Discurso durante a 15ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Considerações sobre o pronunciamento do Senador Antero Paes de Barros. Polêmica sobre o impacto da elevação do salário mínimo sobre a folha de pessoal do setor público.

Autor
Heloísa Helena (PSOL - Partido Socialismo e Liberdade/AL)
Nome completo: Heloísa Helena Lima de Moraes Carvalho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. POLITICA SALARIAL.:
  • Considerações sobre o pronunciamento do Senador Antero Paes de Barros. Polêmica sobre o impacto da elevação do salário mínimo sobre a folha de pessoal do setor público.
Publicação
Publicação no DSF de 14/03/2006 - Página 7736
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. POLITICA SALARIAL.
Indexação
  • COMENTARIO, DISCURSO, ANTERO PAES DE BARROS, SENADOR, UTILIZAÇÃO, MEIOS DE COMUNICAÇÃO, PERSEGUIÇÃO, NATUREZA POLITICA, CONGRESSISTA, OPOSIÇÃO, GOVERNO FEDERAL.
  • PROTESTO, AUSENCIA, INVESTIGAÇÃO, DENUNCIA, FAVORECIMENTO, EMPRESA, FILHO, PRESIDENTE DA REPUBLICA.
  • APRESENTAÇÃO, DADOS, EFEITO, FOLHA DE PAGAMENTO, SETOR PUBLICO, MUNICIPIOS, REAJUSTE, SALARIO MINIMO, OBJETIVO, COMPROVAÇÃO, POSSIBILIDADE, SUPERIORIDADE, REAJUSTAMENTO.
  • CRITICA, DECLARAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, ACUSAÇÃO, COMPROMISSO, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, IDEOLOGIA, LIBERALISMO, FAVORECIMENTO, BANCOS.

A SRª HELOÍSA HELENA (P-SOL - AL. Pela Liderança do P-SOL. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, vou tratar do impacto da elevação do salário mínimo sobre a folha de pessoal no setor público, mas não poderia deixar de fazer uma brevíssima consideração sobre um assunto que também foi abordado pelo Senador Antero Paes de Barros.

Tenho dito, várias vezes, que posso ser injusta em não mais colocar a mão no fogo por ninguém. Repito que pode ser uma injustiça da minha parte, mas essa minha condição acabou sendo viabilizada por todas as angústias que passei na minha relação com o ex-partido, por tantas pessoas que defendi e, depois, descobri que eram não apenas sórdidas e pusilânimes, mas sujas e corruptas. Então, certamente sou capaz de cometer injustiças.

Enquanto o Senador falava sobre o tema, como vários outros Senadores fizeram, fiquei pensando que se o Governo é capaz de, ardilosamente, articular campanhas, nos meios de comunicação ou no mundo da política, contra personalidades tão poderosas politicamente - sob o ponto de vista pessoal e das estruturas partidárias -, arrepio-me ao imaginar o que pode ousar fazer comigo.

Toda vez que alguma personalidade política influente, representante de partidos políticos e de estruturas poderosas, vai à tribuna tratar disso, fico imaginando o que pode ser feito contra mim - não que eu não tenha vivenciado essa experiência. Já a vivenciei, inclusive num processo no qual eu era parte e em que, segundo comentários, um Senador e ex-Ministro poderoso, portanto a canalha do Palácio do Planalto, articulou de forma sórdida contra mim. Assim, já sei o que pode acontecer, mas de uma coisa os meus adversários políticos, quer do atual Governo, quer do passado, tenham certeza: se eu tiver que ir para o sacrifício nessa disputa presidencial, vou fazê-lo. E, quando digo sacrifício, não estou me lamentando ou me “vitimizando”, pelo contrário. Se eu tiver que ir para o sacrifício, eu irei com muita alegria no coração e muita combatividade. Ganhar uma eleição ou voltar à sala de aula, para mim, é coisa absoluta e igualmente honrosa, mas vou dizer uma coisa: conheço-me, sei a mulher honrada que sou e o quanto minha mãe me ensinou com as mais belas lições de honestidade.

            Para V. Exª ter idéia, Senador Flávio Arns, minha mãe era costureira e ficávamos, no período de Natal e Ano Novo, em quartinhos nos quintais das casas onde ela ia trabalhar, em Maceió. Certa vez, eu peguei seis continhas azuis, daquelas bem lindas que enfeitam os vestidos bonitos, para colocar na roupa de uma boneca Susi que achei no lixo de uma casa. Nunca me esqueço que minha mãe as colocou em um saquinho e me obrigou a devolvê-las para a dona do vestido.

Dessa forma, sei como vivo em casa e como vive meu irmão. Ele dá plantões pelo interior de Alagoas como um condenado, arriscando a própria vida. Não vive pendurado no mundo da política, assim como acontece com minha mãe e meus filhos. Por isso, fico profundamente indignada quando vejo essa cumplicidade, esse conluio para não se investigar a situação do filho do Presidente Lula.

Sinto-me envergonhada e constrangida de conseguir um estágio para o meu filho. Não consigo, porque me sinto constrangida em fazê-lo. No entanto, o filho do Presidente Lula entrou em uma sociedade com um papel, como se fossem R$20 mil, e ganhou R$15 milhões de dinheiro público, porque a empresa é privatizada e tem dinheiro do BNDES, acionista de uma empresa que detém mais de 18% do capital da Telemar. O consultor que intermediou a negociação com a Telemar foi indicado pelo Presidente Lula para o Conselho de Ética da Presidência da República e, por sua vez, os outros sócios da empresa são os filhos do principal conselheiro do Fundo de Pensão Público.

Assim, pelo amor de Deus, falem dos meus defeitos, que são muitos, mas não ataquem minha honra pessoal, porque sei que sou uma mulher muito digna e, se o fizerem, não vou ter nenhuma paciência! Nenhuma! Terei zero de paciência, porque me sentirei à vontade para denunciar desde a podre vida privada até a igualmente putrefata vida pública dessa gente.

Pelo amor de Deus, falem do meu radicalismo, falem das teses que defendo, digam que são impróprias, ridículas, sonhadoras. Podem fazer tudo, mas não inventem de criar uma história, uma calúnia, porque, realmente, se alguém acredita que já me viu virando onça, não sabe, ainda, do que sou capaz se alguém tentar atacar a minha honra pessoal.

Sou mãe de família honrada. Se não o fosse, talvez nem partisse para a ofensiva como sou capaz de fazer.

Ouvi o Senador Antero, emocionado, como já aconteceu com outros Senadores. Fiquei imaginando o que aconteceria se fosse comigo, porque, pelo amor de Deus, não ficaria pedra sobre pedra dessas vidas pessoais podres e dessas igualmente putrefatas vidas públicas.... Ninguém mexa comigo, pelo amor de Deus, porque tenho filhos e não quero nenhum problema com eles. Sou realmente capaz de qualquer coisa.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, quero falar mesmo sobre essa cantilena enfadonha e mentirosa. Há tantos fatos todos os dias sobre a república do mensalão, como o império da promiscuidade, o acobertamento dos mensaleiros; há tanta corrupção todos os dias que nem sabemos como tratar desses assuntos, e determinados temas acabam não vindo ao debate nesta Casa.

Já tive a oportunidade de participar, com o Senador Paulo Paim e com outros Senadores e Deputados, da Comissão Mista que busca alternativas para o salário mínimo. Nesta semana, vou querer trabalhar sobre o tema do salário mínimo, tanto em relação ao setor privado como em relação à Previdência e ao setor público. Na última reunião dessa Comissão Mista, houve realmente um debate muito grande. Sei que há muitos técnicos importantíssimos que debatem o tema. Foram citados inclusive muitos textos de brilhantes professores, como Anselmo Luís, Denis Gimenez, Reinaldo Gonçalves, Ricardo Antunes e César Benjamin. Muitos professores e economistas brilhantes tratam do tema, apresentando alternativas concretas e eficazes para o aumento do salário mínimo, que não é efetivamente essa migalha dada pelo Governo e que, de fato, não atende sequer o compromisso de campanha do Presidente Lula, que era dobrar o poder de compra do salário mínimo. E, para isso, tinha de haver a recomposição de 19% das perdas inflacionárias e um aumento real de 26%, até o final do ano.

Foi criada uma polêmica muito grande em relação ao impacto do aumento do salário mínimo sobre a folha de salários do setor público. E há muitos dados sobre isso, que vou passar a apresentar agora, que desmontam claramente a tese de que não seria possível se pagar um salário mínimo maior do que a migalha estabelecida pelo Governo. E há vários dados relacionados à folha de salários do servidor público.

Os impactos no âmbito federal e estadual, está claro para todos, podem ser facilmente assimilados em função do pequeno peso do número de trabalhadores do setor público que ganha em torno de um salário mínimo ou um salário mínimo e meio, e do peso ainda menor da remuneração desses que ganham entre um salário mínimo e um salário mínimo e meio na folha de salários do setor público do ponto de vista global.

Na esfera federal, sabemos todos nós, o peso dos servidores com essa faixa de rendimento é menor do que 1%, e o peso das remunerações dos servidores que ganham um salário mínimo ou um salário mínimo e meio no total da folha de salários do setor público é de apenas 0,09%. Portanto, é absolutamente ridículo dizer que não podem pagar.

No caso do plano estadual, o peso dos servidores que recebem até um salário mínimo e meio é de 6% no total. Embora o número dos servidores da máquina estatal em nível estadual seja de menos de 6%, o peso do aumento em toda a folha de salários, de fato, é de apenas 0,9%. Então, o impacto do aumento do salário mínimo que estamos propondo, que não é a migalha apresentada pelo Governo, que, de fato, significa o cumprimento da promessa de campanha do Presidente em dobrar o poder de compra do salário mínimo, portanto, a recomposição das perdas inflacionárias de 19% mais os 26% de aumento real.

Em relação a um salário mínimo e meio, volto a repetir: embora o percentual desses trabalhadores do setor público esteja em torno de 6%, o peso na folha de salário é de 0,9%, portanto facilmente assimilado pelo setor público estadual.

Na esfera municipal em que, geralmente, os impactos nas contas públicas, de fato, são maiores, mesmo assim, sabendo que o peso da massa salarial dos servidores que ganham até um salário mínimo e meio nos Municípios seja maior, é de fato mais elevado, está em torno de 25,5%. Todavia, o impacto é de apenas 7,1% do total da folha desses Municípios. Então, por mais que o número de servidores que ganham um salário mínimo e meio nas prefeituras atinja 25%, o impacto na folha de salários é de apenas 7%.

Alguns poderão dizer - e é verdade -, que, nas regiões Norte e Nordeste, o impacto do aumento do salário mínimo das prefeituras é muito maior. Do mesmo jeito que é fato concreto que o aumento do salário mínimo tanto para os aposentados e pensionistas quanto para os trabalhadores das prefeituras acabam sendo um instrumento concreto que dinamiza a economia local e gera emprego e renda. O pagamento do aposentado ou pensionista do INSS e o pagamento dos trabalhadores pobres dos Municípios mais pobres do Nordeste têm mais impacto na vida local, na dinamização da economia local do que mesmo a liberação do Fundo de Participação dos Municípios, o FPM. E isso é fato demonstrado até nas frias estatísticas oficiais dos governistas ou da base de bajulação dos Governos.

Então, é importante deixar claro que o impacto anual de uma elevação que estamos propondo sobre a folha de salários de todos os servidores da máquina pública municipal, que iria para 2,6% - e se fosse apenas a recomposição da inflação, como propõe o Governo, seria de 1,3% -, mesmo assim, mesmo que aparentemente signifique um gasto adicional de R$190 milhões para atender mais de 400 mil pessoas no Brasil, fora o significado disso para os pequenos aposentados das regiões Norte e Nordeste, para as economias locais e para as famílias, mesmo assim, um estudo do BNDES mostrou que, nos cinqüenta Municípios com maior impacto na elevação do salário mínimo - uma elevação da folha de salários que oscilaria entre 16% e 19% -, este resultaria em valores absolutos que não ultrapassaria a R$3,5 milhões. Então, imaginem o significado disso.

O próprio BNDES apresentou um estudo recente, mostrando que nos cinqüenta Municípios brasileiros...

(Interrupção de som.)

O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco/PT - PR) - Senadora Heloísa Helena, vou conceder mais dois minutos para a conclusão do seu pronunciamento.

A SRª HELOÍSA HELENA (P-Sol - AL) - Estou concluindo, Sr. Presidente.

O próprio BNDES apresentou um estudo mostrando que nos cinqüenta municípios mais pobres das regiões Norte e Nordeste, onde o impacto na folha de salários estaria em torno de 16%, mesmo assim, isso não significaria nem R$3,5 milhões de impacto anual. O que poderia ser facilmente corrigido com uma simplória, pequena, ridícula alteração do Fundo de Participação dos Municípios ou, proposta de muitos, do Fundo do Servidor Público, para que, por meio deste, pudesse ser feita uma recomposição dos salários desses servidores. Isso sem falar que se aumentasse em 0,5% o Fundo de Participação dos Municípios ou se reduzisse 0,1% do superávit já possibilitaria que o salário mínimo fosse para R$571,00 já agora em 1º de maio.

Apresento apenas esses dados técnicos, que não tem nada de componente ideológico, embora eu devesse fazer comentários sobre a declaração que o Presidente do PT deu ontem com glória, porque se eu fosse ele faria com vergonha, de que o setor empresarial mais conservador do Brasil tem mais medo do Serra do que do Lula. Como o Lula tem compromisso com a política econômica ortodoxa, a ortodoxia monetária que joga R$840 bilhões para encher a pança dos banqueiros, teria mais medo do Serra.

Embora eu ache que o PSDB e o PT sejam as duas fases da mesma moeda e do mesmo modelo neoliberal, que privilegia o capital financeiro, o setor hegemônico do capital, fiquei impressionada com as declarações do Presidente do PT. Sei que o PT, com as exceções dos socialistas honestos que ainda lá estão, Senador Flávio Arns, por uma questão de honestidade intelectual, não é mais um partido de esquerda e sim a representação do triunfo neoliberal. Hoje é uma estrutura partidária que tem todo o direito de continuar existindo, como existem outras estruturas partidárias, mas, infelizmente, não é mais um partido de esquerda. É uma ferramenta da propaganda triunfalista do neoliberalismo que, ao mesmo tempo em que paralisou os movimentos sociais, que estatizou lideranças dos movimentos sociais, pela forma do clientelismo, do fisiologismo, além de tudo isso, ainda legitimou todas as teses da propaganda neoliberal.

Então, por mais que eu saiba de tudo isso, por mais que, por honestidade intelectual, eu tenha a obrigação de dizê-lo, realmente, fiquei muito, muito impressionada quando o Presidente do PT fala, como se fosse um triunfo, que o Serra é mais progressista do que o Lula. Então, realmente, estou impressionada com essa metamorfose ideológica e programática do Partido dos Trabalhadores. Fora as outras coisas - e essas são mais pusilânimes e podres - que vão das orgias sexuais com dinheiro público roubado à roubalheira e aos tentáculos dos roubos dentro da máquina pública. Isso tenha certeza de que dá angústia e sofrimento inclusive a muitos militantes que ainda estão no PT. Mas essa realmente é uma coisa ridícula, embora pode ser até que seja verdade da parte dele, mas, não poderia deixar de fazer esse brevíssimo comentário.

Tratarei, amanhã, mais uma vez, dos impactos do salário mínimo no setor privado, depois na Previdência pública, para deixar clara a farsa técnica e a fraude política do atual Governo, que copia o governo anterior, e que ostenta teses desqualificadas tecnicamente para impedir o aumento do salário mínimo, que privilegia, sem dúvida, às populações mais pobres do nosso País.

É só, Sr. Presidente. Agradeço a generosidade e a tolerância de V. Exª.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/03/2006 - Página 7736