Discurso durante a 62ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre os episódios de violência ocorridos em São Paulo. O caráter subversivo do atual terrorismo.

Autor
Romeu Tuma (PFL - Partido da Frente Liberal/SP)
Nome completo: Romeu Tuma
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SEGURANÇA PUBLICA.:
  • Considerações sobre os episódios de violência ocorridos em São Paulo. O caráter subversivo do atual terrorismo.
Publicação
Publicação no DSF de 19/05/2006 - Página 17464
Assunto
Outros > SEGURANÇA PUBLICA.
Indexação
  • ANALISE, SUBVERSÃO, TERRORISMO, CORRUPÇÃO, COMANDO, CRIME ORGANIZADO, OBJETIVO, AGRESSÃO, ESTADO, SOCIEDADE, OMISSÃO, GOVERNO, PRECARIEDADE, SISTEMA PENITENCIARIO, DEFASAGEM, LEGISLAÇÃO PENAL, REGALIA, INCENTIVO, CRIME, AUSENCIA, PREVENÇÃO, ISOLAMENTO, LIDER, DETENTO, GRAVIDADE, DESVALORIZAÇÃO, POLICIAL, PROTESTO, PARALISAÇÃO, TRAMITAÇÃO, MATERIA, CONGRESSO NACIONAL, ESPECIFICAÇÃO, IMPEDIMENTO, TELEFONE CELULAR, PRESIDIO, REFORÇO, PENA, AUTORIA, ORADOR, REPUDIO, ADIAMENTO, EXECUTIVO, JUDICIARIO, FAVORECIMENTO, CRIMINOSO.

O SR. ROMEU TUMA (PFL - SP. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores,

O caráter subversivo do atual terrorismo

“Vou aos morros e vejo crianças com disposição fumando e vendendo baseado. Futuramente, elas serão três milhões de adolescentes, que matarão vocês (policiais) nas esquinas.” Este trecho de depoimento de William Lima da Silva, alcunhado “Professor”, à polícia no início dos anos 90, consta do livro Comando Vermelho - A História Secreta do Crime Organizado, de Carlos Amorim. Fundador da facção criminosa, ele revela o objetivo último de organizações que surgiram do contato entre presos “comuns” e “políticos”, nos anos 60 e 70.

Ao adotar estrutura e táticas semelhantes às subversivo-terroristas, bandidos “desorganizados” engajaram-se na violência política como “rebeldes sem causa”. Tanto que o “Professor”, então com 59 anos de idade e 35 de cadeia, se vangloriava de ser “o último comunista preso”, conforme disse sua esposa à imprensa.

Eclodiu, assim, um tipo de terrorismo desprovido de militantes políticos, mas de finalidade igual à do antecessor: ferir o Estado e a sociedade. O que aconteceu em São Paulo é inseparável desse contexto, consolidado por linhas auxiliares nos campos do direito e da imprensa, paralelamente à omissão de sucessivos governantes.

Ao invés de se ampliar e melhorar o sistema prisional, as cadeias foram transformadas em autênticas fábricas de celerados. Não recuperam ninguém. Abarrotadas como pocilgas, destinam tratamento desumano aos principiantes no crime e os obrigam a se promiscuir com experientes marginais. Mas, quando são de “segurança máxima”, proporcionam “hospedagem” digna de hotel aos presos mais perigosos. Fácil é imaginar o que se fixa na mente de um jovem acusado do roubo de um boné ou do furto de um pote de manteiga ao ser jogado no meio de assassinos e traficantes.

Paralelamente, para disfarçar sua repugnante omissão e abrir vagas carcerárias, o governo permitiu, quando não incentivou, o sucateamento da Lei de Execução e do Código Penal em consonância com uma nova criminologia que abomina o caráter punitivo das penas. O poder público federal evidencia esse entendimento, perverso para a população honesta e ordeira, também através de indultos e comutações corriqueiros. Liberta milhares de condenados antes do cumprimento da pena.

A enxurrada de regalias penais é a maior fonte de impunidade e incentivo à criminalidade. As benesses permitem aos piores homicidas, por exemplo, aguardarem julgamento em liberdade, durante anos, mesmo quando inculpados por força de confissão apoiada em provas irrefutáveis. Ou até usarem as celas como escritórios de onde comandam a ação dos asseclas nas ruas. Tenta-se, ademais, garantir liberdade para os condenados até que esgotem a última possibilidade de recurso, mesmo depois de julgados em segunda instância. E que se dane o princípio mais elementar da prevenção, isto é, o isolamento das fontes de insegurança.

Além disso, o crime organizado tem na corrupção o melhor caldo de cultura. E ela cresceu até os píncaros do sistema político. Perpassa setores dos poderes constituídos a ponto de disseminar a impressão de que existem leis feitas por bandidos para bandidos.

Assistimos à reprise do que se repete num crescendo há anos. Isto é, a violência desanda em meio a muita demagogia e inconseqüência, enquanto organizações criminosas encontram oposição real apenas no heroísmo e devotamento de policiais mal pagos, desprestigiados, perseguidos, mal equipados e seguidores de uma vocação que, apesar disso, os fazem imolar-se em troca da vida ou do patrimônio de outro ser humano.

            A base da segurança pública é criminoso na cadeia e polícia respeitada nas ruas. Mas, o desprestígio do profissional de Polícia é tamanho que, mesmo diante de informações sobre a iminência dos confrontos, sequer houve alerta para ele “ficar esperto”. Já precisava esconder documento, farda e distintivo para evitar a morte quando de folga. Entretanto, autoridades superiores iludiram-se com a possibilidade de resolver tudo na conversa e na barganha com bandidos.

Há tempos, o crime organizado andou executando promotores, juízes e diretores de presídios. Surgiram comissões legislativas e grupos de trabalho governamentais para tomar providências agora rebatizadas de “legislação de pânico”. Oxalá se produza algum resultado concreto porque já existem projetos de lei no Congresso para tudo o que se imagine em conseqüência daqueles atentados. Por exemplo, minha proposta para tipificar como crime a introdução de telefones celulares nos presídios está parada desde outubro do ano passado. E sabemos como esses aparelhos são fundamentais para as ações coordenadas.

Outras propostas, como minha emenda constitucional para outorga do poder de polícia às guardas municipais em convênio com os governos estaduais, já aprovada por unanimidade no Plenário do Senado há anos, continua adormecida na Câmara dos Deputados. Cogita-se no momento, diante da gravíssima crise na segurança, de revitalizar essa e outras proposições de igual relevância. Por exemplo, a que contorna o limite de trinta anos para o cumprimento do total das penas e a que agrava a receptação, o grande motor dos crimes contra o patrimônio, inclusive o latrocínio.

Entretanto, mesmo que se efetive algum trâmite legislativo acelerado e sejam transformadas em lei, medidas como essas de nada valerão caso os poderes Executivo e Judiciário venham a procrastinar ou truncar a sua eficácia, seja através de vetos governamentais ou de benevolência judicial como tem acontecido com outras normas legais produzidas para prejudicar o banditismo.

O refluxo da maré de violência é diretamente proporcional à eliminação daquelas causas. A alternativa é a implosão do Estado Democrático de Direito.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/05/2006 - Página 17464