Discurso durante a 11ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Lamento pela atitude do zagueiro Antonio Carlos, do time Juventude, que protagonizou gesto racista contra outro jogador, em recente partida de futebol.

Autor
Paulo Paim (PT - Partido dos Trabalhadores/RS)
Nome completo: Paulo Renato Paim
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DISCRIMINAÇÃO RACIAL.:
  • Lamento pela atitude do zagueiro Antonio Carlos, do time Juventude, que protagonizou gesto racista contra outro jogador, em recente partida de futebol.
Aparteantes
Heráclito Fortes.
Publicação
Publicação no DSF de 08/03/2006 - Página 7068
Assunto
Outros > DISCRIMINAÇÃO RACIAL.
Indexação
  • COMENTARIO, NOTICIARIO, IMPRENSA, TELEVISÃO, OCORRENCIA, DISCRIMINAÇÃO RACIAL, ATLETA PROFISSIONAL, COMPETIÇÃO ESPORTIVA, FUTEBOL, ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), REGISTRO, INVESTIGAÇÃO, MINISTERIO PUBLICO ESTADUAL, IMPORTANCIA, PUNIÇÃO, CRIME, OBJETIVO, CONSCIENTIZAÇÃO.
  • APREENSÃO, PARALISAÇÃO, CAMARA DOS DEPUTADOS, PROJETO, ESTATUTO, IGUALDADE, RAÇA, EXPECTATIVA, AGILIZAÇÃO.

O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Tião Viana, 1º Vice-Presidente desta Casa, quero agradecer também ao Senador Gilvam Borges por ter feito a permuta, para que eu fale sobre um tema que está tomando conta da imprensa gaúcha e que hoje foi palco de um debate nas tevês do meu Estado, principalmente na RBS TV. Vou comentá-lo, Sr. Presidente, e não poderia ser diferente, até porque sou gaúcho e nascido em Caxias do Sul.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, no último final de semana, na partida de futebol entre o Grêmio e o Juventude de Caxias, minha cidade, o zagueiro Antônio Carlos, do Juventude, foi expulso após violenta falta cometida contra o jogador do Grêmio, Jeovânio Rocha do Nascimento.

Quando deixava o gramado em direção ao vestuário, o zagueiro fez um gesto, mostrado pela televisão para todo o País, racista, dizendo que o Jeovânio não tinha a sua cor, porque ele era branco, e o Jeovânio, negro.

Sr. Presidente, Antônio Carlos cometeu, queiram ou não alguns, um crime de racismo, de preconceito.

O volante Jeovânio, quando perguntado, disse que não tinha nada contra o Antônio Carlos, até porque a falta foi cometida pelo Antônio Carlos. Só disse que, no futebol, é lamentável esse tipo de atitude.

É lamentável também, Sr. Presidente, que ainda ocorram atos como esse no esporte brasileiro, e não só brasileiro, mas diria que na maioria dos países do mundo. Lembro aqui atitudes racistas que ocorreram no ano passado contra o jogador Grafite, contra o Tinga e contra o Felipe - foram vítimas. Na Europa, temos inúmeros casos, inclusive de torcidas organizadas que utilizam a cruz suástica nazista, e jogador fazendo continência em respeito à cruz suástica. Olha o absurdo e o risco que estamos correndo.

Em seguida, concederei um aparte ao Senador Heráclito Fortes.

O Ministério Público Estadual já tem a fita com as imagens da partida e está investigando o caso. A direção do Grêmio já comunicou que, uma vez comprovada a atitude de Antônio Carlos, o clube vai solicitar uma reparação por parte do jogador, ou seja, vai fazer com que os trâmites legais punam aquele que cometeu o crime de racismo.

Já o volante Jeovânio, com os olhos cheios d’água, contendo o choro por duas vezes, disse ontem em entrevista coletiva à imprensa que não vai recuar na luta contra o racismo. Diz ele:

Se eu recuar, estarei dando motivo para outras atitudes. Queremos ser tratados como humanos. Espero que esta seja a última vez que eu tenha que dar entrevista sobre um tema como esse [que dói tanto a todos nós].

Caso seja comprovado o crime de racismo, previsto inclusive em lei de minha autoria, a pena será de um a três anos de reclusão porque o crime é inafiançável e não prescreve.

Senhoras e senhores, Senadoras e Senadores, o que ocorreu no estádio Alfredo Jaconi, em Caxias do Sul, posso dizer, como caxiense, que é um ato isolado e que não condiz com a cultura da população daquela cidade e do Rio Grande. O Rio Grande está indignado com esse fato.

Sou natural de Caxias do Sul, conheço essa boa gente. Confesso que joguei nos juvenis do Juventude. Lembro-me aqui dos treinadores Irajá, Pastelão, o Baixinho e o próprio Babão, exemplos de homens de solidariedade e amizade a todos os jogadores, brancos e negros.

Digo mais: em 2002, Senador Heráclito Fortes, recebi mais de 2,1 milhões de votos. Caxias, uma cidade basicamente italiana, me deu o privilégio de, proporcionalmente, ser o Município de que mais recebi votos em todo o Estado - e sou negro e nasci em Caxias do Sul.

Senador Heráclito Fortes, por favor.

O Sr. Heráclito Fortes (PFL - PI) - Senador Paulo Paim, ontem à noite, quando cheguei a casa e vi o noticiário da televisão, confesso que pensei exatamente em V. Exª, antevendo o pronunciamento oportuno que faria aqui hoje à tarde. Quero dizer que aquele fato teria para mim sido minimizado se fosse apenas a ofensa em campo.

O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS) - Eu vi também.

O Sr. Heráclito Fortes (PFL - PI) - O que me deixou chocado foram as duas versões dadas pelo jogador. Em um primeiro canal de televisão, ele disse que, quando passava a mão na pele, era para tirar o sangue de um ferimento que tivera. No segundo depoimento, ele já diz diferente, que, na realidade, fez aquilo para mostrar que já vestira várias camisas de time de futebol pelo Brasil e pelo mundo afora. Lamentável é exatamente a maquinação da justificativa do erro do crime que ele cometeu. Se ele tem reconhecido simplesmente o erro e tem pedido desculpas ao jogador...

O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS) - Correto.

O Sr. Heráclito Fortes (PFL - PI) -...uma situação de campo, uma situação de emoção, tudo bem! O inaceitável, Senador Tião Viana, foi a premeditação da justificativa - ele deve ter sido orientado por advogados, por companheiros ou por outras pessoas. A primeira versão era de que ele estava tirando sangue do braço; a segunda era de que demonstrava que tinha vestido várias camisas de futebol. Daí por que, Senador Paulo Paim, que temos de tomar alguma providência séria. Não acho que se deva bani-lo do futebol, não; mas deve haver uma punição exemplar, talvez uma suspensão, para que se acabe com essa brincadeira em campos brasileiros. Que na Alemanha, que no mundo afora alguém pratique isso é lamentável, mas não temos nada a ver com isso. Em nosso Brasil, porém, com a miscigenação que temos, com a liberdade que temos e com a integração racial que o Brasil vive graças a Deus, é inaceitável que fatos dessa natureza aconteçam sem que haja punição rápida para o fato. Parabenizo V. Exª por trazer assunto de tamanha importância para a tribuna do Senado Federal.

O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - SP) - Obrigado, Senador Heráclito fortes.

Também ouvi e vi as versões, inclusive a que ele deu ontem. Até aquele momento, eu também estava na dúvida, mas então ele disse assim: “Se eu o chamei de macaco, foi num momento de nervosismo”. Ora, então! O fato de, a cada momento, apresentar uma versão diferente - na verdade, assumindo e mostrando a todos que cometeu um crime - é que, efetivamente, nos deixou preocupados. Eu também não estou aqui querendo, como foi dito, de uma vez por todas, crucificar o jogador. Acho que a punição é para que esses fatos não se repitam. Tantos são os fatos que vêm acontecendo no Brasil e pelo mundo afora, que ficamos assustados. Por isso, Senador Tião Viana, é que mais uma vez venho à tribuna. Não podia me omitir, até em respeito à minha cidade, Caxias do Sul, e ao povo gaúcho.

Termino dizendo que precisamos denunciar e punir a prática do racismo. A atitude do jogador Jeovânio Rocha do Nascimento de não recuar é exemplo a ser seguido por outros que sofrerem preconceito e discriminação racial. Por isso, hoje apresentei um requerimento a esta Casa para que seja aprovado voto de solidariedade, de louvor, de apoio ao jogador Jeovânio, ao clube Grêmio Porto-Alegrense e ao Ministério Público Estadual, pela tranqüilidade com que este último está investigando a questão.

É importante destacar, Sr. Presidente, que o Estatuto da Igualdade Racial, projeto de nossa autoria aprovado por unanimidade aqui no Senado, infelizmente, está parado na Câmara dos Deputados. É um instrumento de luta pelo fim da discriminação racial em nosso País e pela igualdade que tanto almejamos.

O dia 21 de março é o Dia Internacional de Combate ao Racismo. O mundo todo fará movimentos contra o racismo, e o eixo este ano é, infelizmente, o esporte. Como seria bom, Sr. Presidente, se a Câmara dos Deputados seguisse o exemplo do Senado da República, onde o projeto nem precisou vir a Plenário - foi aprovado nas Comissões por unanimidade e foi direto para a Câmara.

O Senado entendia que o projeto do Estatuto da Igualdade Racial deveria ser promulgado em 20 de novembro do ano passado. Fizemos toda a tramitação, dialogamos com todos os partidos e com o próprio Governo, mas, para surpresa nossa, o Estatuto da Igualdade Racial está engavetado no plenário da Câmara dos Deputados.

Que essa atitude negativa do zagueiro Antônio Carlos e a atitude positiva desse lutador que é o Jeovânio sirvam de exemplo, Sr. Presidente, para que aquela Casa vote rapidamente o Estatuto, que quer só a igualdade. Ele não permitirá que ninguém seja discriminado pela cor da pele, pela etnia, pela raça, pela procedência, pela religião, pela idade, por gênero.

O Estatuto da Igualdade Racial, de nossa autoria, é uma peça do Congresso Nacional; é uma peça da sociedade brasileira. Por isso fica aqui mais um apelo para que o Estatuto seja aprovado antes do dia 21 de março.

Obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/03/2006 - Página 7068