Discurso durante a 17ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Indignação com o silêncio do publicitário Duda Mendonça no depoimento prestado na CPI dos Correios. (como Líder)

Autor
Heloísa Helena (PSOL - Partido Socialismo e Liberdade/AL)
Nome completo: Heloísa Helena Lima de Moraes Carvalho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRAFOS (ECT).:
  • Indignação com o silêncio do publicitário Duda Mendonça no depoimento prestado na CPI dos Correios. (como Líder)
Aparteantes
Almeida Lima.
Publicação
Publicação no DSF de 16/03/2006 - Página 8223
Assunto
Outros > COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRAFOS (ECT).
Indexação
  • COMENTARIO, OCORRENCIA, COMISSÃO PARLAMENTAR MISTA DE INQUERITO, EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRAFOS (ECT), UTILIZAÇÃO, PUBLICITARIO, HABEAS CORPUS, AUSENCIA, ESCLARECIMENTOS, CONFIANÇA, IMPUNIDADE.
  • HOMENAGEM, MULHER, DENUNCIA, VIOLENCIA, DELEGACIA.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


A SRª HELOÍSA HELENA (P-SOL - AL. Como Líder. Sem revisão da oradora) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Senador Alvaro Dias e vários Parlamentares que a S. Exª apartearam já tocaram nesse tema e sobre ele fizeram considerações. Sinto-me na obrigação, como membro da Comissão Parlamentar de Inquérito e como simples cidadã brasileira, de também fazer algumas considerações sobre o que aconteceu hoje na CPMI.

É fato. Já disse aqui várias vezes que não respeito qualquer decisão judicial. Posso até cumpri-la, mas sei que muitas decisões judiciais são tomadas da mesma forma canalha e com a mesma promiscuidade do mundo da política. Do mesmo jeito, existem representantes do Poder Judiciário espalhados por todo o Brasil que põem em risco suas vidas, que já foram assassinados, que têm suas famílias perseguidas. São homens e mulheres honrados, respeitosos. Eu posso até cumprir essas decisões, mas não as respeito. Entretanto é importante deixar claro que, por mais que esse tal instituto do habeas corpus possa também representar e legitimar a promiscuidade com o mundo da política, o que aconteceu hoje na comissão parlamentar de inquérito não está relacionado ao habeas corpus dado pelo Ministro Gilmar Mendes; não está.

Sabem todos que eu gosto muito de fazer críticas ao Poder Judiciário, até porque já fui vítima dele. Do mesmo jeito que o Poder Judiciário às vezes é honrado, o Poder Judiciário também, pela promiscuidade com a canalha, seja do Congresso seja do Palácio do Planalto, faz outras coisas. Mas o parecer não trata disso, o habeas corpus não o faz. Por mais que alguns possam levantar a subjetividade da avaliação do que significa falar sem produzir provas contra si, por mais que haja algo de subjetivo nessa avaliação, o que aconteceu hoje não está relacionado a isso. Portanto nem vou fazer mais considerações sobre o que aconteceu hoje, em relação ao claro cinismo a que assistimos.

Todos os e-mails que recebemos se referem ao Congresso Nacional e à reunião da CPI com a expressão “covil”, e daí para baixo. As pessoas fazem uma generalização perversa - generalização que às vezes magoa quem tem vergonha na cara e amor no coração -, mas é compreensível, porque aquele quadro refletia as relações promíscuas entre o Congresso Nacional e o Palácio do Planalto. Houve a generalização perversa, mas muitas vezes é preferível a generalização perversa - carapuça bota quem culpado é - ao protecionismo e ao acobertamento que, muitas vezes, é feito aqui no Congresso Nacional ou no Palácio do Planalto.

Hoje muitos parlamentares e a sociedade brasileira viram a associação do silêncio com um sorriso. Às vezes o sorriso pode significar consciência tranqüila, às vezes pode significar desespero, às vezes pode significar aquela bela contenda retórica entre Padre Antônio Vieira, que defendia as lágrimas de Heráclito, e o padre que defendia o riso de Demócrito, que dizia que, às vezes, a dor pode ser tão grande que sufoca o pranto, resseca as lágrimas e você sequer é capaz de chorar ou de sorrir por causa do desespero. Mas o que aconteceu hoje não está relacionado a isso: era o sorriso do cinismo, da confiança na impunidade, da arrogância de se fazer cegar a ponto de acreditar que a punição não acontecerá.

Lá estava um homem que tem bilhões de dólares no exterior e uma banca de advogados poderosíssima para defendê-lo. Se lá estivesse um pobre motorista, uma pobre favelada, uma simplória professora - maravilhosa na sua intelectualidade, na sua vida cotidiana, mas simples como eu -, com certeza, nada do que aconteceu hoje naquela CPI teria acontecido.

Ele ainda terá uma segunda chance na reunião secreta. Se ele continuar com a mesma posição na reunião secreta, espero que lá esteja um dos quatro parlamentares e que seja dado a ele o que obrigatoriamente é dado no caso de desacato, que é o impedimento de sair daqui sem algemado estar. É a vida: se fosse um pobre, estaria frito.

Daqui a pouco darei um aparte a V. Exª, Senador Almeida Lima.

O mais importante de tudo o que aconteceu hoje foi constatarmos que, a despeito do silêncio lá apresentado ser uma demonstração da confiança na impunidade - quem tem bilhões de dólares no exterior e uma excelente banca de advogados pode circular por aí livremente e ser recebido nos salões da high society como se inocente fosse, mesmo sendo delinqüente de luxo -, ainda há quem se manifeste contra isso. Temos de prestar um tributo a quem fala. Não ao parlamentar, porque é nossa obrigação falar, mas a quem tem a coragem de falar.

Eu dizia hoje na CPI: imaginem o que é para uma mãe pobre, favelada, ver o filho da vizinha ser assassinado covardemente e ter a coragem de ir à delegacia e delatar o assassino num belo gesto de solidariedade. A mãe chora a dor pelo filho perdido, mas se vê diante de um belo ensinamento, ensinamento que no futuro vai dar forças a uma outra pessoa para agir de maneira semelhante, corajosamente.

Há muitas pessoas corajosas. Já vi muitos casos de simples professoras que, às vezes espancadas em suas escolas, pensando no futuro e na segurança dos seus alunos pobres, prestam queixa policial, fazem o enfrentamento. Apesar do medo de serem perseguidas, vão tremendo para a delegacia, mas vão.

É por isso que temos de dar o tributo da honestidade e da valentia, mas não a alguém que tenha cargo político, porque quem tem cargo político considerar-se valente, considerar que faz ato heróico pessoal é vaidade cretina. Não há ato heróico pessoal em nenhuma das posições políticas por mais nobres que sejam as assumidas aqui, é muito mais fácil. Belo é ver milhares de outras pessoas que estão, no dia-a-dia, fazendo o enfrentamento correto, o enfrentamento importante das injustiças. Por quê? Porque nada de mais belo pode haver do que você ter a certeza de que, ao falar, não produz prova contra si. Tem coisa mais bela, Senador Tasso, do que você ter a certeza de que poderá ir a qualquer lugar, seja um boteco de beira de rua, seja uma comissão parlamentar de inquérito, em qualquer lugar que você esteja, você ter a consciência tranqüila de que pode falar o que quiser, porque qualquer coisa que você falar não significará provas contra si mesmo? Quem silencia para não produzir provas contra si é porque delinqüente é, culpado é e participante da bandalheira é também.

Concedo um aparte a V. Exª, Senador Almeida Lima, antes de concluir o meu pronunciamento.

O Sr. Almeida Lima (PMDB - SE) - Nobre Senadora Heloísa Helena, eu quero me congratular com V. Exª por seu brilhante pronunciamento, lembrando, inclusive, um aparte que concedi na tarde de ontem ao Senador Antonio Carlos Magalhães, quando disse que estranhava a posição do Supremo Tribunal Federal, da mais alta Corte de Justiça do País, sobretudo diante do seu comportamento em relação às comissões parlamentares de inquérito. Quero ratificar hoje neste aparte a V. Exª o que disse: continuo estranhando. Ontem, não tinha conhecimento do habeas corpus concedido ao Sr. Duda Mendonça. Habeas corpus são requeridos e são deferidos ou negados, mas vou um pouco além: acho que se trata de uma posição de desdém ao Poder Legislativo e também à maior Casa Legislativa do País, o Congresso Nacional, por parte do Supremo Tribunal Federal. Diante de tantos fatos e de tanta bandalheira, estranho que uma instituição como o Supremo Tribunal Federal não colabore decisivamente para a apuração rápida, célere, até objetivando a tranqüilidade da vida nacional, das instituições, para atender ao clamor da sociedade. Poderia, na verdade, ter uma postura, uma posição diferente. É lamentável que isso esteja acontecendo. São habeas corpus para as pessoas virem mentir aqui, sem sequer confirmar o depoimento anteriormente dado à mesma Comissão Parlamentar de Inquérito. A pessoa que compareceu à CPMI para prestar depoimento, na vez seguinte que vem à Comissão, não se dá sequer o direito, ou melhor, a obrigação de confirmar ou negar o que disse, e fica por isso mesmo. Dessa forma, o descrédito se amplia. Dizem que a população não está dando valor à bandalheira que aí está, mas é preciso pensar de forma diferente: a população brasileira cansou de dar importância a essa bandalheira, porque entende que não vamos chegar a lugar algum, pois todos os bandidos estão soltos. Não tivemos ainda a oportunidade de ver, embora a relação tenha sido vasta, nenhum dos bandidos apontados por essa CPI sendo preso. Estão soltos, maquinando, inclusive, a produção de provas que lhes possam ser favoráveis e destruindo aquelas que lhe são prejudiciais, o que já é mais do que suficiente para o Ministério Público - ao qual critico também neste instante - pleitear, a exemplo da própria Polícia Federal, a prisão preventiva dessas pessoas e para a Justiça, dentro das normas constitucionais, decretá-la. Não podemos ver, Senadora Heloísa Helena, tanto bandido que está sendo aí posto à luz do dia, descoberto, com tantas provas, continuar solto. Tenho dito, bem como outros também, que andar nas ruas deste País, do nosso Estado, da nossa cidade, está cada vez mais difícil. A população não quer mais nem enxergar. E o mais grave é que, quando não tem conhecimento das suas atitudes, passa também a condená-las, simplesmente por se ostentar a condição de político. É lamentável que isso aconteça. É lamentável que, no nosso País, estejamos contribuindo para que nossas instituições não tenham a credibilidade do povo brasileiro. Concluo, dizendo que é preciso que a população fique atenta, não se canse e fique observando, para poder separar o joio do trigo, ou seja, aqueles que estão pretendendo trabalhar em favor do País daqueles que não estão cumprindo sua missão. Parabéns a V. Exª!

A SRª HELOÍSA HELENA (P-SOL - AL) - Acolho o pronunciamento e o aparte de V. Exª e lhe agradeço, de coração. Mas, realmente, foi um dia melancólico para a CPI.

Hoje, a Senadora Patrícia estava fazendo o debate da licença-maternidade, projeto que é uma verdadeira declaração de amor às nossas crianças brasileiras. O projeto trata das duas maternidades, que são igualmente belas e maravilhosas: a maternidade de quem gera e convive e a maternidade de quem apenas convive. E a própria Senadora Patrícia, para alegria de todos nós, dá essa declaração de amor às meninas e aos meninos pobres brasileiros, fazendo a adoção da Maria Beatriz.

Eu queria estar lá com S. Exª, humildemente auxiliando no debate sobre o alongamento da licença-maternidade, essencial para aumentar esse mais belo vínculo de amor em relação às duas mães: a mãe que gera e a mãe que adota, que são igualmente mães. Mas nem pude lá estar, embora fosse onde meu coração estava. Mas a minha obrigação era a de estar na Comissão Parlamentar de Inquérito.

Senadora Patrícia, imagine o sentimento - é claro que muitas pobres mães brasileiras nem assistem às reuniões, porque há questões relacionadas às antenas parabólicas, à sintonia ou à TV por assinatura, essas coisas - de muitas mães, de muitas mulheres e homens de bem e de paz ao assistiram àquele depoimento!

Para quem tem como esporte predileto o vagabundismo, para quem gosta de ser celebridade no império do banditismo político, está tudo muito bem. Esses devem estar comemorando hoje, e muito, porque foi desolador para quem quer continuar ensinando aos seus filhos que é proibido roubar, mas estimulante para outros. Quantos champanhes vão pipocar hoje dos delinqüentes de luxo que, pelo silêncio, ele acobertou?

Assim sendo, deixo aqui meu repúdio, mas, especialmente, meu tributo às mulheres e aos homens, particularmente, repito, os mais pobres. Não merecemos isso, pois estamos fazendo nossa obrigação. Creio que as mulheres merecem até mais esse tributo que os homens, porque são mais fragilizadas. Às mulheres pobres é imposto o dobro da hierarquia perversa. Então, meu tributo a essas mulheres que não se acovardam e que, mesmo tremendo as pernas, vão a uma delegacia para falar diante dessa covardia do depoimento ocorrido hoje.

Espero, realmente, que quem ainda está na Comissão possa dar um passo para minimizar a desmoralização do Congresso, que, infelizmente, já está desmoralizado perante a sociedade. Isso deveria ser feito, conforme sugestão de vários Parlamentares em apartes ao Senador Alvaro Dias. Ainda está em andamento o depoimento. Portanto, o conserto ainda pode ser feito, sem a manutenção do procedimento, que não é apenas vulgar e imoral, mas também ilegal. Não se coaduna com o habeas corpus dado, nem sequer em relação a essa situação.

Portanto, que se possa, ao menos, minimizar essa desmoralização tão grande do nosso Congresso Nacional!

 


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 16/03/2006 - Página 8223