Pronunciamento de Aloizio Mercadante em 29/03/2006
Discurso durante a 29ª Sessão Especial, no Senado Federal
Homenagem ao Presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministro Nelson Jobim.
- Autor
- Aloizio Mercadante (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
- Nome completo: Aloizio Mercadante Oliva
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
HOMENAGEM.:
- Homenagem ao Presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministro Nelson Jobim.
- Publicação
- Publicação no DSF de 30/03/2006 - Página 9901
- Assunto
- Outros > HOMENAGEM.
- Indexação
-
- HOMENAGEM, NELSON JOBIM, PRESIDENTE, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), ELOGIO, VIDA PUBLICA, PARTICIPAÇÃO, REFORMA JUDICIARIA, EXPECTATIVA, CANDIDATURA, ELEIÇÕES.
SENADO FEDERAL SF -
SECRETARIA-GERAL DA MESA SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA |
O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Presidente Renan Calheiros, Presidente do Congresso Nacional e do Senado Federal; Presidente Aldo Rebelo, da Câmara dos Deputados; Presidente Nelson Jobim, do Supremo Tribunal Federal; Ministra Ellen Gracie, Presidente eleita do Supremo Tribunal Federal; Sr. Roberto Busato, Presidente da OAB; Ministro Vantuil Abdala, do Tribunal Superior do Trabalho; demais Ministros dos órgãos superiores da magistratura; Srªs e Srs. Senadores, convidados e convidadas, o Senado Federal reúne-se hoje para uma cerimônia singular: homenagear um magistrado que se afasta do exercício das funções jurisdicionais, no mais elevado Tribunal do nosso País, tendo como perspectiva ou possibilidade voltar a militar na política.
Não se trata propriamente de uma novidade. Em tempos recentes, diversos foram os Ministros do Supremo Tribunal Federal que, convocados, deixaram a toga para exercitar funções de natureza política. À guisa de ilustração, poderíamos mencionar os nomes de Francisco Rezek, que foi chamado a dirigir o Itamaraty; Célio Borja e Oscar Dias Correa, que, em distintos governos, conduziram o Ministério da Justiça; Leitão de Abreu, que deixou o STF para chefiar a Casa Civil da Presidência da República.
Na República Velha, Amaro Cavalcanti, Ministro do STF, veio a tornar-se Prefeito do Distrito Federal e, depois, Ministro da Fazenda.
Na débâcle do Estado Novo, coube a José Linhares o comando supremo da Nação, até que se restabelecesse a normalidade democrática.
Outros também encontraram na política o prolongamento da dedicação da vida republicana. Cunha Peixoto, após a aposentadoria compulsória, aceitou o desafio do então Governador Tancredo Neves e assumiu a delicada área de segurança pública do Estado de Minas Gerais, ainda no regime de exceção.
Mas Nelson Azevedo Jobim afasta-se para fazer política, em sua forma mais depurada no regime democrático. Poderá, novamente, buscar o mandato popular. A bem da verdade, não inaugura precedente. Epitácio Pessoa, com apenas 47 anos, desvencilhou-se da Suprema Corte para candidatar-se ao Senado, de onde, posteriormente, saiu para assumir a Presidência da República.
A política está no sangue do Ministro Nelson Jobim. Segue os passos do avô, o Governador Walter Jobim, do Partido Social Democrático (PSD). Não quer isso significar que, no exercício da magistratura, não tenha sabido distinguir o legítimo papel político de nosso Tribunal Constitucional, o guardião da Constituição, dos interesses político-partidários.
A ele se aplica, sem restrições, os ensinamentos de Alexander Hamilton, nos cadernos “Federalistas”:
O poder do povo é superior ao poder judiciário e ao poder legislativo e, quando a vontade do legislativo, expressa em suas leis, entra em oposição à vontade do povo, expressa na Constituição, os juízes devem ser governados por esta última, e não pelas primeiras. Devem regular suas decisões pelas leis fundamentais, não pelas que não são fundamentais.
A passagem de Nelson Jobim pelo STF será marcada por seu denodado esforço em aprovar a Reforma do Judiciário - Emenda Constitucional nº 45, de 2003 - que derrapava há dez anos no Congresso Nacional.
Todos nesta Casa sabem que a Reforma do Judiciário só foi possível, só foi concretizada na velocidade em que ocorreu nesta legislatura pela presença determinante, pela capacidade de articulação e de elaboração, pela credibilidade jurídica do Ministro Jobim no Plenário do Senado Federal. Sem ele, seguramente, não teríamos conseguido aprovar uma reforma tão fundamental para a vida democrática, para a eficiência da economia e para os direitos da cidadania. Nosso Relator, Senador José Jorge, é testemunha, como eu, do esforço e da presença determinante do Ministro Nelson Jobim.
À frente do Tribunal Superior Eleitoral, dirigiu o pleito de 2002 com inacatável isenção, não obstante preconceituosas objeções oriundas até de seu próprio Partido.
Presidindo o Conselho Nacional de Justiça, conduziu-o à adoção de resoluções corajosas, reafirmando o caráter republicano de nossas instituições judiciárias, de que são exemplos o combate ao nepotismo e a fixação do teto remuneratório dos magistrados. Mais uma decisão de imensa coragem política e imprescindível ao avanço do Poder Judiciário no Brasil.
Como Chefe do Poder Judiciário, buscou ainda encontrar uma saída equilibrada para o grave problema dos precatórios, solução que, hoje, já se vê consubstanciada na Proposta de Emenda à Constituição nº 12, de 2006, que tem o Senador Renan Calheiros como primeiro signatário e que conta com o apoio de todos os Líderes desta Casa. Uma proposta ansiosamente esperada, eu diria, por Prefeitos, Governadores e credores do Estado brasileiro, diante de um volume de dívida que ultrapassa R$62 bilhões e que não teve até então uma solução satisfatória. É mais uma contribuição inestimável do Ministro Nelson Jobim.
O mais importante, contudo, é que o período de Nelson Jobim na Presidência do Supremo Tribunal significou a afirmação da autoridade da Suprema Corte quanto ao controle dos atos processuais legislativos, com base em uma compreensão adequada do paradigma do Estado Direito Democrático. Vale dizer, da compreensão do lícito exercício, pelo Supremo Tribunal Federal, do controle judicial mais efetivo do processo legislativo, superando a dimensão eminentemente político-deliberativa dos trabalhos do Parlamento, para neles ver também caráter de juridicidade, ou seja, de necessidade de respeito às funções orgânico-institucionais inscritas na Constituição e de observância do princípio da razoabilidade, inserto na cláusula do devido processo legal.
Na gestão de Nelson Jobim, o Supremo Tribunal Federal repudiou tentativas de desrespeito às normas constitucionais e regimentais; obstaculizou medidas que colocavam em risco não somente os direitos de minorias parlamentares, mas também solertes manobras de quebra da operacionalidade da ordem democrático-constitucional.
Valendo-nos dos ensinamentos de Habermas, podemos sustentar que a presença de Nelson Jobim no Supremo Tribunal Federal fortificou a Jurisdição Constitucional, no sentido de referir-se às condições procedimentais do processo legislativo constitucionalmente estruturado, de acordo com o qual os cidadãos, no exercício de seu direito de autodeterminação, tanto na esfera pública, como na privada, perseguem condições de vida mais justas - ou “buscam a felicidade”, para usarmos uma expressão de Thomas Jefferson - frente ao poder administrativo do Estado e às vertentes do poder econômico e ideológico, de que nos fala Bobbio.
Seu nome ficará gravado na história do Supremo Tribunal Federal, junto ao de tantos eminentes magistrados gaúchos, tais como Herculano de Freitas, Plínio Casado, Carlos Maximiliano, Armando de Alencar, Eloy Rocha, Thompson Flores, Leitão de Abreu, Néri da Silveira e Paulo Brossard, para não falar da Ministra Ellen Gracie, gaúcha por adoção, que deixou o Tribunal Regional Federal da 4ª Região, sediado em Porto Alegre, para assumir uma vaga na Suprema Corte e, agora, a Presidência.
Nelson Jobim, orador de quilate ímpar, deixou Santa Maria da Boca do Monte para abrilhantar, na Assembléia Nacional Constituinte, e frustrar-se na Revisão Constitucional, ocasião em que, como João Batista, parecia pregar no deserto. Mais tarde, não sem antes denunciar, à exaustão, a falência do nosso sistema eleitoral proporcional de lista aberta, deixaria transparecer ter-se tomado pelo espírito de candango e querer deitar raízes no Planalto Central, longe das lides políticas.
Agora, se achar oportuno, poderá a procurar a representação política de seus concidadãos, desde Santa Maria, coração do Rio Grande do Sul. Santa Maria, é certo, continuará presente na Suprema Corte pelo trabalho concreto e seguro do Ministro Eros Grau.
Mas lá, na terra que dá equilíbrio à gente meridional, onde os pampas encontram as terras altas gaúchas, no sítio eqüidistante do Guaíba e do Uruguai, lá onde o amor entrelaçou os sangues minuanos e portugueses, na paixão de Imembuí e Rodrigo, o Morotim, a política volta a chamar Nelson Jobim.
A vida tem lá suas motivações, mesmo para os homens profundamente marcados pela lógica e pela razão.
Não permitiu o destino que Hélvio Jobim, decano dos advogados gaúchos, testemunhasse o gesto ousado do filho: descer os degraus do Excelso Pretório, para, humildemente, pedir apoio político a sua gente.
Gesto ousado e inusitado que faria, uma vez mais, o saudoso Hélvio encher-se de orgulho do filho radicalmente comprometido com os ideais democráticos que embalaram os republicanos de Piratini, deixando lições de liberdade e independência para todos os cidadãos.
Ministro Nelson Jobim, termino dizendo que foi uma imensa alegria e um grande aprendizado ter convivido com V. Exª como Deputado Federal na Câmara dos Deputados. Tivemos momentos muito importantes na vida pública e republicana. Desde lá, sou testemunha da competência, do espírito público, da seriedade, da ética com que V. Exª sempre se pautou na vida parlamentar. Como Senador, mais uma vez, quero testemunhar perante o Plenário do Senado Federal e ao País que a presença de V. Exª à frente do Supremo Tribunal Federal foi absolutamente decisiva para que a Reforma do Judiciário finalmente acontecesse, depois de décadas, e que a gestão do sistema judiciário no Brasil, o aprimoramento administrativo, o enfrentamento de problemas fundamentais para a credibilidade do poder, como o fim do nepotismo e o teto salarial, tarefas difíceis, mas que V. Exª, mais uma vez, com a coragem pública que sempre marcou a sua vida, tiveram êxito e deixaram uma herança muito promissora para a continuidade da Reforma do Judiciário.
Por tudo isso, deixo um abraço fraternal. Desejo-lhe muitas felicidades nessa próxima etapa. Sei que o Brasil ganha novamente um grande advogado, e espero que a vida pública possa ter de volta um grande político.
Um grande abraço e felicidades. (Palmas.)
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