Discurso durante a 61ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Registro da participação de S.Exa. na primeira Conferência Nacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência.

Autor
Paulo Paim (PT - Partido dos Trabalhadores/RS)
Nome completo: Paulo Renato Paim
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL.:
  • Registro da participação de S.Exa. na primeira Conferência Nacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência.
Publicação
Publicação no DSF de 18/05/2006 - Página 17025
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • COMENTARIO, PARTICIPAÇÃO, ORADOR, CONFERENCIA NACIONAL, DIREITOS, PESSOA PORTADORA DE DEFICIENCIA.
  • IMPORTANCIA, ESTATUTO, PESSOA PORTADORA DE DEFICIENCIA, AUTORIA, ORADOR, TRAMITAÇÃO, SENADO.
  • LEITURA, TRECHO, PRONUNCIAMENTO, AUTORIA, ORADOR, IMPORTANCIA, CONVENÇÃO INTERNACIONAL, ELABORAÇÃO, TRATADO, DIREITOS HUMANOS, PESSOA PORTADORA DE DEFICIENCIA, GARANTIA, INCLUSÃO, PROTEÇÃO, DIGNIDADE, IGUALDADE, OPORTUNIDADE, AUSENCIA, DISCRIMINAÇÃO.

O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS. Para uma comunicação inadiável. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, agradeço ao Senador Saturnino.

Eu gostaria de usar a tribuna neste momento para, rapidamente, comentar a importância de que se revestiu o evento ocorrido segunda-feira, em que participei como painelista, juntamente com o Senador Flávio Arns; com o Senador Azeredo; com o Procurador do Trabalho, Dr. Ricardo Tadeu Fonseca; com a Conselheira do Conselho Nacional de Direitos da Pessoa Portadora de Deficiência - Conade, a Srª Regina Atalla, e, ainda, a Coordenadora da Corde, Srª Isabel Maior.

Sr. Presidente, quero cumprimentar tanto a Corde quanto a Conade pela realização da I Conferência Nacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência.

Foi um evento que reuniu mais de mil pessoas portadoras de deficiência, um evento de relevância internacional, um grande momento de reflexão e um forte elo na luta entre aqueles que trabalham a favor das pessoas com deficiência.

Peço a V. Exª que receba minha palestra na íntegra, porque, naturalmente, não vou lê-la agora - são mais de vinte páginas -, em que faço uma análise importantíssima deste momento.

Eu gostaria de dizer que para mim foi muito importante, já que fui o autor do Estatuto da Pessoa com Deficiência, que tem como Relator o Senador Flávio Arns, aqui, no Senado; Celso Russomanno é o Relator na Câmara dos Deputados, sendo o Deputado Leonardo Mattos o Presidente da Comissão que discute o Estatuto.

Quero concluir, Sr. Presidente, lendo um trecho da minha palestra, da forma como foi analisado o Estatuto pela Conselheira Regina Atalla. Disse ela que o Estatuto da Pessoa com Deficiência e a Convenção Internacional fazem, sem sombra de dúvida, um gol de placa e avançam no sentido da responsabilização da sociedade civil. Salienta ainda:

A importância em destacar que, com o advento da Convenção Internacional, teremos um Tratado de Direitos Humanos da Pessoa com Deficiência que assegurará os princípios inequívocos e inegociáveis da inclusão, da não-segregação da análise social da deficiência, da equiparação de oportunidades, baseados na proteção ampla e integral para promover e proteger a dignidade e os diretos das pessoas com deficiência.

Sr. Presidente, encerro. Fiz uma síntese da importância dessa conferência nacional - que tem relação com uma convenção internacional que deve ser aprovada até o próximo mês de janeiro - e do Estatuto da Pessoa com Deficiência, que está em debate no Senado Federal.

Era isso o que eu tinha a dizer.

De imediato, agradeço a V. Exª, Sr. Presidente.

 

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SEGUE, NA ÍNTEGRA, PRONUNCIAMENTO DO SR. SENADOR PAULO PAIM.

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O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, eu gostaria de parabenizar a Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência - CORDE e o Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Portadora de Deficiência - CONADE pela iniciativa da realização da I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa Com Deficiência.

Desejo também cumprimentar os painelistas, Senador Flávio Arns, Senador Eduardo Azeredo, o Procurador do Trabalho, Doutor Ricardo Tadeu Fonseca, a Conselheira do Conselho Nacional de Direitos da Pessoa Portadora de Deficiência - Conade, Sra. Regina Atalla, a Coordenadora da CORDE, Sra. Izabel Maior.

Foi um evento da mais alta relevância para todos nós. Um grande momento de reflexão e um forte elo na luta empreendida em favor das pessoas com deficiência.

Solicito ainda, Sr. Presidente que a palestra que proferi e que relato a seguir seja publicada nos Anais desta Casa:

Srªs e Srs. Senadores, foi uma grande honra estarmos compartilhando do evento, discutindo sobre este tema que envolve a vida de todos nós. É um momento que fortalece os elos na luta pelos direitos das Pessoas com Deficiência.

Ao falarmos dos direitos das pessoas com Deficiência, podemos afirmar que ao longo dos anos os movimentos de pessoas com deficiência têm conseguido inúmeros avanços na busca de seus direitos básicos.

E nesse momento é importante que façamos o reconhecimento ao grande trabalho desenvolvido pela CORDE e pelo CONADE na luta por estes avanços. A realização deste evento merece todos os cumprimentos e certamente é um marco nesta trajetória e vem impulsionar a inclusão qualificada das pessoas com deficiência no processo de crescimento brasileiro.

De acordo com a socióloga Marta Gil, consultora e diretora do Amankay Instituto de Estudos e Pesquisas, a expectativa é grande em função do sucesso da etapa estadual da Conferência, que vem sendo realizada em todos os estados brasileiros desde dezembro do ano passado. Ela avalia que "O processo foi bastante participativo, intenso e dinâmico, começando pela base: os Conselhos fizeram suas conferências, envolvendo atores da sociedade civil, de órgãos públicos, entidades representativas e movimentos de pessoas com deficiência"

Ela acrescenta que as conclusões desses encontros estaduais foram encaminhadas e consolidadas em nível nacional e apresentam novas alternativas e soluções. Segundo suas palavras "Talvez tenha sido o processo mais amplo e democrático já realizado, aqui no Brasil, na área da deficiência"

O panorama atual demonstra que são 25 milhões de pessoas com deficiência no País. 14,5% da população brasileira. Grande parte das pessoas com deficiência vive na pobreza. E, de acordo com Adilson Ventura, presidente do Conade, talvez nem 3,5 milhões têm acesso às melhorias alcançadas nos últimos anos. Segundo ele, a maioria das pessoas tem deficiências oriundas da fome, da miséria e de epidemias. "São completamente passíveis de prevenção"

Todos nós estamos de acordo em que a ótica sobre o tema “direitos das pessoas com deficiência” deva ser ampliada.

É preciso que a deficiência deixe de ser vista apenas sob o ponto de vista assistencial. O preconceito deve ser deixado de lado, deve ser substituído por um olhar mais maduro, por uma atitude mais consciente.

Reafirmamos que a sociedade como um todo deve mudar o seu olhar sobre a deficiência. É necessário que se tire o foco do aspecto puramente médico, clínico e o coloque sob o prisma humano, ou seja, é preciso que se entenda a deficiência como parte natural da diversidade humana.

No processo de inclusão é necessário que todos estejam envolvidos: Estado, sociedade e pessoa com deficiência.

            Uma ação conjunta onde a própria pessoa com deficiência reivindica seus direitos de acesso e participação em situação de igualdade de condições como qualquer outro cidadão; onde a sociedade percebe o deficiente e faz da inclusão uma prática; onde o Estado amplie sua área de atuação, adote atitudes afirmativas, de políticas públicas que estimulem a participação da pessoa com deficiência em todos os campos da atuação social.

Gostaríamos primeiramente de falar um pouco sobre tema que nos levou à Tribuna do Senado Federal há alguns dias e que diz respeito à Convenção Internacional de Direitos da Pessoa com Deficiência, que está sendo elaborada no âmbito da Organização das Nações Unidas, com a participação de 192 países e então abordar o Estatuto da Pessoa Com Deficiência, Projeto que está em discussão.

A Convenção Internacional de Direitos das Pessoas com Deficiência, consumiu 7 reuniões do Comitê Especial da Assembléia da ONU em 4 anos de trabalho. A previsão é de que o texto seja assinado pelos países em janeiro de 2007.

Em texto que recebemos da Conselheira do CONADE, Regina Atalla, sob o título “O Estatuto, a Convenção Internacional e a Responsabilidade da Sociedade Civil”, consta: “a importância em destacar que, com o advento da Convenção Internacional, teremos um Tratado de Direitos Humanos das Pessoas com Deficiência que assegurará os princípios inequívocos e inegociáveis da Inclusão, da Não-Segregação, da analise social da deficiência, da equiparação de oportunidades, baseadas na proteção ampla e integral para promover e proteger a dignidade e os direitos das Pessoas com Deficiência.

Compõem esta Convenção Internacional cerca de 40 artigos: os Princípios Fundamentais, que tratam sobre a dignidade, autonomia individual, incluindo a liberdade de fazer suas próprias escolhas e a independência das pessoas, a não-discriminação, a inclusão e participação plena e efetiva na sociedade com base na igualdade aos demais cidadãos, no respeito pela diferença e aceitação da deficiência como parte da diversidade e da condição humana, na igualdade de oportunidades, na acessibilidade e na igualdade entre homens e mulheres e proteção especial às crianças.

Segue a convenção com a enumeração de uma série de obrigações dos estados nacionais, em relação a responsabilidade de execução e cumprimento dos direitos das Pessoas Com Deficiência.

Apresenta um capítulo sobre a Igualdade e Não-Discriminação, sobre Mulheres e Crianças com Deficiência, incluí um capitulo que trata da importância de aumentar a Consciência Social sobre a Deficiência, outro sobre Acessibilidade, sobre o Direito à Vida, sobre a Igualdade de Reconhecimento Perante a Lei, sobre o Acesso à Justiça, sobre a Proteção contra Tortura, contra a Exploração, Violência e Abusos, outro sobre a Proteção da Integridade da Pessoa com Deficiência, sobre a necessidade de assegurar a Vida Independente e a Participação Ativa junto a Comunidade.

Existem ainda capítulos sobre a Mobilidade Pessoal, sobre a Liberdade de Expressão e Opinião e Acesso a Informação, ao Respeito a Privacidade, a Casa e a Família, os direitos relativos a Educação, Saúde, Habilitação e Reabilitação, Trabalho e Emprego, Padrão Adequado de Vida e Proteção Social, Participação na Vida Publica e Política, Vida cultural, Recreação, Lazer e Esporte, Estatísticas e Coleta de Dados, Cooperação Internacional , Implementação e Monitoramento Internacional”

O texto diz ainda que: “a realidade atual, compartilhada entre a maioria dos paises da América-Latina, incluindo o Brasil, registra a existência de um grande número de leis, incompletas e genéricas e sem poder coercitivo que resultam em obrigações condenadas a existirem somente no papel, sem reflexo prático e efetivo no dia-a-dia deste imenso contingente populacional e cuja a maioria, cerca de 80% vive em condições de grande pobreza , carência e exclusão social”

Salientamos ainda que recebemos também as considerações do Grupo de Trabalho criado pelo Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Portadora de Deficiência - CONADE para analisar o substitutivo da Comissão Especial da Câmara dos Deputados destinada a proferir parecer ao projeto de Lei nº 3.638, de 2000, que institui o Estatuto do Portador de Deficiência.

E vale reiterar aqui nossa intenção de realizar um texto de consenso com a Convenção Internacional de Direitos da Pessoa com Deficiência.

            No que se refere ao Projeto Estatuto da Pessoa Com Deficiência, gostaríamos de fazer menção ao texto apresentado na Audiência Pública, no dia 24 de agosto de 2005 promovida pela Comissão de Cidadania e Direitos Humanos da Assembléia Legislativa do Rio Grande do Sul.

O texto aborda o fato de que: “os direitos da pessoa com deficiência são direitos humanos. As pessoas com deficiência são titulares de todo o conjunto de direitos civis, culturais, econômicos, políticos e sociais consagrados na Declaração Universal dos Direitos Humanos, em igualdade com todas as demais pessoas. A proteção igualitária de todos, incluindo os que têm uma deficiência, e a não discriminação são os fundamentos nos quais se basearam os instrumentos internacionais de direitos humanos.

            Entretanto, a realidade é bem diferente. Em todas as sociedades do mundo, incluindo os países com um nível de vida relativamente elevado, cerca de 600 milhões de crianças, mulheres e homens (80% no terceiro mundo, 50 milhões na Europa) continuam a enfrentar práticas e obstáculos discriminatórios, que os impedem de exercer os seus direitos e liberdades dificultando a sua plena participação na vida das sociedades em que estão inseridos.

            Até bem pouco tempo atrás, as pessoas com deficiência sofreram de uma relativa “invisibilidade”, quer nas suas sociedades, quer na arena internacional. Foram consideradas durante muito tempo como “objetos” de proteção em vez de sujeitos dos seus próprios direitos. Esta aproximação, comumente referida como “modelo médico” da deficiência, centrada quase exclusivamente no enfoque clínico/patológico das pessoas, assim como das suas deficiências, conduziu à exclusão das pessoas com deficiência do seu meio social.

Somente em 1993 na Declaração de Viena foi confirmado que as pessoas com deficiência estão incluídas no âmbito da proteção proporcionada pela Carta Internacional dos Direitos Humanos. O item 63 declara:

            “A Conferência Mundial sobre os Direitos Humanos reafirma que todos os direitos humanos e liberdades fundamentais são universais e a sua observância inclui as pessoas com deficiência. Todas as pessoas nascem iguais e têm os mesmos direitos à vida e bem estar, à educação e ao trabalho, à vida autônoma e à participação ativa em todos os aspectos da sociedade. Qualquer discriminação direta ou outro tratamento discriminatório negativo de uma pessoa com deficiência constitui, por isso, uma violação dos seus direitos”

            Em que pese às disposições da Declaração de Viena, as pessoas com deficiência continuam ausentes dos procedimentos dos Órgãos de Controle da Aplicação dos Tratados das Nações Unidas. Nos relatórios emanados por estes Órgãos a questão da deficiência é omissa, o que significa que os relatórios elaborados pelos Estados membros não evidenciam a implementação de medidas de salvaguarda dos direitos humanos das pessoas com deficiência.

Devido a essa realidade é que o movimento das pessoas com deficiência em nível mundial discute a pertinência da implementação de uma compreensiva e integral convenção internacional que promova e proteja os direitos e a dignidade das pessoas com deficiência.”

O texto pondera ainda que: “o Estatuto da Pessoa com Deficiência é potencialmente um importante instrumento para que as pessoas com deficiência possam atingir os níveis de inclusão e participação social desejados, na medida em que sistematiza e consolida toda a legislação existente em nosso país além de introduzir significativos avanços em diversas áreas de atuação do Estado. Cumprindo ainda a função de contemplar a demanda mundial por uma única legislação integrada e integradora dos direitos humanos e sociais das pessoas com deficiência.

É óbvio que, como toda nova proposta, essa também deve passar por ajustes e adequações visando seu aperfeiçoamento o que, diga-se de passagem, tem sido feito através de um amplo processo de discussão em todas as regiões do país, através de mais de 800 reuniões e encontros que, todavia não esgotam todas as possíveis e necessárias correções a serem feitas, e o serão ao seu devido tempo.

            Temos plena consciência também que a simples aprovação do instrumento legal por si só não produzirá uma alteração imediata na realidade de exclusão social das pessoas com deficiência, sabemos que, embora o Estatuto da Pessoa com Deficiência passe a fazer parte do panorama legal brasileiro, em termos da prática dos direitos, ele continuará sendo um "projeto ou meta a ser atingida”, na medida em que ainda estamos longe de construir uma sociedade que, no seu todo, entenda as pessoas com deficiência como sujeitos de direitos. Se, todavia o Estatuto da Pessoa com Deficiência isoladamente não tem esse poder transformador ele, por outro lado, é pré-condição indispensável para que essa transformação se realize.

Visando a concretização dessa nova e desejada realidade destacamos duas questões cruciais para o sucesso da implementação do Estatuto: o controle social e a gestão pública.

O controle social do Estatuto da Pessoa com Deficiência implica em potencializar e oxigenar as formas de representação desse setor da população em todos os estágios envolvidos na elaboração de políticas públicas, planejamento, execução, fiscalização e avaliação, que devem necessariamente suscitar as seguintes questões: como ampliar a participação da sociedade em geral na garantia dos direitos das pessoas com deficiência? Como inserir a população no controle social, e incentivar as pessoas com deficiência a participarem desse processo? Pensamos ser fundamental a esses propósitos uma reavaliação profunda das formas e composição dos organismos de representação existentes hoje.

            Considerando ainda que, os governos em todos os níveis, com exceções que apenas confirmam a regra, não se mostraram capazes de entender, aceitar e praticar os novos direitos das pessoas com deficiência, predominando as práticas assistencialistas e paternalistas. O que demonstra que há uma grande falta de compromisso ético, vontade política e competência técnica na condução das políticas públicas neste campo.

            Faz-se necessário instituir um novo sistema de gerenciamento dessa política em sintonia com as introduções a serem trazidas pelo Estatuto. Hoje esse gerenciamento é feito por uma coordenadoria que ocupa o terceiro escalão hierárquico, o que está a demonstrar a secundarização histórica dessa política setorial.

            Entendemos que, para a devida valoração da mesma e, visando à sinalização para o conjunto da sociedade do novo patamar dessa política, seria fundamental a criação de estrutura equivalente a Secretaria Nacional, com status de ministério, a exemplo das recém criadas Secretarias Nacional de Políticas das Mulheres e da Promoção da Igualdade Racial.

            Em sua essência o Estatuto da Pessoa com Deficiência visa consolidar em um único texto legal todo o cipoal de legislações pertinentes à temática, além de ampliar alguns direitos e garantias. Entendemos que esse instrumento tem um potencial positivo de fazer avançar a tomada de consciência do conjunto da sociedade, fazendo a transição do modelo superado que propõe a inclusão da pessoa com deficiência na sociedade para a nova proposta de possibilitar que a sociedade se capacite a aceitar e respeitar as diferenças.

            No período histórico recente podemos constatar que muitos avanços foram conquistados visando à aceitação das diferenças humanas, em especial do último quarto do século XX para esse alvorecer de século XXI. Pensamos que a busca pelo respeito, dignidade e equiparação de oportunidades que o movimento das pessoas com deficiência em nível mundial, nacional e local tem dado uma contribuição fundamental para a evolução do ser humano, seja no plano material ou mesmo espiritual.

            Tem contribuído para que a humanidade entenda e aceite que as diferenças físicas, sensoriais, mentais ou comportamentais não são sinônimas de inferioridade ou incapacidade, pois está continuamente a provar a poderosa força que tem a garra, a determinação e a superação que possuem todos os seres humanos”

É importante Srªs e Srs. Senadores, ao falarmos do Estatuto, que traz em seu bojo o princípio da inclusão social, lembrarmos a série de direitos e garantias nas várias áreas da atuação pública e social que com ele são contemplados.

No campo da saúde, por exemplo, determina como dever do estado a promoção da saúde integral da pessoa com deficiência que prevê o fornecimento de medicamentos, de próteses e órteses, bem como o direito a habilitação e à reabilitação.

Na área da educação prioriza a educação inclusiva, mas deixa para a família a escolha do tipo de ensino, se em escola regular da rede ou em escola especial. Estipula cotas para o ingresso na universidade. Prevê também para o ingresso no ensino superior, em razão da igualdade de condições a adaptação de provas.

A inclusão da pessoa com deficiência no mundo do trabalho também está contemplada com medidas como o regime de cotas no serviço público, estipulando também uma cota mínima em empresas com 50 empregados.

Na assistência social dá à família do deficiente que não tem condições de se manter o direito de receber o benefício da LOAS.

Nas áreas do desporto, do turismo e do lazer a pessoa com deficiência tem assegurada a acessibilidade aos ambientes desportivos e culturais, através da eliminação das barreiras arquitetônicas , bem como incentivar a participação de pessoas que possuem deficiência em concursos de prêmios, nos campos das letras e das artes.

A Pessoa com Deficiência tem o direito ao transporte adequado as suas necessidades através da adaptação de veículos e locais de embarque, de acordo com as normas vigentes. Como também o direito à reserva de vagas no transporte coletivo interestadual e a gratuidade se a renda familiar per capta não ultrapassar a 2 salários mínimos.

Será incentivada a pesquisa, o desenvolvimento e a difusão de novas tecnologias de informação e comunicação como instrumento para superação de limitações e acesso à comunicação e à educação.

Enfim, várias são as propostas nas mais diversas áreas para trazer melhores condições de vida para essa parcela da nossa população.

A socióloga Marta Gil, que já mencionamos anteriormente destacou, em relação ao Projeto que, “existem ainda dois importantes processos que alcançam a maturidade nesse momento: o Estatuto da Pessoa com Deficiência e a Convenção Interamericana para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Pessoas Portadoras de Deficiência, documento adotado pela Assembléia Geral da Organização dos Estados Americanos (OEA) em 1999.”

            Algumas pessoas tem se mostrado contrárias à aprovação do Estatuto da Pessoa Com Deficiência, fazendo críticas quanto à necessidade de um instrumento legal que vise proteger os direitos dessas pessoas.

Mas, acreditamos ser importante salientar que a introdução do Estatuto da Pessoa com Deficiência no arcabouço legal representa a garantia de acesso aos direitos de cidadania assegurados na Constituição.

Não se trata aqui de perpetuar o protecionismo e o paternalismo que não visam a inclusão da pessoa com deficiência. Mas, para que se atinja a desejada igualdade entre os brasileiros é necessário que se dê tratamento desigual àqueles que sempre foram excluídos.

No entanto aqueles que não desejam ser beneficiados e amparados pelas garantias previstas pelo estatuto da pessoa com deficiência, podem fazer a opção pela não proteção de tais garantias.

Srªs e Srs. Senadores, é importante ratificar que o Estatuto da Pessoa com Deficiência é um documento, um instrumento que nasce do debate entre pessoas com deficiência, a sociedade como um todo e o poder público. Ele caminha na perspectiva de, em conjunto, também encontrar os caminhos da acessibilidade, da inclusão e da cidadania no que têm essas palavras de mais pleno, de mais essencial.

Os relatores do Projeto na Câmara e no Senado, Celso Russomano e Flávio Arns, apresentaram a primeira versão do substitutivo que ainda será exaustivamente debatido pela sociedade.

A fusão das duas propostas resultará numa magnífica peça, moderna, atualizada e condizente com as expectativas da população que vivencia esta realidade.

E aqui, Srªs e Srs. Senadores, fazemos questão de reafirmar que o Estatuto deseja ser uma legislação em consonância total com as deliberações da Convenção Internacional de Direitos da Pessoa com Deficiência.

Estejam certos meus caros de que, torcemos para que possamos construir um texto que esteja em consonância com este tratado internacional, pois sabemos que a simples aprovação do Estatuto da Pessoa com Deficiência não encerrará as discussões sobre o tema, mas será um princípio e um meio através do qual a pessoa que possui alguma deficiência conquiste os seus direitos, conquiste o seu espaço numa sociedade que se caracteriza por oportunizar a todos os seus cidadãos independentemente de suas condições físicas, mentais ou sensoriais a manifestação de suas potencialidades e a riqueza de sua individualidade.

Torcemos e cremos que esta construção é possível.

Certamente todos nós estamos imbuídos do espírito deste lema que congrega milhares de lideranças em todo o mundo e que é ” Nada sobre Nós, Sem Nós!”

Estejam certos de que a nossa intenção é melhorar a qualidade de vida das pessoas com deficiência. É somar com todos aqueles que desejam que as pessoas com deficiência exerçam plenamente sua cidadania.

Temos exemplos de pessoas que somam, tal como Marilza Matos, uma moça de 28 anos, cega, que escreveu uma belíssima carta ao escritor e poeta Rubem Alves, sobre seu desejo de ter pleno acesso aos seus livros pois conforme ela dizia tudo que conhecia dele, eram artigos e crônicas publicadas em jornais aos quais tinha acesso através da internet.

O autor após receber esta carta tomou a iniciativa da produção de seus textos em áudio e a Editora lançou a "Coleção Rubem Alves em Audiolivro."

As palavras de Marilza foram:

“Olá, amigo escritor e poeta!!! Chamo-te de amigo, porque nem imaginas o quanto falas aquilo que gostaria de falar!! Considero-te de verdade meu amigo, porque partilhas comigo a tua emoção, a tua clareza de pensamento e a tua total lucidez sobre o mundo insensato e desumano no qual estamos vivendo...

Quero-te muito como meu amigo porque calas dentro de ti (e de mim também), a idéia da possibilidade, da partilha plena e da divisão igualitária do pão, "não deixando que ele endureça, para não endurecer o coração"...

            Antes de finalizar meus caros, gostaríamos de reforçar as palavras do psiquiatra e psicanalista Jorge Márcio de Andrade, fundador do Centro de Informática e Informações sobre Paralisias Cerebrais (Defnet) que concluiu muito bem quando disse: "Há uma potencialidade de transformação micro e macropolítica, em especial no que chamamos de políticas públicas. Eu desejo e espero que tenhamos um dos mais importantes encontros entre os cidadãos e cidadãs brasileiros que desejam uma real efetivação dos direitos de pessoas com deficiência"

Bem, meus amigos e minhas amigas, esperamos que a cada dia mais e mais pessoas se tornem elos nesta grande corrente chamada inclusão.

Construir uma sociedade inclusiva é a nossa meta, uma sociedade onde partilhar não seja só uma palavra, mas uma atitude. Uma sociedade feita de seres humanos diferentes, que além de se saberem diferentes, respeitem estas diferenças e aprendam a conviver de tal forma que todos possam exercer plenamente sua cidadania.

Sociedade inclusiva é aquela em que um ser humano olha para o outro sem pensar que se o outro é diferente dele é porque o outro tem algo de errado, de inferior.

Sociedade inclusiva é aquela onde um ser humano olha para o outro e pensa em partilhar as diferenças, pois isso irá gerar o crescimento de ambos, e o produto final disto será o bem comum.

Queria encerrar e dizer para vocês que o Estatuto da Pessoa Com Deficiência não será aprovado em hipótese nenhuma sem que vocês dêem a palavra final.

E queria também dizer, quase num desabafo, que devido as minhas posições já fui chamado de demagogo.

Se, ser demagogo, é amar e lutar para que ninguém seja discriminado pela cor da pele e por isso apresentei o estatuto da igualdade Racial, eu sou um demagogo.

Se, ser demagogo, é amar e lutar por um reajuste decente para aposentados e pensionistas e pela implementação efetiva do Estatuto do Idoso, do qual sou autor, eu sou demagogo.

Se, ser demagogo, é amar e lutar pelos trabalhadores brasileiros para que tenham um salário justo e combater o desemprego e por isso sou Relator da Comissão Mista do Salário Mínimo, também sou demagogo.

Se, ser demagogo, á amar e lutar e combater as discriminações como faço no Congresso Nacional em relação às mulheres, eu sou demagogo.

Se, ser demagogo é amar e lutar pela livre orientação sexual para todos os homens e mulheres, podem dizer que sou demagogo.

Se, ser demagogo, é amar e lutar pelos povos indígenas, sendo autor do projeto que colocou um índio como herói da Pátria, que foi Sepé Tiaraju, e criou a Comissão Mista para tratar de assuntos indígenas, eu sou demagogo.

Se, ser demagogo, é amar e lutar e pensar a favor de que a nossa juventude tenha direito ao ensino profissionalizante, à universidade gratuita, principalmente para os que não podem pagar, eu sou demagogo.

Se, ser demagogo, é amar e lutar e defender o Estatuto da Criança e do Adolescente para que seja efetivamente aplicado e respeitado, que falem que sou demagogo.

Se, ser demagogo, é amar e lutar por um Projeto da dimensão do Cantando as Diferenças, que propõe o reconhecimento político das diferenças, então eu sou demagogo.

Para concluir quero dizer a vocês que, se a minha vida é amar e lutar para que as pessoas com deficiência tenham direito a não somente o Estatuto da Pessoa Com Deficiência, mas a muito mais, para que possam viver com dignidade, amar e ser amados, vocês podem saber que eu tenho muito orgulho que digam que eu sou demagogo.

Viva a I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa Com Deficiência!

Vida longa para todas as outras que virão!!!

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 18/05/2006 - Página 17025