Discurso durante a 75ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Reflexão acerca das decisões tomadas pelo Brasil a respeito da gestão da matriz energética brasileira.

Autor
Romero Jucá (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RR)
Nome completo: Romero Jucá Filho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ENERGETICA.:
  • Reflexão acerca das decisões tomadas pelo Brasil a respeito da gestão da matriz energética brasileira.
Publicação
Publicação no DSF de 07/06/2006 - Página 19253
Assunto
Outros > POLITICA ENERGETICA.
Indexação
  • ANALISE, FISICA, CONCEITO, ENERGIA, IMPORTANCIA, BUSCA, FONTE ALTERNATIVA DE ENERGIA, ENERGIA RENOVAVEL, VANTAGENS, Biodiesel, AUSENCIA, PREJUIZO, MEIO AMBIENTE, SUBSTITUIÇÃO, DERIVADOS DE PETROLEO, PREVISÃO, ALTERAÇÃO, MATRIZ ENERGETICA, MUNDO.

O SR. ROMERO JUCÁ (PMDB - RR. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o momento de crise energética que vivemos, desencadeada pela nacionalização do gás boliviano, é muito propício à reflexão acerca das diversas decisões já tomadas pelo Brasil e das que ainda o poderão ser a respeito da gestão da matriz energética brasileira.

Antes de abordar esse assunto, contudo, sob uma ótica didática, eu gostaria de tecer algumas considerações sobre o conceito de energia e suas aplicações práticas.

A primeira é a constatação de que energia é movimento. De fato, a ciência já relacionou essas duas grandezas de maneira unívoca. É muito curioso que energia não seja uma substância nem possa ser tocada ou enxergada, contudo, pode, perfeitamente, ser quantificada e armazenada.

            Sempre que há movimento, há energia, e a recíproca também é verdadeira. Mover um simples membro de nosso corpo, por exemplo, envolve o gasto de energia armazenada sob a forma de ligações químicas em nossas células musculares. O mesmo é verdade em relação a todo processo mecânico, luminoso, elétrico, térmico, etc, que ocorre em nosso planeta. Isso nos remete à grande importância que a energia tem. Tudo o que se necessita fazer sobre a face da Terra, até mesmo o mais simples ato de pensar, requer energia.

A segunda consideração preliminar que desejo fazer é a de que existe uma única fonte de energia - segundo a acepção pura do termo - para todos esses processos. Essa fonte é o Sol.

De fato, embora possa parecer estranho, a energia que os Senhores e as Senhoras estão utilizando, agora mesmo, para respirar, provém do nosso Sol. Em algum momento, os raios solares, altamente energéticos, atingiram algum vegetal, que, pelo processo de fotossíntese, armazenou essa energia sob a forma de glicose. Posteriormente, algum animal alimentou-se dessa planta, e isso pode ter ocorrido sucessivamente, e a energia foi percorrendo a cadeia alimentar até chegar a nós.

A terceira observação que faço diz respeito ao princípio da conservação da energia. Esse princípio - na verdade, uma lei universal da natureza - diz que a energia não é criada nem destruída, apenas sofre transformações. Imaginemos, por exemplo, a queima de uma certa quantidade de combustível no motor de um veículo. Como resultado desse processo, ocorre a liberação de calor, a produção de luz e som, a expansão de gases e a formação de novas moléculas. Os cientistas são capazes de demonstrar que a energia antes armazenada nas ligações químicas do combustível original é exatamente igual à soma de todas essas outras formas de energia produzidas ao final do processo.

            Dessa última observação, Sr. Presidente, quero derivar o conceito tão popular, mas muitas vezes mal compreendido, de energia renovável.

Primeiramente, vejamos o que seria uma forma de energia não-renovável. Ora, sempre se usa essa classificação para os combustíveis fósseis, os derivados do petróleo. E porque se diz que a gasolina, o óleo diesel e o gás de petróleo são formas de energia não-renovável? Simplesmente pelo fato de que, após sua combustão, a energia é definitivamente liberada para o meio-ambiente e não torna mais à forma original, ou seja, não pode mais tornar a ser petróleo.

Em contrapartida, vejamos o caso da queima de um óleo vegetal - óleo de mamona, por exemplo. Quando se queima óleo de mamona, há liberação de energia sob a forma de calor e há, também, a liberação de carbono e outras substâncias para a atmosfera. Contudo, não podemos nos esquecer de que a mamona vem de um vegetal, e vegetais podem ser plantados e replantados quantas vezes se queira.

Portanto, se olharmos para esse quadro de uma maneira abrangente, veremos um ciclo: o vegetal é plantado e o óleo extraído de suas sementes é queimado, resultando em energia - aproveitada pelo homem - e em resíduos liberados para a atmosfera. Contudo, o processo não pára aí. Ao se fazer um novo plantio, os resíduos liberados na atmosfera são absorvidos pela planta. Esse processo é conhecido por ciclo do carbono.

Na verdade, a germinação e o crescimento de um vegetal absorvem muito mais carbono do que a queima de suas sementes libera na atmosfera. Trocando em miúdos, isso significa que a produção de energia dentro de um programa de plantio vegetal retira mais carbono da atmosfera do que lança nela. É, portanto, Sr. Presidente, um processo mais do que limpo, poderíamos dizer que é um processo que limpa.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, uma rápida olhada para um mapa mundi no qual esteja destacada a concentração das reservas petrolíferas do Planeta nos dará uma clara idéia de que a natureza não foi equânime na distribuição geográfica desses recursos. Para expressar isso em números, basta dizer que 63,3% das reservas mundiais de petróleo utilizável estão no oriente médio e apenas 5,5%, na América do Norte. Em contrapartida, sabemos que os maiores consumidores desses recursos são justamente os norte-americanos.

Sabemos que boa parte dos conflitos armados dos últimos tempos, incluindo atentados terroristas e seus desdobramentos bélicos, relacionam-se com a disputa pelo petróleo, o ouro negro. Aqui na América do Sul, por sua vez, as reservas petrolíferas têm sido motivo de disputas político-econômicas que ainda não se converteram em bélicas, contudo, não podemos afastar definitivamente tal hipótese, caso a dependência mundial dos derivados do petróleo continue nos níveis atuais.

Tudo isso porque o petróleo, por enquanto, é a fonte mais barata de energia. Energia, como disse, é movimento, e ninguém pode viver num mundo sem movimento.

Contudo, Sr. Presidente, nós, no Brasil, temos sido, lamentavelmente, negligentes em relação ao potencial de riqueza de nosso País de clima tropical e condições privilegiadíssimas de agricultura.

Talvez surpreenda aos Senhores saber que, na demonstração de seu primeiro motor, durante a Exposição Mundial de Paris, Rudolf Diesel tenha utilizado óleo de amendoim como combustível. Ele utilizou um óleo vegetal que pode, facilmente, substituir o óleo diesel, com a grande vantagem de ser uma fonte de energia limpa e renovável.

            No Brasil, já desenvolvemos o Pró-álcool e lançamos, há pouco tempo, o Pró-biodiesel. Entretanto, essas iniciativas são, ainda, tímidas e estão muito aquém de nosso potencial. O Brasil poderia, facilmente, se tornar líder mundial na exploração e no desenvolvimento de tecnologia de combustíveis renováveis baseados na biomassa.

No início deste ano de 2006, o Presidente Bush declarou que seu país necessita diminuir sua dependência - que ele classificou de “vício” - dos derivados do petróleo. O Presidente Bush faz essa declaração ao perceber o alto custo que tem sido manter programas bélicos que sustentem o fornecimento de petróleo para seu país. Esse é mais um forte indício de que a era da dependência do petróleo está chegando ao fim. Nós, no Brasil, precisamos nos antecipar e perceber que haverá uma grande “virada” na matriz mundial de fornecimento e consumo de energia. Dentro de pouco tempo, o petróleo não terá preços viáveis e será substituído por óleos vegetais. Se formos pró-ativos e tivermos uma firme visão de futuro, saberemos agarrar a oportunidade de nos tornarmos um grande fornecedor de combustíveis renováveis e de tecnologia de produção para o restante do Planeta.

Era o que eu tinha a dizer.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 07/06/2006 - Página 19253