Discurso durante a 74ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Defesa da renegociação das dívidas dos cacauicultores. Sugestão para que deputados e senadores derrubem o veto aposto pelo Presidente da República ao Projeto de Lei da Câmara 142, de 2005, sobre renegociação de dívidas dos produtores rurais.

Autor
César Borges (PFL - Partido da Frente Liberal/BA)
Nome completo: César Augusto Rabello Borges
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA AGRICOLA.:
  • Defesa da renegociação das dívidas dos cacauicultores. Sugestão para que deputados e senadores derrubem o veto aposto pelo Presidente da República ao Projeto de Lei da Câmara 142, de 2005, sobre renegociação de dívidas dos produtores rurais.
Aparteantes
Jonas Pinheiro, Ramez Tebet, Valdir Raupp.
Publicação
Publicação no DSF de 06/06/2006 - Página 19080
Assunto
Outros > POLITICA AGRICOLA.
Indexação
  • SOLICITAÇÃO, SENADO, DERRUBADA, VETO (VET), PRESIDENTE DA REPUBLICA, PROJETO DE LEI, RENEGOCIAÇÃO, DIVIDA AGRARIA.
  • CRITICA, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, CRISE, AGRICULTURA, PAIS, AUSENCIA, INCENTIVO, CREDITOS, PRODUTOR RURAL, FALTA, CONSTRUÇÃO, RODOVIA, INEFICACIA, POLITICA CAMBIAL, PREJUIZO, EXPORTAÇÃO, PRODUÇÃO, INFERIORIDADE, PREÇO, PRODUTO ALIMENTICIO, AUMENTO, DEMANDA, REDUÇÃO, OFERTA, PRODUTO.
  • COMENTARIO, ANTERIORIDADE, CRISE, PRODUÇÃO, CACAU, ESTADO DA BAHIA (BA), EFEITO, PRAGA, LAVOURA, INFERIORIDADE, PREÇO, PRODUTO, MERCADO EXTERNO, FALTA, CREDITOS, FINANCIAMENTO, AUMENTO, DESEMPREGO, DESMATAMENTO, MATA ATLANTICA, EXTRAÇÃO, MADEIRA, ELOGIO, ATUAÇÃO, GOVERNO ESTADUAL, SOLUÇÃO, PROBLEMA, CRIAÇÃO, PROGRAMA, RECUPERAÇÃO, AGRICULTURA, UTILIZAÇÃO, MUDAS, RESISTENCIA, DOENÇA, REGISTRO, DADOS.
  • REGISTRO, CONTINUAÇÃO, CRISE, PRODUÇÃO, CACAU, ESTADO DA BAHIA (BA), EXTINÇÃO, RECURSOS FINANCEIROS, PROGRAMA, RECUPERAÇÃO, APREENSÃO, PRODUTOR RURAL, DESAPROPRIAÇÃO, PROPRIEDADE, OBJETIVO, REFORMA AGRARIA, AUMENTO, DIVIDA AGRARIA, DIFICULDADE, PRODUTOR, ACESSO, CREDITOS, SOLICITAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, RENEGOCIAÇÃO, DIVIDA.

O SR. CÉSAR BORGES (PFL - BA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Obrigado, Sr. Presidente.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, venho a esta tribuna nesta segunda-feira para registrar, em primeiro lugar, a situação em que hoje se encontra a agricultura, de forma geral, no nosso País. Eu diria que é mesmo aviltante, para não dizer vergonhosa, a forma com que o Governo Lula trata a agricultura nacional. O setor, que é a grande locomotiva da economia brasileira, vê-se relegado a um plano secundário na escala de prioridade da atual administração. Falta incentivo, crédito, estrada, falta inclusive uma política cambial realista, e não essa política cambial surreal, com a valorização indevida do real diante do dólar, como a que vemos hoje, que prejudica as exportações brasileiras.

Lamentavelmente, não adianta promover “tratoraço”, não adianta bloquear rodovias, porque nada faz com que este Governo se mova. Quando digo que nada adianta, não o faço desmerecendo o movimento, o qual considero justo, mas tem de ser feito um pouco mais do que isso, porque este Governo não acorda. E, quando ele diz que vai tomar alguma medida, lamentavelmente, ela é pífia, caquética, desimportante, mais uma verdadeira enrolação com os produtores rurais do nosso País.

A insensibilidade ainda é maior em se tratando das necessidades de uma região sofrida como é o Nordeste brasileiro, da agricultura nordestina.

            A despeito de o Nordeste ser a Região mais pobre deste País e, por isso, mais carente de investimentos públicos, o Governo Federal insiste em obstruir a renegociação das dívidas dos produtores rurais nordestinos. O Presidente da República - que já se esqueceu de que é nordestino e está hoje muito mais ligado às oligarquias de São Paulo, principalmente ao mercado financeiro paulista - vetou o Projeto de Lei da Câmara nº 142, de 2005, que aprovamos aqui, e agora anuncia que vai vetar o novo texto - aprovado na Câmara - da Medida Provisória nº 285, encaminhado pelo próprio Governo e modificado pelos Deputados, o qual temos obrigação de aprovar aqui quando entrar em votação.

Estou cada vez mais convencido, Sr. Presidente, de que a única alternativa que possui este Parlamento para se afirmar, para fazer valer a sua vontade, que é a expressão legítima da vontade do povo brasileiro, é a derrubada imediata desse veto presidencial ao PLC nº 142. Já apelei, e volto a apelar, ao Presidente Renan Calheiros para que coloque o veto em discussão o mais rápido possível. Está em nossas mãos corrigir tamanha injustiça!

São enormes as dificuldades dos produtores rurais brasileiros, sejam eles pequenos, médios ou grandes. Hoje, no entanto, quero falar a respeito da situação delicada por que passa um setor da agricultura muito caro ao meu Estado, a Bahia, que é a cacauicultura. Digo, de forma honrada, que sou oriundo de uma família tradicionalmente produtora de cacau, cacauicultora, e tenho a obrigação de relatar a situação vexatória por que passa a economia do cacau, lembrando que domingo foi o Dia Internacional do Cacau, em que não houve comemoração, mas protesto.

Farei meu pronunciamento a respeito, não sem antes ouvir o nobre Senador Ramez Tebet, que muito me honra solicitando um aparte à minha fala.

O Sr. Ramez Tebet (PMDB - MS) - Quero apenas dizer que, quando acertadamente V. Exª ocupa a tribuna para defender os agricultores do País, não posso deixar de apresentar-lhe minha solidariedade, porque venho de um Estado cuja indústria ainda é incipiente. O seu Estado, a Bahia, já se orgulha do seu processo de industrialização, mas o de Mato Grosso do Sul está ainda incipiente. A nossa economia está calcada na agricultura e na pecuária, e os nossos agricultores estão tão sofridos quanto os agricultores do Nordeste. O Brasil inteiro está sofrido. Concordo com V. Exª: não é possível essa insensibilidade do Governo diante desse quadro, quando sabemos que o agronegócio é responsável pelo superávit da balança de pagamentos do nosso País. Isso interessa à própria economia nacional. É preciso olhar um pouco para aqueles que produzem no campo, e V. Exª faz bem em estar aí nessa tribuna. Quero prestar-lhe solidariedade, fazer das suas as minhas palavras, e também dizer que V. Exª, embora rapidamente, passou por um assunto que julgo que precisamos resolver imediatamente. O Poder Executivo está com muita força e o Poder Legislativo está definhando pelo excesso de medidas provisórias. Nesse ponto, creio que a culpa é do próprio Poder Legislativo, porque não apreciamos os requisitos da urgência e da relevância, e o Governo funciona como um trator. Sabemos da dificuldade que temos para votar, porque a medida provisória entra em votação tão logo...

O SR. CÉSAR BORGES (PFL - BA) - E sobrestando a pauta.

O Sr. Ramez Tebet (PMDB - MS) - As medidas tornam sobrestada a pauta, entram em funcionamento, e nós, pensando nas conseqüências, acabamos votando essas matérias que nem seriam casos de medidas provisórias. Mas eu queria falar mesmo era do veto, se V. Exª me permite. O Senador Marco Maciel apresentou uma emenda à Constituição, da qual eu fui Relator e à qual dei parecer favorável - há um pedido de vista -, que tramita na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania e que espero possa solucionar esse problema, porque o veto não pode ser objeto de apreciação pelas duas Casas ao mesmo tempo. É preciso que ele seja apreciado tanto na Câmara quanto aqui, porque estamos vendo que, ao longo das últimas décadas, o Congresso, para apreciar vetos, não se reuniu mais do que uma dúzia de vezes. Então, vetar um projeto de lei é praticamente enterrá-lo, e isso é um absurdo. Portanto, espero que o Presidente do Congresso Nacional, Senador Renan Calheiros, que tão bem tem dirigido esta Casa e o Congresso, atenda ao nosso apelo e coloque essa medida provisória que beneficia, em parte, os agricultores imediatamente em votação para que possamos, como é o meu caso e o de V. Exª, votar contra esse veto e fazer a lei prevalecer. Agradeço a V. Exª.

O SR. CÉSAR BORGES (PFL - BA) - Sou eu quem lhe agradeço, Senador Ramez Tebet. V. Exª se expressa com muita precisão, com muito cuidado. Efetivamente, o Governo não se interessa pelo agronegócio, a não ser quando o setor está muito bem. Aí, ele se jacta de ter feito algo a favor do agronegócio, da agricultura. Quando entra em crise, por conta de um câmbio artificial que prejudica a expansão do agronegócio, o Governo fica com medidas paliativas, inócuas, que não atendem às necessidades de nosso produtor, que acumulou, por conta dessa política equivocada, um passivo muito grande com as entidades de crédito.

Em segundo lugar, V. Exª fala do veto. Realmente, esta Casa, se não apreciar os vetos do Presidente - que são, antes de tudo, uma posição antagônica à do Parlamento -, para que possamos reafirmar nossa intenção, porque temos direito constitucional para isso, lamentavelmente, estará cedendo exatamente a esse desejo imperial do Executivo de fazer do Parlamento uma instituição menor, caudatária dos interesses do Executivo, os quais, também lamentavelmente, não são os do País.

Ouço o aparte do Senador Valdir Raupp e, depois, do Senador Jonas Pinheiro, ambos muito ligados ao agronegócio.

O Sr. Valdir Raupp (PMDB - RO) - Nobre Senador César Borges, realmente a situação do campo é preocupante. V. Exª tem absoluta razão quando se refere a todas essas questões. O meu Estado, que é novo e tem sua economia calcada no agronegócio, na agricultura, principalmente as cidades interioranas - talvez não a capital, que tem lá os seus poderes, a economia do contracheque -,já começa a sentir os efeitos danosos dessa política agrícola brasileira. Hoje, o produtor rural está penando, está pagando; mas o comércio já começa a sentir também. A economia das principais cidades do meu Estado é baseada no agronegócio: na agricultura, na pecuária, no leite, no gado de corte.

O SR. CÉSAR BORGES (PFL - BA) - É uma seqüência de fatos; um setor prejudica o outro.

O Sr. Valdir Raupp (PMDB - RO) - Hoje, o Governo está talvez desfrutando dessa situação nas grandes cidades, nos grandes centros. O produto sai da roça com um preço muito baixo, o arroz, o feijão, a carne, o leite. Mas, até quando isso vai? Sabemos que um grande percentual de nossas cidades é agrícola. São cidades que vivem da agricultura, que respiram a agricultura. Quando a agricultura vai bem, o comércio também vai bem. Se a agricultura vai mal, o comércio começa a sentir esses efeitos. É o que está acontecendo hoje no Mato Grosso, do nobre Senador Jonas Pinheiro; no Mato Grosso do Sul, do Senador Ramez Tebet; no meu Estado, em Rondônia; no interior do Rio Grande do Sul; no Paraná; em Santa Catarina; enfim, na grande maioria dos Estados. Também no Nordeste a agricultura passa por dificuldades. Parabéns a V. Exª.

O SR. CÉSAR BORGES (PFL - BA) - Agradeço V. Exª, Senador Valdir Raupp.

No Nordeste, além das dificuldades da macroeconomia brasileira em relação ao agronegócio, temos a seca, que é uma intempérie que, lamentavelmente, ocorre em nossa região.

Concedo a palavra ao Senador Jonas Pinheiro.

O Sr. Jonas Pinheiro (PFL - MT) - Sr. Senador César Borges, V. Exª referiu-se ao prejuízo, mas não o quantificou. Foram R$30 bilhões que o campo perdeu nesses dois anos. Portanto, não há atividade que agüente um prejuízo de R$30 bilhões! E depois, o problema da agricultura não passa a ser um problema apenas dos agricultores, passa a ser um problema da sociedade. Como disse o Senador Valdir Raupp, as cidades já estão sentindo o profundo problema que o campo vive. Neste fim de semana, visitei as áreas produtoras, mesmo porque eu precisava conversar com os produtores para verificar em que ponto está o movimento por eles organizado, o chamado “Grito do Ipiranga”, lançado na pequena cidade de Ipiranga, no dia 17 de abril, de cujo lançamento estive presente. Fui também agradecer a participação dos produtores, que estão reivindicando à beira das estradas e permitindo que nós, aqui no Congresso Nacional, façamos um trabalho a favor deles. É uma calamidade generalizada. Eles ainda não têm condições de voltar ao campo, porque o Governo lançou um pacote que não está entendido, não se sabe como desembrulhar esse pacote. Semana passada, houve uma audiência pública na Câmara dos Deputados com a participação do Ministro da Agricultura e do Ministro da Fazenda, que permaneceram durante seis horas com os Deputados, com os produtores rurais. Eu estive presente a essa audiência pública, onde começamos a ter um entendimento. Esse entendimento, nobre Senador César Borges, tem de ser urgente para fazer com que esses produtores engraxem as máquinas e voltem para o campo. O problema do Brasil, Senador, não é agora - o problema vai acontecer no próximo ano, quando haverá uma crise de desabastecimento no Brasil. O Governo Lula, que acha que está fazendo política com preço baixo da alimentação, proveniente do meio rural, vai chorar por ver que, no próximo ano, mesmo com dinheiro na mão, vai ser difícil achar produto para comprar em função do desabastecimento, em função da dificuldade que os produtores têm, independente da sua vontade, de voltar ao campo. Obrigado, Senador.

O SR. CÉSAR BORGES (PFL - BA) - Agradeço-lhe, Senador Jonas. Espero que no próximo ano não seja mais esse governo, ou desgoverno, porque, efetivamente, ele foi um carrasco para a agricultura brasileira.

No primeiro ano, dizia que era o responsável pelo sucesso da agricultura. Aí passou a ser o carrasco por conta de uma política de câmbio flutuante - flutuante que não é flutuante, porque os juros elevados inundam o País de dólares e faz o câmbio cair. Agora, faz uma política dizendo que está fazendo com que a cesta básica fique mais barata, e quebrando todo agricultor.

Vai acontecer o que o Senador Jonas disse: desabastecimento. E aí nós pagaremos muito mais caro, porque pagaremos pelo desabastecimento, uma inflação de demanda, porque não teremos produto a ofertar.

Mas, Sr. Presidente, eu disse que falaria aqui sobre o cacau e vou falar - não poderia deixar de dar esse aparte tão importante para minha fala. Peço um pouco de compreensão de V. Exª.

A Região Cacaueira, Sr. Presidente, sempre foi, ao longo da história, o principal centro econômico e social do sul da Bahia - V. Exª conhece bem, porque é um Senador do vizinho Estado do Espírito Santo, que tem também a lavoura cacaueira, assim como o Senador Valdir Raupp -, região que concentra uma população de mais de três milhões de pessoas. O cacau foi o grande responsável pelo florescimento da região, trazendo emprego e prosperidade para as famílias que lá habitam. Mais do que isso, Sr. Presidente, para o Brasil. Foi o cacau que, nas décadas de cinqüenta e sessenta, permitiu a industrialização com os dólares que vinham da sua exportação.

A exuberância econômica, social e cultural da região foi muito bem retratada nos romances do grande e inesquecível escritor Jorge Amado, filho de cacauicultor e nascido numa fazenda de cacau, a Fazenda Auricídia, localizada no Município de Itabuna. O eixo Ilhéus-Itabuna era o centro econômico da pulsante Região Cacaueira, até que a vassoura-de-bruxa viesse ofuscar seu brilho, tingindo de marrom os cacaueiros baianos.

A vassoura-de-bruxa chegou à Bahia no ano de 1989 e, num período de seis anos, devastou a lavoura cacaueira do meu querido Estado. Entre 1989 e 1995, a doença, associada aos baixos preços internacionais do cacau e à falta de crédito para financiar a produção, arrasou a base econômica de 92 Municípios baianos, que dependiam do cacau para sua sobrevivência.

Das 400 mil pessoas que trabalhavam na produção do cacau, cerca de 250 mil se viram obrigadas a migrar para os grandes centros urbanos, pois, simplesmente perderam os seus empregos. Além dos devastadores prejuízos econômicos e sociais, a decadência da lavoura cacaueira causou enormes prejuízos ao meio ambiente. Sem alternativa de sobrevivência, muitos produtores migraram para a criação extensiva de gado, o que ocasionou o desmatamento de grandes porções da Mata Atlântica para o plantio de pastagens. E, muitas vezes, o desmatamento se dava para que, retirando madeira de lei existente nas matas, pudesse se dar o sustento necessário a esses proprietários rurais.

Consciente da extrema gravidade da situação, o Governo da Bahia agiu, como sempre, prontamente e propôs ao Conselho Monetário Nacional o Programa de Recuperação da Lavoura Cacaueira Baiana. Aprovado, esse programa assegurou o aporte de R$340 milhões, recursos oriundos do BNDES, do Tesouro Nacional e do Banco do Nordeste.

Entre 1995 e 1997, a ênfase do Programa era o controle da vassoura-de-bruxa, por intermédio do rebaixamento das copas das árvores, dos cacaueiros, bem como do corte e queima das partes infectadas. Infelizmente, a estratégia se mostrou pouco eficaz. Em 1997, o escopo foi modificado. E isso não foi o agricultor que fez, foi indicação da Ceplac - Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira, que chegou à conclusão de que a solução para a praga estava no uso de plantas clonadas, resistentes à doença, que é a atual saída técnica para a questão.

Com a utilização da clonagem, o profundo sentimento de desânimo, que tomara conta da região, foi substituído pela confiança em tempos melhores.

A utilização de plantas resistentes permitirá, como está permitindo, a efetiva recuperação da lavoura cacaueira e o retorno ao nível de produção de 380 mil toneladas, com o faturamento de 600 milhões de dólares por ano. O renascimento da região promoverá a geração de milhares de novos empregos, a preservação da Mata Atlântica e o aumento das divisas do País.

Importante destacar o papel proeminente do Governo da Bahia para a recuperação da lavoura cacaueira. Entre diversas outras medidas, o Governo do Estado assumiu a metade dos encargos financeiros dos créditos concedidos aos cacauicultores que ultrapassem a taxa de 8,75% ao ano. Criou ainda um fundo de aval para os mini e pequenos produtores, que não possuem garantias para obtenção de financiamento junto ao Banco do Nordeste.

A principal medida, entretanto, é a implantação e manutenção da Biofábrica de Cacau da Bahia, cuja tarefa é multiplicar em larga escala e distribuir mudas de cacau resistentes à vassoura-de-bruxa, recomendadas para enxertia e para o adensamento das plantações. A Biofábrica produz, ainda, mudas de fruteiras e de árvores nativas da região.

Em 1999, quando era Governador da Bahia, tive a satisfação de inaugurar a primeira unidade da Biofábrica. Justiça se faça: essa luta teve início no Governo de Antonio Carlos Magalhães, passou pelo Governo de Paulo Souto, pelo meu Governo e, agora, novamente, no Governo de Paulo Souto. Desde então e até março deste ano, foram produzidas e distribuídas cerca de 14 milhões de mudas, sendo quase 9 milhões de cacaueiros, além de mais de 4 milhões de garfos para enxertia de cacaueiros decadentes. Nada menos do que 8 mil e 200 produtores já foram beneficiados.

A despeito do ressurgimento, ou melhor, da ressurreição da agricultura cacaueira, o setor continua a enfrentar sérias dificuldades. Os recursos do Programa de Recuperação se esgotaram, permitindo a recuperação de apenas 130 mil dos 300 mil hectares programados.

Os cacauicultores baianos vivem assombrados com a possibilidade de verem suas terras destinadas à reforma agrária, a despeito de ainda serem produtivas. É que a Instrução Normativa nº 11, de 2003, editada pelo Incra, fixou o Grau de Eficiência na Exploração, o GEE, para a lavoura cacaueira em 0,7 tonelada por hectare, valor muito além da atual realidade da fazenda de cacau da Bahia. Diga-se de passagem que a Bahia nunca atingiu essa média de produtividade que quer o Incra fixar. Então, nós vamos declarar todas as terras hoje utilizadas na produção do cacau como improdutivas.

Essa Instrução Normativa veio para regulamentar a Lei nº 8.629, de 1993, que trata da questão da reforma agrária. Acontece que o regulamento do Incra estabelece que as propriedades somente são consideradas produtivas se possuírem um grau de eficiência na exploração de no mínimo 100% do valor estabelecido para cada cultura.

O próprio Diretor da Ceplac, Gustavo Costa de Moura, expôs o problema ao Ministro da Agricultura, em correspondência enviada em maio de 2004. Segundo ele, a lavoura cacaueira ainda está em processo de recuperação e o GEE máximo que pode ser exigido é de 0,19 toneladas por hectare.

Dois anos depois, em mais uma demonstração da inépcia e da insensibilidade do Governo que aí está, nenhuma providência foi tomada pelo Incra para modificar esse índice que tanto traz inquietação à lavoura cacaueira.

Outro enorme problema dos cacauicultores, Sr. Presidente, é o mesmo de todos os produtores rurais deste País: as dívidas oriundas dos financiamentos. Como já disse, os recursos do Programa de Recuperação da Lavoura Cacaueira não foram suficientes para o cumprimento de todas as suas etapas.

Muitos produtores de cacau só conseguiram cumprir as duas primeiras fases, ou seja, não conseguiram atingir as fases posteriores, e mais importantes, da clonagem de plantas resistentes e da recomposição da lavoura. Isso ocorreu por causa das dívidas contraídas para financiar as fases iniciais do Programa, que, como já disse, se mostravam ineficientes.

O setor cacaueiro ficou completamente descapitalizado, em decorrência do descompasso entre as receitas projetadas e sua efetiva consolidação no campo, bem como da inadequação dos prazos de pagamento em relação ao período de produção econômica das áreas clonadas. Ademais, os produtores enfrentam muitas dificuldades para obtenção de crédito, de forma a dar suporte à atividade até a entrada em produção dos cacaueiros enxertados.

É preciso levar em consideração que a recuperação da lavoura cacaueira baiana ainda está no início. Para se ter uma idéia, na safra 1986/1987 foram colhidas quase 400 mil toneladas de cacau. A produção atingiu o fundo do poço na safra 1999/20000, quando foram colhidas míseras 98 mil toneladas. Na safra 2005/2006, esse número passou para pouco mais de 142 mil toneladas, menos da metade da produção de vinte anos atrás, mas já mostrando uma recuperação.

Essa é a realidade do cacau na Bahia. Uma lavoura em recuperação, mas que ainda não produz o suficiente para retomar a auto-sustentabilidade. O Governo do Estado tem feito todo o possível para ajudar os cacauicultores. Entretanto, é preciso que o Governo Federal faça o mesmo. O que está em jogo não é apenas a saúde financeira dos fazendeiros, mas o emprego de milhares de pessoas e a preservação do meio ambiente. O que está em jogo é o futuro de toda uma região! E, com a transformação dos antigos débitos rurais em débitos junto ao Tesouro Nacional, que se transformaram em débitos fiscais, o que está existindo hoje é uma ameaça do Governo Federal de execução com dívida fiscal das dívidas dos produtores rurais da região cacaueira, o que traz uma inquietação enorme em toda a população que ali vive e que tem no cacau seu grande sustentáculo.

Sendo assim, é preciso fazer um diagnóstico detalhado do endividamento do setor, levando em conta todas as dívidas vincendas e vencidas. Não é possível que haja disposição de negociar apenas as dívidas que ainda estão por vencer, exigindo que os produtores arquem com as impagáveis dívidas já vencidas, com juros exorbitantes, impagáveis, sob pena de entrarem - ou de permanecerem - no cadastro de inadimplentes dos agentes financeiros.

O setor precisa de um plano sério e eficaz, que considere as dificuldades dos produtores e as peculiaridades da lavoura cacaueira. A verdade é que, tendo em vista a total descapitalização dos produtores, a lavoura cacaueira não terá condições de prosseguir com sua recuperação sem renegociar as dívidas e sem ter acesso às fontes de financiamento.

Nesse sentido, gostaria de fazer um apelo veemente ao Governo Federal, se é que ainda lhe resta alguma sensibilidade com a agricultura e com a cacauicultura, para que realize um levantamento completo da situação, de forma a promover a renegociação das dívidas dos produtores de cacau do Estado da Bahia. Não estou a pedir, Sr. Presidente, o perdão das dívidas. Estou cobrando uma renegociação. Que ela seja feita em termos realistas. Se possível, em condições favoráveis aos cacauicultores, segmento importante para o Brasil, pois gera emprego e renda. É preciso fazer com que os cacauicultores possam pagar o que devem, quando os cacaueiros voltarem a produzir em pleno vapor.

Portanto, Sr. Presidente, para encerrar, essa é uma questão de justiça com um setor que gera tantos empregos e do qual dependem milhares de famílias. É também uma questão de justiça para com o Estado da Bahia. A Bahia e os cacauicultores merecem respeito por tudo que já fizeram por este País.

Era isso que EU tinha a dizer, Sr. Presidente, agradecendo-lhe a tolerância.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/06/2006 - Página 19080