Pronunciamento de Eduardo Suplicy em 11/04/2006
Discurso durante a 39ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
Importância do funcionamento das instituições democráticas. Lembrança dos 30 anos da morte de Zuleika Gomes Netto, a Zuzu Angel, ocorrida em 14 de abril de 1976. (como Líder)
- Autor
- Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
- Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
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COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRAFOS (ECT).
HOMENAGEM.
MOVIMENTO TRABALHISTA.
POLITICA DE TRANSPORTES.:
- Importância do funcionamento das instituições democráticas. Lembrança dos 30 anos da morte de Zuleika Gomes Netto, a Zuzu Angel, ocorrida em 14 de abril de 1976. (como Líder)
- Aparteantes
- Heráclito Fortes.
- Publicação
- Publicação no DSF de 12/04/2006 - Página 11855
- Assunto
- Outros > COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRAFOS (ECT). HOMENAGEM. MOVIMENTO TRABALHISTA. POLITICA DE TRANSPORTES.
- Indexação
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- SAUDAÇÃO, ESTADO DEMOCRATICO, BRASIL, AUTONOMIA, PROCURADOR GERAL DA REPUBLICA, ENCAMINHAMENTO, INDICIAMENTO, ACUSADO, CORRUPÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR MISTA DE INQUERITO, EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRAFOS (ECT), IMPORTANCIA, DIREITO DE DEFESA, INDEPENDENCIA, JUSTIÇA.
- HOMENAGEM, ANIVERSARIO DE MORTE, ARTISTA, MODA, VALORIZAÇÃO, CULTURA, BRASIL, MÃE, PRESO POLITICO, MORTE, TORTURA, VITIMA, DITADURA, REGIME MILITAR, ELOGIO, LUTA, DENUNCIA, REGISTRO, FILME NACIONAL, BIOGRAFIA.
- SOLICITAÇÃO, DIRETOR, PRESIDENTE, AGENCIA NACIONAL DE VIGILANCIA SANITARIA (ANVISA), CONCESSÃO, AUDIENCIA, SINDICATO, VIGIA PORTUARIO, PORTO DE SANTOS, DIFICULDADE, GREVE, MOVIMENTAÇÃO, NAVIO.
- EXPECTATIVA, GESTÃO, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA DEFESA, MINISTERIO DO TRABALHO E EMPREGO (MTE), SOLUÇÃO, CRISE, VIAÇÃO AEREA RIO GRANDENSE S/A (VARIG).
SENADO FEDERAL SF -
SECRETARIA-GERAL DA MESA SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA |
SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP. Pela Liderança do PT. Sem revisão do orador.) - Prezado Senador, Presidente Roberto Saturnino; Srªs e Srs. Senadores, em primeiro lugar, ressalto, juntamente com o Senador Tião Viana, que me cedeu a oportunidade de falar em nome da Liderança do Governo, a importância do funcionamento das instituições democráticas, a maneira independente e isenta com que o Procurador-Geral Antonio Fernando de Souza encaminhou o seu relatório, inclusive indiciando quarenta pessoas envolvidas com o problema detectado também pela CPMI dos Correios. É importante que os apontados tenham todo o direito de defesa, mas também que a Justiça se pronuncie da maneira a mais independente possível. Que bom que estamos vivendo em uma democracia, Senador Sibá Machado, porque isso significa muito para todos nós brasileiros.
O Sr. Heráclito Fortes (PFL - PI) - V. Exª me permite um aparte, Senador Eduardo Suplicy?
O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Agradeço, Senador Heráclito Fortes, se...
O Sr. Heráclito Fortes (PFL - PI) - Eu é que agradeço a V. Exª, que é um homem urbano e gentil, por isso que São Paulo o admira tanto. Eu queria apenas, Senador Suplicy, perguntar a V. Exª...
O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Mas é que V. Exª tem uma tática tal que, de repente, não consigo falar do tema principal para o qual vim à tribuna.
O Sr. Heráclito Fortes (PFL - PI) - Eu quero um minuto apenas.
O SR. PRESIDENTE (Roberto Saturnino. Bloco/PT - RJ) - V. Exª concede o aparte se desejar, Senador Eduardo Suplicy.
O Sr. Heráclito Fortes (PFL - PI) - S. Exª é um lorde, não nega aparte a um admirador dele como eu.
Senador Suplicy, V. Exª fez elogios ao Procurador. Quero apenas ouvir de V. Exª - e o Brasil todo está nos assistindo: V. Exª achou justo o indiciamento do Sr. José Dirceu, do Sr. Delúbio Soares, do Sr. Waldomiro Diniz, do Sr. Silvio Pereira? Ou V. Exª acha que foi injusto?
O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Senador Heráclito Fortes, eles terão o direito completo - quero assegurar - de se defender, a Justiça vai se pronunciar, e eu então terei elementos os mais completos para responder a V. Exª, mas permita-me agora que eu faça o meu pronunciamento.
O Sr. Heráclito Fortes (PFL - PI) - V. Exª não concorda com o seu Partido. Era só isso o que eu queria saber. Muito obrigado.
O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Sr. Presidente, hoje gostaria de falar de Zuzu Angel. No dia 14 de abril, há 30 anos, ela foi morta, porque, como diziam seus amigos, “ninguém podia com a força dela”. Força de mãe, coisa que não se esquece.
A cultura popular, sempre sábia, lembra que “a força de uma mãe vale mais que um exército”.
A música “Angélica”, de Chico Buarque, gravou para sempre, na memória brasileira, a luta de Zuzu para encontrar seu filho Stuart, torturado até à morte durante a ditadura militar e até hoje desaparecido:
Quem é essa mulher
Que canta sempre esse estribilho?
Só queria embalar meu filho
Que mora na escuridão do mar...
Assim diz a música, que também teve problemas com a censura do Governo Militar, de autoria de Chico Buarque de Holanda.
Stuart Angel Jones tinha pouco mais de 20 anos quando foi preso pelo DOI-CODI no Rio, por pertencer aos quadros do Movimento Revolucionário 8 de Outubro, o MR-8, que lutava contra a ditadura. Levado para a Base Aérea do Galeão, sofreu toda sorte de torturas e humilhações, até que foi amarrado no pára-choque de um jipe, com a boca no cano de escapamento. Morreu por asfixia, morreu por esfolamento, de forma perversa, durante as várias voltas do jipe no pátio do quartel. É cruel demais para continuar, Senador Roberto Saturnino.
Imaginem como foi terrível para Zuzu, a mãe de Stuart, receber uma carta com o relato de Alex Polari, um companheiro dele que testemunhou sua morte em 1971. Imaginem que dura foi a notícia para a jornalista Hildegard Angel e para Ana Cristina, as outras duas filhas de Zuzu que estiveram ao seu lado até o fim.
As três transformaram a sua dor em luta, e Zuzu colocou a sua criatividade a serviço da busca de Stuart e do protesto contra a ditadura e os seus métodos truculentos. O corpo de Stuart jamais foi encontrado. Os relatos da época dizem que foi jogado ao mar. Sua mulher, Sônia Jones, também morreu em São Paulo.
Zuzu era o apelido de Zuleica Gomes Netto, mineira de Curvelo, a cidade cheia de história e cultura. Nasceu em 1921. Morou em Belo Horizonte e Salvador e, desde cedo, desenhava roupas e costurava para as amigas. Depois se mudou para o Rio, onde a sua criatividade explodiu em peças que usavam, pela primeira vez, as cores e materiais brasileiros, com estampas de papagaios e borboletas. Foi Zuzu quem descobriu o tal “jeitinho da mulher brasileira”. Exportou a sua moda nos anos 60, conquistando clientes como Kim Novak, Lisa Minelli, Joan Crawford e outras estrelas de Hollywood.
Mas Zuzu também costumava dizer: “Quero criar para a mulher comum, a que trabalha e cuida dos filhos, e não apenas para as que copiam figurinos vindos da Europa”. Foi a primeira estilista a juntar moda e democracia. Queria ver suas estampas coloridas nas calçadas, queria ver a renda de bilro - tão brasileira - nos desfiles.
Essa era a Zuzu que surpreendeu muitas passarelas internacionais com as suas “novidades do Brasil” e que, ironicamente, foi surpreendida pela tragédia que vivíamos no Brasil daquela época. E foi a esse mundo da moda internacional, que ela já havia conquistado com a sua criatividade, que Zuzu recorreu para denunciar o que ocorria no País. Ela desfez a imagem do “milagre do país tropical”, que os militares se esforçavam para manter.
Suas criações mudaram. As cores alegres foram substituídas pelo preto e pelo cinza, “enfeitadas” com correntes, crucifixos e anjos, simbolizando o martírio que viveu “seu anjo”, seu filho Tuti, como ela o chamava. Como os filhos de D. Felícia de Oliveira, D. Julieta Petit, D. Helena Pires, D. Ana Silva, D. Encarnação Crispim, D. Isabel Gomes da Silva e centenas de outras mães que, como ela, levavam sua dor aonde fossem.
Foi assim que, em 1972, no auge da ditadura, Zuzu fez um desfile em Nova York, chamou a imprensa internacional, que já a conhecia. As modelos usavam quepes e botas pesadas, em roupas cor verde-oliva, cinza e preto. Pregavam crucifixos e anjos como adornos. As estampas mostravam passarinhos brasileiros engaiolados. Falou aos jornalistas por que havia mudado de estilo. Contou o que significava aquele desfile, que ela conseguiu realizar nas dependências do consulado brasileiro graças à sua astúcia. É que, caso falasse mal do Governo militar brasileiro em território estrangeiro, não poderia voltar ao País sem ser presa. Ela teve mais coragem: falou em território brasileiro, colocado em terra estrangeira.
Zuzu passou a ser perseguida, e, em 14 de 1976, seu carro foi abalroado e jogado num precipício ao sair do túnel Dois Irmãos, no Rio de Janeiro. Hoje o túnel leva o seu nome.
V. Exª, que é morador do Rio de Janeiro, Senador Roberto Saturnino Braga, deve compreender ainda mais que eu próprio os efeitos desses fatos para os cariocas e para os brasileiros.
Pela vida de Zuzu, entendemos por que, há mais de 20 anos, mulheres com lenços brancos na cabeça percorrem todas as quintas-feiras a Praça de Maio, em Buenos Aires, querendo saber dos seus filhos e netos. Ganharam o Prêmio Nobel, e não há no mundo quem possa contestá-las. Já foram chamadas de loucas; hoje, são heroínas. Como Zuzu, que pensava na beleza da mulher brasileira e, com seu destino, acabou representando a sua parte mais bonita, a força interior de quem foi, mais do que tudo, mãe.
Como a morte também é renascimento, quero registrar que, há 30 anos, nasceu um anjo que nos protege. É ele que deve ter conduzido o cineasta Sérgio Rezende a fazer o filme, rodado em setembro do ano passado, que leva o seu nome. Zuzu é o anjo da história do Brasil.
Quero aqui também homenagear o Grupo Tortura Nunca Mais, a Rose Nogueira, presidente do Grupo, que me ajudou nessa reflexão, por sua contínua batalha para que nunca, por razão alguma - de natureza política, de qualquer outra natureza -, haja a prática da tortura no Brasil.
Sr. Presidente, ao concluir, gostaria de transmitir um apelo ao Diretor-Presidente da Anvisa, Dirceu Raposo de Mello, para que receba em audiência o presidente do Sindicato dos Vigias Portuários de Santos, Jorge Ferreira, uma vez que há cerca de 32 navios ali em Santos, bem como outros navios em outros portos, que estão com dificuldades para se movimentar em função de greve. Esses trabalhadores gostariam de ter a oportunidade de dialogar com o Presidente da Anvisa, Agência Nacional de Vigilância Sanitária, para chegarem a um entendimento.
Avalio como importante também o esforço que o Ministro Waldir Pires está realizando para conversar com o Ministro do Trabalho, Luiz Marinho, e com todos aqueles que contribuem pelo seu trabalho para a Varig. Espero que possa se encontrar uma solução viável que signifique o respeito, a condução séria dos recursos públicos pelo Governo do Presidente Lula, mas que também signifique um atendimento aos anseios de toda a comunidade da Varig, sem que se promova o emprego de recursos públicos em uma empresa que, em alguns momentos, não foi tão bem administrada, mas em função de tudo aquilo que a Varig representa.
Muito obrigado.
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