Discurso durante a 65ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Denúncias contra o novo "valerioduto" do Governo, o Ministério das Cidades.

Autor
Antonio Carlos Magalhães (PFL - Partido da Frente Liberal/BA)
Nome completo: Antonio Carlos Peixoto de Magalhães
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • Denúncias contra o novo "valerioduto" do Governo, o Ministério das Cidades.
Publicação
Publicação no DSF de 24/05/2006 - Página 17748
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • DENUNCIA, GRAVIDADE, CORRUPÇÃO, MINISTERIO DAS CIDADES, LIBERAÇÃO, RECURSOS, FUNDO NACIONAL, HABITAÇÃO, INTERESSE SOCIAL, CRITICA, CONGRESSO NACIONAL, APROVAÇÃO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), ABERTURA, CREDITO EXTRAORDINARIO, QUESTIONAMENTO, URGENCIA, ALEGAÇÕES, PERIODO, ELEIÇÕES, PROTESTO, CRITERIOS, FAVORECIMENTO, POLITICA PARTIDARIA, EXPECTATIVA, INVESTIGAÇÃO, TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO (TCU), MINISTERIO PUBLICO FEDERAL.
  • CRITICA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, VISITA, ESTADO DA BAHIA (BA), MANIPULAÇÃO, OPINIÃO PUBLICA, REFERENCIA, OBRAS, GOVERNO ESTADUAL.

O SR. ANTONIO CARLOS MAGALHÃES (PFL - BA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. raros Senadores, a vida política, em seus momentos mais críticos, deveria ter uma atuação mais presente do Congresso Nacional. Infelizmente, isso não está ocorrendo. Vimos na sessão de ontem quatro Senadores; hoje o número é de 46, mas o plenário está vazio. Ora, Sr. Presidente, nunca como hoje seria necessário que este plenário estivesse completo, porque vou fazer uma denúncia, das mais graves que já fiz nesta Casa - e já fiz muitas -, em relação ao novo “valeriodouto” do Governo, que se chama Ministério das Cidades.

As últimas ações do Governo e o que disse o Presidente Lula ontem sobre gastos em período eleitoral fazem crer que ambos perderam de vez a compostura. O que o Governo faz agora no Ministério das Cidades com o Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social é um acinte. Mais um escândalo com as verbas do Orçamento da União. Tudo - a forma, o volume de recursos, a pressa - aponta para um novo esquema igual ao do “valerioduto”. E isso, Sr. Presidente, graças à Medida Provisória nº 279 deste ano, aprovada pelo Congresso, que é culpado - o Congresso é culpado, que me ouça o Presidente Renan -, no dia 17 de maio, que liberou crédito extraordinário de R$890 milhões ao Ministério das Cidades - recursos do Fundo Nacional de Habitação.

Tenho dito ao meu Partido - e repito agora - que não se deve votar nenhum crédito extraordinário nesta Casa, porque quase todos são para roubar.

O Fundo de Habitação, constituído para construir e melhorar moradias para pessoas de baixa renda, foi o primeiro projeto de iniciativa popular a ser aprovado no Congresso Nacional. Criado em junho de 2005, até hoje não está regulamentado. Com a regulamentação, deverá ser constituído um Conselho Gestor, formado por 12 membros, metade do Governo, metade da sociedade civil organizada. Já é um perigo essa metade, como o Governo vai fazer. Conheço o Governo e conheço como o Presidente Lula age.

Mesmo sem Conselho para geri-lo e fiscalizá-lo, o Fundo recebeu este ano quase R$1 bilhão.

O Governo Lula faz com o Fundo de Habitação o mesmo que vem fazendo com o Fundo de Combate à Pobreza: utiliza-se de uma medida de alcance social para fazer politicagem da pior espécie. Basta ver como vem agindo nesse caso.

Vejam a rapidez do Governo para gastar. Chamo a atenção dos Srs. Senadores, em particular do Senador Jefferson Péres, cuja conduta sempre deve ser ressaltada neste Congresso. O Congresso ainda analisava a Medida Provisória nº 279 e o Ministério das Cidades já recebia propostas, muitas preparadas por empreiteiros e lobistas - lembremos que ela foi aprovada no dia 17. Em menos de quarenta dias, 99,7% dos recursos já estavam empenhados! Isso é coisa nunca vista na política brasileira! A Caixa recebeu os ofícios do Ministério das Cidades, com a relação de beneficiários e, prontamente, efetuou os empenhos de 235 convênios pelo País afora.

A verdade é que temos em marcha um novo escândalo. Ou isso ou então estamos diante da “proeza de eficiência” em um Governo que até agora apenas mostrava paralisia. E não venham dizer que a pressa é ditada por exigências legais face ao calendário eleitoral, como o Presidente da República disse ontem, cinicamente, na televisão. É mentira, digo eu. Lula mentiu ontem como tem mentido todas as vezes.

É inexplicável o volume de recursos, muito superior ao previsto nos Orçamentos de 2005 e 2006. Senão, vejamos: em 2005, o Governo destinou ao Fundo de Habitação R$58 milhões. Destinou, mas não gastou nada. Em “restos a pagar” liquidou míseros R$672 mil, menos de 1% do previsto. No Orçamento de 2006 estavam previstos R$185 milhões; veio a Medida Provisória, com esse crédito cínico, e o Congresso Nacional, sem examinar, aprova tudo, merecendo, portanto, também o repúdio popular, como o Presidente da República. A farra destinou esse dinheiro, R$890 milhões, 265% a mais do que se previa nos Orçamentos de 2005 e 2006.

Numa passada de olhos, os valores empenhados tornam nítido o uso político e a troca de favores. Não há um padrão de distribuição de recursos que obedeça aos ditames constitucionais. Municípios de tamanho, população e índices de desenvolvimento completamente diferentes recebem montantes praticamente iguais. Vejam o caso da Bahia, por exemplo - mas isso ocorreu em todos os Estados do Brasil: cinco Municípios totalmente distintos - Salvador, Camaçari, Camamu, Valença e Itabuna - receberam R$9,75 milhões cada um. Ilhéus ficou com R$9,26 milhões e Lauro de Freitas com R$6,65 milhões. Enquanto isso, ao Governo do Estado, que domina 417 Municípios, foram destinados R$3,7 milhões. Exatamente o mesmo ocorreu nos outros Estados. Os documentos estão aqui, todos eles. É de estarrecer!

Quem é deste Governo deve ficar com as barbas de molho, porque isso não vai ficar assim. O Ministério Público vai tomar providências e o Tribunal de Contas também, já que a Controladoria-Geral da União só toma providências em relação a fatos que não dizem respeito ao Governo.

Os partidos da base do Governo, mesmo administrando um número menor de prefeituras, ficaram com mais da metade dos recursos. O recordista, é claro, foi o PT, que abocanhou 22%. O PFL recebeu 5,6%, mas de uma maneira interessante, que deve ter-se dado também com os outros partidos: para Municípios que não solicitaram, mas que os colegas da base aliada querem tomar por meio de recursos da União. Querem comprar Municípios como compraram Deputados, e não aconteceu nada porque a maioria foi absolvida por um Congresso imoral.

Quero dizer, portanto, que o PSDB, com o dobro do número de administrações, recebeu metade do que recebeu o Partido dos Trabalhadores.

Há também números mágicos. O critério de definição do montante a ser destinado é tão estranho quanto suspeito. Inúmeros Municípios foram contemplados de forma rigorosamente igual. Por exemplo: os Governos do Amapá e do Rio de Janeiro e as Prefeituras de São João do Meriti, Magé, Natal, Cuiabá, Jaboatão e Porto Velho receberam, todos, R$9,75 milhões. Que coincidência é essa do mesmo número para esses Municípios? Os projetos são iguais? As empreiteiras são as mesmas? A roubalheira é idêntica?

Sr. Presidente, existem outros números mágicos: vinte e sete localidades receberam R$292 mil e dez receberam R$390 mil. Esses são os números. Essa aqui é a prova, tirada do Siaf.

Peço providências ao Tribunal de Contas da União, peço providências ao Ministério Público. Enviarei requerimentos ao Ministério das Cidades para saber como isso acontece.

Sr. Presidente, eu não vou ficar parado. Por mais que o Congresso queira ficar inerte, eu não ficarei. Eu sempre estarei nesta tribuna reclamando e clamando pela moralidade pública num Governo desonesto, tão desonesto que nos seus programas de ontem - e isto será o meu assunto de amanhã - apresentou todas as obras do Estado como se fossem dele. É de um cinismo total.

Outro dia, ele foi visitar a fábrica da Ford, se julgando o autor daquela façanha que cabe a nós, ao Governador César Borges e a mim, que tivemos que lutar com o Presidente Fernando Henrique para levar a Ford para a Bahia. Foi uma luta que terminou gloriosa pela coragem dos baianos, do seu Governador à época e também pela minha coragem de dizer ao Presidente que romperíamos com o Governo Federal se tentasse prejudicar a ida da Ford para Bahia.

Ele foi visitar também uma fábrica de pneus que era negociada desde o tempo de César Borges e que Paulo Souto conseguiu levar da Alemanha para a Bahia. Foi visitar e passou como o dono da idéia.

O Prodeb, que até hoje não foi sequer votado, passa na propaganda política como já dando benefícios de mais de 4 bilhões, quando mais de 4 bilhões serão dados somente ao final de quatro anos.

É assim que nós estamos vivendo: da impostura, da falta de vergonha de governantes e também de Senadores e Deputados que permitem votar nesta Casa coisas que não poderiam ser votadas.

Quero dizer a V. Exª, Sr. Presidente, que, com ou sem Líder, ninguém vai me fazer votar crédito extraordinário aqui nesta Casa, a não ser por calamidade pública. Eu não vou alimentar o furto que já é feito para as eleições deste ano.

Ontem, o Lula se queixava de que só se pode fazer esse tipo de roubalheira até o fim de junho; ele queria roubar até o fim. A lei já impede. Portanto, quero fazer, da minha parte, um apelo: Presidente, não roube até junho! Deixe de roubar de hoje em diante! Faça, em seu governo, uma mudança total! Não deixe haver mais “valeriodutos”, não deixe haver compra de deputados, não deixe, afinal de contas, que a imoralidade tome conta de um país que tem tudo para crescer moralmente e com desenvolvimento e, sobretudo, com justiça social!

A justiça social do Governo nós vimos, ainda hoje, com o depoimento de Delúbio Soares, que não tinha e nem tem qualquer lastro em qualquer banco. Mesmo assim, o Banco Rural e o Banco de Minas Gerais, que já deviam ter sido fechados pelo Banco Central, emprestaram a ele, sem lastro qualquer, R$55 milhões.

Essa tem sido a tristeza que nós temos visto neste País. Todos acham muito bom tudo isso, cada um vai para seu lugar pensando que o povo não está olhando a vergonha que se passa no Governo, muitas vezes com o apoio do Senado e da Câmara, principalmente desta.

Sr. Presidente, precisamos mudar esse ritmo ou, como disse Café Filho certa vez, eu direi: lembrai-vos de 37, lembrai-vos de 64, senão, evidentemente, quem vai fazer a revolução não são os militares, mas o povo, contra todos nós.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/05/2006 - Página 17748