ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Homenagem de pesar pelo falecimento do artista plástico Aldemir Martins, ocorrido no último domingo.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Homenagem de pesar pelo falecimento do artista plástico Aldemir Martins, ocorrido no último domingo.
Publicação
Publicação no DSF de 08/02/2006 - Página 3469
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM POSTUMA, ALDEMIR MARTINS, ARTISTA, ARTES PLASTICAS, REGISTRO, BIOGRAFIA, ELOGIO, ATUAÇÃO.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP. Para encaminhar a votação. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, o Brasil perdeu, no último domingo, o artista plástico Aldemir Martins - um criador sem limites -, vítima de um infarto, aos 83 anos de idade.

Nascido em Ingazeiras, no Ceará, em 08 de novembro de 1922, aos oito anos já fazia, com pedaços de tijolo e carvão, seus primeiros desenhos. Transferindo-se na adolescência para Fortaleza, começou, em princípios da década de 1940, sua carreira artística, participando do movimento de renovação cultural desencadeado pela Sociedade Cearense de Artes Plásticas, a qual ajudou a fundar. Até no Exército, onde permaneceu de 1941 a 1945, sua vocação marcou presença: Aldemir tornou-se Cabo Pintor ao vencer um concurso nas oficinas de materiais bélicos.

Participou de exposições, fez ilustrações que enriqueceram jornais e livros diversos e, em 1945, mudou-se para o Rio de Janeiro, onde tomou parte em coletivas. Um ano depois, transferiu definitivamente para São Paulo.

Lá, em 1947, obteve seu primeiro prêmio de significação: o terceiro lugar na mostra 19 pintores, realizada na União Cultural Brasil - Estados Unidos e julgada por Segall, Malfatti e Di Cavalcanti, Grupo dos 19. Desde então, Aldemir Martins é figura de destaque no cenário artístico brasileiro.

Oriundo de uma das regiões mais dramaticamente carentes do Brasil, era compreensível que Aldemir evocasse, nos primeiros testemunhos de sua produção pictórica, temas e motivos pungentes, reveladores das condições subumanas em que viviam - e ainda vivem - tantos nordestinos.

E embora muito jovem e inexperiente, sem dispor sequer dos recursos técnicos de que mais tarde se apossaria, é de se realçar a força dramática dos seus quadros da época, nos quais a miséria, a seca, a fome e a doença desempenham o papel principal; força dramática, de resto, que a partir da década de 1950 cederia gradativamente vez a uma crescente estilização e a uma acentuada pesquisa formal, que os tornariam mais bem realizados, sem dúvida, mas também muito expressivos.

Com o passar dos anos, Aldemir foi-se definindo cada vez mais como artista gráfico, em detrimento da pintura. E foi como gravador e desenhista que se impôs no panorama de nossas artes plásticas, ganhando prêmios de importância como o da Bienal de São Paulo, em 1955 (Melhor Desenhista), ou o da Bienal de Veneza, em 1956 (Desenho), ou ainda o de viagem ao estrangeiro do Salão Nacional de Arte Moderna de 1959, graças ao qual passou dois anos na Itália.

A temática dos seus primeiros tempos em Fortaleza e São Paulo foi pouco a pouco substituída por assuntos como bichos, em especial gatos, aves, galos, flores, frutos, cangaceiros e mulheres rendeiras, tratados não mais expressionisticamente, mas de modo mais adocicado. Foram esses assuntos, divulgados por todo o País até como padrões decorativos de louças e tecidos, que terminaram por transformar Aldemir num dos artistas plásticos mais populares do Brasil.

Recebeu inúmeros prêmios, nacionais e internacionais, e suas pinturas, além de enriquecer capas de livros como Terras do Sem Fim e Gabriela, Cravo e Canela, de autoria de Jorge Amado, foram reproduzidas nos mais variados produtos industriais, como pratos, bandejas, xícaras, tecidos e embalagens. E foi o próprio Jorge Amado que tão bem definiu Aldemir Martins:

Talvez por ser assim tão violento o sol, tão áspera a terra, tão cruel a seca, tão devastadoras as enchentes, tão pobre o homem em chão rico, talvez para compensar tanta dificuldade a enfrentar e a vencer, da sofrida (não, porém, vencida) humanidade do Nordeste nascem os grandes criadores, os poetas, os romancistas, os músicos, os pintores. Nasce Aldemir Martins, mais do que nordeste, o próprio Nordeste.

A carreira de Aldemir Martins conta com mais de 150 exposições coletivas e individuais. Era em seu gostoso e espaçoso ateliê no bairro do Sumaré que ele se recolhia todas as tardes para dar liberdade ao seu talento e cores à sua imaginação.

Tive a honra de conhecer Aldemir Martins em 1955, quando eu tinha 14 anos. Ele se tornou amigo de minha família. Acompanhei de perto quando ele recebeu o prêmio de melhor desenhista da Bienal de São Paulo, em 1955, e, depois, da Bienal de Veneza, em 1956. Desde então fui admirador de seu extraordinário talento e sensibilidade. Ele soube, por meio de seus desenhos, expressar tão bem as dificuldades do sertanejo nordestino, as aspirações de liberdade e de justiça de todos os brasileiros.

Requeiro, portanto, que seja inserido voto de pesar pelo falecimento de Aldemir Martins e a apresentação de condolências a sua querida esposa Cora Pabst, aos filhos e netos.

Eu gostaria de registrar que os Senadores José Jorge, Tasso Jereissati e Arthur Virgílio também encaminharam requerimentos no mesmo sentido.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/02/2006 - Página 3469