Discurso durante a 18ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Homenagem ao escritor Josué Montello.

Autor
Marco Maciel (PFL - Partido da Frente Liberal/PE)
Nome completo: Marco Antônio de Oliveira Maciel
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Homenagem ao escritor Josué Montello.
Publicação
Publicação no DSF de 17/03/2006 - Página 8535
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM POSTUMA, JOSUE MONTELLO, ESCRITOR, ESTADO DO MARANHÃO (MA), ELOGIO, VIDA, OBRA LITERARIA.

O SR. MARCO MACIEL (PFL - PE. Para encaminhar o requerimento. Com revisão do orador.) - Sr. Presidente, ilustre Senador Cristovam Buarque, Srªs e Srs. Senadores, venho, ao lado de eminentes Senadores, expressar o mais profundo sentimento de pesar pelo falecimento do escritor e acadêmico Josué Montello, membro da Academia Brasileira de Letras, ontem falecido.

Maranhense de São Luís, onde moldou sua rica personalidade, concluiu seus estudos secundários em Belém do Pará e fixou, em 1936, residência no Rio de Janeiro para exercer o mister de Técnico de Educação, conquistado por concurso público junto ao Governo Federal. Com o mesmo devotamento que dedicou às causas da educação, Josué Montello se entregou à maior paixão de sua vida: o ofício de escrever. Josué, escritor, ninguém o foi mais. Dono de uma disciplina rara, escrevia diária e metodicamente, fazendo fluir de sua invenção obras extraordinárias que honram a cultura brasileira.

Houve um escritor francês, Sr. Presidente, o conde De Buffon, que disse, em pleno Século XVIII, em uma sessão da Academia Francesa, que o estilo é o homem - Le style c’est l’homme. Aproveito a sentença de Buffon para dizer que Josué tem um estilo caracterizado que o fez reconhecido como grande escritor, romancista, ensaísta, historiador - por que não dizer também -, teatrólogo, enfim polígrafo. Portanto, Josué foi múltiplo. Afirmou ele, certa feita:

     É preciso ter uma consciência artesanal das letras, da sonoridade das vogais, a intuição da realização estilística do texto, coisa que ninguém ensina. Às vezes refaço duas ou três vezes meu texto, embora também possa dá-lo de imediato... O importante para mim é que ele corresponda ao meu ideal de arte.

            Para escrever, disponho de vocabulário, ritmo e tema. Todo escritor tem duas fases: uma em que a língua domina a língua. E dominar a língua é fundamental; do artigo de um jornal ao trecho de um romance. Não é vaidade. Sou homem simples. Mas reconheço que cheguei, pelo meu trabalho, a este domínio.

Mais adiante, disse, em seu livro Diário do Entardecer:

            A vocação é o gosto de fazer aquilo para que supomos ter nascido. Não vem só; há de ter trazido consigo a companheira que se chama aptidão. Esta ensina como fazer.

     As duas, juntas, harmônicas, solidárias, dão sentido à vida que Deus nos deu. E mais, antes que me esqueça: o que se faz por vocação não cansa.

            Por aí vemos, Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, que Josué Montello nasceu vocacionado para o ofício de escrever.

No romance, a presença do seu Maranhão é constante. E tomo como exemplo uma obra que bem define a sua teluricidade: Os Tambores de São Luís, romance que confere a sua obra e marca o seu sentimento de maranhensidade. Consegue com raro brilho juntar a força telúrica e o cosmopolitismo. A curiosidade intelectual e o caminhar de sua vida naturalmente o conduziram a essa síntese brilhante.

Lembraria outros livros dele: A Décima Noite, Os Degraus do Paraíso, Cais da Sagração, A Luz da Estrela Morta, entre outros., constituem expressão de sua vasta e diversificada produção intelectual. Foram 27 romances escritos, trazidos à luz por editoras, tais como José Olympio, Nova Fronteira e Martins, etc.

Sobre Josué e sua obra há muito o que falar. Amigo de seus amigos, de uma fidelidade exemplar, possuía forte ligação com o nosso colega de Senado e de Academia, José Sarney.

Nutria Josué também velha e terna afeição por Herberto Salles,cultivava uma grande admiração por Gilberto Freyre, meu conterrâneo, e tinha um carinho fraterno por Rachel de Queiroz.

Josué Montello era um líder que se revelava por uma enorme sensibilidade política. De grande capacidade de articulação, foi responsável pela implantação e modernização de inúmeras instituições culturais no Brasil.

À alma do escritor, somava-se um grande talento para a administração pública. Assessorou o Governo Juscelino Kubitschek, como Subchefe da Casa Civil e exerceu a função de Embaixador do Brasil junto à Unesco quando governava o País o Presidente José Sarney. Dirigiu o Museu Histórico Nacional, a Biblioteca Nacional, o Serviço Nacional de Teatro, fundou o Museu da República e foi o principal construtor, no final do Governo Castello Branco, do Conselho Federal de Cultura, trabalho tão reconhecido hoje. Seguiu sua carreira pública como Conselheiro Cultural da Embaixada do Brasil em Paris e também Reitor da Universidade Federal do Maranhão, com excelente atuação. 

Em todos esses cargos, se houve com instinto de nacionalidade, para usar uma expressão de Machado de Assis, e elevada provisão de espírito público.

Josué Montello realizou a notável proeza de, aos 37 anos, jovem e já sólido intelectual, chegar à Academia Brasileira de Letras, que veio a presidir em 1994 e onde continuou o trabalho de seus antecessores, conseguindo, inclusive, modernizar a instituição e implantar o Centro Cultural do Brasil.

Por tudo isso e por muito mais que o respeito ao tempo de que disponho me impede de dizer neste instante, quero reiterar minha tristeza pela perda desse grande amigo, a quem muito apreciava como cidadão e como intelectual.

Josué teve em sua vida um grande amor, sua esposa e companheira de tantos anos, Yvonne Montello a quem e às filhas transmito meu respeito, minha admiração e minha solidariedade.

Josué Montello, que permaneceu décadas na Academia e era o Decano da Instituição, deixa ali um grande vácuo e, ao mesmo tempo, um belíssimo exemplo.

            Sobre a morte, disse, certa feita, João XXIII:

     Aqueles que morreram estão apenas invisíveis aos nossos olhos, mas não estão, de modo algum, ausentes de nossa vida.

Isso pode aplicar-se rigorosamente a Josué Montello. Ele desaparece, mas permanece junto de todos nós, não somente pela conduta e pela obra que produziu, penhor de sua permanência na memória da Pátria,

Sirvo-me da ocasião para pedir que essa manifestação seja levada ao conhecimento da Academia Brasileira de Letras, dos seus familiares e também das instituições a que Josué Montello para honra delas pertenceu.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/03/2006 - Página 8535