Discurso durante a 59ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Registro das celebrações alusivas ao Tratado de Roma, que deram origem à União Européia.

Autor
Marco Maciel (PFL - Partido da Frente Liberal/PE)
Nome completo: Marco Antônio de Oliveira Maciel
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA INTERNACIONAL. POLITICA EXTERNA.:
  • Registro das celebrações alusivas ao Tratado de Roma, que deram origem à União Européia.
Aparteantes
Arthur Virgílio, José Agripino, Roberto Saturnino, Sibá Machado.
Publicação
Publicação no DSF de 17/05/2006 - Página 16810
Assunto
Outros > POLITICA INTERNACIONAL. POLITICA EXTERNA.
Indexação
  • COMEMORAÇÃO, ANIVERSARIO DE FUNDAÇÃO, UNIÃO EUROPEIA, REGISTRO, HISTORIA, CONTINENTE, EUROPA, TENTATIVA, ENCERRAMENTO, CONFLITO, POSTERIORIDADE, SEGUNDA GUERRA MUNDIAL, UNIFICAÇÃO, MOEDA, MELHORIA, QUALIDADE DE VIDA, POPULAÇÃO.
  • ANALISE, CRISE, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL), CANCELAMENTO, REUNIÃO, UNIÃO EUROPEIA, MOTIVO, IMPOSSIBILIDADE, ENTENDIMENTO, GOVERNO, ESTADOS MEMBROS, NECESSIDADE, INICIATIVA, GOVERNO BRASILEIRO, CONSOLIDAÇÃO, INTEGRAÇÃO, AMERICA DO SUL.
  • SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, NOTICIARIO, HOMENAGEM, ANIVERSARIO DE FUNDAÇÃO, ESCRITORIO, PAIS ESTRANGEIRO, PAISES BAIXOS, CAPITAL DE ESTADO, ESTADO DE PERNAMBUCO (PE), POSSIBILIDADE, AMPLIAÇÃO, INTERCAMBIO, CULTURA, EMPRESA.

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DISCURSO PROFERIDO PELO SR. SENADOR MARCO MACIEL NA SESSÃO DO DIA 15 DE MAIO DE 2006, QUE, RETIRADO PARA REVISÃO PELO ORADOR, ORA SE PUBLICA.

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O SR. MARCO MACIEL (PFL - PE. Pronuncia o seguinte discurso. Com revisão do orador.) - Nobre Senador e Presidente desta sessão Gilvam Borges, Srªs e Srs. Senadores, a Europa iniciou, dia nove deste mês, as celebrações alusivas ao cinqüentenário do Tratado de Roma, que deu origem à chamada Comunidade Econômica Européia, hoje União Européia.

Após muitos projetos - exitosos alguns, malogrados outros -, a primeira tentativa de construção da União Européia sucedeu em 1944, nos fins da Segunda Grande Guerra Mundial, com a criação do Benelux, acordo aduaneiro entre Bélgica, Holanda e Luxemburgo.

O Continente Europeu - recordar é necessário - vinha de um doloroso passado, de longos e multisseculares conflitos, internos e externos. Seus povos anelavam com a paz e abrigavam a esperança da unificação de políticas sociais e econômicas.

Em 1949, foi criado um órgão de cooperação política: o Conselho da Europa. No ano seguinte, os estadistas franceses Robert Schuman e Jean Monnet, desvendando o futuro, apresentaram plano que gerou, em 1951, o Tratado de Paris, destinado a instituir a Comunidade Européia do Carvão e do Aço, agregando, além do Benelux, a que já me referi, França, Alemanha e Itália, a chamada Europa dos Seis.

A fusão do carvão francês e da hulha alemã ensejava a construção de siderurgia franco-alemã, superando velhos conflitos que marcaram a relação entre os dois países pelo controle de matérias-primas básicas para a produção do aço. Aliás, o nove de maio passou a ser chamado Dia da Europa por ser a data do discurso do então Primeiro-Ministro Robert Schuman sugerindo a proposta da citada associação.

O Plano Schuman consistia no estabelecimento de uma Alta Autoridade, tendo um Conselho de Ministros, o que equivale ao Poder Executivo; um Parlamento, Poder Legislativo; e um Tribunal, Poder Judiciário, com competências transnacionais específicas.

O Reino Unido da Grã-Bretanha, por sua vez, constituiu, em 1959, associação de livre comércio com Áustria, Dinamarca, Suécia, Noruega, Suíça e Portugal, em que depois se incorporaram Finlândia, Islândia e Liechtenstein.

Sem querer me alongar em considerações históricas, Sr. Presidente, em 1957, com o já citado Tratado de Roma, a Comunidade Européia do Carvão e do Aço desenvolveu expressivo esforço integrador e estabeleceu denominar-se Comunidade Econômica Européia.

Os seus próceres fundadores, ao lado dos já citados Robert Schuman e Jean Monnet, o alemão Konrad Adenauer e o italiano Alcide De Gasperi, eram todos - anote-se - pertencentes a partidos democratas cristãos, sob inspiração do pensador Jacques Maritain, talvez o maior sistematizador filosófico da conciliação e convergência de cristianismo e democracia.

Aliás, é de Jean Monnet esta frase que bem define o ideal integrador da Europa: “Ou a Europa se unifica, ou a Europa não é a Europa”. Monnet, ao final, estava certo, tendo em vista que o processo integrador europeu prosseguiu com a entrada, em 1973, da Inglaterra na então ainda chamada Comunidade Econômica Européia.

Em 1986, expande-se a agora intitulada União Européia com o ingresso dos ibéricos Portugal e Espanha e aprofunda a sua caminhada com o Tratado de Maastricht, assinado na Holanda, em 1991.

A seguir, são subscritos os Acordos de Schengen, admitindo a livre circulação dos cidadãos da União por todos os seus países membros e instituíram uma moeda - o Euro - e um Banco Central únicos.

Enquanto isso, fortaleciam-se em atribuições o Executivo, em Bruxelas; o Legislativo, em Estrasburgo; e o Judiciário, em Luxemburgo.

Nos albores deste século, a União Européia compreende 25 países, inclusive nações da antiga União das Repúblicas Socialistas Soviéticas. Aliás, a futura agregação da Turquia deflagrou uma acesa discussão sobre o que é efetivamente a Europa, seus limites geográficos, políticos e culturais.

Constate-se que nem tudo nesse itinerário associativo foi primavera, Sr. Presidente, Senador Gilvam Borges. A recusa de importantes países ao projeto da Constituição Européia, cujo texto foi coordenado pelo ex-Presidente da França Giscard d’Estaing, pareceu levar a uma fase outonal a União Européia, o que redundou numa reflexão por parte dos seus dirigentes sobre seu futuro e seus rumos.

O mundo, entretanto, vê com admiração os resultados já obtidos pela União Européia, que tende a se estruturar em Estado Confederal. O fato é que a União Européia conseguiu fazer com os seus cidadãos desfrutem de altos níveis de renda e, sobretudo, de excelente qualidade de vida.

Além da paz interna e externa num continente que foi objeto dos dois maiores conflitos no século XX, é grande nesse campo o contributo da União Européia pelo fato de haver conseguido superar conflitos que pareciam insuperáveis entre países vizinhos.

Sr. Presidente, a análise da evolução da União Européia induz a fixar os nossos olhos no espaço da América Latina e em especial da América do Sul. O principal projeto de integração regional, o Mercosul, criado há 15 anos, passa nos últimos três anos por um sentimento de que está fenecendo antes de adolescer. O Mercosul via talvez a mais grave crise de sua história.

Por isso, entendo que é o momento de fazer-se uma reflexão sobre o referido projeto. Trata-se de uma iniciativa cujas sementes foram lançadas há cem anos pelo descortino do Barão do Rio Branco. Essas sementes, de alguma forma, frutificaram, e a idéia foi-se materializando ao longo da história, valendo lembrar alguns eventos, como salientou o ex-Embaixador da Argentina no Brasil Alieto Guadagni:

Primeiro, em 1944, o Chanceler argentino Henrique Ruiz-Guiñazú e seu colega brasileiro Oswaldo Aranha discutiram a constituição de uma união aduaneira entre os países do Cone Sul, isto é, Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai, a Região do Prata.

Mais adiante, os governos democráticos de Raúl Alfonsín, na Argentina, e José Sarney, no Brasil, assinaram o Tratado de Integração, Cooperação e Desenvolvimento, em 1986, junto a seus protocolos setoriais.

Posteriormente, Menem, Presidente argentino, e Fernando Collor, Presidente brasileiro, assinaram a Ata de Buenos Aires, em 1990, elemento instrumental do Tratado de Integração de 1986.

Finalmente, em 1991, é assinado em Assunção, no Paraguai, o Tratado que cria o Mercado Comum do Sul, Mercosul, entre Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai. O Mercosul - frise-se, Sr. Presidente - é reconhecidamente imprescindível à integração regional e à obtenção pelo Brasil da desejada inserção num planeta que vive forte onda globalizadora, inclusive pelos instrumentos que a ciência e a tecnologia nos oferecem.

            O Mercosul começou a materializar-se, portanto, ao tempo em que o Presidente José Sarney governava o Brasil e Raúl Alfonsín, a Argentina, por sinal os dois principais parceiros do Cone Sul. Nas tratativas dos referidos Chefes de Estado se desenhou o Mercosul, ao final formatado por meio do Tratado de Assunção, como disse, também subscrito por Uruguai e Paraguai.

Como destacou salientou nosso então Chanceler Celso Lafer, por ocasião do décimo aniversário do Mercosul, “ele é o nosso destino, e não a nossa opção”. Celso Lafer disse com muita propriedade: “O Mercosul é o nosso destino; a Alca é uma opção”. Explicitou Celso Lafer, parafraseando Ortega y Gasset: “Trata-se da circunstância do nosso eu diplomático. Aprofundá-lo é não apenas fazer da geografia nossa economia, buscando crescentes formas de integração física e comercial, mas também reafirmar as afinidades derivadas das culturas e das formas compartilhadas de conceber a vida democrática em sociedade”.

Nos primeiros anos, conquanto tenha enfrentado problemas, ora em função de crises econômicas, algumas determinadas por causas externas, ora pela explicável falta de uma “cultura associativista”, o Mercosul promoveu um aumento expressivo de trocas comerciais intrazona e começou a construir mecanismos de convivência e arbitramento dos problemas dos sócios - de que é exemplo o Acordo de Ouro Preto, firmado em 1994, ao tempo em que Itamar Franco era Presidente da República e Fernando Henrique, Presidente eleito, tendo este também comparecido à referida reunião.

            O Acordo de Ouro Preto aprofundou relações para além do econômico, promoveu intercâmbio no campo social, acolheu novos sócios, alguns como membros associados, cogitou da constituição de um parlamento regional, embora, reconheça-se, não haja investido mais assertivamente na edificação de instituições para o adequado funcionamento do bloco.

Ressalte-se, igualmente, a assinatura, em Madri, no primeiro semestre de 1995, de um Acordo-Quadro do Mercosul com a União Européia, sendo o Presidente Fernando Henrique Cardoso o representante do Mercosul.

Em discurso, por ocasião da formatura da Turma Darcy Ribeiro, do Instituto Rio Branco, em 1997, o Chanceler Luiz Felipe Lampreia relatava o empenho em enraizar o processo de integração ao dizer:

            “Continuaremos a concentrar boa parte de nossas energias diplomáticas no trabalho de seguimento das visitas presidenciais realizadas, de consolidação do Mercosul e de uma ‘cultura do Mercosul’, de ampliação da integração física e energética da América do Sul, complemento indispensável...”

É bom frisar esta parte: “complemento indispensável da integração econômica e comercial, de aprofundamento das negociações sobre a integração hemisférica...”. Aí já não se falava mais no Cone Sul e nem nos países que posteriormente a ele se associaram, mas já se cogitava da Comunidade dos Países da América do Sul. Integração hemisférica vai mais além, pois compreende América do Sul, América Central e Caribe com América do Norte.

Ademais, Sr. Presidente, tal como ocorreu com a União Européia, esse projeto tinha, como corolário lógico - e citei o Ministro Lampreia por ter ele versado assunto relativo à questão -, o Mercosul, como vocação, para ser o mecanismo integrador de toda a América do Sul. Nesse sentido, recorde-se proposta lançada pelo Presidente Fernando Henrique Cardoso, que se consubstanciou no ano 2000, resultado de ações empreendidas pelo seu Governo, através do Itamaraty. No referido ano, aliás, carregado de forte simbolismo por se tratar do último do século, realizou-se em Brasília a primeira reunião dos Chefes de Estado e de Chefes de Governo de todas as nações sul-americanas, algo jamais ocorrido na história dos nossos povos. Repito: em toda a história dos povos da América do Sul, em nenhum momento, houve uma reunião desse tipo.

Ao fazer, Sr. Presidente, ainda que perfunctoriamente, uma análise da situação em que se encontra o Mercosul, constata-se que ele atravessa agora, nestes dias, o mais grave momento de sua vida.

O fato mais recente ocorreu na sexta-feira passada, e foi também o mais dramático: o cancelamento da reunião do Mercosul com a União Européia, em Viena, pela impossibilidade, veja bem, de um entendimento entre os parceiros sul-americanos. Vale gizar que as tratativas com os europeus estavam congeladas há quase dois anos. O encontro era do interesse do Mercosul, e pressupõe-se que, em conseqüência, do Governo brasileiro, para que pudéssemos avançar por essa ocasião, em Viena, nas negociações com os europeus.

O Sr. Sibá Machado (Bloco/PT - AC) - V. Exª me permite um aparte, Senador Marco Maciel?

O SR. MARCO MACIEL (PFL - PE) - Pois não, Senador Sibá Machado. Mais adiante.

E o que aconteceu, Sr. Presidente? O Mercosul pediu o cancelamento da reunião com a União Européia, em um sinal de evidente fragilidade da instituição e também de desinteresse de seus parceiros, membros fundadores, na continuação do tão importante projeto de integração regional.

E mais, Sr. Presidente, o que se constatou, pelo que eu li na declaração conjunta da reunião da União Européia é que o único evento positivo - pode parecer irônico - que se registrou foi a criação de uma área de livre comércio da União Européia com a América Central, quando se esperava que o solo fertilizado pelos acordos de 1995, entre o Mercosul e a União Européia, avançasse na germinação de seus frutos.

Ao Governo brasileiro, como principal membro do Mercosul, não resta, a meu ver, alternativa, a não ser concentrar energias e corrigir rumos para que ele não desapareça, conforme se verifica pela leitura de jornais e revistas.

Eu não sou pessimista. Repito sempre repito uma frase do Presidente Juscelino Kubitschek com relação ao Brasil: “O otimista pode errar, mas o pessimista começa errando”. Sem querer ser pessimista - e nesse caso espero estar errado -, entendo que corremos o risco de ver comprometido o sonho da desejada integração dos países do Cone Sul e da constituição de uma associação dos países da América do Sul.

Daí por que se exige, neste momento, do Presidente da República, uma ação rápida para que o Mercosul não pereça, porque se essa ação tardar, certamente nós constataremos o soçobrar um bem tecido projeto de integração regional. E isso nos levaria, parafraseando Carlos Drummond de Andrade, a dizer que, da forma que vai, o Mercosul será, daqui a pouco, uma mera fotografia na parede. E como isso vai doer!

Concedo o aparte ao nobre Senador Sibá Machado.

O Sr. Sibá Machado (Bloco/PT - AC) - Senador Marco Maciel, espero que a profecia de V. Exª jamais aconteça.

O SR. MARCO MACIEL (PFL - PE) - Pois não. E eu espero que V. Exª envide esforços nesse sentido, porque será muito importante que haja um esforço rápido do Governo, sob pena de o Mercosul soçobrar.

O Sr. Sibá Machado (Bloco/PT - AC) - Na verdade, pedi o aparte, primeiro, para parabenizá-lo, porque é novamente uma aula para mim o histórico da formação dos pontos econômicos da União Européia.

O SR. MARCO MACIEL (PFL - PE) - Agradeço a generosidade de V. Exª.

            O Sr. Sibá Machado (Bloco/PT - AC) - As datas que V. Exª nos traz, bem como os principais nomes que ajudaram na elaboração dos tratados, na seqüência e na liderança dos processos.

(Interrupção do som.)

            O Sr. Sibá Machado (Bloco/PT - AC) - É claro que o Mercosul é uma necessidade para todos nós, e oxalá se expanda por toda a América do Sul. É algo que ainda aguardamos que possa acontecer. Estou preocupado porque parece que a sensação de soberania dos vários Líderes de Estado que se elegeram nos últimos tempos, nesta parte do mundo, tem levado um pouco a esse discurso de refazer uma série de contratos e de procedimentos, o que talvez tenha causado a baixa, digamos, animação para o fortalecimento desse bloco. Considero também vital para essas economias que o Mercosul exista, que persista e que possa se relacionar de forma bilateral com outro bloco econômico, e não apenas sirva de intermediário entre nações. Fico preocupado porque, até onde pude acompanhar o debate sobre a Alca, o que se dizia é que, nos moldes em que estava sendo proposta, a Alca era...

O SR. PRESIDENTE (Gilvam Borges. PMDB - AP) - Senador Sibá Machado, solicito a V. Exª que seja conciso no aparte, tendo em vista que o tempo do orador já expirou.

O Sr. Sibá Machado (Bloco/PT - AC) - Agradeço a V. Exª. A Alca seguia um caminho que deixava a todos nós preocupados pela possibilidade de ser uma verdadeira entrega do patrimônio nacional. O Mercosul cria um novo cenário de proteção dessas soberanias. Acredito que a sensatez e a visão de longo prazo dos Chefes de Estado vão prevalecer, e, com certeza, o Mercosul seguirá o caminho para o qual V. Exª, tão brilhantemente, nos chama a atenção na tarde de hoje.

O SR. MARCO MACIEL (PFL - PE) - Agradeço ao nobre Senador Sibá Machado o aparte. Rapidamente quero dizer a V. Exª que a Alca não era bem objeto de meus comentários quando a mencionei. Na realidade, o desdobramento do processo integrador da América Meridional seria a integração hemisférica, e, neste caso, teríamos que discutir se tal convém ou não. Mas ainda estamos numa fase muito preliminar desses entendimentos. O fundamental agora é o Mercosul.

O Sr. Arthur Virgílio (PSDB - AM) - Permite-me V. Exª um aparte, Senador?

O SR. MARCO MACIEL (PFL - PE) - Aliás, isso vem de Rio Branco. Há mais de cem anos, Rio Branco teve a graça de ser Ministro das Relações Exteriores durante dez anos e pôde definir os chamados paradigmas da política externa. Já naquela ocasião, ele dizia: atenção ao Prata, isto é, ao Cone Sul. Era o nosso principal projeto integrativo, e a história demonstrou que isso era evidente.

            Por outro lado, sem o Mercosul não é possível pensar o seu desdobramento numa comunidade envolvendo todos os países da América do Sul, como o Presidente Fernando Henrique deixou assentado naquela reunião em 2000, realizada em Brasília, presentes todos os Chefes de Estado e de Governo da América do Sul. Daí por que acolho com satisfação o aparte de V. Exª. Espero que se faça um esforço para salvar o Mercosul. Não quero encerrar as minhas palavras sem deixar de conceder um aparte ao nobre Senador Roberto Saturnino e, a seguir, ao nobre Líder Arthur Virgílio Neto.

            O Sr. Roberto Saturnino (Bloco/PT - RJ) - Senador Marco Maciel, o meu aparte será breve e destina-se a cumprimentá-lo pelo pronunciamento que V. Exª, com seriedade e substância, sempre apresenta. Concordo efetivamente com V. Exª: no momento, o Mercosul passa por um problema grave, que se liga a um dos países essenciais à formação do Mercosul, o Uruguai. Além de o Uruguai estar se sentindo menosprezado, na medida em que as decisões sempre acabam seguindo interesses até bem negociados de Brasil e Argentina. Mas é preciso que o Uruguai se sinta considerado e tenha a atenção dos demais membros do Mercosul, para que ele também usufrua, de alguma forma, dessa integração que não vem acontecendo, efetivamente, neste momento. O esforço que V. Exª pede e do qual quero participar para a superação da crise do Mercosul é um esforço de atenção...

(Interrupção do som.)

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O Sr. Roberto Saturnino (Bloco/PT - RJ) - ...a um membro. Não se pode pensar em uma integração do Cone Sul com o Uruguai de fora, ligado diretamente aos Estados Unidos. Isso é impensável. É preciso todo o esforço para realmente, com certa dose até de generosidade, incluir-se o Uruguai mais positivamente e mais substancialmente nos acordos que estão propiciando grande progresso do comércio e da integração do Cone Sul, o qual o Uruguai também deve usufruir e dele participar. Deve-se também toda atenção, neste momento, ao Uruguai para superar essa crise a que V. Exª se refere com toda razão.

O SR. MARCO MACIEL (PFL - PE) - Nobre Senador Roberto Saturnino, agradeço o aparte de V. Exª. Comungo com pontos de vista expressos por V. Exª. Mas devo fazer a seguinte observação: para que isso não aconteça, isto é, a hipótese do desligamento do Uruguai etc, é fundamental que haja uma ação política, e essa ação política tem que ser feita pelo Brasil, principal parceiro do Mercosul ao lado da Argentina. Penso que essa é uma ação política a ser empreendida agora.

O Sr. Roberto Saturnino (Bloco/PT - RJ) - Muito bem! Concordo com V. Exª.

O SR. MARCO MACIEL (PFL - PE) - Mesmo porque um projeto de integração econômica, política, social e cultural é antes um projeto político, cimento que garantirá nossa unidade, nossa integração.

Ouço o nobre Líder Arthur Virgílio Neto, do PSDB.

O Sr. Arthur Virgílio (PSDB - AM) - Sr. Presidente Marco Maciel, serei igualmente breve. A verdade é que os dias de debate esclareceram a opinião pública - tenho a impressão - e as mentes de todos os nossos companheiros de Senado. No começo, era uma conversa meio companheira com Morales. Dizíamos que não, que a conversa tem que ser dura. O Ministro Celso Amorim, de repente, endureceu. Disse, inclusive - e isso vazou para a imprensa -, que poderia deixar de comprar o gás boliviano. Imediatamente, as coisas começaram a entrar em um certo eixo. O fato é que sou pessimista, hoje, em relação ao Mercosul. Um dos grandes passivos que o Governo deixará para o futuro será, a meu ver, essa crise interminável do Mercosul. A Venezuela contra Peru e Colômbia; Argentina contra Uruguai; o Brasil escanteado em sua posição de liderança natural. Chávez impõe as idéias mais obscuras e mais atrasadas em um mundo que não comporta essas idéias obscuras e atrasadas. Tenho a impressão de que vimos aqui uma vitória de tese: a de que não existe companheirismo em política internacional. Existe o interesse frio de uma nação, o profissionalismo da diplomacia. O Sr. Marco Aurélio Garcia atrapalha. O Sr. Celso Amorim deve ser deixado para trabalhar em paz. Nós temos que aprender a lição do Rio Branco outra vez: a defesa dos interesses brasileiros. Inclusive incluindo, com muita frieza, os interesses das empresas brasileiras, estatais ou não, Petrobras ou o que seja. É capital brasileiro, significa poupança de brasileiros lá fora. O Brasil tem que tirar os punhos de renda e, efetivamente, sair em campo como fazem todas as nações adultas politicamente. O mundo globalizado o exige. Não dá para brincar mais de liderança sindical, quando se tem um mundo que exige uma diplomacia preparada e pragmática - sempre é preparada a diplomacia brasileira e, como ninguém, foi pragmático o Barão do Rio Branco.

O SR. MARCO MACIEL (PFL - PE) - Muito obrigado, nobre Senador Arthur Virgílio.

Ao concluir as minhas palavras, quero fazer duas observações. Em primeiro lugar, V. Exª chama a atenção para o fato de que se alterou substancialmente, sobretudo na nossa vizinhança, com a recorrência de fenômenos que talvez possamos denominar de “neopopulistas”. Por outro lado, cabe fazer um esforço para salvar o Mercosul. Se não agora, quando? Se não nós, quem? Sobretudo o Brasil, que é, indubitavelmente, como demonstram as estatísticas, o principal parceiro do Mercosul. Daí eu não ver outro caminho.

Nobre Senador José Agripino, concedo um aparte a V. Exª.

O Sr. José Agripino (PFL - RN) - Senador Marco Maciel, V. Exª fala com autoridade de quem foi Vice-Presidente da República e de quem é, costumeiramente, um orador ameno que trata de assuntos de alto nível, sempre em alto nível. V. Exª fere a questão da dilaceração do Mercosul - vamos usar esse termo, que é muito forte, mas, na verdade, lamentavelmente estamos vendo a desagregação do Mercosul. O Uruguai está em claro conflito com a Argentina, o segundo maior parceiro do Mercosul; o Brasil está num desinteressante - para ambas as partes - conflito com a Bolívia, dois parceiros do Mercosul. Aquilo que era o sonho de algo que se pretendeu chamar de casa: a integração sul-americana com o Pacto Andino, altamente comprometido por atitudes individualistas de líderes que não são líderes, mas que, com o poder econômico, estão criando dificuldade para a reintegração sul-americana. O momento envolve estadismo, capacidade de o Presidente da República ser estadista, pensar grande, não agir, em nenhum instante, com demagogia, ter visão de futuro. V. Exª, em muito boa hora, provoca este debate, calcado na racionalidade, na moderação, no equilíbrio e na capacidade de liderar sem querer mostrar que é líder. É este o papel que cabe a nós, brasileiros, destacando-se V. Exª, que foi, com muito mérito, Vice-Presidente da República, pelo nosso Partido.

O SR. MARCO MACIEL (PFL - PE) - Muito obrigado, eminente Senador José Agripino. V. Exª chama a atenção para um fato importante: a postura do líder. Líder não é aquele que se proclama. Líder não é aquele que quer se impor. Líder é aquele que é capaz de conceber e conduzir propostas que sejam discutidas e, após, executadas.

Sr. Presidente, ao encerrar, gostaria que V. Exª consentisse que fosse publicado, em apenso ao discurso que acabo de proferir, uma nota relativa ao quinto aniversário da existência do escritório da Holanda no Recife, inaugurado ao tempo que exercíamos - eu, as funções de Vice-Presidente da República, e Jarbas Vasconcelos, de Governador do Estado de Pernambuco.

.Trata-se de um escritório técnico de cooperação, que está permitindo ampliar - e muito - o intercâmbio do Brasil com a Holanda, país com o qual a relação, no século XVII, foi inamistosa, com a presença militar holandesa, no Nordeste, sobretudo em Pernambuco. Hoje, até pela conduta que nos legou o Príncipe Maurício de Nassau, boas parcerias se desenvolvem entre empresas brasileiras e holandesas, pois muitas delas se instalaram em Pernambuco e no Nordeste, sem contar programas de intercâmbio cultural.

Muito obrigado a V. Exª.

 

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DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR MARCO MACIEL EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inserido nos termos do art. 210, inciso I e § 2º do Regimento Interno.)

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Matéria referida:

“Holanda poderá transferir tecnologia naval para PE.”


Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/05/2006 - Página 16810