Discurso durante a 31ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Críticas ao Programa Segundo Tempo, gerido pela Secretaria Nacional de Esporte Educacional do Ministério do Esporte.

Autor
Efraim Morais (PFL - Partido da Frente Liberal/PB)
Nome completo: Efraim de Araújo Morais
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ESPORTE.:
  • Críticas ao Programa Segundo Tempo, gerido pela Secretaria Nacional de Esporte Educacional do Ministério do Esporte.
Publicação
Publicação no DSF de 31/03/2006 - Página 10524
Assunto
Outros > ESPORTE.
Indexação
  • DETALHAMENTO, PROGRAMA, MINISTERIO DO ESPORTE, AMPLIAÇÃO, DEMOCRACIA, ACESSO, CULTURA, ESPORTE, CRIANÇA, ADOLESCENTE, ESCOLA PUBLICA, REGISTRO, DADOS, CRIAÇÃO, NUCLEO, RECURSOS, NUMERO, ATENDIMENTO.
  • ANALISE, RELATORIO, AUDITORIA, TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO (TCU), DESCUMPRIMENTO, REQUISITOS, PROGRAMA, ESPORTE, GRAVIDADE, AUSENCIA, CRITERIOS, PRIORIDADE, MENOR, SITUAÇÃO, BAIXA RENDA, RISCOS, VIOLENCIA, PRECARIEDADE, INFRAESTRUTURA.

O SR. EFRAIM MORAIS (PFL - PB. Sem apanhamento taquigráfico.) -

Do Senador Efraim Morais

Primeiro Secretário do Senado Federal

Senhor Presidente, Sras e Srs. Senadores.

Este pronunciamento visa a tratar do Programa Segundo Tempo, gerido pela Secretaria Nacional de Esporte Educacional do Ministério do Esporte, que recentemente teve divulgado pelo Tribunal de Contas da União Relatório de Auditoria de Natureza, que visava apurar em que medida as ações implementadas terão colaborado para o alcance dos objetivos pretendidos pela Administração, no exercício de 2005. Queremos, ao fazê-lo, demonstrar a qualidade com que são gerenciados os recursos públicos pelo atual Governo, que é ótimo nas propagandas, mas sofrível em realizar o que promete.

Ressaltamos que o Programa Segundo Tempo vem sendo considerado pelo Ministério do Esporte como a mais importante iniciativa daquele órgão. O programa tem por objetivo geral democratizar o acesso à prática e à cultura do esporte como instrumento educacional, com vistas ao desenvolvimento de crianças e adolescentes. A proposta metodológica prevê a iniciação esportiva em diversas modalidades coletivas e individuais, preparando os jovens envolvidos para a sua prática regular, além de atuar no desenvolvimento dos raciocínios lógico e espacial, no incentivo à ação coletiva e na melhoria da comunicação, favorecendo a inserção do indivíduo no grupo.

Como resultado do programa, prevê-se o fortalecimento de valores sociais, privilegiando as noções naturais de liderança, de trabalho em equipe e de disciplina individual e coletiva, o que deverá contribuir para formar cidadãos mais preparados, mais solidários e com maior sentido de cooperação.

O programa tem como público-alvo crianças e adolescentes matriculados nos níveis de ensino fundamental e médio do sistema de educação pública do país, com atendimento prioritário a jovens matriculados em escolas públicas localizadas em áreas de risco social, definido pelo manual de diretrizes do programa como todas as situações que expõem a vida de crianças e adolescentes a perigo constante. Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) 2003 permitem estimar que existem cerca de quinze milhões de crianças e adolescentes nesta situação no Brasil.

Em agosto de 2005, o programa encontrava-se instalado em 870 municípios, contando com 3.073 núcleos. As crianças e adolescentes atendidos estão sendo cadastrados no sistema de informações do programa, atingindo, na época da realização da auditoria, a 336.287 beneficiários. A meta de atendimento constante da Lei Orçamentária Anual (LOA) de 2005 é de 1.262.406 alunos. Observemos que a meta é muito superior aos que efetivamente estão sendo atendidos, o que implica a probabilidade de sérias distorções nos custos incorridos pelas ações do programa.

A execução das atividades é descentralizada via assinatura de convênios com secretarias estaduais e municipais e com organizações não governamentais (ONG), bem como estabelecimento de termos de cooperação técnica com governos estaduais e municipais.

A ação considerada de maior prioridade pela gerência do programa é a 4.377 - Funcionamento de núcleos de esporte educacional. Em 2004, seus créditos consignados foram de R$37.729.610,00, com execução orçamentária de 81,1%. Para 2005, sua dotação teve um aumento de 65,8%, passando para R$62.511.738,00. A ação 5069 - Implantação de infra-estrutura para o desenvolvimento do esporte educacional teve um aumento orçamentário ainda mais expressivo entre 2004 e 2005. Seus recursos passaram de R$9.933.000,00 para R$48.824.999,00, um aumento de 491%.

Os recursos repassados pelo Ministério do Esporte são destinados ao pagamento dos estagiários/ monitores e para a oferta de reforço alimentar aos beneficiários. Os valores seguem as orientações contidas no manual do programa, podendo haver variações de acordo com o projeto básico apresentado, as condições da estrutura local para aquisição e preparação das refeições, bem como a contrapartida negociada. A bolsa a ser paga a estagiário/monitor equivale a um salário mínimo para vinte horas semanais, enquanto que o custo padrão do reforço alimentar é de R$0,50 x três dias por semana.

Além destes recursos, o Segundo Tempo também destina material esportivo aos núcleos pôr meio do Projeto Pintando a Liberdade. Este projeto emprega detentos na produção do material, com previsão de distribuição de cinqüenta bolas para cada núcleo com 200 crianças.

A partir de 2004 os convênios passaram a prever também o repasse de R$600 por núcleo para a aquisição de material esportivo suplementar (cones, apitos, coletes, cordas elásticas, lápis e cadernos, dentre outros), de forma a possibilitar que outras atividades esportivas peculiares à cultura regional possam ser desenvolvidas.

Senhor Presidente, Sras e Srs. Senadores.

O TCU aponta que a esmagadora maioria dos núcleos tem descumprido com os requisitos do programa. Segundo o Manual de Diretrizes do Segundo Tempo, os núcleos devem observar algumas condições: atender pelo menos 200 crianças; oferecer atividades esportivas no mínimo três vezes por semana e duas horas por dia; e oferecer pelo menos duas atividades coletivas e uma individual. Porém, a auditoria indicou que 49,9% dos núcleos pesquisados atendem menos de 150 crianças. Além disso, 58% dos núcleos não oferecem atividades no mínimo duas horas por dia e três vezes por semana e 43,2% não têm atividades individuais.

O exame da documentação de alguns convênios mostrou que foram aprovadas propostas falhas na observância dos requisitos do programa. Projetos básicos não tinham previsão de oferta de atividades individuais ou ofereciam apenas uma coletiva. O caso do convênio firmado com a Fundação de Apoio ao Menor de Feira de Santana/BA (FAMFS) chamou particularmente a atenção por prever a instalação de 129 núcleos, mas operados por apenas 30 coordenadores.

A fiscalização do TCU evidencia que as atividades de monitoramento do programa têm sido insuficientes para identificar e corrigir procedimentos em desacordo com as diretrizes do Segundo Tempo. Segundo os gestores do programa, visitas assistemáticas aos núcleos foram realizadas, pois a escolha dos núcleos baseia-se mais em critérios pontuais, como ocorrência de denúncias, e não em análise sistemática de características que indiquem fragilidades operacionais. Assim, há um empobrecimento na execução local do Segundo Tempo. Dezenas de milhares de crianças deixam de ter acesso à implementação plena da proposta do programa, o que limita bastante o alcance dos benefícios esperados.

Uma das falhas mais sérias apontadas, em nosso ver, é a de que a maior parte dos núcleos do programa não tem utilizado critérios de priorização para os alunos atendidos.

O Manual de Diretrizes do Segundo Tempo recomenda o uso dos seguintes critérios no atendimento pelo programa:

     Maior dificuldade de aprendizado na escola;

     Habitantes de municípios de regiões metropolitanas com alto índice de violência urbana; - Beneficiários do Bolsa-Família;

     Menor renda familiar;

     Em maior situação de risco social.

De forma geral, os núcleos visitados pelos auditores estão atendendo crianças e adolescentes carentes. Entretanto, entrevistas com a maioria dos coordenadores revelaram que os atendimentos são feitos levando-se em conta apenas a ordem de inscrição dos interessados. Não é desenvolvido um trabalho visando envolver alunos com dificuldades de aprendizado ou em situações de maior risco social, como quadros de desestruturação familiar ou exposição à violência e drogas. A pesquisa postal mostrou situação semelhante: 53,8% dos núcleos pesquisados fazem o atendimento por ordem de chegada e apenas 11,4% priorizam alunos com maior dificuldade de aprendizagem. Isso indica que não tem havido vinculação do programa com as necessidades pedagógicas e sociais das escolas atendidas pelo Segundo Tempo. Em decorrência disso, existe subaproveitamento do programa para atender alunos que poderiam se beneficiar particularmente da sua dinâmica inclusiva e que, por apresentarem um quadro de fragilidade pessoal, não participam das atividades escolares.

Uma outra deficiência observada é de que a maior parte das crianças e adolescentes atendidos é do sexo masculino, em contraste com uma distribuição equilibrada de alunos por gênero nas escolas públicas. Dados do Ministério do Esporte mostram que 63% dos beneficiários são do sexo masculino, enquanto que a distribuição por gênero nas escolas públicas de ensino fundamental indica uma proporção de 51%, segundo dados recentes do Censo Escolar do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP).

A capacitação de coordenadores e monitores tem contribuído para o seu aperfeiçoamento e das atividades oferecidas pelo Segundo Tempo. Entretanto, grande parte dos profissionais envolvidos no programa ainda não teve oportunidade de participar da capacitação. Ao mesmo tempo, a capacitação aborda de forma genérica a inclusão de portadores de necessidades especiais, não sendo suficiente para habilitar os profissionais a lidar com os vários casos que podem surgir no cotidiano dos núcleos de esporte. Os dados revelam que 53,3% dos coordenadores de núcleo não participaram da especialização oferecida pelo CEAD/UnB e que 54,1% dos núcleos pesquisados não têm nenhum monitor participando da modalidade de extensão.

O material esportivo fornecido ao programa foi considerado de qualidade e durabilidade insuficientes. Por sua vez, muitos núcleos não têm oferecido reforço alimentar e, quando o fazem, é muitas vezes inadequado. Além disso, constatou-se que diversos núcleos não receberam os uniformes do programa. Por fim, há núcleos com infra-estrutura precária para a execução das atividades.

No quesito qualidade, a principal reclamação se refere à baixa durabilidade das bolas oferecidas 63,8% dos coordenadores de núcleos declararam que o material estraga rapidamente e quase todos os coordenadores e monitores entrevistados revelaram que a durabilidade e a qualidade técnica das bolas são insatisfatórias. Particularmente criticadas foram as bolas de voleibol, por serem muito duras, mesmo para adultos, e as de basquete, por deformarem rapidamente. Os problemas na qualidade do material produzido são agravados pela falta de reposição tempestiva em alguns convênios. A ausência de bolas ou a sua inadequação compromete a execução das atividades e desestimula a prática das modalidades. 49,7% dos núcleos afirmaram que há prejuízo na oferta de atividades por conta de problemas no material esportivo.

Senhor Presidente, Sras e Srs. Senadores.

De mais sério, dado tratar-se de um programa direcionado a crianças de classes desfavorecidas economicamente, o fato de o relatório apontar que muitos núcleos não têm recebido reforço alimentar adequado às necessidades dos beneficiários do programa. O Ministério do Esporte repassa recursos aos convenentes para a compra e distribuição de merenda para os núcleos. Entretanto, a auditoria indicou que 28,4% dos núcleos nunca receberam o reforço alimentar. Dentre os que receberam, 39,2% disseram oferecer apenas biscoito com refrigerante ou suco, o que não atende ao objetivo do Segundo Tempo de promover hábitos saudáveis de nutrição. Além disso, não há definição de critérios para a composição do reforço alimentar. O programa ainda não estabeleceu quais seriam os requisitos nutricionais mínimos a serem observados pelos convênios para a oferta de merenda aos alunos atendidos.

Segundo a opinião de diversos nutricionistas, a oferta repetida de biscoito e refrigerante supre somente as necessidades calóricas exigidas à atividade esportiva, não podendo ser considerada uma boa prática alimentar, pois estão ausentes proteínas, fibras e vitaminas, entre outros nutrientes necessários às crianças. Isso contraria orientação da Organização Mundial de Saúde.

Diversos núcleos do programa não têm recebido material esportivo de acordo com as atividades desenvolvidas. Nas visitas de estudo, alguns coordenadores informaram ter recebido um kit fechado de material esportivo, repassado igualmente a todos os núcleos do mesmo convênio independentemente das atividades particulares de cada um. A pesquisa postal, por sua vez, indicou que 30,2% dos núcleos não recebem material esportivo para todas as modalidades oferecidas.

Também peca pela qualidade do gerenciamento a base informacional do programa. A auditoria estabeleceu que as informações contidas na base de dados do Segundo Tempo apresentam baixa confiabilidade. Existem diversas inconsistências tais como CEP com sete dígitos ao invés de oito e falta de correspondência entre nomes de ruas, unidade da federação e CEP nos endereços dos núcleos. A relação de coordenadores apresenta vários nomes repetidos, representando 18,6% do total.

O relatório de auditoria do programa revela, ainda, que os indicadores de desempenho constantes do Plano Plurianual não são suficientes para avaliar o desempenho das ações do programa, nem a efetividade da política pública de incentivo ao esporte como meio de inclusão social.

Assim, podemos observar que o principal programa do Ministério dos Esportes apresenta um sem número de deficiências e ineficiências que são emblemáticas na gestão deste Governo. Esse programa, no entanto possui abundante publicidade apresentando números fantasiosos, que não coincidem com a realidade apontada pela auditoria, inclusive outdoors aqui no Distrito Federal onde o Ministro é candidato. É hora, pensamos, de revelarmos ao povo brasileiro mais e mais o que realmente vem sendo realizado pelos atuais governantes. Com esse pronunciamento fazemos uma contribuição. 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 31/03/2006 - Página 10524