Discurso durante a 76ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Homenagem ao Senador Tião Viana por sua aprovação em concurso público para catedrático na Universidade Federal do Acre. Perplexidade com a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que pode livrar condenado por crime hediondo de regime fechado.

Autor
Romeu Tuma (PFL - Partido da Frente Liberal/SP)
Nome completo: Romeu Tuma
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. LEGISLAÇÃO PENAL.:
  • Homenagem ao Senador Tião Viana por sua aprovação em concurso público para catedrático na Universidade Federal do Acre. Perplexidade com a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que pode livrar condenado por crime hediondo de regime fechado.
Publicação
Publicação no DSF de 08/06/2006 - Página 19439
Assunto
Outros > HOMENAGEM. LEGISLAÇÃO PENAL.
Indexação
  • HOMENAGEM, SENADOR, APROVAÇÃO, CONCURSO PUBLICO, UNIVERSIDADE FEDERAL DO ACRE (UFAC).
  • REPUDIO, DECISÃO, JUSTIÇA, POSSIBILIDADE, CUMPRIMENTO, PENA, CRIME HEDIONDO, REGIME ABERTO, RESULTADO, VOTAÇÃO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), AUSENCIA, UNANIMIDADE, ALTERAÇÃO, LEGISLAÇÃO PENAL, FACILITAÇÃO, IMPUNIDADE, REINCIDENCIA.
  • QUESTIONAMENTO, INCONSTITUCIONALIDADE, DECISÃO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), REDUÇÃO, DIFERENÇA, CRIME HEDIONDO, ANALISE, SITUAÇÃO, CRISE, SEGURANÇA PUBLICA.
  • ANUNCIO, INSTALAÇÃO, COMISSÃO ESPECIAL, ESTUDO, REFORMULAÇÃO, LEGISLAÇÃO PENAL.

O SR. ROMEU TUMA (PFL - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, quero, em primeira mão, homenagear V. Exª, Senador Tião Viana, que está presidindo esta sessão, em razão da sua aprovação em concurso público para catedrático da Universidade Federal do Acre, na área de Medicina, em que V. Exª desponta como um grande profissional, com quem, inclusive, tenho me consultado nas horas de dificuldade.

V. Exª é um grande lutador nesta Casa a fim de melhorar a atividade médica nas cidades em que as dificuldades são grandes. Vejo seu esforço para levar o Sarah, o Incor e outros hospitais de ponta para a Região Norte do País. Não quero que V. Exª se aposente aqui, mas que, de vez em quando, dê algumas aulas para contribuir com a boa formação da qualidade médica, tendo em vista a sua experiência e a grandiosidade do seu coração.

Para mim, os médicos, na sua grande maioria, são humanistas, Sr. Presidente. Tenho, inclusive, um filho que é médico, como V. Exª sabe. A grande preocupação do médico é contribuir para que as pessoas vivam sem sofrimento. Às vezes, não alcançam a cura, mas lutam para que não haja sofrimento e para que o paciente tenha boas condições de vida.

Que Deus abençoe as suas mãos, porque a sua atividade privada é a imitação de Jesus Cristo. Parabéns a V. Exª! Fico muito orgulhoso em poder dizer que sou seu amigo.

O SR. PRESIDENTE (Tião Viana. Bloco/PT - AC) - Muito obrigado.

O SR. ROMEU TUMA (PFL - SP) - Mas o que me traz aqui hoje, Sr. Presidente - parece-me que a Senadora Ideli Salvatti saiu -, é o emprego das Forças Armadas, que está previsto na Constituição. Não é um emprego indiscriminado, mas as Forças Armadas têm as suas obrigações na defesa interna e externa. A Constituição é clara e, hoje, foi regulamentado até o seu emprego como Polícia, se necessário for.

Já tivemos alguns exemplos. Ninguém quer que o Exército vá para as ruas combater movimento social. Nada disso. A grande preocupação gerada, hoje, é que estão fazendo um pouco de confusão entre movimento social e prática de crime.

Não podemos confundir e permitir que, sob a égide ou cobertura de movimentos sociais, possam se fazer determinadas ações que estão previstas no Código Penal. Elas não podem ser passadas por cima, senão, realmente, o Governo poderá perder o controle, pela autoconfiança que esses grupos vão ganhando e, a cada dia, piorando a sua ação, com o objetivo, talvez, de forçar o Governo a uma decisão em que, às vezes, tem uma certa dificuldade.

No último mês de fevereiro, o Supremo Tribunal Federal decidiu, por 6 votos contra 5, pela inconstitucionalidade do §1º do art. 2º da Lei nº 8.072, de 25 de julho de 1990, chamada Lei de Crimes Hediondos.

O texto embargado dispunha que as penas por crimes hediondos por prática da tortura, tráfico de entorpecentes e drogas afins e por terrorismo seriam cumpridas integralmente em regime fechado.

Como crimes hediondos - sempre é bom lembrar - foram considerados o homicídio, quando praticado em atividade típica de grupo de extermínio, e o homicídio qualificado; o latrocínio; a extorsão qualificada pela morte; a extorsão mediante seqüestro e na forma qualificada; o estupro; o atentado violento ao pudor; a epidemia como resultado de morte - V. Exª é médico e sabe que pode ser causada pelo ser humano, quando quer praticar o mal contra um prefeito ou um governador -; a falsificação; a corrupção - e tem havido tantos fatos de corrupção e, hoje, é crime hediondo, pelo prejuízo que traz à sociedade. E quantos homicídios são praticados em razão da falta de dinheiro, principalmente na área de saúde? -; adulteração ou alteração de produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais; e o genocídio tentado ou consumado. Em síntese: todos crimes de extrema gravidade; crimes que levam a sociedade sempre a reagir com indignação e repulsa.

Pois bem, a entidade a quem cabe a guarda da Constituição concluiu que aos responsáveis por qualquer um desses crimes pode ser concedido o benefício da progressão da pena.

É evidente, Srªs e Srs. Senadores, que decisões do Supremo não devem ser desafiadas. A elas, em nome dos princípios democráticos, devemos a mais completa obediência.

Não obstante, eu estaria traindo minha consciência e a confiança de milhões de eleitores que me honraram com seus votos se não manifestasse, pelo menos, tristeza, mágoa e perplexidade com tal decisão, principalmente porque ela está longe de explicitar um pensamento unânime daquela Casa; afinal, o placar foi apertadíssimo. E também porque, vejam só, ela foi tomada no bojo do pedido de habeas corpus, impetrado por um cidadão condenado por atentado violento ao pudor contra três crianças, Senadora Patrícia e Senadora Heloísa Helena. A mais nova tinha seis anos e a maiorzinha, oito anos. Ou seja, a decisão se reveste até de certo simbolismo: revelaria, ainda que de forma inconsciente, um pouco de desatenção pelo futuro do nosso País - do Supremo, por seis votos a cinco, sobre a pena para crime considerado hediondo. Portanto, o cidadão tinha de cumprir toda a pena em prisão fechada. Agora, com 1/6 da pena cumprida, o condenado vai para a rua, provavelmente para violentar novamente as crianças, porque isso é um vício terrível, próprio de pessoa de má formação.

Tenho feito aqui, no Senado, e em artigos publicados na imprensa, um alerta que me parece essencial: a enxurrada de regalias penais que acaba levando, quase sempre, à impunidade é a maior fonte de incentivo à criminalidade. As benesses permitem aos piores homicidas, por exemplo, aguardar julgamento em liberdade, durante anos, mesmo quando inculpados por força de confissão apoiada em provas irrefutáveis - ressalte-se o caso da jovem Suzane, que, com o auxílio de dois rapazes, matou os pais à pancada.

As benesses permitem aos criminosos ficar em liberdade mesmo depois de condenados em segunda instância, até que se esgote a última possibilidade de recurso. As benesses permitem aos bandidos que comandam o crime organizado usar as celas como escritórios para orientar a ação dos asseclas nas ruas. As benesses, enfim, libertam milhares de condenados antes do efetivo cumprimento da pena.

Como se tudo isso não bastasse, Srªs e Srs. Senadores, temos agora essa decisão do Supremo, a dificultar que criminosos da mais alta periculosidade cumpram as penas integralmente em regime fechado.

Com todo o respeito, volto a dizer, que devo ao órgão máximo do Poder Judiciário, seria exigir muito pedir que eu me calasse. Tenho insistido, Sr. Presidente, na absoluta inconveniência da medida. E volto ao assunto hoje, porque tenho recebido inúmeras mensagens de cidadãos brasileiros manifestando a mesma contrariedade. Uma delas em especial, eu gostaria de destacar: trata-se de correspondência que me foi encaminhada pelo Sr. Fernando de Macedo, Subprocurador-Geral da República. Seus argumentos, contrários ao critério adotado pelo STF nessa questão, são irretocáveis. Dele, cito dois que me parecem de relevância ainda maior.

Em primeiro lugar, o Subprocurador aponta o fato inquestionável de que, ao permitir a progressão no cumprimento da pena aos condenados por crimes hediondos, o Supremo “reduziu a uma expressão meramente acadêmico-conceitual aquela diferença prática, antes bem mais consistente e tangível, que havia entre esses tipos de crime e todos os demais”.

Um segundo ponto destacado pelo Sr. Fernando de Macedo assusta ainda mais, até porque põe em risco a vida de representantes do Poder Judiciário. Seu alerta, Srªs e Srs. Senadores, é no sentido de que, “ao colocar exclusivamente nos ombros do Juízo das Execuções Criminais todo o pesado ônus jusdecisório, referente à concessão ou não - e em qual medida - do regime progressivo aos condenados por crimes hediondos, a interpretação dada pelo Supremo fez com que o magistrado responsável pela decisão se possa tornar alvo único e preferencial de eventuais retaliações”. Como bem lembra o Subprocurador-Geral, “trata-se, pois, da facilitação do primado irresistível, também entre nós, do princípio antijurídico plata o plomo (isto é, suborno ou morte), já adotado por organizações criminosas como o Sendero Luminoso, os Cartéis de Medellín e de Cali, as Farc, entre outras” - inclusive o PCC.

Em resumo, Sr. Presidente, penso que a decisão adotada por frágil maioria do Supremo, salvo melhor juízo, é equivocada, até porque o principal argumento em que se apoiou, o de preservação do princípio de individualização da pena, pode ser facilmente questionado. Basta citar, a esse respeito, o voto da ilustre Ministra Ellen Gracie - um dos cinco votos vencidos, mas um exemplo de discernimento e clareza. Sustentou a Ministra Ellen Gracie a idéia de que a individualização da pena é garantida “por um complexo de normas e conta com as atuações legislativa e judicial, culminando com a sentença condenatória, resultado da ponderação que o juiz faz dos elementos subjetivos e objetivos do crime em relação a cada réu. Surge, então, o título executivo penal, que, como se viu, levou em consideração as circunstâncias personalíssimas do acusado. Nas fases seguintes, novamente, o perfil do apenado é que determinará o curso da execução”.

Tudo isso, Srªs e Srs. Senadores, levou a Ministra Ellen Gracie a concluir que “é difícil admitir, dentro do grande complexo de normas que constituem o arcabouço do instituto da individualização da pena e de sua execução, que a restrição na aplicação de uma única dessas normas, por opção da política criminal, possa afetar todo o instituto. E mais: que possa essa restrição representar afronta à norma constitucional que instituiu a individualização da pena”.

(O Presidente faz soar a campainha.)

O SR. ROMEU TUMA (PFL - SP) - Já vou terminar, Sr. Presidente.

A segurança pública em nosso País, Sr. Presidente, vive momento de crise. Um momento em que não podemos fraquejar, um momento em que precisamos estar à altura das graves responsabilidades que nos foram atribuídas. Não é o momento, portanto, para retrocessos. Ou enfrentamos a criminalidade com firmeza e desassombro, ou talvez venhamos a ser acusados, no futuro, de não termos feito todos os esforços que devíamos para proteger a nossa população de bandidos que insistem em desafiá-la.

Eu gostaria de lembrar que, recentemente, o Senador Demóstenes Torres, que infelizmente não está presente, apresentou um projeto do qual fui Relator e que recebeu quase a unanimidade de votos na CCJ, modificando para cálculo de progressão o tempo de cumprimento da pena. Já que o Supremo exige a progressão penal, que haja um cálculo maior do tempo de cumprimento da pena, e não 1/6, fazendo com que um marginal de alta periculosidade possa rapidamente deixar a cadeia e voltar a delinqüir com a mesma violência que praticava quando foi encarcerado.

Na próxima segunda-feira, o Tribunal de Justiça de São Paulo instalará uma comissão especial para estudar a reforma da Lei de Execuções Penais, sob a Presidência do ilustre Desembargador Luiz Carlos dos Santos, sendo Relator o Dr. Marco Antônio. Recebi o convite e estarei presente.

A nossa esperança é que as modificações tragam um pouco mais de tranqüilidade à sociedade.

Agradeço, Sr. Presidente, a tolerância de V. Exª.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/06/2006 - Página 19439