Discurso durante a 25ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

"Dia Mundial de Combate à Tuberculose - 24 de março".

Autor
Augusto Botelho (PDT - Partido Democrático Trabalhista/RR)
Nome completo: Augusto Affonso Botelho Neto
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • "Dia Mundial de Combate à Tuberculose - 24 de março".
Publicação
Publicação no DSF de 24/03/2006 - Página 9427
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • DIA INTERNACIONAL, COMBATE, TUBERCULOSE, OPORTUNIDADE, DEBATE, REAPARECIMENTO, DOENÇA GRAVE, APREENSÃO, RISCOS, TRANSMISSÃO, REGISTRO, DADOS, ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAUDE (OMS), MINISTERIO DA SAUDE (MS), OCORRENCIA, BRASIL, MUNDO, IMPORTANCIA, MOBILIZAÇÃO, AUTORIDADE, ESCLARECIMENTOS, POPULAÇÃO, HISTORIA, LUTA, ERRADICAÇÃO, CONCLAMAÇÃO, COLABORAÇÃO, TELEVISÃO, SENADO.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


O SR AUGUSTO BOTELHO (PDT - RR. Sem apanhamento taquigráfico.) -

“Dia Mundial de Combate à Tuberculose - 24 de março”

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, apesar de nós, políticos, estarmos em baixa no conceito do povo brasileiro, principalmente diante dos sucessivos escândalos de corrupção que vêm assolando nosso País, ainda considero a política como uma das mais nobres atividades que um ser humano pode exercer. Isso porque a preocupação maior do político deve ser sempre o Bem Comum e, por esse motivo, precisamos nos dedicar a uma gama imensa de assuntos que afetam as vidas de milhões de pessoas! Basta reparar em nossas atividades cotidianas, aqui no Senado Federal, para constatar essa realidade.

Entre os temas que, enquanto Parlamentares, somos chamados a analisar, merece especial destaque a saúde do povo brasileiro. Como médico e ex-Secretário de Saúde de Roraima, tenho dedicado boa parte de minha vida pública a esse assunto, e não há como não me preocupar com as epidemias modernas que ameaçam a humanidade, como a AIDS, a gripe aviária e o ebola.

            Se essas são doenças potencialmente letais, há ainda uma outra que, apesar de sua elevada periculosidade, foi relegada ao quase- abandono, como se já tivesse sido totalmente debelada, mas que ressurgiu com muita força em meados da década de 80 e que, por esse motivo, em 1993, foi declarada pela Organização Mundial de Saúde (OMS) como “uma emergência mundial”. Refiro-me, à tuberculose (TB), ao chamado “mal do século”, que dizimou milhões de pessoas em todo o mundo, e ceifou as vidas de alguns de nossos mais brilhantes poetas, como os inesquecíveis Castro Alves e Álvares de Azevedo.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, segundo estimativas da OMS, 2 bilhões de pessoas, ou seja, um terço da população da Terra, estão infectadas pelo Mycobacterium tuberculosis, o agente causador da doença. Esse é um dado preocupante, porque estudos têm demonstrado que uma única pessoa infectada, sem receber o tratamento adequado, é capaz de transmitir a bactéria para 10 ou 15 outras pessoas, no período de um ano. Para piorar a situação, mesmo se pudéssemos deter sua transmissão amanhã, ainda teríamos 100 milhões de pessoas que desenvolveriam a TB durante seu período de vida! Ainda segundo a OMS, a tuberculose é hoje a maior causa de morte por doença infecciosa em adultos, com maior incidência na China e em países da Ásia e da África, e menores índices na União Européia, nos Estados Unidos e no Japão.

No Brasil a situação também é preocupante. Estamos situados em 15º décimo quinto lugar no ranking dos 22 países que contribuem, em conjunto, com 80% dos casos de tuberculose registrados em todo o mundo! Segundo dados do Ministério da Saúde, cerca de 50 milhões de brasileiros estão possivelmente infectados por esse mal. Isso faz com que o Brasil, juntamente com o Peru, seja o responsável por 50% das ocorrências verificadas nas Américas. Além disso, nesta triste estatística da enfermidade, surgem, a cada ano, 111 mil novos casos de tuberculose em nosso País, e mil óbitos.

Mas, se no mundo a tuberculose está desigualmente distribuída, sua ocorrência no território nacional também não se verifica de forma homogênea. Quase 80% dos casos registrados no Brasil ocorrem nas regiões Sudeste e Nordeste, com especial destaque para os Estados do Rio de Janeiro e da Bahia, respectivamente. Isso é explicado, em grande parte, pela maior propagação da bactéria causadora da doença nas áreas mais densamente urbanizadas, onde o contágio é mais fácil.

Eu poderia continuar apresentando diversos números, extraídos de estudos sérios, desenvolvidos tanto no Brasil quanto no Exterior, que demonstram a gravidade da situação que enfrentamos neste momento, no que se refere à propagação da tuberculose. Contudo, isso iria tomar uma quantidade considerável do meu tempo, que já é curto, de modo que solicito a Vossa Excelência que, nos termos regimentais, dê como lido o material que encaminharei à Mesa ao final deste pronunciamento.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o ponto principal a que quero me ater neste momento, e para o qual solicito a atenção do Plenário, é que a tuberculose é um problema social, que atinge principalmente as pessoas em idade produtiva, entre 15 e 59 anos, com graves repercussões econômicas. Essa doença está umbilicalmente ligada à pobreza e ao subdesenvolvimento, e a ela associam-se diversos outros males, como a educação precária, as péssimas condições de moradia, a desnutrição, o alcoolismo crônico, a dificuldade de acesso aos serviços de saúde e a fragilidade da assistência social. Por isso, a diferença de incidência entre os países pobres e os ricos é de sete vezes, segundo estimativas da Organização Mundial de Saúde. A esses fatores, somam-se outros dois agravantes que potencializam a ação destrutiva da tuberculose. Refiro-me à infecção pelo vírus HIV, que debilita o sistema imunológico de suas vítimas, e o surgimento da MRTB, a tuberculose multirresistente, que requer doses maciças de quimioterápicos e um período mais prolongado de tratamento. É triste constatar que, no Brasil, a MRTB está associada a falhas terapêuticas, tais como a irregularidade na ingestão de medicamentos, o abandono da terapia antes do prazo e as prescrições inadequadas.

O mais grave, o mais cruel de todas essas estatísticas e de todos esses fatos é saber que a tuberculose é uma doença que mata tanta gente, mas que é quase 100% curável, se diagnosticada e tratada precocemente! Essa é uma informação mais do que relevante para nós, homens públicos, que devemos atuar sobre a sociedade nesta nobre tarefa que é a promoção do Bem Comum.

Foi considerando a gravidade desses indicadores que acabo de apresentar, e a inércia que se verificava na comunidade internacional quanto à tuberculose, que a Organização Mundial de Saúde e a União Internacional contra a TB e Doenças Pulmonares instituíram, em 1982, o Dia Mundial de Combate à Tuberculose, a ser lembrado anualmente, no dia 24 de março. Essa data foi escolhida porque, naquela ocasião, completavam-se 100 anos que o Dr. Robert Koch, anunciara a descoberta do bacilo causador da tuberculose, feito este que constituiu um marco fundamental para o conhecimento dessa enfermidade e para o fortalecimento da teoria dos germes, que vinha sendo desenvolvida por outro notável cientista: o médico francês Louis Pasteur.

Mobilizar toda a sociedade para a luta contra a TB, a fim de erradicá-la definitivamente até o ano de 2050, é o principal objetivo do Dia Mundial de Combate à Tuberculose, que este ano tem como tema Ações pela Vida: Rumo a um Mundo Livre da Tuberculose. Aliás, Senhor Presidente, a completa eliminação da TB é uma das Metas de Desenvolvimento do Milênio, aprovadas pelas Nações Unidas, cuja a realização acarretará a melhoria da qualidade de vida de milhões de pessoas em todo o mundo.

No Brasil, o dia 24 de março integra também a Semana Nacional de Mobilização e Combate à Tuberculose, coordenada pelo Ministério da Saúde, o qual pretende aplicar cerca de R$120 milhões, até 2007, na luta contra essa moléstia. Segundo os especialistas, um dos principais desafios a serem enfrentados é a falta de informação da esmagadora maioria de nosso povo, fato este considerado como o grande motivo dos altos índices de tuberculose no Brasil.

Mas há ainda um outro ponto que como médico me preocupa muito e me causa certa perplexidade. É que, de acordo com o Coordenador-Geral de Doenças Endêmicas do Ministério da Saúde, Dr. Joseney Santos, cerca de 10% dos cursos de Medicina do País, em seu conteúdo programático, simplesmente não contam com orientações sobre a tuberculose! Como pode ser isso? Como pensar que um médico possa ministrar a seus pacientes o tratamento adequado à TB, se nem mesmo ele sabe como proceder nesses casos? Por isso, gostaria de fazer aqui um apelo ao Senhor Ministro da Educação, Fernando Haddad, para que determine a inclusão de temas relacionados à tuberculose nos cursos de Medicina que ainda não os possuem. Não podemos admitir que, em pleno século XXI, ainda formemos profissionais de saúde sem conhecimentos adequados para atuarem no diagnóstico e no tratamento da tuberculose, uma doença tão antiga quanto a própria humanidade!

Apesar dessa lacuna, quero destacar os esforços que vêm sendo realizados no Brasil em prol do combate à tuberculose. A começar pela fundação, ainda no início do século passado, da Liga Brasileira contra a Tuberculose, como resultado de um movimento de médicos e de intelectuais convencidos de que não poderiam se omitir no combate a uma moléstia causadora de elevados índices de mortalidade.

Outra iniciativa importante foi a Reforma Carlos Chagas, que, em 1920, deu origem ao Departamento Nacional de Saúde Pública e à Inspetoria de Profilaxia da Tuberculose. Na década de 1930, surgiram novas tecnologias para lidar com a TB, como a vacina BCG, a baciloscopia, a abreugrafia e o pneumotórax, tecnologias que culminaram com a descoberta, na década de 1940, de antibióticos específicos contra a bactéria causadora da tuberculose. Isso alterou de forma bastante significativa, não apenas o perfil epidemiológico, mas também a ação institucional e o conhecimento científico em relação à TB. Trouxe ainda uma conseqüência importantíssima para os dias de hoje, que é o surgimento de bacilos resistentes aos medicamentos, e o conseqüente aparecimento da MRTB.

Nos anos 70, o Estado passou a monopolizar as ações de combate à TB, iniciando a implementação do Programa Nacional de Controle da Tuberculose (PNCT), que, até hoje, é um dos instrumentos adotados pelo Ministério da Saúde.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, como vemos, a luta contra a tuberculose no Brasil vem de longa data. Atualmente, os esforços do Governo estão voltados para o cumprimento das metas mundiais de controle da tuberculose, quais sejam, localizar no mínimo 70% dos casos estimados anualmente e curar, pelo menos, 85% deles. Por isso, o Sistema Único de Saúde (SUS) tem como uma de suas diretrizes, a gratuidade do diagnóstico e do tratamento da tuberculose a todo cidadão brasileiro.

E os esforços empreendidos, tanto em solo pátrio quanto no exterior, não têm sido poucos! Em nível mundial, o Fórum Econômico de Davos aprovou, no início deste ano, o Plano Global de Combate à TB (2006-2015), que reafirma o compromisso estabelecido nas Metas de Desenvolvimento do Milênio, das Nações Unidas, de deter o avanço e começar a reverter a incidência da tuberculose até o ano de 2015. Para que isso aconteça, o Plano considera fundamental a colaboração com os programas de luta contra o vírus HIV, bem como a criação de grupos de trabalho para o desenvolvimento de novas drogas, novas vacinas e novos diagnósticos da tuberculose que permitam enfrentar, com sucesso, a variedade multirresistente da tuberculose. Sabemos que essa é uma tarefa gigantesca, pois terá o custo aproximado de 56 bilhões de dólares, mas ela permitirá que sejam salvas 14 milhões de pessoas nos próximos 10 anos. É uma causa eminentemente humanitária, para a qual todos os governos devem contribuir.

No Brasil, seguimos a orientação estabelecida pela Organização Mundial de Saúde e, desde 1998, adotamos a Estratégia do Tratamento Supervisionado da Tuberculose, mais conhecida pela sigla DOTS, em inglês, que aumenta a probabilidade de cura dos doentes para 96%, em função do tratamento assistido. A aplicação dessa metodologia vem se expandindo de forma gradual, tendo começado o Ministério da Saúde, em 2004, a aplicá-la nos 315 municípios considerados prioritários no combate à doença, justamente por responderem por mais de 70% dos casos de tuberculose no País.

Além disso, o Governo tem desenvolvido outras iniciativas de relevo para lidar com essa verdadeira chaga, aberta em nosso tecido social, que é a tuberculose. Em particular, gostaria de fazer referência à entrada em vigor do Plano Nacional de Combate à TB, para o período 2004-2007, e à criação de uma força-tarefa para monitorar e assistir os estados, priorizando os municípios na implementação da estratégia DOTS. Essas ações vêm somar-se à recente adesão do Brasil à Parceria Stop TB, um movimento global conduzido pela OMS e outros organismos internacionais, que visa acelerar as medidas de controle da tuberculose no mundo, envolvendo diferentes setores da sociedade civil. Cumpre destacar também a criação, na estrutura do Ministério da Saúde, da Secretaria de Vigilância em Saúde (SVS), que dará mais eficiência às ações já empreendidas, permitindo integrar o controle da TB ao de outras doenças endêmicas.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, por tudo isso, neste momento, gostaria de parabenizar todos os profissionais de saúde que atuam no combate à tuberculose em nosso País, bem como louvar os esforços que vêm sendo desenvolvidos pelas autoridades sanitárias em todo o mundo, a fim de conter e erradicar essa moléstia. Sobretudo, quero externar uma deferência especial ao Ministro da Saúde, o médico-sanitarista Saraiva Felipe, e ao Dr. Horácio Toro Ocampo, representante, no Brasil, da Organização Mundial da Saúde (OMS) e da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), não apenas pela atuação no combate à tuberculose, mas, principalmente, pelas enormes responsabilidades que ambos possuem, tanto na formulação, quanto na condução das políticas públicas voltadas à saúde.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, como disse no inicio deste meu longo pronunciamento, como médico e ex-Secretário de Saúde de Roraima, tenho devotado boa parte de minha vida à melhoria da saúde pública de nosso povo. Por isso, neste Dia Mundial de Combate à Tuberculose, não poderia furtar de subir a esta tribuna para abordar esse tema, que nos apresenta tantos e tão grandes desafios. Se, no passado, ousamos crer que a TB estava debelada, agora devemos ousar agir firmemente para fazer da tuberculose apenas mais um registro nos museus da história! Daí a importância da data que hoje celebramos, para manter sempre viva, em nossas mentes e em nossos corações, a chama da vontade de legar aos nossos filhos e netos um mundo livre do flagelo da tuberculose, que tem assolado a humanidade desde seus primórdios.

Por esse motivo, apelo para a sensibilidade política do Presidente Renan Calheiros, para que determine a veiculação, pela TV e pela Rádio Senado, de programas alusivos ao combate dessa doença, e que isso se faça não apenas durante a Semana Nacional de Mobilização e Luta contra a Tuberculose, mas ao longo de todo o ano de 2006. Tenho a certeza de que, desta maneira, o Senado Federal estará contribuindo para eliminar uma das grandes causas da expansão desse mal entre nós, que é a desinformação.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, para encerrar, reafirmo minha preocupação com as epidemias modernas que hoje somos obrigados a enfrentar, para dizer que, talvez, a maior de todas elas seja a falta de solidariedade e de amor para com o próximo. Por isso, precisamos unir nossos esforços, no Brasil e no mundo, para erradicar não apenas a TB, mas outras chagas da humanidade, que são motivo de vergonha para todos nós: a miséria, a fome e a violência. Só assim alcançaremos um futuro digno, repleto de paz, de justiça e de prosperidade para todos. E isso é possível, basta caminharmos. Afinal, como diz um provérbio chinês, “a maior das caminhadas começa com o primeiro passo”.

Era o que tinha a dizer.

Muito obrigado!


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/03/2006 - Página 9427