Discurso durante a 46ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Justificativas ao Requerimento 462, de 2006, de autoria de S.Exa., que solicita voto de repúdio pela decisão do Tribunal Penal Central do Iraque, que condenou à pena de morte o responsável pelo atentado que ocasionou a morte de Sérgio Vieira de Mello.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA EXTERNA. DIREITOS HUMANOS.:
  • Justificativas ao Requerimento 462, de 2006, de autoria de S.Exa., que solicita voto de repúdio pela decisão do Tribunal Penal Central do Iraque, que condenou à pena de morte o responsável pelo atentado que ocasionou a morte de Sérgio Vieira de Mello.
Aparteantes
Mão Santa.
Publicação
Publicação no DSF de 27/04/2006 - Página 13524
Assunto
Outros > POLITICA EXTERNA. DIREITOS HUMANOS.
Indexação
  • JUSTIFICAÇÃO, REQUERIMENTO, AUTORIA, ORADOR, SOLICITAÇÃO, VOTO, REPUDIO, DECISÃO, TRIBUNAIS, AÇÃO PENAL, PAIS ESTRANGEIRO, IRAQUE, CONDENAÇÃO, PENA DE MORTE, RESPONSAVEL, ATENTADO, MORTE, SERGIO VIEIRA DE MELLO, DIPLOMATA, CHEFE, MISSÃO OFICIAL, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU), DEFESA, PAZ, DIREITOS HUMANOS.
  • SOLICITAÇÃO, EMPENHO, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU), AUTORIDADE, PAIS ESTRANGEIRO, IRAQUE, OBTENÇÃO, INFORMAÇÕES, SITUAÇÃO, ENGENHEIRO, NACIONALIDADE BRASILEIRA, VITIMA, SEQUESTRO.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Romeu Tuma, Srs. Senadores, dei entrada em um requerimento, nos termos dos arts. 222 e 223 do Regimento do Senado Federal, para que seja consignado um voto de repúdio pela decisão do Tribunal Penal Central do Iraque, que condenou com a pena de morte o responsável pelo atentado de 19 de agosto de 2003, que ocasionou a morte do brasileiro Sérgio Vieira de Mello, Alto Comissário para Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas no Iraque, e outras 21 pessoas, e um apelo no sentido de que a punição do responsável seja de outra natureza, uma vez que o então Coordenador das Ações da ONU no Iraque era contrário à pena de morte, aboliu a mesma quando foi Administrador Transitório no Timor Leste e que a Constituição Brasileira também a veda.

O Tribunal Penal Central do Iraque condenou à morte a pessoa que foi considerada responsável pelo atentado em 19 de agosto de 2003 em que foram mortos o Alto Comissário para Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas, o brasileiro Sérgio Vieira de Mello, e mais vinte e uma pessoas, quinze delas funcionárias da ONU. Outras duzentas ficaram feridas e mutiladas. Segundo informou Gianni Magazzeni, chefe do escritório de Direitos Humanos da ONU em Bagdá, em 21 de abril de 2006, o cidadão iraquiano condenado à morte, que supostamente seria membro da rede al-Qaeda vindo de Mossul, está apelando da sentença do Tribunal Criminal Iraquiano. Aparentemente, diz Magazzeni, o homem confessou ter participado do atentado.

Carolina Larriera, companheira de Sérgio Vieira de Mello, escreveu-me contando que as investigações feitas pela própria ONU e pelo FBI americano não foram consideradas conclusivas. Só agora se sabe, pela notícia de apelação, de investigações e de processo num tribunal iraquiano. Carolina comentou, com razão, que sequer o nome do condenado foi divulgado.

Considero da maior importância que, em homenagem a Sérgio Vieira de Mello e aos propósitos maiores da democracia, justiça, respeito aos direitos humanos e promoção da paz, aos quais dedicou sua vida, que a ONU e o Iraque reflitam sobre qual será o melhor procedimento. É necessário lembrar que Sérgio Vieira de Mello era contrário à pena de morte em quaisquer circunstâncias. Como escreveu a mim a Srª Carolina Larriera:

Sérgio defendia o direito à justiça, mas não apoiava atos de vingança. Como prova disso, eliminou a pena de morte na primeira lei passada no Timor Leste. Para os acusados pelo crime que o fez vítima, a justiça, não a morte, é a resposta. O Tribunal Criminal Central Iraquiano é uma corte nacional. Para que a justiça seja feita, é necessária uma abordagem coerente e sólida.

Quero aqui lembrar que, quando Sérgio Vieira de Mello foi designado Administrador transitório do Timor Leste, revogou diversas leis que eram produto de o Timor Leste ser colônia da Indonésia, e principalmente aboliu a pena que instituía a pena de morte.

Infelizmente, na questão do Iraque, temos assistido a ações contínuas de violência que levam à morte um número tão grande de pessoas, sem que surjam consciências que alertem e apontem para outra forma de se resolverem os problemas que não seja por meio da ação bélica.

É importante lembrar daquilo que Sérgio Vieira de Mello propunha para o Iraque: um caminho para aplicação de fato de princípios de justiça, que precisariam ser melhor conhecidos até por aqueles que organizaram o atentado que o vitimou. Em abril de 2003, ele me escreveu, informando que considerava boa a proposta que eu havia lhe sugerido, de que o Iraque pudesse seguir o exemplo do Alasca de constituir um fundo proveniente dos royalties decorrentes da exploração de petróleo. Isso permitiria o pagamento de um dividendo ou de uma renda básica a todos os seus habitantes, transformando o Alasca no mais igualitário dos estados norte-americanos. Ele afirmou que faria a sugestão às autoridades administrativas do Iraque.

Em 23 de junho daquele ano, em Amã, durante a Cúpula de Reconciliação Mundial, o Embaixador Paul Bremmer III, então Administrador do Iraque, afirmou que havia sugerido aos iraquianos que seguissem o mesmo caminho, para que todos os seus cidadãos pudessem participar da riqueza do país. Em 1º de agosto, Sérgio Vieira de Mello me telefonou dizendo que a proposta estava sendo bem aceita, e que a missão do Banco Mundial a considerava viável. Infelizmente ele foi morto no dia 19. Desde então não consegui obter melhores notícias do Iraque que não sejam as de atentados quase diários, de mortes levando a outras mortes.

Tenho a convicção de que Sérgio Vieira de Mello preferiria que seus algozes pudessem compreender que há outros caminhos possíveis para se assegurar maior justiça social aos iraquianos, sejam os xiitas, os sunitas, os curdos e todos os demais. Que justamente o Iraque, por possuir uma riqueza natural como o petróleo pode perfeitamente seguir o exemplo tão bem-sucedido do Alaska.

Há notícias de proposições nessa direção na Assembléia Nacional Iraquiana. Será muito bom que a recomendação de Sérgio Vieira de Mello venha a ser considerada junto com a comutação da pena de morte ao condenado que não conhecemos.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador Eduardo Suplicy...

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Senador Mão Santa, já estou concluindo e, com muita honra, concederei um aparte a V. Exª.

Concordo com Carolina Larriera quando ressalta, relembrando como foi tratado o caso do atentado que ceifou a vida do ex-primeiro ministro do Líbano Rafik Hariri e de dezenove outras pessoas, em que foi constituído um tribunal internacional: “Apenas um tribunal internacional pode orquestrar de forma correta e eficiente as três iniciativas de investigação e garantir que a justiça seja feita. O caso de Sérgio, um campeão de Direitos Humanos, não merece menos”.

Ainda há pouco, a Srª Carolina Larriera me informou que a própria mãe de Sérgio Vieira de Mello, a Srª Gilda Vieira de Mello, está inteiramente de acordo com a proposição que aqui faço.

Aproveito a oportunidade para solicitar o empenho das Nações Unidas e das autoridades iraquianas para obter notícias sobre o paradeiro do engenheiro brasileiro João José Vasconcelos Júnior, seqüestrado no Iraque no dia 19 de janeiro do ano passado - um outro caso penoso à espera de revelação de melhores informações e de justiça.

De outra forma, continuaremos a cantar com o poeta Bob Dylan: “Quantas mortes precisarão acontecer até que finalmente se perceba que muitas pessoas já morreram?”

Gostaria de informar, Senador Mão Santa, que esse requerimento - até por sugestão do Senador Roberto Saturnino - foi apresentado para que seja apreciado primeiramente pela Comissão de Relações Exteriores, o que acontecerá amanhã pela manhã, e depois pelo Plenário do Senado, para que possamos, se aqui aprovado, como espero, encaminhar um ofício com esse conteúdo, podendo haver contribuições outras, para o Secretário-Geral da ONU, Kofi Annan, e para o Primeiro Ministro do Iraque, recém-eleito e empossado pelo Parlamento iraquiano.

Concedo um aparte, com muita honra, ao Senador Mão Santa.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador Eduardo Suplicy, estou a favor de todas as ações de V. Exª no que diz respeito a Sérgio Vieira de Mello, mas, em relação ao outro assunto, sou contra. V. Exª fala com entusiasmo da renda mínima, do bolsa-família, o que eu entendo que contraria as leis de Deus. Deus disse: “Comerás o pão com o suor do seu rosto”. É uma mensagem, Senador Eduardo Suplicy, para os governantes propiciarem trabalho. Embora eu tenha muito apreço por V. Exª, eu sou muito mais o Apóstolo Paulo, que disse: “Quem não trabalha não merece ganhar para comer”. Mas, atentai bem - e vamos ficar com os homens de hoje: foi considerado o melhor Prefeito do mundo Rudolf Giuliani, por oito anos Prefeito de Nova Iorque. Atentai bem! V. Exª sabe por que o mundo o consagrou o melhor Prefeito? Os Estados Unidos já tinham essa lei de segurança ao desemprego, o seguro-desemprego. Então, ele dedicou-se a encaminhar ao trabalho todos esses que recebiam esses seguros, para trabalhar na prefeitura, ser zelador, varrer rua, ser vigia de praça. Então, ele reduziu em 60% o número dos que recebiam sem trabalhar. E o mundo o reconhece hoje como o melhor Prefeito. Então, só pediria a V. Exª que lesse a biografia desse que é tido como o melhor Prefeito do mundo contemporâneo: Rudolph Giuliani.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Prezado Senador Mão Santa, aceito a sugestão de V. Exª de ler o livro sobre Rudolph Giuliani; porém, faço questão de dar a V. Exª dois livros de minha autoria: Renda de Cidadania: A saída pela porta e Renda Básica de Cidadania: a resposta dada pelo vento.

Tenho a convicção de que, uma vez lendo todos os fundamentos, a origem, os prós e contras da renda básica de cidadania - já aprovada pelo Congresso Nacional e sancionada pelo Presidente Lula - estará V. Exª conscientizado de que, para o objetivo de se garantir emprego a todas as pessoas, como é o desejo de V. Exª, a renda básica de cidadania é um instrumento consciente...

O SR. MÃO SANTA (PMDB - PI) - (Intervenção fora do microfone.) V. Exª precisa ler o livro...

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Se V. Exª me interromper sem ouvir, deixará de aprender e perderá a oportunidade de podermos avançar no debate, porque, cada vez que V. Exª interrompe com esse argumento, sem antes estudar aqueles que eu apresento, V. Exª como que coloca uma barreira no conhecimento que eu desejo transmitir. E eu tenho a convicção de que, uma vez V. Exª tendo dado a oportunidade de lhe transmitir por que a economia brasileira, quando tiver instituído a renda básica de cidadania, estará garantindo muito mais emprego a todo e qualquer brasileiro, como é o desejo de V. Exª, nós estaremos promovendo uma maior justiça, solidariedade e também atendendo àquilo que o próprio Jesus falou na parábola sobre o senhor da vinha ou o que São Paulo disse na segunda epístola aos Coríntios: “Para que haja justiça, para que haja igualdade, todo aquele que teve uma safra abundante não tenha demais, todo aquele que teve uma safra pequena não tenha de menos”.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/04/2006 - Página 13524