Discurso durante a 22ª Sessão Especial, no Senado Federal

Homenagem à Campanha da Fraternidade da CNBB de 2006.

Autor
Pedro Simon (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: Pedro Jorge Simon
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
IGREJA CATOLICA. POLITICA SOCIAL.:
  • Homenagem à Campanha da Fraternidade da CNBB de 2006.
Publicação
Publicação no DSF de 23/03/2006 - Página 9092
Assunto
Outros > IGREJA CATOLICA. POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • HOMENAGEM, CAMPANHA DA FRATERNIDADE, IGREJA CATOLICA, DEBATE, INCLUSÃO, PESSOA PORTADORA DE DEFICIENCIA.
  • LEITURA, TRECHO, CARTA, PAPA, APOIO, ANTERIORIDADE, CAMPANHA DA FRATERNIDADE, DEBATE, VIOLENCIA, ANALISE, ORADOR, DEFICIENCIA FISICA, ORIGEM, ARMA DE FOGO, ACIDENTE DE TRANSITO, REGISTRO, DADOS, POSSIBILIDADE, PREVENÇÃO, ACIDENTES, DOENÇA, EFEITO, DEFICIENTE MENTAL, COMENTARIO, ESTUDO, ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAUDE (OMS), BANCO MUNDIAL, INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATISTICA (IBGE), ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU), VINCULAÇÃO, PROBLEMA, BAIXA RENDA.
  • AVALIAÇÃO, MELHORIA, INTEGRAÇÃO, DEFICIENTE FISICO, MERCADO DE TRABALHO, IMPORTANCIA, CONSCIENTIZAÇÃO, SOCIEDADE CIVIL, COMBATE, DISCRIMINAÇÃO.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente e autor desta iniciativa, que, como Líder do Governo, a valoriza, companheiro e amigo Mercadante; bravo Clodoaldo, padrão de admiração e respeito de todo o Brasil; Dom Luciano Mendes de Almeida; Dom Itamar Vian; Dom Xavier; Dom Muniz; Dom Sinésio; senhoras e senhores; estamos aqui para homenagear talvez a maior iniciativa social conhecida no nosso País: a Campanha da Fraternidade.

Há mais de quarenta anos, a Igreja Católica escolhe um tema sensível da realidade e convida os brasileiros a refletirem sobre ele. Mas também nos convoca a uma ação enérgica e engajada, de modo a atenuar os problemas que atingem nossos irmãos, em especial os mais necessitados.

Na época do regime militar, questões importantes para a redemocratização brasileira foram levantadas pela CNBB, uma entidade que esteve à frente da longa luta pela reconstrução do regime democrático.

Nos últimos anos, temas da maior importância têm sido focados pela Campanha da Fraternidade, de modo a fazer com que busquemos, juntos, uma solução para eles. E, quando falo que “busquemos juntos”, estou-me referindo ao Estado e também à sociedade.

É importante destacar que alguns dos nossos principais problemas sociais se agravam nos últimos anos, em função de uma persistente estagnação econômica. Um dos exemplos mais claros é o da violência urbana, questão abordada na Campanha da Fraternidade do ano passado, cujo tema era “Solidariedade e Paz”.

Registro aqui um trecho da carta do Papa João Paulo II, enviada no ano passado ao primaz do Brasil, por ocasião da abertura da Campanha da Fraternidade de 2005. Escreveu naquela ocasião o nosso querido João Paulo II, que pouco depois viria a falecer:

No mundo em que vivemos, abalado com freqüência pela violência e marcado pelo indiferentismo, os cristãos que partilham o empenho pela promoção da paz e da solidariedade tornam-se instrumentos eficazes de evangelização e um exemplo para todos, a fim de construir uma sociedade mais fraterna e mais atenta às necessidades dos pobres e indigentes.

Fiz esta citação porque acho que os temas do ano passado e de 2006 têm um forte traço de ligação, já que um grande número de pessoas adquire deficiências em função da violência que impera absoluta em nosso tempo. Refiro-me mais especificamente às pessoas com deficiência motora em função de tiros e de acidentes de automóvel.

Segundo estudos da Associação de Assistência à Criança com Deficiência, feitos em sua Clínica de Lesão Medular, 73,4% dos pacientes tratados pela instituição adquiriram o problema por acidentes de carro, armas de fogo e queda. Desse universo, 43,5% de seus pacientes sofreram lesões em razão de acidentes por armas de fogo. Os dados estatísticos dos últimos três anos também mostram que 83,5% dos pacientes são do sexo masculino e 68,3% ficaram paraplégicos.

Muitos desses problemas poderiam ser evitados se, no Brasil, tivéssemos realmente um amplo sistema de prevenção, sistema que teria duas linhas centrais. Uma delas teria como objetivo evitar acidentes (de automóveis, com armas de fogo, quedas e mergulhos) causadores de lesões traumáticas. A outra linha cuidaria de fazer um grande esforço na área da saúde para evitar doenças - algumas delas de fácil combate e cura - que podem levar à deficiência mental.

São muitos os estudos sobre a deficiência. Estima-se que, atualmente, em todo o mundo, as pessoas com algum tipo de deficiência física, sensorial ou mental somem meio bilhão!

De acordo com a Organização Mundial da Saúde, nos países em via de desenvolvimento, cerca de 50% dessas pessoas são afetadas por algum tipo de deficiência mental.

Estudos do Banco Mundial avaliam que cerca de 10% das pessoas nos países mais pobres são afetadas por alguma deficiência. Já o mais recente do IBGE aponta a existência hoje, em nosso País, de 24,6 milhões de pessoas portadoras de deficiências, sendo que mais de 9 milhões são portadoras de algum tipo de deficiência física.

A ONU calcula que a população deficiente em países com características socioeconômicas semelhantes ao Brasil é da ordem de 10%.

Falando na abertura da Campanha da Fraternidade de 2006, o Secretário-Geral da CNBB, Dom Odilo Pedro Scherer, disse que o censo demográfico de 2000 registrou cerca de 27 milhões de pessoas com deficiência, o que corresponde a 14,4% da população. E acrescentou que na Região Nordeste essas pessoas passam de 18%. Já em São Paulo, com a menor incidência do País, são 11,4%.

Depois de todos esses números, acho que devemos refletir sobre um aspecto fundamental desse problema: boa parte das pessoas com deficiência no Brasil vem de famílias com renda reduzida. Assim, a dificuldade se aprofunda porque muitas delas não têm sequer acesso aos serviços de educação, saúde e reabilitação. São incontáveis os casos de paraplégicos que não dispõem de cadeiras para se locomoverem, de deficientes visuais que não têm bengalas ou cães-guia, de amputados que não têm acesso a próteses e de deficientes mentais que vivem isolados.

Somos obrigados a reconhecer que a situação é grave, mas, se olharmos para trás, veremos que, nos últimos anos, o Brasil avançou bastante nesse campo. A Constituição de 1988 determinou como um dos pilares de sustentação da ordem econômica nacional a valorização do trabalho, de modo a favorecer uma existência digna. Do mesmo modo, buscou uma maior justiça social, a fim de reduzir as desigualdades sociais.

Uma evidente preocupação dos legisladores constituintes foi garantir ao deficiente físico condições de participar efetivamente da vida brasileira. Num avanço considerável, foram estabelecidas bases do processo de integração do deficiente físico à sociedade e ao mercado de trabalho.

Mesmo assim, ainda há muito a ser feito. Cabe a nós, legisladores brasileiros, sob a pressão legítima da sociedade, enfrentar essa missão.

Senhoras e senhores, a Quaresma é o tempo da reflexão para os cristãos. No entanto, a reflexão sempre pede como complemento uma ação. A Campanha da Fraternidade deste ano tem como tema a Pessoa com Deficiência. Então, o que se quer de nós é que reflitamos sobre a situação angustiante de tantos de nossos irmãos, mas também que partamos para a busca de soluções.

Temos um exemplo a mirar. Jesus Cristo, aquele que nos legou a mais fundamental das atitudes: ama teu próximo como a ti mesmo.

Falando na abertura da Campanha da Fraternidade deste ano, Dom Odilo Scherer, Secretário-Geral da CNBB, disse que devemos olhar para as necessidades dos nossos irmãos e acrescentou que “a autenticidade da nossa fé em Deus é comprovada pelos frutos de caridade e de fraternidade para com o próximo”.

Embora, como já disse, muito já tenha sido feito pelas pessoas com deficiência nos últimos tempos, não basta apenas a ação do Estado. E é preciso que também a sociedade se engaje nessa missão. E é preciso ainda que cada um de nós, enquanto cidadão, assuma esta tarefa pessoal.

Segundo Dom Odilo Scherer, as pessoas com deficiência são freqüentemente vítimas de preconceito e discriminação, “sobretudo num ambiente cultural que tende a marginalizar e excluir os que têm menos capacidade individual de competir com os outros e de se afirmar social e economicamente”.

Lamentavelmente, a valorização dos bens materiais, traço marcante dos nossos dias, leva o homem a uma luta acirrada pela conquista de melhores postos de trabalho. Essa luta se agrava ainda mais em uma Nação como a nossa, vítima de estagnação econômica há muito tempo. Assim, o chamado mercado de trabalho para a pessoa com deficiência se estreita ainda mais. Felizmente, esse problema está sendo combatido. O Brasil tem uma boa legislação para inclusão da pessoa com deficiência nos organismos de gestão do Estado. Da mesma forma, as empresas passam a contratar maior número de pessoas com deficiência para mostrar que desenvolvem efetivamente ação social.

Depois de mencionar que, no Brasil, vivem milhões de pessoas com deficiência, advertimos que todos nós estamos sujeitos a adquirir alguma deficiência, ao longo da vida por doença, acidente ou alguma outra causa.

Dom Odilo traz a importante informação de que o Brasil, daqui a pouco, vai ingressar no bloco dos países que têm elevada parcela de idosos na sua população. E a idade avançada pode concorrer para que as pessoas adquiram certas deficiências. Pessoas de idade passam a exigir maior cuidado em função da natural limitação de sua capacidade de trabalhar e mesmo de enfrentar pequenas tarefas cotidianas.

Ainda na mesma linha de raciocínio, Dom Odilo Scherer nos lembra que...

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Já encerro, Sr. Presidente.

(...) em nossos dias, a cultura dominante vai afirmando a tendência a valorizar apenas os fortes, os belos, os que têm um corpo perfeito, os que podem mais, os que são capazes de competir e se afirmar sobre os outros... E, com isso, tantas pessoas que não se enquadram nos padrões de perfeição e excelência impostos pelo mercado, a moda e os preconceitos sociais vão ficando de lado, abandonadas a si próprias, lá no cantinho de sua angústia, à margem da sociedade.

É uma constatação das mais pertinentes. A valorização do exterior é uma lamentável característica de nossa época. Hoje, muitas vezes, o ser humano é levado em conta pelo que aparenta, e não pelo que é realmente.

Numa época em que impera a linguagem visual, imposta pela televisão, passamos a valorizar mais a embalagem do que o conteúdo.

A Campanha da Fraternidade, agora em 2006, mais uma vez toca num ponto sensível da nossa realidade. Há uma verdade indiscutível: a pessoa com deficiência não foi completamente assimilada em nosso País. É preciso uma tomada geral de consciência sobre as dificuldades enfrentadas por esses nossos irmãos, para que as ações de resgate sejam implementadas.

A Campanha da Fraternidade, segundo a CNBB, objetiva promover em relação a elas “atitudes fraternas e ações voltadas para sua inclusão e para uma verdadeira cultura da fraternidade e da solidariedade humana, que venha traduzida em leis justas e políticas públicas adequadas ao reconhecimento da dignidade e dos direitos das pessoas com deficiência”.

Já encerro, Sr. Presidente.

Volto a insistir: o dever do cristão de hoje é lutar contra a corrente.

Diante da indiferença e do egoísmo que marcam boa parte das ações humanas, o cristão tem que se engajar na luta de resgatar esses irmãos que lutam por dignidade e que procuram meios de atuar efetivamente na sociedade brasileira.

Diante do exibicionismo e da leviandade, temos que pregar a reflexão, a oração e o recolhimento.

Diante da indiferença, temos de pregar o amor.

Diante do individualismo, temos de pregar a solidariedade.

Num tempo de egoísmo acerbado, indiferença, exibicionismo e competição acirrada, o cristão deve-se voltar para a generosidade, a modéstia, a cordialidade, a solidariedade e a civilidade.

Senhoras e Senhores, encerro este pronunciamento com um pequeno trecho da oração da Campanha da Fraternidade deste ano: “Ó Pai de misericórdia, ajudai-nos a promover a autonomia e a plena realização desses nossos irmãos e irmãs na família, na sociedade e na Igreja.”

Obrigado pela tolerância, Sr. Presidente. (Palmas.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/03/2006 - Página 9092