Discurso durante a 70ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Questionamentos sobre o problema da fome no Brasil e as estatísticas divulgadas pelo governo sobre o tema. (como Líder)

Autor
Leonel Pavan (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/SC)
Nome completo: Leonel Arcangelo Pavan
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL.:
  • Questionamentos sobre o problema da fome no Brasil e as estatísticas divulgadas pelo governo sobre o tema. (como Líder)
Publicação
Publicação no DSF de 31/05/2006 - Página 18490
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • COMENTARIO, DIVERSIDADE, ESTATISTICA, FOME, BRASIL, REGISTRO, DADOS, INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATISTICA (IBGE), INSTITUTO DE PESQUISA ECONOMICA APLICADA (IPEA), GRAVIDADE, SITUAÇÃO, FALTA, SEGURANÇA, ALIMENTAÇÃO, POPULAÇÃO, DESIGUALDADE SOCIAL, DESIGUALDADE REGIONAL, INCIDENCIA, PROBLEMA, RAÇA, NEGRO, QUESTIONAMENTO, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, ALCANCE, PROGRAMA ASSISTENCIAL, DESCUMPRIMENTO, PROMESSA, CAMPANHA ELEITORAL, MANIPULAÇÃO, OPINIÃO PUBLICA.

O SR. LEONEL PAVAN (PSDB - SC. Pela Liderança do PSDB. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, quero agradecer ao Senador Eduardo Siqueira Campos por também entender a nossa inscrição. Às vezes, aqui se dá espaço para um e para outro, e alguns Senadores acabam não usando mais da tribuna.

Como o tema também é importante, fiz a minha inscrição e prefiro fazer meu pronunciamento agora. Registro a presença aqui da Comissão que está levantando a situação dos miseráveis em nosso Brasil que não são poucos.

Miséria sem tamanho. Venho hoje falar dessa problemática vergonhosa que coloca nossos corações na mão e com a qual jamais deveríamos ter de conviver. O problema da fome no Brasil começa pelos números. Os institutos não se entendem sobre quantos são os famintos, produzem estatísticas distintas, cada uma com um critério diferente, que vai da renda mensal à quantidade de calorias diárias consumidas. Os dados variam muito, e as diferenças por si sós já mostram o tamanho do problema.

A última pesquisa do IBGE, revelada há duas semanas, diz que quase 14 milhões, ou melhor, 13.921 milhões de pessoas passaram fome no Brasil em 2004. Repito: quase 14 milhões de pessoas no Brasil passaram fome em 2004. A estimativa nos dá um índice de 7,7% da população total que vive em domicílios caracterizados por um “estado de insegurança alimentar grave”!. Isso significa dizer que essa parcela da população convive com o fantasma da fome “quase todos os dias”, “alguns dias” ou “um ou dois dias” por mês. São pessoas que não têm acesso a alimentos em quantidade ou em qualidade adequadas e que temem sofrer restrições ainda maiores no futuro.

Os Estados do Norte e do Nordeste lideram a trágica estatística, com mais da metade da população vivendo em um ambiente onde a quantidade de alimento disponível para a família é insuficiente para garantir a sobrevivência em condições dignas. E aqui poderíamos enumerar inúmeros Estados com percentuais gravíssimos daqueles que passam pela “insegurança alimentar grave”.

E as estatísticas que aqui são dadas - que me permito depois apenas deixar registradas nesta Casa -, número bastante intenso, mostram números que realmente preocupam qualquer cidadão brasileiro, principalmente aqueles que são levados pela onda de que o atual Governo está investindo na alimentação para os pobres, está investindo em três refeições diárias para os pobres.

A estatística comprova, além da miséria, uma brutal desigualdade social neste País. A desigualdade regional é confirmada mais uma vez quando analisada a situação da residência da população, se urbana ou rural. No Norte e Nordeste a segurança alimentar grave apresentou proporções mais elevadas na área rural, enquanto no Sul e no Centro-Oeste ocorreu o inverso, em maiores proporções nas áreas urbanas - são estudos do IBGE.

Segundo levantamento, dos 8 milhões de residências em que algum morador recebeu dinheiro de programa social de governo, 52,1% estavam localizados na Região Nordeste, 27,7% no Sudeste, 10,7% no Sul, 8% no Norte e 6,5% no Centro-Oeste. Então, aquilo que dizem que estão direcionando investimentos para o Norte e o Nordeste, que estão investindo nos que têm fome é só mídia, e com isto acaba iludindo a maioria da população brasileira que acha que há um investimento nesse setor.

E, como se não bastasse, a insegurança alimentar reforça também a desigualdade econômica entre raças.

Em 2004, vivam no Brasil em situação de insegurança alimentar grave 11,5% da população negra ou parda. Entre os brancos, o percentual cai para 4,1%.

A definição de segurança alimentar, Sr. Presidente, é o direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, tendo como bases práticas alimentares promotoras da saúde, que respeitem a diversidade cultural e que sejam social, econômica e ambientalmente sustentáveis.

O resultado do estudo encomendado pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, chamado de Segurança Alimentar, indica que a promessa repetida incessantemente por Lula durante a campanha eleitoral, de que todos os brasileiros fariam, no mínimo, três refeições diárias, está longe de ser concretizada - e o Governo está acabando.

Eu queria muito que a promessa tivesse saído do papel. Mas todas as áreas que influenciam diretamente essas estatísticas não foram bem tratadas nesse atual Governo. Quantas vezes viemos aqui suplicar para que nosso Presidente olhasse para os pequenos agricultores, que valorizasse essa atividade! E não só isso, o Governo mascara a ineficiência e a incapacidade de resolver esse problema com um programa que só deu certo na parte publicitária.

Tomando como base dados do Mapa da Fome do Ipea - Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada - do Ministério do Planejamento, o Governo apresentou como prioridade uma proposta de Política Integrada de Segurança Alimentar e Combate à Fome, ou seja, o Projeto “Fome Zero”. A fome continua com números antes desse zero. Números assustadores! A sociedade civil, no entanto, tem-se organizado e demandado um posicionamento minimamente coerente do Poder Público para o enfrentamento de uma realidade já tão bem diagnosticada.

Não basta o Presidente mascarar com suas políticas mercadológicas de grande impacto.

O País inteiro chora, Sr. Presidente, e sente as dores causadas pela falta do Governo! Falta do pai e da mãe que eles elegeram para não esquecerem que precisam se alimentar, que precisam não só de doações, mas de incentivos, de ensinar a auto-subsistência, de favorecê-los em quaisquer circunstâncias!

A complexidade da questão exige a abordagem, em simultâneo, de aspectos estruturais e conjunturais, e se constitui em um dos grandes desafios do atual Governo e da sociedade civil organizada. Isso não é brincadeira e nem bandeira a ser levantada em ano eleitoral. É uma prioridade máxima na gestão de qualquer governo, mesmo que queiram roubar, mentir, extorquir. Mesmo um governo fraudatório deveria ter ao menos um dia de ser humano e colocar a mão no peito e se deixar invadir pelo espírito humanitário e, depois, arrastar a mão para o estômago cheio de delícias, tão ocupado que não cabe mais nem um gole d’água e, assim, pensar como seria não ter o que comer, acordar e não saber se pode levantar-se, pois o corpo já não tem energias.

Para que não fiquem dúvidas: a gravidade do problema se expressa, tanto pelo grande número de pessoas que convivem com a fome, quanto pelo número ainda maior de pessoas - quase 40% da população - que não sabem se terão dinheiro para repor a comida que têm.

Por isso, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, peço encarecidamente aos atuais líderes do Governo que pesem as minhas palavras proferidas hoje.

Não vamos deixar que esses números continuem a crescer ou que permaneçam como estão! Que o menor índice, os dois por cento de Santa Catarina, não nos alivie em face de tanta crise, mas nos deixe completamente conturbados.

Sr. Presidente, fiz questão de fazer este pronunciamento porque nós percorremos o Brasil, como V. Exª. Dizem que o Lula está bem nas pesquisas, porque está investindo nos pobres, está ajudando os miseráveis. É mentira! Aqui estão os dados, Senador Flecha Ribeiro, mostrando que 14 milhões de pessoas estão passando fome, não têm o que comer!

No entanto, alguns dizem que o Lula está ajudando a população. É claro que milhares de pessoas estão sendo atendidas, mas isso é obrigação, há investimentos previstos no Orçamento com essa finalidade. Mas não se pode mentir dizendo que todos os brasileiros estão sendo assistidos. Há quatorze milhões de pessoas correndo o risco de virem a perder suas vidas porque não têm o que comer.

Acorda, Presidente, tens de fazer muito ainda! Estamos torcendo para que, pelo menos até o final do mandato, destine ao Orçamento os recursos corretamente para atender aos famintos, aos miseráveis que estão com o pires na mão esperando que Vossa Excelência cumpra pelo menos a promessa de que todos tenham três refeições diárias, como divulgou no mundo inteiro. Vossa Excelência disse que todos os brasileiros, sem exceção - até o mais pobre, o mais miserável -, teriam esse direto durante seu mandato.

Infelizmente, essa é mais uma promessa que não foi cumprida!


Este texto não substitui o publicado no DSF de 31/05/2006 - Página 18490