Discurso durante a Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Preocupação dos agricultores de todos os locais onde se planta a soja, com a doença denominada "ferrugem asiática". Denúncia contra a Bayer pela venda de defensivo ineficaz.

Autor
Serys Slhessarenko (PT - Partido dos Trabalhadores/MT)
Nome completo: Serys Marly Slhessarenko
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
IMPRENSA. POLITICA AGRICOLA.:
  • Preocupação dos agricultores de todos os locais onde se planta a soja, com a doença denominada "ferrugem asiática". Denúncia contra a Bayer pela venda de defensivo ineficaz.
Publicação
Publicação no DSF de 03/03/2006 - Página 6655
Assunto
Outros > IMPRENSA. POLITICA AGRICOLA.
Indexação
  • SOLIDARIEDADE, DISCURSO, TIÃO VIANA, CONGRESSISTA, DEFESA, MARINA SILVA, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DO MEIO AMBIENTE (MMA), ANA JULIA CAREPA, SENADOR, INJUSTIÇA, ACUSAÇÃO, IMPRENSA.
  • APREENSÃO, AGRICULTOR, ESTADO DE MATO GROSSO (MT), PRAGA, SOJA, PREJUIZO, SAFRA, EFEITO, INADIMPLENCIA, DIVIDA AGRARIA, DENUNCIA, FALTA, RESPONSABILIDADE, EMPRESA MULTINACIONAL, LABORATORIO FARMACEUTICO, MANIPULAÇÃO, PRODUTOR RURAL, TESTE, DEFENSIVO AGRICOLA, INEFICACIA, COMBATE A PRAGA, SOLIDARIEDADE, ORADOR, AÇÃO JUDICIAL, PEDIDO, INDENIZAÇÃO, DETALHAMENTO, OCORRENCIA, FALENCIA.
  • DENUNCIA, ATUAÇÃO, EMPRESA MULTINACIONAL, PAGAMENTO, INDENIZAÇÃO, PRIMEIRO MUNDO, DISCRIMINAÇÃO, PRODUTOR RURAL, BRASIL.

A SRª SERYS SLHESSARENKO (Bloco/PT - MT. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, há, aliás, vários vírus para os quais precisamos de vacina, começando pelos da maldade, como a da revista Veja, de difícil antídoto. Realmente, Senadora Ana Júlia Carepa, a quem presto solidariedade, assinando embaixo de tudo o que o nosso Senador Tião Viana acabou de falar. Não vou fazer discurso aqui pró-Ministra Marina, porque tenho feito muitos; apenas digo que assino embaixo das palavras do Senador Tião Viana, o que significa que, se eu falasse, eu teria que repetir praticamente tudo que S. Exª disse aqui.

Quero também registrar a minha total e irrestrita solidariedade à nossa companheira Ana Júlia Carepa, antes mesmo de S. Exª vir a esta tribuna se posicionar. Sei que vai fazê-lo, porque a conheço, sei da história e também já li toda a justificativa e sei do porquê, do preço que se paga, Senadora, por combatermos os grandes grileiros, os destruidores das florestas e tudo o mais que, em meu Estado de Mato Grosso, não é muito diferente.

Mas o assunto que nos traz aqui também é um outro vírus. Não deixa de ser um vírus a irresponsabilidade de determinadas grandes empresas. Srªs e Srs. Senadores, Sr. Senador Romeu Tuma, que preside esta sessão neste momento, trago a esta Casa um assunto da maior gravidade, um assunto que preocupa os agricultores de Mato Grosso, mas que também é do interesse dos agricultores de diversos Estados, como Mato Grosso do Sul, Goiás, Bahia, Minas Gerais, Paraná, Rio Grande do Sul. Em suma, é da preocupação de agricultores de todos os Estados onde se planta soja. Preocupação de agricultores que enfrentaram, especialmente na safra 2003/2004, a praga denominada ferrugem asiática, que ataca a soja e dizima plantações. Uma doença que, em 2004, provocou perdas superiores a US$2 bilhões para o Brasil, considerando o estrago provocado pela ferrugem asiática em nossas lavouras.

É um assunto extremamente complexo, porque depois a produção não rende, vem o problema de negociação de dívidas, os produtores ficam no prejuízo, o Brasil fica prejudicado. O caso que vou relatar foi resultado de um grande ato de irresponsabilidade de uma multinacional, a Bayer. Vou explicar detalhadamente o porquê do que estou declarando aqui.

Trago para esta Casa uma grande ansiedade, a agonia mesmo de inúmeros produtores rurais que foram lesados por uma multinacional na tentativa de combater a ferrugem asiática. Produtores rurais que, acreditando estar assessorados por uma grande empresa, serviram, em verdade, de cobaias. Produtores que foram cobaias no uso de um defensivo agrícola. Produtores usados como cobaias e que arcaram sozinhos com o prejuízo. Produtores que foram cobaias no uso de um fungicida vendido com a promessa de ser o melhor preventivo contra a ferrugem que atacava a soja.

Estou falando, Srªs e Srs. Senadores, da multinacional Bayer CropScience. Estou falando do produto denominado Stratego 250 EC, que foi recomendado pela Bayer como preventivo contra a ferrugem asiática na safra 2003/2004. Estou falando de um produto usado em lavouras de vários Estados brasileiros, contando com a boa-fé de inúmeros produtores rurais que confiaram na Bayer e compraram caro o produto. Estou falando de um produto que continua disponibilizado pela multinacional, mas que praticamente não foi comercializado nas safras 2004/2005 e 2005/2006 como defensivo contra a ferrugem asiática. Um fungicida rejeitado pelo setor agrícola porque ineficaz como preventivo contra a ferrugem asiática que ataca a soja.

Estou falando de centenas de agricultores que procuraram a Justiça pedindo indenização contra a Bayer. Estou falando de uma enxurrada de ações na Justiça contra a Bayer, que usou produtores brasileiros como cobaias e, agora, relegou ao prejuízo aqueles que confiaram na propaganda de que “Se é Bayer é bom”.

Estou falando de direito do consumidor. De direito de clientes lesados pela Bayer na condição de consumidores, de compradores de um produto que se revelou ineficaz e, via de conseqüência, contribuiu para a falência de muitos produtores, de centenas de produtores.

Estamos também falando de uma praga voraz, uma doença que dizima plantações e com a qual não se brinca. Tanto que o mercado oferece diversos fungicidas destinados à prevenção e controle. Produtos que não podem falhar, sob pena de levar à falência quem trabalha nessa atividade.

Foi isso que aconteceu em diversos Estados brasileiros.

Basta uma simples pesquisa nas páginas dos Tribunais de Justiça para se encontrar um grande número de ações com pedido de reparação por danos contra a multinacional Bayer CropScience. Ações exatamente pela ineficiência de um produto Bayer. Agora, imaginem, senhores, quantos produtos, remédios para seres humanos não estão com problema? São inúmeras ações pelo mundo afora.

Em Mato Grosso, por exemplo, apesar de a Bayer reconhecer para a imprensa a existência de apenas e tão-somente 18 ações, existem dezenas de processos na Justiça.

Existe uma verdadeira enxurrada de ações na Justiça, processos em Comarcas como Cuiabá, Rondonópolis, Campo Verde, Campo Novo do Parecis, Sorriso, Comodoro, Lucas do Rio Verde, Nova Mutum, Diamantino e outras.

É bem verdade que também existem muitas ações contra empresas que comercializaram o produto Stratego da Bayer.

Mas o fato é que existem dezenas de ações na justiça contra a Bayer por conta do Stratego, que, aliás, deveria ser chamado “estrago”.

Uma prova de que o produto da Bayer provocou prejuízos é a existência, na cidade de Diamantino, região do Médio Norte de Mato Grosso, de uma entidade denominada Associação dos Produtores Lesados pelo Uso do Stratego, a Aplus.

O nome dessa associação denuncia o produto da Bayer.

O nome “Associação dos Produtores Lesados pelo Uso do Stratego” é um pedido de socorro ao Poder Público.

Assim, essa entidade presidida pelo agrônomo e ex-produtor rural Sônio Aramis Blauth é uma denúncia cabal de que produtores rurais foram usados como cobaia.

Agora, imaginem como fica a natureza e a população de um modo geral.

O nome dessa entidade reporta para um senso comum de que o produto não serviu para a prevenção da ferrugem asiática nas lavouras de soja. Com certeza, não só não serviu para o combate como prejudicou grandemente. É um pedido de socorro de produtores que não suportaram os prejuízos e deixaram de plantar soja, como é o caso de Sônio Aramis Blauth. Ou do outro produtor rural, o Sr. Lauro Diavan Neto, que amargou um prejuízo de 350 mil sacas de soja na safra 2004/2005 por confiar na Bayer e usar o fungicida Stratego como preventivo contra a ferrugem asiática.

O caso Diavan contra a Bayer é acintoso, está na imprensa de Mato Grosso.

A Bayer recomendou o uso do Stratego e vendeu-lhe R$2,5 milhões em fungicida Stratego 250 EC para serem pagos gradativamente. Só que não houve nenhum resultado e a soja não produziu.

Como Diavan era considerado grande comprador, que comprava direto da fábrica, a Bayer manteve técnicos da empresa permanentemente na propriedade do agricultor acompanhando a aplicação do produto. Então, toda operação foi feita com acompanhamento da Bayer. Mas, quando o fungicida não deu resultado, a Bayer abandonou o produtor rural, retirou-se da fazenda e não ficou lá sequer para assistir a empresa que foi fazer a fiscalização e diagnosticar o problema.

Diante dos prejuízos, obviamente, a Bayer não quis e não quer reconhecer a sua responsabilidade. Mais grave ainda: está cobrando judicialmente os R$2,5 milhões que foram empenhados para a compra dos 6 mil litros do fungicida Stratego.

Não é por menos que Lauro Diavan Neto está reclamando milhões em indenização como reparação de prejuízos diretos e indiretos. Da mesma forma, inúmeros produtores rurais pelo Brasil afora estão cobrando indenização da Bayer e de empresas que revenderam o fungicida Stratego como o melhor remédio para a prevenção contra a ferrugem asiática.

Sr. Presidente, o produto é contra a ferrugem asiática. Foi fácil, não deu certo. A ferrugem tomou conta. Constatou-se que o prejuízo foi de milhões e milhões. E se um remédio qualquer da Bayer não der certo para um de nós e vidas forem perdidas? Como fica? Porque até que se constate e se prove que a Bayer tem grande irresponsabilidade no que está produzindo, inclusive medicamentos, talvez muitas e muitas vidas tenham se acabado.

Esse assunto, Srªs e Srs. Senadores, vem dominando a imprensa de Mato Grosso e de vários Estados do Brasil nas últimas semanas. Ela vem destacando principalmente a existência de inúmeras ações na Justiça contra a Bayer, mas trouxe também a resposta desta indústria. Pasme, Sr. Presidente! A multinacional alegou que houve grande incidência de chuva na safra 2003/2004 e também argumentou que os produtores rurais não tinham muito conhecimento para usar o produto Stratego como preventivo contra a ferrugem asiática.

Esse produto, é bom que se diga, era usado principalmente contra doenças em lavouras de algodão e café. Mas a resposta da Bayer, como informa a matéria do jornal Folha do Estado, em seu suplemento rural do dia 23 de fevereiro, aponta os produtores rurais mato-grossenses e dos Estados onde existem ações na Justiça pelo mesmo caso como caipiras, ignorantes - palavras da Bayer - que não dominam a técnica de uso de defensivos.

Srªs e Senhores, é muita arrogância da Bayer CropScience!

Vejamos o caso do Sr. Lauro Diavan Neto. Em novembro passado, em solenidade na cidade de São Paulo, ele foi laureado com uma das 13 premiações nacionais que todo ano a empresa Bunge oferece a seus parceiros. Como se vê, o produtor Lauro Diavan é o melhor produtor/parceiro de soja no Brasil, pois foi laureado. Mas, para a Bayer, ele não passa de alguém que não sabe cuidar de uma lavoura de soja, de um caipira ignorante. São as palavras da Bayer.

Mesmo tendo enfrentado prejuízos na safra 2003/2004, mesmo vendo sua produtividade cair de 55 sacas por hectare para apenas 30 sacas, já que o Stratego da Bayer não preveniu contra a ferrugem asiática, na safra seguinte, a de 2004/2005, usando o Stratego da Bayer, Lauro Diavan esperava colher 820 mil sacas de soja. Em 2003/2004, usando o Stratego da Bayer, Lauro Diavan esperava colher 650 mil sacas em 12 mil hectares. Colheu apenas 370 mil sacas. Em 2005, Lauro Diavan, sem a Bayer, com fungicida de outra empresa, enfrentou a ferrugem asiática e se deu muito melhor.

Então, Srªs e Srs. Senadores, há algo de errado nessa história. E errada está a Bayer. Errada porque o mencionado produtor - que como tantos outros aciona a Bayer na Justiça pedindo indenização - não pode ser considerado um imperito no uso de defensivo; não pode ser apontado como um caipira ignorante; não pode ser tratado como alguém que não entende do cultivo que faz. Ele deve ser respeitado, assim como devem ser respeitados todos os produtores rurais brasileiros, grandes e pequenos. Alguns deles alcançam produtividade de fazer inveja a qualquer país do mundo no número de sacas colhidas por hectare.

O Senado tem a obrigação de acompanhar esse assunto que permeia a Justiça em vários Estados do Brasil. Inclusive porque a Embrapa de Londrina, que é a maior especialista do Brasil em ferrugem asiática, classificou a composição química presente no Stratego como pouco eficaz contra a praga. Pelo menos é o que está na imprensa.

Srªs e Srs. Senadores, em ano recente, a Bayer teve que gastar €900 milhões com indenizações pelos efeitos prejudiciais causados pelo remédio Lipobay - mas isso ocorreu na Europa.

Há notícias de que a Bayer já estaria caucionando cerca de US$100 milhões para indenização na área agrícola por conta de seus produtos - mas isso é lá nos Estados Unidos.

E, no Brasil, como a Bayer se posiciona? Estaria ela caucionando algum valor perante a Justiça brasileira para eventual derrota no caso do uso do Stratego recomendado como preventivo contra a ferrugem asiática? Ou será que a Bayer vai ficar apenas insistindo que os nossos produtores rurais são caipiras e ignorantes? Ou será que vai ficar apenas justificando a ineficácia do seu produto no excesso de chuvas, conforme a resposta pelos jornais?

Para encerrar, Sr. Presidente, quero falar de chuva.

Será que durante o plantio da safra de soja 2004/2005 choveu apenas nas propriedades que usaram o Stratego da Bayer?

Em Campo Novo do Parecis, Município de Mato Grosso, onde está a propriedade de Lauro Diavan, e em Diamantino, onde está a propriedade do Presidente da Associação dos Produtores Lesados pelo Uso do Stratego, sojicultores que não usaram o produto da Bayer conseguiram controlar a ferrugem asiática, apesar das chuvas. Sojicultores que usaram outros fungicidas conseguiram controlar a praga, e esses, não.

Então, senhoras e senhores, o problema foi o excesso de chuva, foi certamente o produto Stratego da Bayer que não funcionou como preventivo contra a ferrugem asiática. E se a Bayer não tem culpa nessa história, então a culpa é de São Pedro, que fez chover apenas nas lavouras onde foi usado o Stratego da Bayer? Mas a Bayer não pode culpar São Pedro, não, nem os produtores que estão reclamando; culpada é ela, porque senão daqui a pouco, Sr. Presidente, no Brasil, tudo é culpa dos deuses. Ninguém mais vai receber seguro. Ventou, culpa de Zeus; choveu, de São Pedro; se fez sol, de um santo outro.

O Senado da República precisa acompanhar esse assunto do Stratego da Bayer. O caso está na Justiça, mas interessa aos produtores rurais brasileiros, interessa ao Brasil, interessa ao Senado da República.

Hoje é a Bayer; amanhã pode ser outra multinacional. Hoje é um fungicida aplicado na soja; amanhã pode ser um remédio recomendado para seres humanos.

Atentai! Vamos atentar para todos os fungicidas, a sua validade, as suas contaminações possíveis, os seus malefícios à vida etc. Que se atente para todos os aspectos e, cada vez mais, aos remédios fabricados por todas as multinacionais, mas especialmente pela Bayer, porque sabemos que, na Europa, ela já tem procedimentos de indenização que somam mais de €900 milhões, por erros em medicamentos para a vida de seres humanos. E eu lhes digo, Srªs e Srs. Senadores, que esse é um risco muito grande à vida. Se um produto fungicida traz riscos à vida quando mal usado ou quando usado em excesso, sem controle nem fiscalização, há também prejuízos à vida quando se trata de medicamentos para seres humanos.

E quando os agricultores brasileiros se vêem em total prejuízo, recorrem a transferências, a renegociação de dívida e não se buscam as raízes desses problemas, Srªs e Srs. Senadores. Aí está um gigantesco prejuízo que a agricultura no Brasil, em mais de dez Estados, sofreu nas safras de 2003 e 2004. Contudo, felizmente, esses pequenos e grandes produtores despertaram em tempo e estão atacando hoje a causa do problema, não apenas as conseqüências, para depois não ter de recorrer à negociação de dívidas porque os seus produtos foram atacados pela ferrugem asiática. Isso ocorreu por incompetência, por malversação no trato do produto fungicida, o tal Stratego 205 EC, para o combate à ferrugem asiática.

Muito obrigada, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/03/2006 - Página 6655