Discurso durante a 74ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Contraponto ao pronunciamento do Senador Antonio Carlos Magalhães. Questionamentos sobre os dois programas de acesso à energia elétrica por parte da população mais carente, no governo FHC e no governo Lula.

Autor
Roberto Saturnino (PT - Partido dos Trabalhadores/RJ)
Nome completo: Roberto Saturnino Braga
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO. POLITICA ENERGETICA.:
  • Contraponto ao pronunciamento do Senador Antonio Carlos Magalhães. Questionamentos sobre os dois programas de acesso à energia elétrica por parte da população mais carente, no governo FHC e no governo Lula.
Publicação
Publicação no DSF de 06/06/2006 - Página 19066
Assunto
Outros > PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO. POLITICA ENERGETICA.
Indexação
  • CRITICA, PRONUNCIAMENTO, ANTONIO CARLOS MAGALHÃES, SENADOR, AUSENCIA, PROVA, CORRUPÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, COMENTARIO, DISCURSO, BANCADA, OPOSIÇÃO, TENTATIVA, DIFAMAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, OBJETIVO, MANIPULAÇÃO, OPINIÃO PUBLICA.
  • CRITICA, PROGRAMA, LUZ, CAMPO, GOVERNO, ANTERIORIDADE, PRIORIDADE, LUCRO, RESULTADO, DECRETO FEDERAL, AUSENCIA, GARANTIA, CONTINUAÇÃO, FALTA, RECURSOS FINANCEIROS, ESTADOS, ATENDIMENTO, POPULAÇÃO CARENTE, NECESSIDADE, CONSUMIDOR, PAGAMENTO, INSTALAÇÃO ELETRICA.
  • ELOGIO, GOVERNO FEDERAL, EFICACIA, PROGRAMA, LUZ, ACESSO, POPULAÇÃO CARENTE, APROVAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, GARANTIA, PRAZO, CONTINUAÇÃO, CRIAÇÃO, FUNDO NACIONAL, ENERGIA ELETRICA, PROVISÃO, RECURSOS FINANCEIROS, AMPLIAÇÃO, ATENDIMENTO, DESNECESSIDADE, CONSUMIDOR, PAGAMENTO, INSTALAÇÃO ELETRICA.

O SR. ROBERTO SATURNINO (Bloco/PT - RJ. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, há pouco, usou esta tribuna o Senador Antonio Carlos Magalhães para repetir suas acusações tão freqüentemente trazidas a esta Casa, com a ênfase que caracteriza os pronunciamentos de S. Exª.

No meu discurso, que pretendo ser modesto, o que vou fazer não será a resposta ao Senador Antonio Carlos Magalhães, mas o contraponto ao pronunciamento de S. Exª, antecipando o que vai se passar na campanha presidencial, na campanha política que se avizinha, na reeleição do Presidente Lula. Isso é o que vai acontecer. A Oposição usará todas as tribunas e todos os tempos de rádio e televisão de que dispuser para repetir essas mesmas acusações, com ênfases variadas e prioridades, com maior ou menor insistência, em determinados pontos.

Não vamos entrar no jogo da Oposição nem vamos ficar discutindo se o Presidente sabia ou não sabia, porque isso é o que deseja a Oposição. A Oposição deseja transformar a campanha em um debate sobre se o Presidente Lula sabia ou não dos fatos que foram revelados nas diferentes CPIs que funcionaram nesse Congresso. Nós não vamos discutir. Sabemos que a população já fez o seu julgamento.

A OAB, a Ordem dos Advogados do Brasil, ao levar a questão ao Poder Judiciário, ou seja, para o campo judiciário, sem utilizar o campo político que demandaria o impeachment, sabe que esse julgamento da Nação, da população brasileira, já foi feito. Pode-se modificar algo aqui ou ali, um centímetro para lá ou um milímetro para cá, mas o julgamento em geral já foi feito e preserva a figura do Presidente Lula, embora condene profundamente, veementemente, figuras importantes do seu Governo e do seu Partido, é claro! Esse julgamento já foi feito, e os fatos já foram apresentados.

O Presidente nunca obstou nenhum trabalho de investigação nem no Congresso nem no Ministério Público. Em Governos anteriores, o que se via era a busca do impedimento, da instalação de CPIs, como a CPI da Compra de Votos, a das Privativações e a dos Empreiteiros. As CPIs nunca eram instaladas porque o Governo desenvolvia esforços para isso e obtinha êxito em não instalá-las. O Governo Lula, ao contrário, abriu todas as apurações. Dessa forma, apareceram as acusações que foram comprovadas, atingindo pessoas importantes do seu Governo e ponto. O Governo cumpriu o seu dever, e a Polícia Federal cumpre o seu dever, investigando e denunciando. Nunca se apuraram tantas quadrilhas que são desmanchadas, e também o Ministério Público não mais engaveta as acusações, como fazia antes. Agora, o Ministério Público dá curso às acusações.

A população já fez esse julgamento, e nós não vamos entrar neste jogo: se o Presidente Lula sabia ou não sabia. Não! Não vamos entrar nesse jogo.

Nós vamos fazer o nosso contraponto, que é o cotejo, que é a colocação frente a frente do que foi o Governo passado e do que é este Governo. E mais, ressaltando uma dimensão que tem um conteúdo ético muito grande, que é a social, a da justiça social, uma dimensão que também é ética, e muito importante. Ética não é apenas não usar a corrupção. Não usar a corrupção, evidentemente, é uma exigência ética, mas a ética tem outras exigências, a partir da justiça, da justiça distributiva, da justiça estrutural da organização da sociedade. E dessa dimensão ética esse Governo está cuidando. Em cotejo com o Governo anterior, é um avanço que realmente a população compreende e compreenderá, cada vez mais, com muita nitidez.

Então, a semana passada eu já avancei num cotejo desses e hoje quero avançar um pouco mais, falando exatamente sobre o que foram os dois programas de acesso à energia elétrica por parte da população mais carente nos dois Governos, o Programa Luz no Campo, do Governo Fernando Henrique, e o Programa Luz para Todos, do Governo Lula.

E começo dizendo que não desconhecemos, não deixamos de reconhecer o mérito do programa do Governo Fernando Henrique, do Programa Luz no Campo, porque foi um programa que demonstrou sensibilidade para a falta de acesso a esse serviço, o que caracteriza quase que o século XIX. Quer dizer, são parcelas da população brasileira que ainda estavam no século XVIII quando não tinham acesso aos serviços de energia elétrica, essa coisa tão fundamental na vida de hoje.

Então, o Governo Fernando Henrique demonstrou uma sensibilidade para com esse problema e instituiu o programa Luz no Campo, só que instituiu e pôs em marcha esse programa com aquela ótica neoliberal do mercado. Confiou que o mercado ia resolver o problema do acesso à energia elétrica por parte das populações carentes do Brasil. Nesse sentido, o programa dele ficou quilômetros atrás do programa do Governo Lula, do programa Luz para Todos. Por isso mesmo, no programa do Governo Fernando Henrique não se demarcava um tempo para completar a universalização do serviço de energia elétrica, o tempo era infinito, ao passo que o programa Luz para Todos institui o tempo de oito anos, ao fim do qual todos os brasileiros terão acesso ao serviço de energia elétrica. Agora, é claro que para conseguir isso, não se pode confiar no mercado porque o mercado não realiza esse tipo de meta, de objetivo ou, enfim, de cumprimento, de universalização.

O mercado atende a quem pode pagar, a quem tem poder aquisitivo. O mercado e o programa Luz no Campo do Governo Fernando Henrique confiava na viabilidade econômica dessa operação. E essa operação não tem viabilidade econômica. Ela exige a presença do Governo, do Estado, a presença da sociedade por intermédio do Governo, subsidiando, criando o fundo para a universalização, porque evidentemente as empresas não iam dar conta do cumprimento desse objetivo.

O programa Luz no Campo foi instituído por decreto presidencial; o programa Luz para Todos foi legitimado pelo Congresso Nacional e, na medida em que foi instituído por lei, há a garantia da sua continuidade até o cumprimento da meta de universalização, prevista para o fim do período de oito anos. Como eu disse, o programa do Governo anterior não tinha prazo, porque não podia ter, porque era impossível confiar que as empresas, pelo mercado, iam conseguir instituir essa universalização. O programa Luz no Campo era um programa das concessionárias e se subordinava à lógica do mercado e à lógica dos negócios das concessionárias.

Ora, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, são coisas incompatíveis pretender uma universalização desses serviços, que é uma meta de natureza social; confiar na lógica do mercado e no negócio das concessionárias é condenar ao fracasso o atingimento da meta, é deixar para o infinito o atingimento dessa meta.

O Luz para Todos é um programa de Governo e nasceu em conjunto com a criação de um fundo para exatamente prover os recursos necessários por cima dos interesses e dos negócios das concessionárias.

E o programa do Governo Fernando Henrique contava com a parceria dos Estados. É claro que é útil contar com parcerias dos Estados, mas sabemos perfeitamente que a maioria de nossas Unidades da Federação não tem condições de colocar recursos em quantidade suficiente para atender a essa universalização, transformada em meta social, em razão de ser de um programa tão importante como este, que dá acesso ao século XX a essas populações que ainda estão no século XVIII.

O programa, ao criar o fundo, instituiu obviamente a prioridade para as populações de baixa renda, cidadãos de mais baixa renda, moradores das regiões mais distantes e de mais difícil acesso de nosso País. Ora, Srªs e Srs. Senadores, isso é que define a meta social. Como disse, essa questão social tem, sim, uma dimensão ética que não se pode esquecer, não se pode esquecer! A injustiça reinante neste País em termos de direitos e acessos a determinadas facilidades, que ficam restritas a uma determinada minoria com exclusão de uma maioria, constitui uma violação do princípio ético da justiça, da igualdade estrutural, da igualdade de oportunidades, da igualdade de condições de vida mínimas da população, viola flagrante e profundamente essa dimensão ética que não pode ser esquecida. Na ética, como eu disse, o combate à corrupção é muito importante; vamos bani-la. E como podemos banir a corrupção? É apurando, é permitindo e facilitando a apuração, é mostrando e exibindo à opinião pública os resultados de funcionamento, de investigações de todo o tipo. Mas não se pode esquecer que essa dimensão ética da justiça é também extremamente importante.

E, no Programa “Luz no Campo”, nesse cotejo que vamos fazer, mostraremos em cada setor o que se passava e o que se passa, sob a ótica da justiça social e do princípio ético da justiça social. Nesse programa, o consumidor entrava com parte dos custos do Governo e, como forma de subsidiar, contava com a parceria dos Estados, como eu disse. No Programa “Luz para Todos”, o consumidor não paga nada pela instalação da rede. No programa do Governo Fernando Henrique, o consumidor tinha de pagar parte do custo da instalação para criar as condições de viabilidade econômica no acesso ao serviço e do funcionamento da operação da concessionária. Isso foi abolido no Programa “Luz para Todos”, na medida em que o que se objetiva é o cumprimento do princípio do acesso universalizado, isto é, o cumprimento da meta social.

No “Luz no Campo”, a parceria com os Estados era uma solução interessante que poderia superar o problema dos consumidores que não tivessem condições de custear a instalação das redes. Entretanto, essa parceria dependia da vontade política dos Estados e do jogo das forças políticas nas respectivas Assembléias Legislativas. E sabemos como isso funciona. E em relação à questão de distribuição dos recursos disponíveis, os Estados da Federação que, na sua imensa maioria, são muito carentes de recursos, na hora de disponibilizá-los para um programa como esse de subsidiar a instalação das redes para atender os consumidores de baixa renda, freqüentemente deixavam como uma prioridade posterior. O programa do Governo Lula, por sua vez, supera essa questão na medida em que se cria o fundo e o consumidor não vai ter... Não vai ser exigida a parceria do Estado e nem o consumidor vai entrar com um tostão sequer para a instalação da rede que dará acesso ao serviço de energia elétrica.

O “Luz para Todos” percebeu essas dificuldades e partiu da premissa que um programa de universalização deve ter critérios que garantam a todos os beneficiados o acesso à energia.

O Programa “Luz no Campo” se encarregava de levar a energia até o poste mais próximo, padrão de entrada considerado como ponto de entrega, dali para dentro o encargo passava a ser das famílias carentes, pobres, que não têm recursos nenhum para custear essa rede de acesso até a sua casa. Já o Programa “Luz para Todos” se encarrega de levar energia elétrica até dentro da casa das famílias, que recebem um kit de instalação interno composto por três pontos de luz e duas tomadas. E tudo gratuitamente, Sr. Presidente, sem despender recursos nenhum, porque essa é a condição daquele brasileiro mais carente que se encontra sem acesso ao serviço de energia elétrica. Ora, em um País onde milhões de famílias vivem abaixo da linha de miséria, sem condições até para comprar comida, é de se presumir que essas famílias não tenham condições de arcar com os custos de uma instalação elétrica, considerados os padrões de exigência das concessionárias. Isso porque as concessionárias também exigem um padrão minimamente necessário para a ligação nas suas respectivas redes.

Então, Sr. Presidente, o último cotejo que quero fazer sobre o Programa “Luz no Campo” é que se entendia por universalização o atendimento às demandas existentes nos cadastros; enquanto que, por universalização, no “Luz para Todos”, entende-se o atendimento de todas as pessoas que ainda não possuem energia elétrica. Porque essa é a meta! O cadastro registra...

(Interrupção do som.)

O SR. ROBERTO SATURNINO (Bloco/PT - RJ) - Já encerro, Sr. Presidente. O cadastro registra aquelas famílias que têm a mínima condição de manifestarem e se inscreverem no cadastro. Mas existem muitas famílias e muitos brasileiros que não têm sequer essa condição e que precisam ser atendidos da mesma forma, porque é isso que caracteriza a justiça e a ética, a dimensão ética correspondente à justiça e que, freqüentemente, é esquecida por aqueles que vivem a acusar o Governo disso e daquilo, como se o Governo não tivesse apurado tudo e mostrado á população a verdadeira dimensão desse problema.

Então, Sr. Presidente, este contraponto ao pronunciamento do Senador Antonio Carlos Magalhães está antecipando o que será a campanha. Pelo lado da Oposição haverá a repetição, ao infinito, com a mostra das cenas das CPIs na insistência da acusação. Por parte do Governo, haverá o argumento de que não impediu as apurações, que reconheceu a culpa de servidores graduados de seu Governo. Avançou muito, não simbolicamente, mas substancialmente, na dimensão ética referente à justiça social, que também é ética e precisa ser lembrada.

Obrigado, Sr. Presidente.

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/06/2006 - Página 19066