Discurso durante a 41ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Protesto contra a violência no Estado do Rio de Janeiro, solidarizando-se com o Senador Gilberto Mestrinho, agredido durante assalto a sua residência naquele Estado, no último domingo.

Autor
Jefferson Peres (PDT - Partido Democrático Trabalhista/AM)
Nome completo: José Jefferson Carpinteiro Peres
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SEGURANÇA PUBLICA.:
  • Protesto contra a violência no Estado do Rio de Janeiro, solidarizando-se com o Senador Gilberto Mestrinho, agredido durante assalto a sua residência naquele Estado, no último domingo.
Aparteantes
Marcelo Crivella, Ramez Tebet, Romeu Tuma.
Publicação
Publicação no DSF de 19/04/2006 - Página 12165
Assunto
Outros > SEGURANÇA PUBLICA.
Indexação
  • SOLIDARIEDADE, SENADOR, VITIMA, ASSALTO, LEITURA, TRECHO, SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, ARTIGO DE IMPRENSA, AUTORIA, ORADOR, PUBLICAÇÃO, JORNAL, O GLOBO, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, CAPITAL DE ESTADO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), VIOLENCIA, CRIME ORGANIZADO, RETIRADA, CONTROLE, PODER PUBLICO, SUPERIORIDADE, NUMERO, ABANDONO, POPULAÇÃO, AUSENCIA, HABITAÇÃO, CONCLAMAÇÃO, PROVIDENCIA, RECUPERAÇÃO, CIDADE.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


O SR. JEFFERSON PÉRES (PDT - AM. Para uma comunicação inadiável. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, como todos sabem, nosso companheiro de Senado, Senador Gilberto Mestrinho, foi vítima, no domingo, de uma violência inominável em sua residência no Rio de Janeiro. Mas não é pelo fato de S. Exª ser Senador que estou na tribuna. O Senador Gilberto Mestrinho tem toda a minha solidariedade como ser humano. Contudo, o problema que me preocupa é que S. Exª é uma das milhares de vítimas da violência que se abateu sobre o Rio de Janeiro. E não é a agressão sofrida por um Senador que me leva à preocupação com o que ocorre naquela cidade, Sr. Presidente.

Exatamente há onze dias, no dia sete de abril, Senador Alvaro Dias, publiquei em O Globo um artigo sobre a situação daquela cidade, que passo a ler e cuja transcrição nos Anais solicito. Pego o gancho da violência sofrida pelo Senador Gilberto Mestrinho para fazer este registro, um grito de protesto contra o que ali acontece.

À semelhança de milhões de outros brasileiros, sinto um misto de dor e raiva impotente com a trágica situação que vive a bela e mui amada cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro.

Sentimentos que se aliam ao espanto de quem não consegue entender por que essa imensa tragédia não provocou ainda a mobilização de toda a sociedade carioca, se não mesmo uma cruzada nacional, sob a liderança do governo federal.

Sim, porque não ocorrem ali mazelas comuns a outras grandes cidades do mundo. As chagas do Rio não encontram similitude com as de nenhum centro urbano de países com o mesmo nível de desenvolvimento do Brasil, menos ainda com os de nível mais elevado.

Falo das duas manifestações mais graves e mais visíveis de patologia social. Uma, a criminalidade violenta e desafiadora; outra, a ocupação desordenada dos espaços públicos.

Claro que em todas as cidades ocorrem assaltos à mão armada. Mas em nenhuma os criminosos dominam comunidades, interditam ruas, decretam o fechamento do comércio e travam batalhas campais durante horas e às vezes dias.

Certo que em todas as cidades se encontram pessoas isoladas, geralmente toxicômanos, doentes mentais e desajustados a pedir esmolas nas ruas. Mas em poucas são vistas centenas, senão milhares de sem-teto, aos montes, a fazer de dormitório as vias públicas. Como já disse alguém, “a rua no Rio é um sistema de punição coletiva, onde cada qual joga dejetos ou escarra, tropeça em pedras soltas ou em seres humanos”.

A situação atual do Rio de Janeiro, para mim, é um espelho a refletir a dupla imagem da falência do Estado brasileiro e, de certa forma, do nosso fracasso como nação.

Como é possível conviver com isso e suportar isso? Como é possível um país desperdiçar um patrimônio natural e cultural desse porte, deixando se degradar aquela que é - sem ufanismo - a mais bela cidade do mundo?

A desordem urbana do Rio é tão grave que deveria ser enfrentada, em primeiro lugar, pela sociedade carioca, num mutirão cívico, com autoridades, empresários, intelectuais e meios de comunicação na liderança do processo.

Mas, de tão dramática, deveria ser também uma questão nacional, assim encarada pelo Governo Federal. De preferência, em articulação com os governos estadual e municipal. Se necessário, como medida heróica, para restabelecer ali o império da lei, com a decretação de uma intervenção federal, rigorosamente dentro dos limites constitucionais.

Num caso ou no outro, seria desencadeada uma vasta Operação Rio de Janeiro, destinada ao resgate da cidade, com a duração de anos, a ser feita com planejamento e mediante a mobilização de um grande volume de recursos financeiros, humanos e institucionais, aplicados nas áreas de reurbanização, habitação popular, educação, saúde e segurança. E a terminar quando o Rio voltasse a ser uma cidade normal, vale dizer, um espaço urbano de convivência minimamente civilizada.

Trata-se de uma questão nacional, sim, seja pela gravidade do problema, seja pelo bem que faria a todo o País a sua solução. A ressurreição do Rio de Janeiro seria um refrigério para a alma brasileira, que sangra com a cidade. Sua reconstrução, social e urbanística, teria para o Brasil o mesmo efeito que teve a construção de Brasília na era jusceliniana.

Lamento muito, como Senador por outro Estado, não ter legitimidade, nem influência, nem poder para tentar reverter a lenta agonia daquela cidade tão amada.

O Sr. Marcelo Crivella (PRB - RJ) - Senador Roberto Jefferson...

O SR. JEFFERSON PÉRES (PDT - AM) - Senador Roberto Jefferson? Agora, V. Exª me insultou.

O Sr. Marcelo Crivella (PRB - RJ) - Perdão, Senador. É que o seu depoimento me comoveu tanto que eu até acabei me confundindo.

O SR. JEFFERSON PERES (PDT - AM) - Já concluo e vou ouvi-lo, Senador.

O Sr. Marcelo Crivella (PRB - RJ) - Pois não.

O SR. JEFFERSON PERES (PDT - AM) - Mas fica aqui o meu protesto, ao não ver, da parte dos seus filhos ilustres, uma reação proporcional à enormidade da crise.

A tragédia do Rio de Janeiro me afeta profundamente. Como cidadão brasileiro e carioca honorário, eu me sinto inconformado. E também humilhado.

Ouço-o com prazer, Senador Marcelo Crivella. Peço desculpas.

O Sr. Marcelo Crivella (PRB - RJ) - Sou em quem pede desculpas a V. Exª. O Rio de Janeiro teve, em 2005, 117 mil furtos com uso de armas; assaltos, 111 mil; lesões corporais dolosas, brigas com uso de facas e até de garrafas, naquelas comunidades carentes, bêbados dirigindo e atropelando pessoas e balas perdidas foram 79 mil ocorrências. Nós tivemos 6 mil homicídios porque não consideramos como homicídios os 10,5 mil corpos encontrados ao relento que são dados como morte natural de população de rua; 1,5 mil mulheres estupradas e 4,5 mil ônibus assaltados. A situação no Rio de Janeiro é uma calamidade! Tenho, como Senador - e V. Exª foi Relator de um projeto de minha autoria, aprovado aqui em plenário e que seguiu para a Câmara dos Deputados -, a idéia de convocarmos a reserva, os aposentados da Polícia Militar e dos Bombeiros para nos ajudarem num mutirão para conter a violência. A violência nasce do relacionamento político e irradia-se dali para baixo. A Força Nacional de Segurança, com um efetivo de 5 mil homens, não foi treinada no Rio de Janeiro, mas na Paraíba, porque o Governo do Rio achou que não precisava. A Paraíba recebeu quartel, equipamentos, munição, 5 mil homens que receberam...

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O Sr. Marcelo Crivella (PRB - RJ) - Já concluo, Sr. Presidente.

Receberam salários durante um ano. Nós, por questões políticas, não conseguimos enxergar a necessidade do nosso Estado. E essa força foi treinada, deixando como patrimônio para o Estado da Paraíba um quartel, armas, equipamentos, munição e o fluxo dos próprios salários que lá foram pagos. E o Governo da Paraíba é do PSDB, um governo de oposição ao Presidente da República. Dessa maneira, alio-me a V. Exª nesse clamor pelo Rio, pela cidade onde nasci e a qual amo. Penso que o Rio de Janeiro, com tudo isso, é também um exemplo, porque, nos momentos de maior agrura e agonia, segundo pesquisas, continuamos a ser, no Brasil, o povo mais simpático, mais cordato, mais solidário. O Rio precisa de ajuda. V. Exª fez um belíssimo pronunciamento. Mas tenha a certeza de que todos nós, Senadores do Rio, estamos aqui com o mesmo coração de V. Exª: indignados! É preciso fazer alguma coisa. Outro projeto que eu gostaria de lembrar aqui, já aprovado nesta Casa e que nos ajudaria muito se fosse implementado pelo Presidente da República, diz respeito a colocar o Exército, a Marinha e a Aeronáutica com poder de polícia nas fronteiras. Sou autor dessa emenda ao projeto do Senador César Borges, aprovado aqui. E hoje podemos cobrar do Exército, da Marinha e da Aeronáutica que tenham poder de Polícia Federal nas fronteiras, sobretudo com o Peru, Colômbia e Bolívia, de onde vêm toda a cocaína para o meu Estado. Crianças foram viciadas; adultos foram viciados. E a Polícia Federal, com doze mil homens, não pode guardar as nossas fronteiras. Nem temos na Marinha brasileira uma guarda costeira. Associo-me a V. Exª nesse clamor. Lamento profundamente o que aconteceu com o Senador Mestrinho - e graças a Deus que guardou a sua vida -, mas, infelizmente, esse é mais um caso nessa tragédia que é o Rio de Janeiro. Muito obrigado.

O SR. JEFFERSON PÉRES (PDT - AM) - Muito obrigado, Senador Crivella. Espero que V. Exª, irmanado a outras lideranças do Rio de Janeiro, comande essa cruzada cívica em favor da cidade.

O Sr. Romeu Tuma (PFL - SP) - V. Exª me permite um aparte?

O SR. JEFFERSON PÉRES (PDT - AM) - Ouço o Senador Ramez Tebet e, em seguida, o Senador Romeu Tuma, com muito prazer.

O SR. PRESIDENTE (Alvaro Dias. PSDB - PR) - Peço aos Srs Senadores a gentileza de abreviarem os apartes em respeito aos demais inscritos.

O SR. JEFFERSON PÉRES (PDT - AM) - Desculpe, Sr. Presidente. Já ultrapassei o meu tempo?

O SR. PRESIDENTE (Alvaro Dias. PSDB - PR) - Sim, bastante.

O Sr. Ramez Tebet (PMDB - MS) - Sr. Presidente, desculpe-me, mas um pronunciamento como esse não tem prazo. Eu acho até que V. Exª, Senador Jefferson Peres, teve um poder de síntese extraordinário e quero aplaudi-lo pelo pronunciamento, mas peço que V. Exª me permita fazer um reparo. V. Exª tem espírito democrático para aceitar o que vou dizer. V. Exª disse que não tem legitimidade para falar sobre o Rio de Janeiro, embora seja cidadão honorário da ex-capital da República. Eu discordo disso, pois penso que V. Exª tem legitimidade para falar por qualquer Estado da Federação brasileira. A sua atuação no Senado da República já o credenciou não só no seu Estado, mas perante toda a Nação, perante a Federação brasileira. Quero dizer a V. Exª que, quanto a essa mobilização, pedida em boa hora, é preciso haver qualquer coisa, porque a mim me parece que acabou a indignação no Brasil. Essa é a impressão que eu tenho, Senador Jefferson Péres.

O SR. JEFFERSON PÉRES (PDT - AM) - E isso é que é o trágico, Senador Ramez Tebet.

O Sr. Ramez Tebet (PMDB - MS) - Não vejo a palavra de uma autoridade neste País. A casa de um Senador da República é invadida por quinze homens encapuzados... Há palavras dos seus colegas do Senado da República, mas cadê a palavra do Governo? Não é só por se tratar de um Senador; também as pessoas humildes estão tombadas no Rio de Janeiro, como estão tombando no Brasil inteiro. Quando não tombam pela violência, tombam pela fome avassaladora que está ocorrendo e tombam pela desordem que está ocorrendo no Brasil. Se lá no Rio de Janeiro a violência é produto do tráfico, é produto do contrabando, é produto do crime propriamente dito, junto com alguns problemas, junto com problemas sociais, no Brasil, setores produtivos não agüentam mais trabalhar. Invade-se e não acontece nada! As beiras das estradas estão sendo ocupadas e ninguém reage! Daqui a pouco não haverá acostamento nas BRs das vias públicas do Brasil. Srs. Senadores, isso é de uma gravidade que não tem tamanho, porque demonstra falta de autoridade, demonstra desgoverno. E num país desgovernado não adianta o Senado e a Câmara promulgarem leis se elas não são cumpridas, se as autoridades que têm responsabilidade pelo seu cumprimento ignoram essas leis e ficam discutindo outras mazelas que existem por aí. Então, Sr. Senador Jefferson Péres, tenho impressão que V. Exª, ao falar do Rio de Janeiro, quis ir mais longe. É que os últimos acontecimentos no Rio de Janeiro chocaram bastante, e V. Exª, como um grande amazonense, é solidário com o Senador Gilberto Mestrinho, assim como eu. Eu estava em São Paulo, Senador Gilberto Mestrinho, de onde telefonei para V. Exª, e não tive oportunidade de me manifestar antes. Mas de que vale a palavra de um colega seu? É apenas um abraço de quem agradece a Deus por não ter acontecido nada com V. Exª e sua família. Senador Jefferson Péres, meus cumprimentos.

O SR. JEFFERSON PÉRES (PDT - AM) - Obrigado, Senador Ramez Tebet. Comove-me muito o aparte de V. Exª, um daqueles poucos que ainda não perderam a capacidade de indignação. Podem 180 milhões de brasileiros perder essa capacidade, Senador Ramez Tebet, mas eu serei o último brasileiro a deixar de me indignar, assim como a Senadora Heloísa Helena, com o que está acontecendo no Rio de Janeiro, que é um espelho, uma amostra do que acontece em todo o País.

Se eu merecer a generosidade do Presidente, ainda ouviria o Senador Romeu Tuma.

O Sr. Romeu Tuma (PFL - SP) - Senador Jefferson Péres, eu não deveria aparteá-lo, mas apenas reconhecer que as palavras de V. Exª representam a realidade do momento nacional, que não começou agora, mas que vem de uma evolução negativa há algum tempo. V. Exª diz que não teria condições de falar pelo Rio de Janeiro, mas já se cogitou do nome de V. Exª para candidato a Presidente da República, podendo, portanto, falar de qualquer Estado e de qualquer assunto, pois saberá, como sempre soube, durante todo o seu mandato, discutir qualquer problema que surja no País, com o mesmo esforço e indignação quando for negativo e com apoio quando for positivo. O Senador Marcelo Crivella falou sobre a criação de uma força nacional, com o que não concordo, e por isso peço desculpa a S. Exª. Sou contrário porque teriam os Governadores de receber meios para preparar forças especiais para combater o crime local, porque, se eu treino, em Brasília, mil homens de todos os Estados brasileiros para agir em outro local, quando eles chegarem lá, não vão saber nem o endereço para onde ir. Falta confiança dos Governadores, que deveriam receber os meios para, dentro da sua polícia, selecionar aqueles que teriam competência e realmente formar uma força local, pois é isso que falta no Rio de Janeiro, em São Paulo, em vários Estados. Tenho muito respeito pelo Governador Geraldo Alckmin, que trabalhou muito para tentar montar uma polícia que fosse combativa ao crime organizado, porque a criminalidade hoje está organizada, Senador. Desculpe-me extrapolar seu tempo outra vez, mas tornarei a falar do assunto depois. Quero parabenizá-lo e dizer que temos de nos somar e discutir mais a segurança pública, como pediu o Presidente Fernando Henrique Cardoso, em sua última entrevista, concedida a Míriam Leitão, pois chegou a hora de se discutir também a segurança pública como meta de governo.

O SR. JEFFERSON PÉRES (PDT - AM) - Senador Romeu Tuma, Senador Marcelo Crivella, recente pesquisa revelou que 51% dos moradores do Rio de Janeiro querem deixar aquela cidade. Não é possível, repito, que mais da metade dos moradores da mais bela cidade do mundo queiram deixá-la, Sr. Presidente, para estrangeiros, se for possível.

Senador Gilberto Mestrinho, eu o abraço e me solidarizo com V. Exª pela violência que sofreu, mas na pessoa de V. Exª abraço toda a população abandonada do Rio de Janeiro.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/04/2006 - Página 12165