Discurso durante a 36ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Protesto contra episódio ocorrido ontem, na apresentação do relatório final da CPMI dos Correios, quando parlamentares foram impedidos de usar da palavra. (como Líder)

Autor
Ideli Salvatti (PT - Partido dos Trabalhadores/SC)
Nome completo: Ideli Salvatti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REGIMENTO INTERNO. COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRAFOS (ECT).:
  • Protesto contra episódio ocorrido ontem, na apresentação do relatório final da CPMI dos Correios, quando parlamentares foram impedidos de usar da palavra. (como Líder)
Publicação
Publicação no DSF de 07/04/2006 - Página 11271
Assunto
Outros > REGIMENTO INTERNO. COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRAFOS (ECT).
Indexação
  • PROTESTO, DESCUMPRIMENTO, REGIMENTO INTERNO, SENADO, APRESENTAÇÃO, RELATORIO, COMISSÃO PARLAMENTAR MISTA DE INQUERITO, EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRAFOS (ECT), ESPECIFICAÇÃO, AUSENCIA, AUTORIZAÇÃO, VOTAÇÃO, ENFASE, UTILIZAÇÃO, PALAVRA, CONGRESSISTA, LEITURA, RESUMO, TEXTO.
  • PROTESTO, VOTAÇÃO, ALTERAÇÃO, RELATORIO, ACUSAÇÃO, AUSENCIA, APRESENTAÇÃO, INTEGRALIDADE, TEXTO.
  • LEITURA, NOTA OFICIAL, BANCADA, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), REGISTRO, IRREGULARIDADE, VOTAÇÃO, RELATORIO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRAFOS (ECT), SOLICITAÇÃO, ENCAMINHAMENTO, RESULTADO, INVESTIGAÇÃO, MINISTERIO PUBLICO, DEFESA, CONDUTA, MEMBROS, REPRESENTAÇÃO PARTIDARIA.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


A SRª IDELI SALVATTI (Bloco/PT - SC. Pela Liderança do PT. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, venho à tribuna, nesta tarde, depois de um episódio ocorrido no Congresso Nacional que considero de extrema gravidade, pelo seu significado e suas conseqüências.

O que se faz nesta Casa que não esteja amparado na Constituição Federal e no Regimento Interno cria precedentes e situações extremamente delicadas. Até porque, se bastasse tão-somente ter maioria e ter votos suficientes para se tomar uma decisão, nós não precisaríamos ter Regimento. O Regimento, tanto do Congresso, quanto do Senado ou da Câmara, é exatamente a regra, a lei que estabelece os procedimentos, previamente reconhecidos, sobre como se comportar durante todas as atividades inerentes à nossa função no Parlamento nacional.

Ontem, vários Parlamentares não puderam falar - a prerrogativa primeira de quem é eleito para o Parlamento. Portanto, parlar, falar, é a condição primeira de qualquer cidadão ou cidadã brasileira que chega à Câmara ou ao Senado.

Ontem, na reunião da CPMI dos Correios, apesar do princípio elementar de que o Parlamentar pode e deve falar, nem antes, nem durante, nem depois da votação, os Parlamentares puderam falar, fosse “pela ordem” ou “para uma questão de ordem”.

A segunda afronta diz respeito à ciência ou à publicidade. Apesar de não termos tido o direito de falar publicamente, porque não nos era dada a palavra nem “pela ordem”, nem “para uma questão de ordem”, nós não sabíamos o que estávamos votando. Não sabíamos como não sabemos até agora. Neste momento, está havendo uma coletiva - não sei se já terminou - do Presidente e do Relator da CPMI dos Correios, e talvez esteja sendo apresentado o texto, não um resumo.

Lerei um dos itens votados ontem: “Suprime parte do texto do item 5, alínea a, referente ao Sr. Marcos César de Cássio Lima, Diretor da Quality”. O que isso significa?

E mais: “Inclui parágrafo no final do texto que remete o conteúdo das investigações às autoridades competentes”. Esse é o resumo. O que está sendo incluído?

O que está sendo retirado? Ninguém sabia.

Mesmo não se podendo falar, porque não era dada a palavra nem “pela ordem” nem “para uma questão de ordem”, vários Parlamentares foram pessoalmente ao Presidente e ao Relator para poderem entender. O Sub-Relator de contratos, Deputado Cardoso, foi inúmeras vezes, porque houve várias alterações relativas à Sub-Relatoria do Deputado Eduardo Cardoso, falar com o Relator: “Por quê? O que está sendo modificado? Quero saber qual é o texto da modificação!” E lhe era apresentado única e exclusivamente esse resumo.

Portanto, ontem, estabelecemos dois gravíssimos precedentes: o de se votar com o resumo, e não com o texto, na íntegra, sem se saber na totalidade o que se estava deliberando; e o outro precedente gravíssimo é que, durante a votação, não se pôde fazer destaque. E vejam que já existem precedentes! Inclusive, à tarde, tive oportunidade de exemplificar até com votação de texto de relatório de CPMI - uma delas presidida pelo Senador Alvaro Dias, que agora preside a sessão -, em que, aprovado o texto do relatório, encaminhava-se a votação de destaque. Isso aconteceu a pedido de vários Senadores: Senadora Heloísa, Senador Suplicy, Senador Arthur Virgílio, Senador Pedro Simon. Houve o mesmo procedimento regimental em várias CPMIs: após a votação do relatório, sem prejuízo dos destaques, fazia-se, em seguida, a votação dos destaques. Mas não pudemos utilizar esse expediente, que é regimental e sempre foi usual nas CPMIs ao longo da história deste Congresso.

O Regimento garante o direito à palavra, ao conhecimento, a tornar público o que está em processo de votação e à possibilidade de se votar o destaque, mas tudo isso foi eliminado ontem. Foi retirado o legítimo direito de qualquer Parlamentar recorrer ao Regimento da Casa.

Por isso, esse episódio tem conseqüências.

O Sr. Heráclito Fortes (PFL - PI) - V. Exª me permite um aparte?

A SRª IDELI SALVATTI (Bloco/PT - SC) - Ontem, fui impedida de falar muitas vezes e, hoje, vou concluir o meu pensamento. Se me for permitido, depois de concluir todo o meu pensamento, concederei apartes, mas vou usar todo o meu tempo agora.

Esse precedente é de uma gravidade, porque poderá servir de exemplo. Assim como levei os exemplos das CPMIs, em que o direito de votação do destaque foi utilizado à exaustão, abrimos um precedente para que, agora, no Congresso Nacional, Parlamentar não possa falar; Parlamentar vote sem saber o que está votando e sem o direito de pedir votação de destaque.

Por isso, entendo que não é qualquer coisa o que aconteceu, e espero que tomemos alguma providência para que esse tipo de situação seja totalmente eliminado, porque, senão, o Regimento, que é a nossa lei, a nossa regra, não precisa mais existir.

Eu gostaria ainda de fazer uma indagação: quero saber, das pessoas que votaram, se elas têm conhecimento efetivo do que votaram, porque o texto foi modificado sem que houvesse sido apresentado o que estava sendo modificado. Não foi divulgado o nome de quem estava pedindo a modificação. A Bancada do PT e vários Parlamentares que apresentaram voto em separado foram expostos. Pelo menos o que apresentamos, o que foi considerado um substitutivo, um global, o que foi denominado paralelo, etc., foi público. Todo mundo sabia quem estava pedindo aquelas modificações, inclusões, alterações ou exclusões. Houve determinadas matérias, votadas ontem, que ninguém sabe quem as pediu, porque não foi dado texto, não foi divulgado o nome de quem pediu, nem houve justificativa do pedido. E não foi pouca coisa!

Quero aqui relatar pelo menos três votações feitas ontem que nos causaram muita estranheza. Muita! A primeira exclui todos os indiciamentos da comissão de licitação da concorrência nos Correios de outubro de 2000, concorrência que beneficiou o esquema...

(Interrupção do som.)

A SRª IDELI SALVATTI (Bloco/PT - SC) - Vou pedir a V. Exª, Sr. Presidente, que considere relevante o meu pronunciamento e que me permita concluí-lo. Tenho ainda alguns elementos importantes a expor.

O Sr. Heráclito Fortes (PFL - PI) - É justo, Sr. Presidente. Creio que se deve dar o tempo necessário à Líder.

O SR. PRESIDENTE (Alvaro Dias. PSDB - PR) - Vou conceder mais tempo a V. Exª, a exemplo do que já fizemos com os oradores que a antecederam.

A SRª IDELI SALVATTI (Bloco/PT - SC) - Agradeço a V. Exª.

Essa concorrência de outubro de 2000, para beneficiar o esquema Beta-Skymaster, tinha indícios de fraude e de vício escandalosos. E o relatório pedia as providências legais cabíveis pelas provas levantadas, mas foram retirados, foram excluídos todos os nomes, sem nenhuma justificativa. Sabe qual é o valor desse contrato, dessa licitação de outubro de 2000? Duzentos e oitenta milhões de reais! Era sobre esse valor que havia uma investigação contundente, com indícios fortíssimos, elementos, provas; e isso foi retirado.

Foram retirados também dois nomes nas franquias, num outro processo, do qual não foi possível quebrar todos os sigilos. Foi possível quebrar o sigilo de uma única franquia. Uma única! Nem chegou à CPMI toda a quebra do sigilo. Em relação à parte que chegou, ficou identificado saque na boca do caixa de oito milhões, além de inúmeros depoimentos de que os recursos tinham vinculação com políticos. Está tudo lá, testemunhado; comprovados os saques, os repasses, tudo! E é bom saber: franquia é um processo que houve nos Correios já há mais de uma década e, só para se ter a dimensão do dinheiro - porque é importante conhecer a dimensão do dinheiro que estava envolvido nessa investigação -, o faturamento/ano, isto é, só de um ano, de uma única franquia que teve quebra de sigilo, é da ordem de R$144 milhões. Some-se isso, ao longo de muitos anos, aos R$280 milhões da Beta-Skymaster e some-se isso ao terceiro item que quero aqui levantar, retirar ou modificar - não sabemos o que é, porque não acessamos o texto - a aplicação internacional, feita em outubro de 2002 pelo IRB, que, à época, era presidido pelo Sr. Demóstenes Madureira de Pinho Filho -, da ordem de US$240 milhões, a qual deu um baita prejuízo ao IRB. Inclusive, há um processo de investigação, já avançado, no Tribunal de Contas da União.

Então, houve três modificações, e ninguém sabe o que foi feito, porque o texto não foi apresentado, foi votado e aprovado. Ninguém sabe por que, nos três casos, aparece o Deputado Osmar Serraglio. Não houve voto em separado, e ninguém sabe, efetivamente, quem fez o pedido, porque foi diferente dos outros votos. Nós, a Senadora Heloísa Helena e vários Parlamentares apresentamos voto em separado. Isso se tornou público. Desses, não se sabe.

Mas somem o volume de recursos sob investigação: US$240 milhões no caso do IRB; 280 milhões no caso da Skymaster e da Beta; 144 milhões/ano, no caso de uma única franquia. Ou seja, o que foi retirado ou modificado, sabe-se lá o que ou como, ultrapassa a casa de R$1 bilhão, no mínimo, e ficamos todos achando que tudo isso é porque se quer investigar com profundidade e até as últimas conseqüências.

O Sr. Heráclito Fortes (PFL - PI) - Permite-me V. Exª um aparte?

A SRª IDELI SALVATTI (Bloco/PT - SC) - A Bancada do Partido dos Trabalhadores na CPMI dos Correios deu uma coletiva e apresentou uma nota pública que lerei, para, dessa forma, encerrar meu pronunciamento:

1 - A bancada de parlamentares do PT na CPMI dos Correios reafirma seu compromisso de que tem por indispensável o encaminhamento do relatório desta investigação parlamentar ao Ministério Público e a outras autoridades competentes. O não-encaminhamento do relatório compactuaria com uma situação de impunidade inaceitável.

2 - São inverdadeiras as afirmações de que a bancada do PT tentou utilizar expedientes de obstrução à votação do relatório. Expedientes regimentais habituais para esse fim, como a tentativa de se evitar o encerramento da discussão, a apresentação de requerimentos de adiamento de votação, ou outros, não foram utilizados.

3 - O processo de votação do relatório do Deputado Osmar Serraglio, na reunião de ontem da CPMI, violou vários dispositivos constitucionais e regimentais, entre estes:

a) art. 37, caput, da Constituição Federal (princípio da publicidade);

b) art. 241 do Regimento Interno do Senado (obriga a leitura das proposições e, portanto, do texto das modificações propostas pelo Relator);

c) art. 312 do Regimento Interno do Senado (admite a apresentação dos destaques para a votação em separado);

d) art. 131 do Regimento Comum (permite a apresentação de questões de ordem).

4 - Estas violações legais e regimentais impediram aos parlamentares e à sociedade brasileira o conhecimento integral da matéria votada, propiciando que o relatório tivesse texto diferente do divulgado e discutido. Por esta razão, foi interposto o recurso contra a decisão do Presidente da CPMI que impediu a votação de destaques e até mesmo o simples esclarecimento das modificações introduzidas pelo Relator momentos antes da votação, e sem a necessária publicidade dos textos alterados. É importante salientar que a interposição deste recurso não será por nós utilizada para obstar o encaminhamento do resultado da presente investigação parlamentar ao Ministério Público e às autoridades competentes. Também não serão propostas quaisquer medias judiciais com este objetivo.

5 - São inaceitáveis as modificações feitas pelo Relator no texto do relatório, minutos antes da votação, e sem conhecimento do texto modificado. As alterações e supressões injustificadas do encaminhamento ao Ministério Público do nome de suspeitos, particularmente nas conclusões propostas em relação às franquias, aos dirigentes dos Correios, do IRB e de corretoras, sem permitir que parlamentares indagassem a motivação do Relator ao fazê-las, é fato grave e ofensivo à transparência que deve orientar as investigações parlamentares. Causa espécie, inclusive, que até o momento o texto modificado ainda não tenha sido divulgado.

6 - Para que omissões injustificadas nas investigações realizadas pela CPMI dos Correios sejam levadas ao conhecimento das instituições competentes, encaminharemos representação ao Ministério Público Federal e a outras autoridades, para que tomem ciência dos fatos delituosos lamentavelmente retirados e omitidos do relatório originalmente apresentado pelo próprio Relator.

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.

Agradeço a V. Exª a gentileza com que me concedeu alguns minutos a mais.


Modelo1 8/17/244:26



Este texto não substitui o publicado no DSF de 07/04/2006 - Página 11271