Discurso durante a 65ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Colocações a respeito da conscientização do eleitorado, sobre a crise em que o país se encontra submerso e a necessidade de que o Congresso Nacional estabeleça como sua grande prioridade, operar as reformas constitucionais.

Autor
Marco Maciel (PFL - Partido da Frente Liberal/PE)
Nome completo: Marco Antônio de Oliveira Maciel
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA POLITICA. POLITICA DE TRANSPORTES.:
  • Colocações a respeito da conscientização do eleitorado, sobre a crise em que o país se encontra submerso e a necessidade de que o Congresso Nacional estabeleça como sua grande prioridade, operar as reformas constitucionais.
Aparteantes
Flexa Ribeiro.
Publicação
Publicação no DSF de 24/05/2006 - Página 17733
Assunto
Outros > REFORMA POLITICA. POLITICA DE TRANSPORTES.
Indexação
  • ANALISE, NECESSIDADE, REFORMA CONSTITUCIONAL, PRIORIDADE, REFORMA POLITICA, DEFESA, CONSCIENTIZAÇÃO, ELEITOR, CANDIDATO, URGENCIA, REFORMULAÇÃO, REFORÇO, PARTIDO POLITICO, COMBATE, INTERESSE PARTICULAR, AVALIAÇÃO, FEDERAÇÃO, COMENTARIO, HISTORIA, BRASIL.
  • ANALISE, FEDERAÇÃO, DESEQUILIBRIO, CONTRIBUIÇÃO, RECEITA TRIBUTARIA, ENCARGO, COMPETENCIA, UNIÃO FEDERAL, ESTADOS, MUNICIPIOS, MODELO, CENTRALIZAÇÃO, PODER, IMPORTANCIA, VINCULAÇÃO, REFORMA POLITICA, REFORMA TRIBUTARIA.
  • SOLICITAÇÃO, PROVIDENCIA, GOVERNO FEDERAL, RETOMADA, AMPLIAÇÃO, PONTE, RODOVIA, LIGAÇÃO, MUNICIPIO, PETROLINA (PE), ESTADO DE PERNAMBUCO (PE), JUAZEIRO (BA), ESTADO DA BAHIA (BA).

O SR. MARCO MACIEL (PFL - PE. Pronuncia o seguinte discurso. Com revisão do orador.) - Ilustre Presidente desta sessão, Senador João Alberto, representante do Estado do Maranhão nesta Casa, Srªs e Srs. Senadores, o Professor Miguel Reale, jurista e filósofo - morto recentemente -, em artigo publicado no ano 2001, afirmou que a revisão de 1988 deveria ter começado pela reforma política, “a fim de ter um bem tecido sistema de poder com base numa organização partidária na qual não predominassem objetivos pessoais ou corporativos”.

Este, aliás, foi o propósito do PFL, sob a direção do Presidente Jorge Bornhausen, e de representantes do PSDB e do PMDB por ocasião da revisão constitucional.

Tal objetivo não chegou a se materializar. A revisão constitucional, como todos nós sabemos, infelizmente, por motivos e fatores externos - proximidade das eleições e desinteresse do Poder Executivo Federal - e internos, como a CPI do Orçamento, limitou-se a aprovar apenas seis emendas, todas elas de reduzida significação.

Urge, agora, Sr. Presidente, recolocar a questão institucional na agenda. Fazer com que as reformas políticas e, mais do que isso, reformas institucionais figurem como prioridade da agenda nacional. Para tal fim, são necessários, a meu ver, dois fatores. Em primeiro lugar, conscientizar e mobilizar o eleitorado para que reflita, por ocasião do exercício do voto nas eleições deste ano, sobre a crise em que o País se encontra submerso. É fundamental que o eleitor faça essa reflexão para que vote e escolha seus representantes, quer para o Legislativo quer para o Executivo, capazes de criar no País uma nova esperança. Além disso, é imprescindível que o Congresso Nacional a ser eleito em outubro e empossado em fevereiro do próximo ano coloque como sua primeira urgência operar as reformas institucionais.

Sr. Presidente, o Estado é, todos o sabemos, a mais relevante das instituições políticas e, talvez, a mais engenhosa construção da humanidade. Da República de Platão ao Leviatã de Hobbes, foram vinte séculos para se tentar explicar, entender e desvendar a complexidade que transformou as famílias em clãs, as cidades em nações e as nações em estados. Da fundação da ONU, aos nossos dias, o número de Estados filiados a essa organização internacional aumentou quase quatro vezes, passando dos cinqüenta e um que subscreveram a Carta de São Francisco, a cerca de duzentos hoje existentes. A despeito de o Estado ter passado por profundas mudanças que vão desde a polis ao Império, do Império ao feudo, do feudo à monarquia e da monarquia unitária à república federativa, não conhecemos mais que duas formas originais de sua organização: ou são unitárias ou compostas, isto é, federativas.

É possível adotarmos uma forma derivada mista, combinando federalismo e unitarismo, mas essa combinação não seria senão uma espécie a mais do mesmo gênero, ou seja, o semi-federalismo ou o semi-unitarismo. Por essa razão, Sr. Presidente, toda e qualquer alteração transcendente na vida das nações, a meu juízo, passa necessariamente pela reforma do Estado; em nosso caso, a reforma da Federação.

Nos dias atuais, a questão federativa tem ocupado a agenda política do País em torno de expressões atraentes como “repactuação federativa”. Aliás, houve o pacto? No Brasil, que há pouco mais de século passou da condição de estado unitário durante o Império para a federação, com a proclamação da República, pode até ser fascinante imaginarmos os delegados das antigas províncias reunidos numa convenção para negociarem com os Estados Unidos, entre 1776 e 1787, um pacto para o estabelecimento de nosso sistema federativo. Essa hipótese, porém, ainda que atraente, não passa de uma utopia sem qualquer base na realidade histórica.

No Brasil, Sr. Presidente - insisto -, não houve esse pacto federativo, e, quando ouço falar em repactuação, fico ainda mais preocupado porque não sei em que pressupostos essa repactuação se dará. Insisto: a Federação, que nasceu provisoriamente com o Decreto nº 1, de 1889, e se consumou com a Constituição de 1891, não foi pactuada, nem sequer seriamente debatida. A medida, adotada de forma provisória, transformou-se em permanente e assim se manteve, à exceção de 1898 a 1930, de 1930 a 1937 e de 1964 a 1988, quando tivemos regimes unitários de fato.

No primeiro período a que me referi - de 1898 a 1930 -, o regime unitário decorreu da chamada “política dos Estados” ou a chamada “política dos Governadores”, como se tornou conhecida. Na realidade, quem usava a expressão “política dos Estados” era o então Presidente da República Campos Salles, autor desta chamada “política dos Governadores”, que praticamente predominou em toda a República Velha.

No período de 1930 a 1945, tivemos, também, um tipo bem caracterizado de Estado unitário, sob a regência - se assim posso dizer - de Getúlio Vargas. Na realidade, a Constituição de 1937, por ele outorgada e que vigorou até 1945, proclamava-se Federativa, mas isso era apenas retórico, porque ele ignorou e fechou o Congresso e extinguiu o Senado, que, por excelência, é a Casa Federativa.

E o terceiro período, em que vivemos, de fato, num Estado unitário, foi durante a vigência dos Atos Institucionais que converteram as eleições para Presidente da República de diretas em indiretas, o mesmo acontecendo para Governadores e, depois, para os Municípios das capitais, os declarados de segurança nacional e os sediados na faixa de fronteira.

A organização federativa republicana brasileira foi concebida, pautada e tem sido sustentada, Sr. Presidente, por uma discriminação de rendas entre os entes federativos, de que resultou um sistema tributário simétrico num país assimétrico, tanto sob o ponto de vista geográfico quanto demográfico, e também - por que não dizer? - sob o ponto de vista econômico. As sucessivas Constituições sob as quais vivemos desde a Independência têm contribuído para manutenção desse desequilíbrio, que não guarda, contudo, relação de simetria com a distribuição de encargos e atribuições entre a União, os Estados - ficções jurídicas essenciais à concepção federativa - e os Municípios, estes, sim, a realidade federativa em que vivem os cidadãos. Somos, em conseqüência, uma Federação que reproduz os desequilíbrios existentes entre as demandas locais e regionais e a possibilidade de seu atendimento equilibrado por Estados e Municípios, aos quais as diferentes Constituições sempre impuseram um modelo concentrado e, ao mesmo tempo, concentrador do poder. A forma, Sr. Presidente, é efetivamente federativa, mas a substância, infelizmente, continua essencialmente unitária.

Prossigo, Sr. Presidente, observando que exemplos dessa deformação político-institucional encontram-se em todas as áreas. Eles vão desde a recente camisa de força imposta à liberdade de organização e funcionamento dos partidos políticos supostamente nacionais em seu desempenho, pela denominada “verticalização” das coligações, até avanços como a Lei de Responsabilidade Fiscal, que impõe modelos de gestão financeira indistintamente aplicáveis a municípios de mais de dez milhões de habitantes e aos que não chegam sequer a dez mil habitantes.

Os sistemas federativos equilibrados exigem princípios comuns de um lado e práticas adequadas às suas peculiaridades materiais do outro. Uma reforma institucional, portanto, pressupõe como requisito a concepção de um sistema fiscal e tributário compatível com as peculiaridades e responsabilidades dos entes federativos. A distribuição constitucional de encargos e competências deve ser, portanto, resultado da discriminação de renda proporcional à soma dos encargos que possam ser livres e eficientemente repartidos e assumidos pela União, pelos Estados e pelos Municípios, proporcionalmente às suas necessidades e adequadamente segundo suas possibilidades.

A multiplicidade de sistemas fiscais que têm por objeto os tributos e não os contribuintes respondem, em muitos casos, tanto pela elisão fiscal quanto pela corrupção, pela fraude e pela sonegação.

Uma reforma assim esboçada permitirá, a meu ver, que se defina, segundo uma nova federação, os sistemas eleitorais, partidários e de governo adequados e um modelo político com ela compatível. Sem adequarmos meios e fins e sem sopesarmos condicionantes e condicionamentos, um novo modelo de engenharia constitucional resultará, como até agora, o mais do mesmo. Dos acertos, sempre, sem dúvida, mas dos erros também.

Nestas condições, Sr. Presidente, a reforma do Estado pressupõe a prévia definição de um sistema fiscal e tributário simplificado, com custos mínimos de afetação para todos os contribuintes, segundo sua capacidade contributiva. Esse modelo deve ser adequado e criteriosamente definido em função das responsabilidades, atribuições e encargos de cada ente federativo, sem camisas-de-força que lhes imponham padrões inflexíveis, criação de impostos de cima para baixo, sem levar em conta as peculiaridades, exigências e condicionamentos regionais e locais.

Enfim, é preciso evitar os erros que até agora cometemos, de que resultam a sobreposição de serviços e atribuições que, além de onerarem custos, têm o condão, como o definiu o professor Robert Nozick, de transformar meios em fins.

Sr. Presidente, concluo as minhas palavras...

O Sr. Flexa Ribeiro (PSDB - PA) - V. Exª me permite um aparte, nobre Senador Marco Maciel?

O SR. MARCO MACIEL (PFL - PE) - Pois não. Concedo a palavra ao nobre Senador Flexa Ribeiro.

            O Sr. Flexa Ribeiro (PSBD - PA) - Senador Marco Maciel, quero parabenizá-lo pelo pronunciamento oportuno que V. Exª faz no momento em que se avizinha a mudança de poder, no próximo dia 1º de janeiro de 2007. V. Exª colocou aqui, com bastante propriedade, que o primeiro ato do novo Governo terá que ser o de dar seguimento ou dar início às reformas de base necessárias para que o nosso País encontre o caminho do desenvolvimento econômico e social de forma sustentada. Quero dizer a V. Exª que, ao se referir ao pacto federativo, há a questão da necessidade de se fazer uma revisão tributária, de tal forma que as obrigações e os deveres sejam conciliados com as fontes de recursos necessários à execução dessas obrigações e deveres por parte dos Municípios e dos Estados. Não é possível se continuar a ter mais de 60% de toda a riqueza nacional na forma de tributos pagos pela população concentradas na mão da União e apenas de 23% a 24% nas mãos dos Estados e em torno de 15% nas dos Municípios, pois é dos Estados e dos Municípios que a população cobra os serviços necessários à melhoria da qualidade de vida da população brasileira. Então, quero parabenizar V. Exª por trazer, neste instante, um assunto da maior importância para o futuro do nosso País.

O SR. MARCO MACIEL (PFL - PE) - Agradeço, ilustre Senador Flexa Ribeiro, pelo aparte substancioso de V. Exª, que fere a questão essencial de um pacto federativo, que é a distribuição de renda, a exigir, portanto, atenção prioritária do legislador brasileiro, mas também dos responsáveis pelos respectivos executivos federal, estaduais e municipais. Acredito que somente dessa forma vamos construir no Brasil uma verdadeira federação. Não uma federação meramente legal, mas uma federação real.

Aproveito a ocasião, Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, para, mais uma vez, cobrar do Governo Federal que reinicie a obra de duplicação da ponte sobre o rio São Francisco no trecho Petrolina-Juazeiro. Na realidade, a paralisação dessas obras está provocando grande constrangimento ao desenvolvimento da região. Essa ponte é essencial para a ligação do Nordeste com o Sul e o Sudeste do País. O fato de as obras terem sido adiadas está provocando um retardo na sua ampliação e criando, conseqüentemente, grandes dificuldades para o deslocamento das pessoas e a fluidez da economia.

Por ser a região onde se localiza a referida ponte, na BR-407, uma área de grande dinamismo, os problemas gerados têm provocado, naturalmente, grande redução das atividades econômicas, trazendo prejuízos sociais, inclusive no que diz respeito à geração de emprego. Daí porque reitero, como fez o então Senador José Coelho, que o Governo Federal, sobretudo o Ministério dos Transportes, libere os recursos para que as obras da ponte tenham continuidade.

Muito obrigado a V. Exª, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/05/2006 - Página 17733