Discurso durante a 65ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Denuncia operação da empresa Rio Tinto, segunda maior mineradora do mundo, para aumentar as vendas australianas de minério de ferro, em detrimento dos interesses comerciais brasileiros.

Autor
Antonio João (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/MS)
Nome completo: Antonio João Hugo Rodrigues
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA MINERAL.:
  • Denuncia operação da empresa Rio Tinto, segunda maior mineradora do mundo, para aumentar as vendas australianas de minério de ferro, em detrimento dos interesses comerciais brasileiros.
Aparteantes
João Batista Motta, Juvêncio da Fonseca, Ramez Tebet.
Publicação
Publicação no DSF de 24/05/2006 - Página 17767
Assunto
Outros > POLITICA MINERAL.
Indexação
  • DETALHAMENTO, ATUAÇÃO, EMPRESA MULTINACIONAL, MINERAÇÃO, MUNICIPIO, CORUMBA (MS), ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL (MS), EXTRATIVISMO, JAZIDAS, MINERIO, FERRO, EXPORTAÇÃO, AUSENCIA, BENEFICIAMENTO, DENUNCIA, OMISSÃO, PROMESSA, CRIAÇÃO, POLO INDUSTRIAL, SIDERURGIA, ATENDIMENTO, INTERESSE, PAIS ESTRANGEIRO, AUSTRALIA, APROVEITAMENTO, NEGLIGENCIA, LEGISLAÇÃO, BRASIL, PROTEÇÃO, INTERESSE NACIONAL, COMPARAÇÃO, GOVERNO ESTRANGEIRO, INDIA.
  • REGISTRO, IRREGULARIDADE, EMPRESA ESTRANGEIRA, ATUAÇÃO, FAIXA DE FRONTEIRA, ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL (MS), OMISSÃO, DEPARTAMENTO NACIONAL DE PRODUÇÃO MINERAL (DNPM), MINISTERIO DE MINAS E ENERGIA (MME), CONCLAMAÇÃO, COBRANÇA, CUMPRIMENTO, LEGISLAÇÃO.

O SR. ANTÔNIO JOÃO (PTB - MS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, hoje é o meu dia de estréia neste Plenário. Com muito cuidado, trago um discurso escrito que vou ler, pedindo a atenção de todos.

É um assunto que considero de alta relevância para o Brasil, em especial para o meu Estado, Mato Grosso do Sul. Trata-se de uma questão que afeta a economia brasileira e até mesmo a soberania nacional, assunto que há de preocupar os que pensam, com seriedade, o nosso destino comum.

Srªs e Srs. Senadores, está em curso, em nosso País, uma operação de interesse internacional, para que uma das maiores jazidas mundiais de minério de ferro granulado seja usada para aumentar as vendas australianas de minério de ferro, em detrimento dos interesses comerciais brasileiros.

A jazida a que me refiro é a Mineração Corumbaense Reunida (MCR), localizada no Município de Corumbá, e a empresa responsável pela manobra é a Rio Tinto, a segunda maior mineradora do mundo, uma empresa poderosa, de origem anglo-australiana, com sede na cidade de Londres.

Essa mineradora está presente em Corumbá há mais de uma década. Opera a jazida MCR desde 1991 e vem praticando uma política de exploração puramente extrativista, voltada unicamente à exportação. Eles retiram a nossa riqueza do subsolo, mandam agregar valor lá fora e, quando as nossas jazidas se exaurirem, vão nos abandonar depois de acabar com o minério do Brasil e do meu Mato Grosso do Sul.

Embora a Rio Tinto garanta que tem planos de desenvolver um pólo minero-siderúrgico em Corumbá, o que realmente importa para a MCR é seguir a política ditada pelos interesses internacionais da Mineradora Rio Tinto mesmo, ou seja, recuperar suas vendas globais para o mercado europeu.

As jazidas de minério de ferro em Corumbá são áreas de extração de classe mundial e adquirem ainda maior importância por figurarem na lista das últimas grandes reservas mundiais de minério de ferro granulado de alto teor.

O uso do minério granulado proporciona enormes vantagens na redução dos custos para a produção de aço. Atualmente, apenas as empresas australianas produzem quantidades expressivas desse minério granulado, produto usado como chamariz para a tal “venda casada” de outros produtos de pior qualidade, mediante a estratégia de vendas do tipo “guaraná com cerveja”.

Esse método foi usado com muito sucesso no mercado europeu. As usinas com planta na Europa necessitam fazer uso do minério granulado, e as empresas australianas condicionavam a venda desse produto à inclusão de minérios finos de pior qualidade, em prejuízo à economia brasileira, pois subtraíam mercado das nossas empresas, produtoras de finos de alta qualidade.

Tal cenário sofreu mudanças nos últimos três anos por conta do aumento de vendas na Ásia, fato que obrigou os empresários australianos a reduzir suas vendas de granulado na Europa para preservar suas reservas na Austrália, que estão se exaurindo e não podem mais sustentar o aumento da produção.

Assim, desprovida de granulados, a Austrália não manteve suas vendas de finos, tendo sofrido uma dramática perda de mercado. O efeito da queda nas vendas, combinado com a exaustão das jazidas australianas de minério granulado, tornou prioritária, para os nossos concorrentes, a aquisição de novas reservas de minério fino em outros países.

Foram à Índia, um dos principais alvos da estratégia australiana, uma vez que o país conta também com significativas jazidas de minério granulado, embora de qualidade muito inferior ao minério de Corumbá. Os indianos, entretanto, impuseram sérias restrições, Senador Juvêncio, aos novos investidores estrangeiros, uma vez que não aceitaram o projeto meramente exportador das indústrias e das mineradoras australianas.

Atualmente, as licenças de exploração de reserva de minério de ferro na Índia estão condicionadas a uma agregação de valor de, no mínimo, 70% da produção de minério, dentro do território indiano, para uma exportação máxima de 30%, Senador Ramez Tebet.

Srªs e Srs. Senadores, apesar do poderoso lobby das mineradoras australianas, o governo da Índia manteve-se firme em seus projetos e não permitiu a exploração da forma como é feita em nosso País e dentro, Senador Juvêncio, do nosso Mato Grosso do Sul.

Até mesmo a poderosa BHPBilliton, concorrente da Rio Tinto, acabou curvando-se às exigências do governo indiano, muito mais zeloso, com certeza, do que o nosso, e está se associando à Posco, empresa coreana, para exploração conjunta de uma jazida na Índia, com a instalação de uma siderúrgica capaz de produzir, anualmente, três milhões de toneladas de aço.

Como não deu certo na Índia, a Rio Tinto voltou os seus olhos, ainda mais famintos, para as nossas reservas brasileiras, em especial as de Corumbá, onde está no comando há 10 anos. Ela tem um projeto para exportar 15 milhões de toneladas do produto para a Europa. Lá irão agregar valor ao nosso minério de ferro e nós vamos ficar como simples fornecedores de minério.

O problema que impede a Rio Tinto de fazer essa exploração é que existe a Lei da Faixa de Fronteiras, que impede o controle acionário de empresas de mineração por mineradoras estrangeiras, situação em que se encontra a Rio Tinto até agora, Senador Ramez.

Para contornar o problema - e eles são espertos -, anunciaram que iriam criar um pólo minero-siderúrgico em Corumbá. Foi uma solenidade de que se recordam V. Exªs, a que esteve presente o Presidente Lula, juntamente com a Ministra Dilma Rousseff. Assinaram protocolos mil e até hoje não aconteceu absolutamente nada, porque não interessa a eles que aconteça.

O Sr. Juvêncio da Fonseca (PSDB - MS) - V. Exª me concede um aparte?

O SR. ANTÔNIO JOÃO (PTB - MS) - Concedo o aparte a V. Exª.

O Sr. Juvêncio da Fonseca (PSDB - MS) - Senador Antonio João, faço um apelo à Mesa para o discurso de V. Exª receba tolerância quanto ao tempo, especialmente porque, ao que me parece, esta é a estréia de V. Exª na tribuna do Senado, que já era esperada por todos nós. V. Exª, como suplente do Senador Delcídio Amaral, em sua ausência, está aqui cumprindo o seu mandato. V. Exª é um homem de experiência, que traz uma bagagem muito grande, em função de sua atividade jornalística, principalmente no Estado de Mato Grosso do Sul. Posso dizer que privo da amizade de V. Exª há mais de trinta anos.

O SR. ANTÔNIO JOÃO (PTB - MS) - É verdade.

O Sr. Juvêncio da Fonseca (PSDB - MS) - Lembro-me de que, quando eu era chefe de gabinete de prefeitura, V. Exª era fotógrafo do jornal.

O SR. ANTÔNIO JOÃO (PTB - MS) - Isso mesmo.

O Sr. Juvêncio da Fonseca (PSDB - MS) - Lembro-me do estalar do disparo da máquina, ainda na rodoviária. Portanto, a vinda de V. Exª para o Senado Federal é a consagração do seu trabalho, da sua inteligência, da sua pertinácia e insistência no trabalho sério em favor de Mato Grosso do Sul. A colocação que faz V. Exª sobre os minérios, não somente de Corumbá, mas do Brasil inteiro, é de uma importância muito grande. Sabemos perfeitamente que Corumbá é uma cidade que detém uma reserva muito grande de minérios. O interessante é o minério de manganês junto com o minério de ferro.

O SR. ANTÔNIO JOÃO (PTB - MS) - Sim; de ferro.

O Sr. Juvêncio da Fonseca (PSDB - MS) - Justamente os dois minérios que são essenciais para a fabricação do aço. Junto dessa usina passa o gasoduto, e o gás natural serve para transformação do minério de ferro em ferro gusa, que é matéria-prima para o aço. Portanto, temos tudo na mão, ali em Corumbá. No entanto, estamos vendo, há muito tempo, desde a época da United States Steel, que explorava principalmente o nosso manganês, essa nossa riqueza que não é renovável, saindo das nossas fronteiras pelo rio Paraguai, naquelas chatas enormes que transportam essa riqueza imensa para outros países, que, como disse V. Exª, não têm minério, mas levam o nosso e vão formando aquelas montanhas, como se fossem verdadeiras minas naturais, mas certamente são nossas minas que perdemos pela exportação. Portanto, deixo minha homenagem a V. Exª, pelo discurso que faz, pela iniciativa de trazer esse assunto para o conhecimento de todos nós e do Brasil, pois se trata de tema de suma importância, relacionado com os interesses nacionais, principalmente neste período em que precisamos de afirmação econômica, sobretudo mediante o potencial energético de nossos minerais. Parabéns pelo seu pronunciamento, Senador Antônio João!

O SR. ANTÔNIO JOÃO (PTB - MS) - Muito obrigado, Senador Juvêncio da Fonseca.

O SR. PRESIDENTE (Garibaldi Alves Filho. PMDB - RN) - Senador Antônio João, atendendo à justa solicitação do Senador Juvêncio da Fonseca, já prorrogamos o tempo de V. Exª por cinco minutos.

O SR. ANTONIO JOÃO (PTB - MS) - Muito obrigado, Sr. Presidente. Esse tempo será mais do que suficiente.

Senador Juvêncio da Fonseca, quando houve aquela famosa reunião em Campo Grande, os Diretores da Rio Tinto disseram que iam instalar a siderúrgica, que iam promover o desenvolvimento do Estado. Contudo, não fizeram nada. Isso é muito triste para o meu Estado e para o Brasil.

O Sr. Ramez Tebet (PMDB - MS) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. ANTÔNIO JOÃO (PTB - MS) - Pois não, Senador Ramez Tebet.

O Sr. Ramez Tebet (PMDB - MS) - Senador Antônio João, fico muito contente de estar neste plenário quando V. Exª faz sua estréia nesta Casa, alertando para os interesses do Brasil e de Mato Grosso do Sul. V. Exª trata de assunto de suma importância, que realmente já está despertando o interesse nacional, mas com nada de prático. O minério se encontra lá, como diz V. Exª, vai para outros países e não é explorado. Agora, há uma questão importante que eu queria ressaltar: V. Exª defende Mato Grosso do Sul e, principalmente, Corumbá, onde estão localizadas essas jazidas, a maior jazida de minério de ferro e de manganês do mundo. E Corumbá jaz ali num esquecimento total - essa é a verdade. Corumbá é uma cidade isolada. Tenho certeza de que V. Exª, ao fazer esse pronunciamento, está com seu coração, com seu raciocínio e com sua inteligência voltados para Corumbá, para Mato Grosso do Sul e para o Brasil. V. Exª não poderia escolher outro assunto para sua estréia que não esse. Parabéns! Fico feliz com isso.

O SR. ANTÔNIO JOÃO (PTB - MS) - Muito obrigado, Senador Ramez Tebet.

Falamos de Corumbá, onde estão as maiores jazidas, falamos de Mato Grosso do Sul, mas, sobretudo, falamos de Brasil, porque isso ocorre não só com o nosso minério de ferro lá, mas também com todas as nossas outras jazidas, em todo o País, que são, em sua absoluta maioria, exploradas por estrangeiros. É tudo mandado para fora, e ficamos a ver navios.

O Sr. João Batista Motta (PSDB - ES) - V. Exª me permite um aparte, com a autorização do Presidente?

O SR. ANTÔNIO JOÃO (PTB - MS) - Com prazer, ouço V. Exª.

O Sr. João Batista Motta (PSDB - ES) - Senador, eu também queria trazer meus parabéns a V. Exª pelo pronunciamento que faz. Não poderia ser um assunto mais importante para que V. Exª pudesse estrear neste Senado. As nossas riquezas são grandes, são enormes, como as do seu Estado, que estão sendo cantadas e decantadas em seu discurso e nos apartes de seus companheiros. No Estado de Minas Gerais, também há uma série de enormes jazidas de ferro, de manganês e de ouro. Há jazidas também no Estado do Maranhão e no Estado do Pará. O Brasil é riquíssimo em todo tipo de mineral, desde o urânio até o ouro, a prata e o alumínio. É Pena, Senador, que este Governo esteja entregando tudo isso absolutamente de graça a outros países, principalmente à China, para que esta possa industrializar os minérios e revendê-los para outros países do mundo! Isso é uma vergonha, Senador! No momento em que a Bolívia praticamente corta o fornecimento de migalhas de toneladas de gás para cá, defendendo seu território e sua riqueza, prejudicando o Brasil e quebrando contratos, entregamos tudo gratuitamente, sem que se pague um centavo de imposto. E, para nossa maior vergonha, recentemente, neste Senado Federal, foi aprovada, por meio da 255, a isenção na importação de maquinário que vai retirar essa riqueza do nosso subsolo, riqueza que será mandada para outros países. Agora, eles não pagam nem quando exportam nem quando importam. Por isso, o Bradesco, dono da Vale do Rio Doce, e essas outras grandes empresas só têm a comemorar essa insensatez e essa irresponsabilidade cometidas pelo Presidente Lula. Muito obrigado.

O SR. ANTÔNIO JOÃO (PTB - MS) - Muito obrigado pelo aparte. Mas a verdade, Sr. Senador João Batista, Srªs e Srs. Senadores, é que a Rio Tinto está em situação irregular no Brasil desde 1999, há mais de sete anos, quando requereu assentimento prévio da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República para a mudança de sua composição societária, ocasião em que recebeu parecer desfavorável.

O próprio Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República solicitou, em 2 de agosto de 2002, ao Departamento Nacional da Produção Mineral (DNPM), do Ministério de Minas e Energia, que adotasse as providências cabíveis, pelo fato de a MCR ser empresa estrangeira, impedida, portanto, de atuar em faixa de fronteira.

E onde está o DNPM? O que o DNPM fez? O que o Ministério de Minas e Energia fez? Nada. E o nosso minério de ferro continua saindo. Pelo ritmo que os anglo-australianos querem, em 40 anos a nossa primeira jazida vai estar absolutamente exaurida, e o Brasil não terá mais nada a comemorar, a não ser a morte da sua jazida de minério.

Então, Srs. Senadores, para encerrar, é hora de exigirmos o cumprimento da legislação mineral vigente, a exemplo do governo indiano, que condiciona a outorga do direito de lavra de reservas de minério de ferro à agregação de valor, na Índia, de parcela relevante da produção de cada mina.

É hora de darmos um basta nessa situação, garantindo aos brasileiros o controle do subsolo e das nossas riquezas minerais, além da soberania plena sobre o nosso território.

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/05/2006 - Página 17767