Discurso durante a 76ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre a questão do Mercosul. Defesa da política externa brasileira.

Autor
Roberto Saturnino (PT - Partido dos Trabalhadores/RJ)
Nome completo: Roberto Saturnino Braga
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA EXTERNA.:
  • Considerações sobre a questão do Mercosul. Defesa da política externa brasileira.
Publicação
Publicação no DSF de 08/06/2006 - Página 19411
Assunto
Outros > POLITICA EXTERNA.
Indexação
  • ANALISE, POLITICA EXTERNA, IMPORTANCIA, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL), DESENVOLVIMENTO ECONOMICO, BRASIL, CRITICA, IMPROPRIEDADE, DECLARAÇÃO, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, PERDA, PODER, GRUPO ECONOMICO, REGISTRO, ENTRADA, PAIS ESTRANGEIRO, VENEZUELA, REFORÇO, GRUPO, AMERICA DO SUL.
  • RESPOSTA, CRITICA, OPOSIÇÃO, DEFESA, POLITICA EXTERNA, BRASIL, AUSENCIA, INTERVENÇÃO, CONFLITO, PAIS ESTRANGEIRO, URUGUAI, ARGENTINA, REFERENCIA, INSTALAÇÃO, FABRICA, PAPEL, COMENTARIO, COINCIDENCIA, DECLARAÇÃO, MINISTRO DE ESTADO, ITAMARATI (MRE), ASSESSOR, PRESIDENCIA DA REPUBLICA, IMPORTANCIA, DIVISÃO, LIDERANÇA, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL).
  • TENTATIVA, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, DESVALORIZAÇÃO, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL), COMENTARIO, IMPORTANCIA, CRIAÇÃO, GASODUTO, INTEGRAÇÃO, AMERICA DO SUL, ELOGIO, DIPLOMACIA, BRASIL, MANUTENÇÃO, AMPLIAÇÃO, RELAÇÕES INTERNACIONAIS.

O SR. ROBERTO SATURNINO (Bloco/PT - RJ. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Obrigado, Sr. Presidente, Senador João Alberto, do Estado do Maranhão. Srªs e Srs. Senadores, eu não vou responder ao discurso do Senador César Borges, como há dois dias também não respondi às mesmas acusações feitas pelo Senador Antonio Carlos Magalhães, porque esses assuntos, como ele mesmo disse, têm de ser repetidos, e serão repetidos pela Oposição. Essas denúncias vêm sendo repetidas já há dez meses, é papel da Oposição fazer isso, mas não vamos entrar nesse jogo, porque a população brasileira já tomou conhecimento, a OAB apresentou a denúncia e o Poder Judiciário vai julgar. A OAB não quis apresentar a denúncia política do impeachment, porque sabe que não encontraria respaldo junto à população.

Mas, enfim, nós aqui, representantes do Governo, não vamos alimentar esse debate, assim como também não vou falar, Sr. Presidente, sobre o vandalismo, os acontecimentos de ontem na Câmara. Eu já tenho o meu juízo formado: acho que se trata de um bando de desmiolados - para usar a expressão mais adequada - que pensa que vai fazer a reforma agrária na marra. Eu conheço esse tipo de grupo, isso já existiu no passado, no Governo João Goulart. Eu presenciei muito de perto pessoas, grupos que achavam que iam fazer as reformas na marra, se não fossem feitas na lei. Quer dizer, são grupos que não respeitam o Estado, a Lei, o Governo, as instituições, o Parlamento e acham que o que resolve é na marra. Então, o que tem que se fazer é o tratamento que está sendo dado. Eles estão presos, estão sendo autuados. E pronto, o assunto vai para a Justiça, não é? Eu acho só que, realmente, o PT devia cuidar de excluir dos seus quadros esse Sr. Bruno Maranhão. Mas isso é uma opinião pessoal. Não sou da Direção do PT, mas acho que esse assunto tem que ser considerado.

O que eu quero hoje abordar, Sr. Presidente, é a questão do Mercosul e da política externa, porque sinto que há um interesse difuso pelo mundo, pelo Hemisfério Norte principalmente, em destruir o Mercosul, em inviabilizar este que é um projeto importantíssimo para o Brasil. É um projeto que não é de governo. É um projeto de Estado brasileiro. É um projeto no qual o Brasil está investindo todo o seu esforço, porque sabe que o seu destino está ligado ao destino desses países da América do Sul, especialmente do Cone Sul.

E o que é lamentável é que o ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso sabe disto - sabe que é um projeto de Estado e que é uma questão do destino do País - e usa a sua prerrogativa de ex-Presidente para colaborar com esse esforço de destruir o Mercosul. Poucos dias atrás, em entrevista a um jornal uruguaio - o jornal El País - declarou que o Mercosul está agonizando e que os países do Mercosul estão assinando acordos de livre comércio com outros países, ao mesmo tempo em que o Brasil vai perdendo a liderança na região, o que absolutamente não é verdade, Sr. Presidente. O Mercosul não agoniza absolutamente. Ao contrário, o Mercosul se reforçou, agora recentemente, com o ingresso da Venezuela, que é um país de economia relativamente grande em comparação com os demais países da América do Sul. É um país rico em energia, um país cujo comércio com o Brasil, nos último três anos, cresceu em 300%. É um país que tem muito a oferecer e a demandar do conjunto de países que compõem o Mercosul. É um país que, com o seu ingresso e com a força da sua economia, tem condições de, por exemplo, colaborar para que o Brasil e a Argentina possam ajudar um pouco mais os países de economia mais modesta, como é o caso do Uruguai e do Paraguai.

Então, esse ingresso da Venezuela foi um grande passo para a ampliação e o fortalecimento do Mercosul. Por conseguinte, não há nenhum sintoma de agonia nesse projeto porque o Uruguai ameaçou fazer um acordo de livre comércio com os Estados Unidos, mas esse acordo não foi fechado. Assim também o Peru, que, embora não seja do Mercosul, ensaiou um acordo de livre comércio, mas que também não foi fechado. O Equador começou uma negociação e recuou. Quer dizer, não há ameaça. Há um descontentamento, sim, flagrante, declarado, por parte do Uruguai que é preciso considerar - eu até já abordei este assunto aqui - mas que não constitui ameaça maior ao Mercosul.

O ex-Presidente criticou o Governo brasileiro por não intervir no conflito entre Argentina e Uruguai a respeito das papeleras, das fábricas de celulose, que estão sendo projetadas para a fronteira entre os dois países.

É claro que o Brasil, o Itamaraty, a política externa do Governo brasileiro tem bom senso, assim como teve bom senso com a Bolívia. Mostrou que sua linha de ação estava absolutamente certa, porque não caminhou para declarações de hostilidade, como a Oposição queria, mas buscou a negociação e está encontrando os frutos e o resultado dessa negociação.

O Brasil também não vai intervir numa questão que é eminentemente bilateral entre Argentina e Uruguai, a menos que os países interessados peçam uma arbitragem, uma interferência do Brasil. Mas, sem esse pedido, por iniciativa própria seria um desrespeito aos países vizinhos e componentes do mesmo Bloco, que é o Mercosul.

Então, não tem nenhum sentido essa crítica. É uma crítica apenas para somar a argumentos que são falsos, para mostrar que o Mercosul não vai bem e que o Brasil não está certo na sua linha de conduta na América do Sul. Mostrou-se preocupado com o papel de destaque do Presidente da Venezuela, Hugo Chávez. O Presidente Hugo Chávez é agora pretexto para tudo que se quer criticar em relação ao Brasil. Foi assim com a Bolívia, tem sido assim com a crítica que se está fazendo ao projeto do gasoduto. O Presidente Hugo Chávez passa a ser pretexto para qualquer tipo de crítica dos projetos brasileiros e sul-americanos de integração.

Na mesma entrevista, ele diz que a liderança do Brasil na América do Sul diminuiu na medida em que alguns dos líderes brasileiros começaram a proclamá-la de forma ostensiva, quando que o que acontece é exatamente o contrário. Esteve aqui na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional o Ministro Celso Amorim, há mais ou menos duas semanas, onde S. Exª declarou exatamente o mesmo que declara o Assessor Especial da Presidência da República, o Sr. Marco Aurélio Garcia, em entrevista ao mesmo jornal para o qual o ex-Presidente Fernando Henrique concedeu entrevista, o jornal uruguaio El País.

No mesmo jornal, o Professor Marco Aurélio sustenta que o Brasil não pretende ser o líder da região. Segundo ele, é preciso compartilhar essa liderança. E a atitude do Governo brasileiro tem sido esta: compartilhar a liderança com países como a Argentina, a Venezuela, e o Uruguai - o qual precisa ser um pouco mais destacado nessa convivência.

Mas o que quero ressaltar é a atitude negativa de um ex-Presidente tentando prejudicar um projeto nacional, um projeto de Estado, um projeto do qual depende o destino do País, que é Mercosul, mostrando ressentimentos com o destaque internacional que o Brasil vem tendo durante o atual Governo, o que não teve no seu período. Mas essa é uma atitude menor, que não casa com a grandeza que deve ter a figura de um ex-Presidente.

Só para ilustrar posições do Governo brasileiro, quero mostrar que, há poucos dias, o Secretário-Geral do MRE, Embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, lançou um livro em que destaca exatamente a prioridade do projeto de integração sul-americana, dizendo que não há solução individual para nenhum país da América do Sul sem essa integração. E delineia um projeto segundo o qual o Brasil se insere no continente sul-americano com base na integração e na liderança compartilhada.

Desse modo, Sr. Presidente, não procedem em absolutamente nada as declarações do ex-Presidente, que deveria pensar mais no destino do País e nos interesses do Estado brasileiro.

Mas, Sr. Presidente, o que é importante é que há, sim, interesses difusos, interesses não explicitados, não declarados, sempre colocados de forma subterrânea pela imprensa, pela mídia, por posições políticas assumidas, de bombardear, de destruir, sim, o Mercosul usando em grande parte o ingresso da Venezuela, ingresso esse que significa um grande avanço para o Mercosul.

Agora eu gostaria de destacar - e já me referi ao crescimento de 300% em três anos - o comércio do Brasil com a Venezuela. O Brasil compra derivados de petróleo, uréia, vidro, enxofre, carvão e matérias-primas do setor plástico da Venezuela. E vende manufaturados, como telefones celulares, equipamentos agrícolas, automóveis, carne e carne de frango. E o Brasil tem com a Venezuela um superávit no comércio bilateral de US$2 bilhões. Quer dizer, é muito significativo, é muito efetivo esse comércio e é importante que a Venezuela ingresse para desenvolver projetos de integração na área da energia.

Esse gasoduto, Sr. Presidente, precisa ser tratado com mais seriedade. Não é essa brincadeira de chamar o gasoduto de “Transpinel”. Isso me lembra muito da Belém-Brasília que chamavam de “Estrada das Onças”, que diziam que “ligava o nada a coisa nenhuma”. A própria construção de Brasília, a ocupação do Centro-Oeste, tudo isso era ridicularizado da mesma forma. E hoje a realidade aí está. É claro que, para ser decidido e iniciado, esse investimento requer um estudo, um exame muito aprofundado e demorado. É decisão para demorar aí...

(Interrupção do som.)

O SR. ROBERTO SATURNINO (Bloco/PT - RJ) - Eu já termino, Sr. Presidente.

Trata-se de um investimento da maior importância para o Brasil, para a Argentina, para o Chile, para América do Sul toda, para a integração sul-americana, de vez que a Venezuela é o país que dispõe de reservas de gás muito maiores ainda do que as da Bolívia.

De forma que é um projeto que precisa ser tratado com mais seriedade, mas os críticos que querem bombardear de toda forma a integração sul-americana, para jogar o Brasil nos braços do tradicional domínio da hegemonia norte-americana, usam esse tipo de argumento.

Aliás, Sr. Presidente, não há descuido também nas relações do Brasil com os Estados Unidos. O Governo Lula não tem descuidado disso absolutamente.

Recentemente, o Ministro Luiz Fernando Furlan e o Secretário de Comércio norte-americano, Carlos Gutiérrez, que fez uma visita ao Brasil de quatro dias, conversaram exaustivamente e abriram estradas e caminhos para o crescimento e o incremento das relações comerciais muito importante.

Então, não há nenhum descuido, não há descuido com as relações com outros países que não pertencem ao Mercosul, como é o caso da Colômbia. As relações políticas e comerciais do Brasil com a Colômbia vão muito bem. Eu diria extraordinariamente bem. Não vou, agora e aqui, citar números porque o meu tempo já se esgotou, mas quero fazer uma referência, ainda que breve: o comércio bilateral Brasil-Colômbia cresceu substancialmente, mais de 200%, e os entendimentos para o relacionamento político também estão muito avançados e satisfatórios para ambas as partes. De forma que o Brasil busca essa integração mais próxima e mais efetiva com os países do Mercosul, agora com o ingresso da Venezuela, sem descuidar das relações tradicionais com os Estados Unidos, com a Europa, buscando a abertura de novos mercados, agora com a Índia, com a China, com a África, com a África do Sul, mas sem descuidar, naturalmente, das relações tradicionais, que, absolutamente, não se deterioraram. O comércio entre Brasil e União Européia e entre Brasil e Estados Unidos não se reduziram. Ao contrário, também cresceu, só que, para os novos mercados, o crescimento foi muito maior, muito mais substancial, o que corresponde a um interesse do Brasil e a um desejo da Nação brasileira de diversificar nossas fontes de aquisição de comércio, para tornar o País um pouco mais imune a crises que venham da economia norte-americana e que, agora, por exemplo, avizinham-se à perspectiva de uma parada no dinamismo da economia americana.

Sr. Presidente, encerro e agradeço muito a tolerância de V. Exª.

Era o que eu tinha a dizer hoje.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/06/2006 - Página 19411