Discurso durante a 57ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comemorações pela passagem dos cento e oitenta anos do Senado Federal.

Autor
Serys Slhessarenko (PT - Partido dos Trabalhadores/MT)
Nome completo: Serys Marly Slhessarenko
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Comemorações pela passagem dos cento e oitenta anos do Senado Federal.
Publicação
Publicação no DSF de 12/05/2006 - Página 16101
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM, ANIVERSARIO DE FUNDAÇÃO, SENADO, SIMBOLO, EVOLUÇÃO, REPRESENTAÇÃO, POVO, REGISTRO, HISTORIA.

A SRª SERYS SLHESSARENKO (Bloco/PT - MT. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente; nosso Senador Renan Calheiros na função de Presidente da República, o que muito nos honra neste momento; Presidenta do Supremo Tribunal Federal deste País, Ministra Ellen Gracie, que é uma honra para todas as mulheres brasileiras e cuja presença muito nos alegra na comemoração dos 180 anos do nosso Senado; Sr. ex-Presidente da República e do Senado José Sarney; Sr. ex-Presidente do Senado Antonio Carlos Magalhães; Sr. Ministro Hélio Costa; Srªs Senadoras, Srs. Senadores; Srs. ex-Senadores, seus familiares, realmente hoje é um dia de festa para o nosso Senado da República.

Fiz - e não costumo fazê-lo - um discurso por escrito, porque realmente a data de hoje precisa ser rememorada em sua história.

Em seus 180 anos de história, o Senado representa, como quase nenhuma outra instituição política nacional, a evolução da representação popular, os caminhos e descaminhos que o povo trilhou para chegar ao poder e construir um sistema de governo efetivamente inclusivo e democrático.

Na dupla condição, de mulher e de representante de um Partido de firmes raízes populares, o Partido dos Trabalhadores, não posso me furtar a recuperar, na historiografia do Parlamento, alguns fatos, episódios e momentos em que essa evolução se apresenta nítida e eloqüente. Alguns momentos que demonstram, de forma significativa, o progresso das instituições democráticas e, em especial, no que toca ao Poder Legislativo - âncora maior do Estado de Direito -, o desta Casa.

O Senado, que se instalou a 6 de maior de 1826, no Rio de Janeiro, era composto por representantes das 19 províncias brasileiras - entre elas a que deu origem ao meu Estado, o Mato Grosso - e se, por um lado, tinha seus membros escolhidos com base na manifestação direta dos cidadãos, o que se elegia afinal era apenas uma lista, a partir da qual o Imperador selecionava nome de sua predileção, com mandato vitalício.

Paradoxal para uma democracia era essa forma de eleição, tal como era paradoxal a exigência de que o postulante do cargo apresentasse renda pessoal mínima de 800 mil réis, uma quantia verdadeiramente respeitável para a época. Foram 235 os nomeados a Senadores no decurso de todo o período monárquico. E todos eles homens, Sr. Presidente; todos representantes da elite culta do País.

Às mulheres, como sabemos, não era dado o direito de voto e muito menos de candidatar-se à posição parlamentar. Curiosamente, quem poderia ter sido a primeira Senadora brasileira, a Princesa Isabel, jamais o foi, uma vez que não exerceu, de forma efetiva, o direito ao status senatorial que a Carta Imperial conferia aos príncipes de sangue. Por outro lado, a Princesa Isabel teria sido a primeira ou das primeiras mulheres a falar nesta Casa, no Senado da República, no juramento como herdeira do Trono, em 1860.

O Senado imperial, à época da Proclamação da República, contava com 52 integrantes, número equivalente à metade dos Deputados, em cada Província, sendo essa a lógica de composição da Casa. O Brasil Império, por sua vez, era um Estado unitário, e o conceito federativo, ou seja, de igualdade entre as diversas unidades políticas do País, somente aparecerá com a primeira Constituição da Era Republicana, em 1891, quando ficou estabelecida, pela primeira vez, a regra ainda hoje observada de três Senadores por Estado Federado. Foi assim que, de lá para cá, nosso número cresceu - de 63 para 81 Parlamentares - sempre em função da criação de novos Estados.

Mas, se em 1891 aboliram-se os critérios de renda, mantiveram as mulheres afastadas do exercício do voto e do direito de representação. De modo radical para a época, o Rio Grande do Norte liberou o acesso feminino ao voto e à candidatura eletiva, mas viu sua decisão cassada, num movimento infeliz, de iniciativa da Comissão de Poderes, órgão da estrutura do próprio Senado.

A mulher somente conquista o voto em 1932, com o novo Código Eleitoral, em curto interregno brutalmente interrompido pela instalação do Estado Novo, e por 8 longos anos de silêncio democrático.

Como fato marcante, na década de 1930, toma posse, em 1934, o primeiro Presidente do Senado republicano, efetivamente eleito dentre os Senadores, uma vez que, até então, comandava a Casa o Vice-Presidente da República, mecanismo que hoje nos estranha, mas que será retomado na Carta de 1945.

O regime militar instalado em 1964 irá cometer, por sua vez, algumas das maiores violências jamais perpetradas contra o Parlamento, em toda sua história, como o foram as inúmeras cassações, a indicação de representantes “biônicos” - atingindo diretamente esta Casa - e o fechamento do Congresso, em mais de uma oportunidade.

Finalmente, o ciclo de configuração formal do estatuto democrático e representativo se completa, entre nós, na década de 1980. Não há mais voto censitário, todos os cidadãos podem eleger e eleger-se; não há mais parlamentares indicados e, apesar de percalços, a democracia se apresenta forte, tendo no Parlamento sua garantia maior e mais imediata. Não foi outro o motivo pelo qual três parlamentares, egressos do Senado, foram guindados à Presidência da República, a partir de 1985, por quatro mandatos distintos, enfrentando, por vezes, circunstâncias difíceis e críticas do ponto de vista político e institucional.

Mas falta, Srªs e Srs. Senadores, alcançar, na representação popular, uma proporção que melhor traduza a composição do nosso tecido social.

Nesse pormenor, Sr. Presidente, entendo que ainda estamos em débito com os brasileiros, em especial no que toca à “minoria” mais sub-representada entre todas: a mulher.

Ao contrário da Câmara dos Deputados, que em 1933 empossava a sua primeira Parlamentar, a Deputada Carlota Pereira de Queiroz, de São Paulo, o Senado esperaria até o ano de 1979, quase 43 anos depois!, para ver a posse da Senadora Eunice Michilles, representante Suplente do Estado do Amazonas, e outros 12 anos, para que pudesse incorporar como Titular a Senadora Júnia Marise, de Minas Gerais.

Significativo, ainda, Sr. Presidente, é que o número de mulheres Parlamentares somente se robusteça, efetivamente, após a redemocratização do País, chegando hoje as Deputadas Federais a 45 e as Senadoras a 10 - proporção superior à apresentada pela Câmara -, sendo do meu próprio Partido a maior Bancada feminina desta Casa, composta de 4 companheiras, sob a Liderança da nossa companheira e Líder do nosso partido, Ideli Salvatti.

É fato, portanto, que muito caminhou o Brasil na construção de instituições mais sólidas e democráticas e no aprimoramento de mecanismos de representação mais fiéis aos anseios de inclusividade e de respeito à diversidade que demonstra ter o nosso povo. Mas ainda temos muito que fazer; muito há que avançar. Estes foram apenas os primeiros 180 anos de história do Senado Federal.

Finalizo, Sr. Presidente, evocando a memória daqueles que nos trouxeram aqui, das brasileiras e dos brasileiros - cidadãos anônimos e Parlamentares ilustres - que tornaram possível ao Senado comemorar a sua data inaugural, já sob o signo da democracia e da submissão à vontade popular. Mais uma vez a minha homenagem aos ex-Senadores e seus familiares aqui presentes. Evoco, agradecida, o esforço dos funcionários desta Casa, que souberam fazer jus a essa herança cívica e apoiar de forma incansável - nos Órgãos e nos nossos gabinetes - nossa atividade legislativa.

Quero aqui homenagear todos os servidores desta Casa, o Diretor-Geral, Dr. Agaciel Maia, que publicou o livro O Senado e os seus Presidentes e o próximo, que ele lançará, Tempo de Transformação, que também ilustra o profundo conhecimento que este servidor público possui de nossa brilhante instituição.

Junto a eles evoco, ainda, emocionada, aquilo que o futuro poderá nos trazer, à força do constante aprofundamento na crença em nosso povo; na sua capacidade de superação e de renovação.

O Senado, Sr. Presidente, é a Casa da renovação. E soube tornar-se, no decurso do tempo, a Casa de todo brasileiro. Estou pronta, junto a todos, a dizer tal como o poeta: “Se muito vale o já feito, mais vale o que será”. Como todas as Colegas e os Colegas Senadoras e Senadores,estou pronta para o futuro!

Era isso o que eu tinha a dizer.

Muito obrigada. (Palmas.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/05/2006 - Página 16101