Discurso durante a 77ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Repúdio à afronta sofrida pela democracia brasileira, com a invasão e depredação das dependências da Câmara dos Deputados, patrocinada por integrantes do MSLT. (como Líder)

Autor
Ney Suassuna (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PB)
Nome completo: Ney Robinson Suassuna
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
MANIFESTAÇÃO COLETIVA.:
  • Repúdio à afronta sofrida pela democracia brasileira, com a invasão e depredação das dependências da Câmara dos Deputados, patrocinada por integrantes do MSLT. (como Líder)
Aparteantes
Heráclito Fortes, Mão Santa, Sibá Machado.
Publicação
Publicação no DSF de 09/06/2006 - Página 19806
Assunto
Outros > MANIFESTAÇÃO COLETIVA.
Indexação
  • COMENTARIO, HISTORIA, DEMOCRACIA, FEDERAÇÃO, BRASIL, FUNÇÃO, SENADO, DEFESA, REPUBLICA, REPUDIO, OFENSA, CONGRESSO NACIONAL, VIOLENCIA, MANIFESTAÇÃO COLETIVA, SEM-TERRA, INVASÃO, DEPREDAÇÃO, CAMARA DOS DEPUTADOS, SOLIDARIEDADE, PRESIDENTE, LEGISLATIVO.
  • APREENSÃO, AUMENTO, VIOLENCIA, BRASIL, OCORRENCIA, ASSALTO, INTERIOR, ESTADO DA PARAIBA (PB), BANCOS, EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRAFOS (ECT).

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB. Como Líder. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o fim do unitarismo monárquico foi uma das mais importantes conquistas do sistema político-administrativo brasileiro nascido com o regime republicano.

Fortemente influenciada pelo modelo norte-americano, nossa República surgiu, entre outras motivações, para responder adequadamente ao grande desafio de manter unida uma Nação complexa e diversificada; manter unido um Estado capaz de bem cumprir sua missão em um território verdadeiramente continental, mas - e este é o ponto inovador e absolutamente correto - respeitando as especificidades, as singularidades e as necessidades próprias de cada uma de suas unidades.

O federalismo foi, e haverá de ser sempre, a pedra angular sobre a qual se assenta a República em nosso País. Seu pressuposto, consensualmente compreendido e aceito, é o de que o todo não elimina as partes. Antes, é do conjunto de nossas semelhanças e diferenças, fundado na história, na cultura, no idioma, nos adjetivos comuns, que brota esta extraordinária unidade chamada Brasil. Unidade que nos faz Nação, em sua mais perfeita e incontestável definição. Unidade que, por isso mesmo, não pode nem deve ser confundida com uniformidade.

Sabiamente, a Constituição de 1891 manteve o bicameralismo existente desde o Império, mas explicitou o novo papel que caberia ao Senado republicano, não por acaso, denominado Federal. Nascia, pois, com o federalismo republicano, a concepção prevalente até hoje de ser esta a Casa representativa dos Estados na composição do Poder Legislativo.

Poucos foram os momentos em que essa condição essencial ao funcionamento regular e natural do federalismo deixou de ser respeitada. Todas as vezes que isso se deu, inevitavelmente estavam eclipsados o sistema representativo e as instituições democráticas.

Foi assim, por exemplo, entre 1937 e 1945, quando o ditatorial Estado Novo de Vargas eliminou qualquer vestígio de democracia entre nós - seguindo, aliás, uma tendência da época, quando vicejavam pelo mundo afora regimes centralizadores, autoritários e totalitários - e sepultou as instituições legislativas e as práticas federalistas.

No passado recente, ao longo de duas décadas, o regime militar, ainda que mantendo o Poder Legislativo em funcionamento na maior parte do tempo, mitigou-lhe a força, subtraiu-lhe de tal forma suas clássicas prerrogativas que, em determinadas circunstâncias, fez-se do Congresso Nacional pouco mais que Casa meramente chanceladora do poder discricionário.

Hoje, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, felizmente, outros são os tempos. Nosso reencontro com a democracia - e lá se vão duas décadas - veio para ser definitivo, crescentemente aprimorado e sempre balizador de nossa vida política.

Justamente por isso, a Carta de 1988 consagra o papel do Senado como a mais elevada Casa de representação dos interesses dos Estados e do Distrito Federal. É isso, é precisamente isso o que somos: sem jamais perdermos de vista o compromisso com a Pátria, que é a razão maior do nosso trabalho, somos a garantia de defesa dos princípios federalistas e, por extensão, do ideal republicano que nos move ao longo do tempo.

Portanto, é à luz desses altos ideais, que nos servem de inspiração e razão de existir, que não podemos tolerar a afronta sofrida pela democracia brasileira por meio do ultraje praticado por um bando de vândalos na tarde de anteontem.

Ao invadir o prédio do Congresso Nacional, não conspurcaram e ofenderam apenas a Câmara dos Deputados - o que já seria inaceitável; outrossim ofenderam, ultrajaram e agrediram o próprio Estado Democrático de Direito.

É no Parlamento que o Estado Democrático de Direito encontra a expressão física dos valores éticos e dos princípios basilares que diferenciam barbárie e civilização. Não podemos tolerar que grupos de marginais, encobertos pelo falso manto de pretensos movimentos sociais, espalhem o medo e o terror num País onde a memória recente ainda guarda memórias do terror e do medo da noite escura do autoritarismo.

Desta tribuna, o Partido do Movimento Democrático Brasileiro se solidariza com os Presidentes da Câmara e do Senado para repudiar, com toda a força dos mais elevados valores e crença na democracia, os atos praticados anteontem nas dependências da Câmara dos Deputados por inimigos da democracia disfarçados de trabalhadores sem-terra.

Ao encerrar, Sr. Presidente, eu queria também dizer que não é só esse tipo de...

O Sr. Heráclito Fortes (PFL - PI) - V. Exª me permite um aparte?

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB) - Pois não.

O Sr. Heráclito Fortes (PFL - PI) - Fico muito feliz em ver o Líder de um Partido como o PMDB, que é da base de sustentação do Governo, mas que nem por isso se curva a esses atos irresponsáveis, fazer esse registro aqui. Vale lembrar que foi esse mesmo grupo, Senador Suassuna, que invadiu, há dois anos, a sede do Ministério da Fazenda aqui em Brasília. Esse mesmo grupo está envolvido com invasões em vários pontos do País. Essa história de declarações de que não concordam com isso, de fazer beicinho ou cara de indignado é só para turista ver. O Sr. Bruno, além de amigo íntimo do Presidente da República, foi seu hóspede por diversas vezes - hóspede palaciano, segundo a imprensa. É grave, Sr. Presidente, o que aconteceu aqui. É um precedente altamente perigoso, e acho que deve ser repelido, mas de maneira sincera. Quero crer - e aí, Senador Sibá Machado, é um mal menor - que ele será levado ao Conselho de Ética e poderá até olhar os companheiros de cabeça erguida, porque o ato dele é ideológico, diferente dos que para lá foram encaminhados, ao Comitê de Ética do Partido, por atos de corrupção. Só espero que o PT não tenha com o Sr. Bruno a mesma compreensão que teve com os “mensaleiros”, com os envolvidos em caixa dois, com os que foram cassados e tiveram de renunciar. Se tivermos o cuidado de ver, Senador Ney Suassuna, fotografias de atos no Palácio, veremos alguns desses cassados ou veremos a dançarina ao lado do Presidente da República animando palanques pelo Brasil afora. Digo isso para nos preservarmos um pouco dessas companhias. Um Líder como V. Exª não pode passar pelo vexame de estar em solenidades no Palácio ao lado daqueles que foram punidos por terem assaltado o cofre público. Nós temos de ter cuidado. Só espero que o Presidente Lula tenha um sentimento sincero com relação a isso e que suas palavras sejam verdadeiras, e não apenas uma encenação para enganar os menos avisados. Muito obrigado.

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB) - Nobre Senador, por ser da Base, de maneira alguma posso comungar com todas as idéias. Não fazemos isso nem em casa, com as nossas esposas. E é um direito nosso não concordar. Tenho certeza de que o Presidente não concorda e tenho certeza de que o PT também viu que há um desvio de comportamento nesse cidadão. E ele tem de ser punido - e punido duramente. Espero que a punição seja exemplar, para servir como ato de inibição a outros que possam imaginar ou ousar fazer coisa semelhante. Portanto, em relação a isso, esse é o meu posicionamento.

Eu ia usar da tribuna também para dizer que não temos só esses atos de violência aqui, em São Paulo, no Rio de Janeiro. E peço ao Presidente um minutinho só para concluir, porque hoje vi, com tristeza, na minha Paraíba, que é sempre tão tranqüila, os jornais trazerem notícias sobre a cidade de Cubati: os moradores fecharam as casas e o comércio devido à insegurança. Informaram que vai haver assalto geral, porque já havia ocorrido na cidade de Caaporã assalto às agências bancárias e à agência dos Correios, como também houve, em Itabaiana, assalto ao Banco do Brasil. Então, temos que tomar muito cuidado e começar a punir com dureza.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador Ney Suassuna, peço-lhe um aparte.

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB) - Pois não, Senador Mão Santa.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - V. Exª, líder do meu Partido, muito civilizado, é um homem internacional. Até o chamo, na intimidade, de Shakespeare. A bem da verdade, Cristo não tinha a tribuna que V. Exª tem. Ele dizia: “Em verdade, em verdade, vos digo...” Não é tão simples não. E minha mãe, terceira franciscana, que está no céu, sempre dizia: “Não se fala de padre”. Tenho essa formação. Então, está aqui: D. Tomás Balduíno, no Estado de São Paulo: “Esse é um Congresso hipócrita!” Para o Balduíno, congressista não tem autoridade moral para condenar os sem-terra que invadiram a Câmara. “Esse é um Congresso hipócrita e sem autoridade moral” - foi o Bispo Dom Balduíno. Eu não sei se ele é, mas tem até nome de santo - Dom Tomás Balduíno, Tomás de Aquino. E ele vai mais adiante: “É um Congresso hipócrita e sem autoridade moral. São pessoas não dignas do cargo que ocupam. E insisto: não têm autoridade para ocupar seus cargos.” Então, é sério. E V. Exª diz que está levando a bandeira do PMDB para segurar esse Governo. Votei no PT. Eu até tive medo de que ele trocasse a nossa linda bandeira, aí, de colorido verde, amarelo, branco e azul com estrelas. Mas eles não mudaram por uma bandeira vermelha. Eles só foram na lista branca: onde tem “Ordem e Progresso”, é “Baderna e Baderna”! Essa é a lei do PT.

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB) - Nobre Senador, o meu Arcebispo é o da Paraíba, Dom Aldo Pagotto. Rezo sempre pela cartilha dele. Eu nunca rezei pela cartilha de Dom Balduíno. Acho que ele tem todo o direito de dar a opinião dele, mas eu nunca fui lá dar opinião na diocese que ele preside, como eu nunca vou admitir - a não ser que ele receba votos populares - ele vir aqui dar opinião no nosso Congresso. Cada um no seu “departamento”.

O Sr. Sibá Machado (Bloco/PT - AC) - Permite V. Exª um aparte?

O Sr. Romeu Tuma (PFL - SP) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB) - Sr. Presidente, V. Exª permite que eu conceda o último aparte ao Senador Sibá Machado, que está aqui nervoso, solicitando um aparte, como também ao Senador Romeu Tuma, que está nervoso porque deverá pegar um avião? (Pausa.) Ouço o aparte do Senador Sibá Machado e tenho certeza de que S. Exª será conciso.

Ouço o aparte de V. Exª, Senador Sibá Machado.

O Sr. Sibá Machado (Bloco/PT - AC) - Serei rápido, Sr. Presidente, mas é porque o assunto tomou conta da Casa e quero dizer ao nobre Senador Ney Suassuna que as palavras de S. Exª respondem por todos nós em relação ao que entendemos que foi esse ato de violência. Seremos contra a violência de qualquer natureza, de qualquer pessoa, de quem quer que seja. Contra o comportamento do Sr. Bruno Maranhão, com certeza, será tomada uma atitude. Tenho total segurança com relação a isso. Queria lembrar um fato, porque gosto muito de me pautar pela história. Senador Ney Suassuna, V. Exª, que é do PMDB, quando o Senador José Sarney foi Presidente da República, lançou o Plano Nacional de Reforma Agrária. Naquela época, eu era uma criança, um jovem que lia muitas revistas e jornais. Vi como a UDR nasceu naquele momento, fez leilão de bois, comprou armas, armou pistoleiros, num franco desacato e desobediência à orientação presidencial. Eu não me esqueço dessas coisas. Estava na capa da revista Veja a figura de um pistoleiro do Tocantins, um tal de Bicalho - lembro-me até do nome -, que aparecia em cima de um mourão de cerca, com um rifle Winchester na mão e um revólver 38 na cintura. Aquilo era uma afronta à autoridade presidencial. Então, a questão da violência no Brasil tem que ser tratada linearmente, seja do PCC, seja contra a mulher, seja contra criança, seja contra qualquer pessoa.

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB) - Queria pedir desculpas, mas não poderei conceder aparte.

O Sr. Heráclito Fortes (PMDB - PI) - Queria só fazer um registro, pois é bom a gente ter cuidado daqui para a frente: estamos acabando de descobrir que Sibá Machado é um profundo conhecedor de armas. Veja como, numa fotografia, a distância ele identifica, com precisão, o tipo de arma, o calibre e até quantos tiros dispara. Quero parabenizá-lo. Para mim foi uma surpresa. Eu vou tomar cuidado. Não debato mais com ele, Deus me livre! Tire-me dessa!

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB) - Sr. Presidente, queria agradecer a paciência de V. Exª. Realmente, o nosso Senado da República tem que tomar muitas providências em relação à violência, até a verbal.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 09/06/2006 - Página 19806