Discurso durante a Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Apelo no sentido da derrubada do anunciado veto presidencial ao projeto que trata da renegociação das dívidas dos agricultores do nordeste.

Autor
Mão Santa (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PI)
Nome completo: Francisco de Assis de Moraes Souza
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA AGRICOLA.:
  • Apelo no sentido da derrubada do anunciado veto presidencial ao projeto que trata da renegociação das dívidas dos agricultores do nordeste.
Publicação
Publicação no DSF de 21/02/2006 - Página 5632
Assunto
Outros > POLITICA AGRICOLA.
Indexação
  • NECESSIDADE, VALORIZAÇÃO, TRABALHO, CAMPO, BENEFICIO, PAIS, CRITICA, GOVERNO FEDERAL, OMISSÃO, IMPROBIDADE, ZONA RURAL, ESPECIFICAÇÃO, DADOS, INFERIORIDADE, PREÇO, PRODUTO PRIMARIO, LEITE, APREENSÃO, VETO (VET), PROJETO, RENEGOCIAÇÃO, DIVIDA, AGRICULTURA, RISCOS, PERDA, TERRAS, REPUDIO, FAVORECIMENTO, LUCRO, BANCOS.

O SR. MÃO SANTA (PMDB - PI. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Ilustre Senador Ramez Tebet, que preside esta sessão do Senado da República de 20 de fevereiro, segunda-feira, Senadoras e Senadores, brasileiras e brasileiros presentes aqui no plenário e que nos assistem pelo sistema de comunicação do Senado.

Senador Ramez Tebet, ouça a voz rouca das ruas. Muitas foram as mensagens de Ulysses Guimarães, encantado no fundo do mar, mas essa nos toca porque quem está nas ruas é o povo.

Senador Mestrinho, nesse fim de semana, estive no meu Piauí e vi a decepção de um povo com os chamados Poderes, principalmente este em que Camata adentra: o Poder Legislativo.

Atentai bem, Mestrinho, à renegociação das dívidas do homem do campo, do homem que produz, do homem que, com suas mãos santas, mexe a terra, a transforma e dela tira seu alimento.

Camata, a ignorância é audaciosa. Nosso Presidente da República é do PT, Partido dos Trabalhadores. “Comerás o pão com o suor do teu rosto”. Não conheço quem trabalhe mais do que o homem do campo. Não sou do campo; sou urbano. Minha família é de empresários, e eu fui ser médico.

Deus traz para cá os preparados. No começo desta legislatura, eu dizia e profetizava: nenhum do núcleo duro vai adentrar aqui. Nenhum! É, Camata!... Nenhum, eu dizia. Olhe que eles tombaram pela incompetência, pela ignorância audaciosa. Olha, não é preciso saber muito, não. A gente tem que ver.

Ô Tuma, não sei como V. Exª se tornou um extraordinário delegado. Não sei se foi vendo o Hopalong Cassidy, o Tom Mix, Rock Lane. Esses xerifes. V. Exª, na transição, simbolizou a segurança, a ordem. Muito da moral que tem a Polícia Federal, eu como médico afirmo que o DNA pertence ao delegado Romeu Tuma. V. Exª é para nós o que Eliot Ness foi para os Estados Unidos, aquele que prendeu Al Capone em Chicago.

Aprendi a operar vendo os outros, Senador Camata. Fui vendo, vendo, com o tempo estava operando. A frase “a ignorância é audaciosa” é do meu professor de cirurgia, do professor Marino de Andrade. Quando ele via um cirurgião apressado dizia: “isso não é corrida de cavalo, não, ô menino, que se mede em tempo. A ignorância é audaciosa. É preciso ver o que têm os nervos de visível, as complicações que podem advir... 

A gente aprende vendo. Então, o Lulinha deveria ver aí, há tanto cinema, audiovisual, já que ele não gosta de ler, nem estudar, aborrece-se, zanga-se. Ele deveria.

Ô Camata, então viriam os melhores. Ninguém poderia dizer que não sabe; se não sabe, se informe que existiu Franklin Delano Roosevelt, quatro vezes Presidente da República! Pegou os Estados Unidos no pós-guerra, na recessão, para recuperar muitos territórios bombardeados do mundo e da Europa. Aquele homem assumiu, com os seus princípios, queiramos ou não, o país mais rico, de melhor tecnologia, melhor renda per capita. E como ele fez isso, Camata? Ele disse, nas suas meditações - ô, Alvaro Dias: as cidades podem ser bombardeadas e destruídas - ele viu a guerra -, e elas ressurgirão do campo; mas, se o campo for abalado, destruído, sacrificado, as cidades morrerão de fome.

Ô, Lula, isso é para proteger o campo! E disse mais: se cada fazenda tiver um bico de luz - Franklin Delano Roosevelt - e uma galinha na panela, este país estará salvo. E quem salva, Lulinha, paz, amor e ignorância grande? Quem salvou os Estados Unidos foi o campo com a produção de grãos: 500 milhões de toneladas de grãos! Carro? Japonês faz melhor do que eles. Relógio? Os suíços davam um banho e, agora, os outros. E também esses “bichinhos” que vocês estão vendo aí e em que o Senador Alvaro Dias é mestre, Ph.D - já olhou até o número de apartes que eu lhe dei: 43.

O americano ficou forte pelo campo: 500 milhões de toneladas de grãos. O nosso campo está arrasado. Eu quero ensinar - e só deve entrar aqui quem pode ensinar, eu posso. Ó Lulinha, eu tenho 63 anos, acreditando em Deus, no estudo, no trabalho, no amor.

É! Eu fui Prefeitinho, Governador, e vou dar um quadro.

Ramez Tebet, V. Exª visitou o Piauí e o ajudou - nunca um Ministro, em tão pouco tempo, ajudou tanto o Piauí, mas também o Senador saiu de lá com a medalha no peito, a Grã-Cruz Renascença, pela gratidão do povo do Piauí. Em 1980, eu era Deputado Estadual. Era Governador de Estado um dos homens mais honrados que existem no Brasil: Lucídio Portella, irmão de Petrônio Portella, a quem ninguém excedeu como Presidente desta Casa - não foi Presidente da República porque Deus não quis. Tancredo Neves estava certo de ser o seu vice e ganhar o Colégio Eleitoral. Mas o Lucídio era quem sustentava o Petrônio e foi Senador. Ele foi Governador e eu fui Vice-Líder dele - Líder era o Juarez Tapety. E o jeitão dele era assim: não gostava muito de viajar, e eu adorava inaugurar, em nome do Governador, a energia na região ribeirinha do rio Parnaíba. São 1.458 Km que nos separam do Maranhão.

Senador Romeu Tuma, atentai bem! Era festa. Havia peru, carneiro, churrasco, música, bebedeira nas fazendas nos anos 80.

Depois, Deus me permitiu governar o Piauí por seis anos, dez meses e seis dias. E, como Senador, lá tenho ido com outros benefícios. Senador Gilberto Mestrinho, Presidente Lula, todas as fazendas estão mais empobrecidas! Os pratos estão encardidos, rachados. Não tem mais peru, no máximo uma galinhazinha. Mas tem calor humano.

Ô, Camata, então eu sou agora menos querido do que quando Deputadinho? Senador é menos do que Deputado?! Então, somos iguais. Mas é porque eles estão empobrecidos, Lula!

Lula, você não conhece a situação. Eu sei que foi o destino, que foi retirante, que foi embora, mas eu fiquei. Podia ter ficado no sul, em qualquer lugar como cirurgião, mas fui convidado para ser fundador do Ipase. Fui por amor e voltei. E paulista não fez lavagem cerebral em mim, não. Esses que o acompanham são office-boys dos bingos, do FMI, do BIRD, dos bancos e dos banqueiros.

Senador Gerson Camata, todos estão mais empobrecidos! Todos! É o testemunho que quero dar. Outro dia fui ao restaurante Bargaço, que é do Nordeste, João Pessoa, Pernambuco. Olhei água mineral - não comprei - Gilvam, R$ 6,50, a Perrier, com que esses traquinos se banquetearam, comemorando a vergonha dos 21 anos do PT. Foi R$ 6,50 a água, Cristovam. O litro de leite é R$ 0,75. Como é que pode estar o campo?

Campo é a vaquinha, a pecuária, ela é que fixa o homem. Se o litro de leite é R$ 0,75 e a água mineral para os que vivem farreando aí é R$ 6,75... Então, como está pobre. Não tem mais aquela quantidade de gente de quando eu era Deputado Estadual. Todos estão fugindo. E é no campo que estão os heróis. Pediu-se uma renegociação neste Senado, Camata - e é isso que me envergonha - há três anos. Pensei que já tinham conseguido. Eu sou da CAE e lá nos debruçamos sobre a questão e a analisamos, nós que temos experiência, não o Lulinha e os pilantrinhas do lado que servem aos banqueiros. Vai à Câmara, vem para cá, e só quatro votos contra. E o “homem” vai vetar.

Mestrinho, permita-me mudar o seu nome para Mestrão. O Alberto Silva lá tem um Estádio em que botaram o nome de Albertão. Então, V. Exª é Mestrão. O que se deve é renegociar, é pactuar uma dívida, não é anistiar não. Deu-se uma carência para quem deve até R$ 30 mil, juros de 1,5%, que é muito em qualquer País do mundo, Lula! Quem deve de 30 a 70, a mesma carência, um juro de 3%, que é muito, e mais de 100, a mesma carência e juros de 5%.

Heloísa Helena, e se vetar? Aí, Mestrinho, aquelas terras vão ser executadas pelos Bancos dos banqueiros. Vai ser uma luta jurídica, Camata. Daqui a cinco ou seis anos - porque a Justiça é lenta, é lerda -, vão acabar tomando as fazendas, e os nossos velhinhos do campo vão acabar se suicidando. Vão morar onde? Para que esses banqueiros com essas fazendas? Vão tomar! E a humilhação pela perda da terra, da vaquinha? Ó Lula, e a humilhação das famílias e dos velhinhos que trabalharam? O Banco está executando e leiloando o carro de boi, a vaquinha, o cavalo, o casebre, e esses pilantras estão se banqueteando na AABB!

Aprendi com minha mãe, uma terceira franciscana, que a caridade começa com os de casa. Não se tem dinheiro mas se dá dinheiro para a Venezuela, anistia para o Haiti, Cuba e Paraguai. E os nossos? Vetaram. O dia de maior vergonha. De nada adiantará termos um Presidente nordestino. O da Câmara é igual ao Lula, pegou lavagem cerebral dos paulistas. É a hora do Presidente desta Casa mostrar nossa grandeza. É a hora de nós derrubarmos o veto do Presidente Lula, que pouco sabe, pouco sente, pouco estuda e não tem sensibilidade. Nenhuma! É duro!

Ó, Camata, V. Exª tem irmão?

O Sr. Gerson Camata (PMDB - ES) - Sim.

O SR. MÃO SANTA (PMDB - PI) - É! O Lula também tinha. Morreram dois e ele não foi ao enterro de nenhum. É por isso que, de insensibilidade em insensibilidade, ameaça os nossos irmãos do Nordeste que, com honradez, não pagaram os Bancos porque os banqueiros roubaram demais. Não pagaram, e eu sei, ó Camata.

Eu entrei numa prefeiturinha, Heloísa Helena, e tinha uma dívida no cheque ouro. Eu era famoso cirurgião, ganhava muito. Quando eu fui para a Prefeitura, diminuí as operações. A minha mulher, Adalgisa, disse: “Nunca foi tão difícil!”. Eu ganhava mais como médico-cirurgião, fui famoso cirurgião. Para colocar o cheque ouro em dia, Heloísa Helena, só Deus e minha família sabem. Eu, Prefeito...

Agora, Ramez Tebet, vemos esses gaiatos nas CPIs, essa roubalheira toda. E sei que aqueles do campo não pagaram porque não podem, porque não têm. Agora, eles têm vergonha, a vergonha que está faltando no Planalto. Nós estamos aqui para isso, para acordar. Em verdade, em verdade, eu vos digo, Senadora Heloísa Helena: o lucro da Caixa foi de 40% em 2005. Quer dizer, é só os banqueiro, é só comemorando aqui. Olha, Senador do Nordeste: lucro da Caixa, e os nossos pobres homens do campo, sofridos, desgastados, ameaçados, sem sono, no fim da vida ameaçados pela falta de sensibilidade do Presidente da República.

Então, essas são as nossas palavras. Não creio no PT, que, para mim... Se houver uma reforma eleitoral aqui, eu pedirei uma emenda: vamos chamar esse partido de PB, Partido dos Banqueiros, porque é só quem ganha dinheiro. A negociata... Eles vão mandar uma medida provisória desprestigiando, desrespeitando a inteligência, o compromisso, o mandato, o povo deste Senado e desta Câmara!

É, Camata, é triste! É triste! E nada fizemos. “Ó Deus, Ó Deus” - eu digo como Castro Alves quando via os negreiros, os escravos nos navios. “Onde estais...?”

Caiu um troço aqui neste Parlamento e vamos fechar, porque, se não tivermos coragem de vetar o veto do Presidente da República, isso é uma vergonha!

Gilvam Borges, eu estava do lado de Petrônio Portela quando a ditadura botou os canhões na porta e fechou esta Casa, em uma “reforma de Judiciário”. Eu estava do lado quando a Imprensa indagou, e ele disse: “É o dia mais triste da minha vida!”

Com essa mensagem, abalou. E reabriram o Congresso. E é isso o que o Presidente deste Senado tem de fazer, se for vetado esse apoio, esse reconhecimento e esse ato de justiça desta Casa. O Presidente do Senado e nós todos temos de dizer: “É o dia mais triste da História do Brasil!”

Esperamos - e ele vai viajar para o Nordeste - que Sua Excelência o Presidente da República, em que votei, em quem acreditei... Eu sabia que o preparo era uma interrogação, mas sensibilidade e amor no coração eu esperava que o Presidente tivesse. Lamento. E essas são as minhas palavras.

Esperamos que esta Casa veja o símbolo de Rui Barbosa: “Só tem um caminho e uma salvação: é a lei e a justiça.” A lei nós fizemos. Só falta o Presidente sancionar. É isso o que queremos reivindicar, porque o nosso homem do campo está empobrecido, está em dificuldade, e esta Casa não pode lhe faltar.

Era o que eu tinha a dizer, Srª Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 21/02/2006 - Página 5632