Discurso durante a 77ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Preocupação com o crescimento da violência urbana no país.

Autor
Valmir Amaral (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/DF)
Nome completo: Valmir Antônio Amaral
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SEGURANÇA PUBLICA.:
  • Preocupação com o crescimento da violência urbana no país.
Publicação
Publicação no DSF de 09/06/2006 - Página 19864
Assunto
Outros > SEGURANÇA PUBLICA.
Indexação
  • GRAVIDADE, AUMENTO, VIOLENCIA, ZONA URBANA, BRASIL, SUPERIORIDADE, MORTE, JUVENTUDE, ATUAÇÃO, COMANDO, CRIME ORGANIZADO, REGISTRO, DADOS, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A EDUCAÇÃO A CIENCIA E A CULTURA (UNESCO), SISTEMA UNICO DE SAUDE (SUS), INCLUSÃO, PERDA, ACIDENTE DE TRANSITO, SUICIDIO, ANALISE, CULTURA, DESIGUALDADE SOCIAL, IMPUNIDADE, OCORRENCIA, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), NECESSIDADE, INVESTIMENTO, PODER PUBLICO, REFORMULAÇÃO, MODELO, SEGURANÇA PUBLICA.

O SR. VALMIR AMARAL (PTB - DF. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr Presidente, Srªs e Srs. Senadores, as cidades brasileiras estão envolvidas em uma guerra urbana sem trégua. Morrem mais jovens em nossas ruas do que em países onde existem conflitos armados declarados. Por trás das estatísticas dos assassinatos está a grande dor das vítimas ocultas desses tristes acontecimentos: parentes e amigos de jovens chacinados e de policiais mortos em serviço, como vemos todos os dias e como vimos há pouco em São Paulo, durante rebelião liderada pelo famigerado grupo marginal, Primeiro Comando da Capital (PCC). O que estamos assistindo em nosso País é a banalização da morte e da violência, e um crescimento incontrolável dos homicídios de pessoas entre 15 e 24 anos.

Segundo estudos realizados pela Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO), em 1979, 6 mil 943 jovens entre 15 e 24 anos foram assassinados no Brasil. Em 1996, 15 mil 231 jovens foram eliminados. Em 2000, foram registrados 45 mil 919 homicídios em todo o território nacional. Destes, cerca de 39% se situaram na mesma faixa etária. Entre 1993 e 2002, os homicídios de jovens na faixa etária de 15 a 24 anos cresceram 88,6%. Na população em geral, o incremento foi de 62,3%, mais de quatro vezes superior ao aumento populacional registrado no período, 15,2%. Finalmente, a Unesco mostra que, dos 550 mil mortos por arma de fogo no Brasil entre 1979 a 2003, 44,1% eram jovens de 15 a 24 anos. Desse grupo, 74,6% eram negros.

De acordo com dados do Sistema Único de Saúde (SUS) e do Sistema Nacional de Informações de Segurança Pública, o Mapa da Violência IV aponta que, de 1980 a 2002, a taxa global de mortalidade entre os jovens brasileiros só fez aumentar. Logo abaixo dos homicídios, aparecem os acidentes de trânsito e os suicídios. É importante destacar que, dos óbitos registrados em 2002, 31,2% foram causados por armas de fogo. Mais ainda, as taxas de homicídio deixam o Brasil em quarto lugar entre os 67 países em que há levantamentos semelhantes. Ao se considerar a taxa de assassinatos na população em geral, ficamos atrás apenas da Colômbia, de El Salvador e da Rússia. No ranking mundial de homicídios entre jovens, o Brasil ocupa o quinto lugar, após Colômbia, Ilhas Virgens, El Salvador e Venezuela. Por conta dessa realidade trágica, nos últimos anos, a sociedade brasileira entrou no grupo das mais violentas do mundo.

A violência urbana é determinada pela deformação dos valores sociais, culturais, econômicos, políticos e morais de uma sociedade. Na opinião dos cientistas sociais, de uma maneira geral, as manifestações mais extremas da violência urbana ocorrem em sociedades nas quais existe uma tradição cultural de violência e que são marcadas por acentuadas divisões étnicas, sociais e econômicas. Além disso, a violência urbana é grande em países em que os mecanismos de controle social, político e jurídico não funcionam eficazmente.

Dessa forma, em países como o Brasil, de instituições frágeis, desigualdades profundas e tradição cultural de violência, a realidade do cotidiano é das mais cruéis. Portanto, são freqüentes os comportamentos criminosos graves, como assassinatos, ajustes de contas, linchamentos, assaltos, tráfico de drogas, tiroteios entre quadrilhas rivais, corrupção desenfreada e desrespeito sistemático às normas de conduta social estabelecidas pelos códigos legais ou pelo costume. Resta dizer que todos esses desvios encontram respaldo na certeza da impunidade, que ameaça seriamente a democracia e compromete perigosamente a autoridade do Estado.

Outrossim, convém destacar que os dados que acabamos de apresentar são reveladores de um verdadeiro filme de terror, de uma macabra carnificina que nos causa tristeza e vergonha. Em verdade, a imagem do brasileiro cordial, afável, alegre, hospitaleiro, brincalhão e solidário é parte de um sonho, de um equívoco de análise do notável historiador Sérgio Buarque de Holanda, incluído nas páginas de um dos seus livros, Raízes do Brasil.

Nobres Senadoras e Senadores, a violência que presenciamos hoje em nosso País não tem mais limites nem respeita nenhuma regra. Não importa o lugar, a hora ou o motivo, porque ela está sempre presente em cada rua, em cada viela, em cada beco, em cada semáforo e em cada esquina. Além disso, ela não distingue classe social, cor, credo, raça ou ideologia. Todos sem exceção são seus alvos. Há poucos dias, como já fiz referência, a violência bateu todos os recordes em São Paulo capital. A cidade praticamente parou, muitas lojas cerraram as portas, a população ficou aterrorizada e as autoridades perplexas diante da ousadia praticada pelo PCC, que resultou em mais de cem mortos entre bandidos, policiais e gente do povo.

Eminentes colegas Senadoras e Senadores, a maioria da sociedade não agüenta mais tanta violência. Então, a pergunta mais urgente que deve ser colocada é a seguinte: o que fazer para diminuir esse drama, reduzi-lo pelo menos a patamares mais civilizados e menos vergonhosos? Obviamente, devemos pensar em planos eficazes, de aplicação e resultados rápidos, e de custos razoáveis.

Sabemos perfeitamente que as ações sociais são de fundamentais, mas seus resultados são de longo prazo. Todavia, elas são importantes e precisam ser desenvolvidas conjuntamente com outros projetos que sejam capazes de proporcionar respostas imediatas. Assim, o ideal nesse combate à violência é promover a associação das políticas de desenvolvimento com as políticas de reaparelhamento jurídico-repressivo do Estado.

Para tanto, é preciso, por exemplo, reformular já as polícias, militares e civis, objetivando maior integração entre elas e melhor capacidade operacional e profissional para que possam mostrar mais eficácia no combate ao crime organizado. É preciso melhorar os salários, punir exemplarmente os policiais corruptos e acabar de vez com os privilégios especiais corporativos que incentivam a impunidade e alimentam a violência. É preciso igualmente reformular a justiça, acabar com o excesso de processos, suprir a sua falta em recursos humanos, modificar os Códigos já ultrapassados, garantir proteção aos cidadãos que testemunham em inquéritos policiais ou em juízo, enfim, torná-la ágil, moderna, competente e isenta em seus julgamentos. É preciso reformular o sistema penitenciário, acabar com o terror nos presídios, com a promiscuidade, com a falta de higiene, com a corrupção, com os maus-tratos, com presos dormindo uns sobre os outros ou se revezando em espaços minúsculos, com as injustiças das condenações, com as coações, com a falta de humanidade que existe nos presídios inteiros do País, com a superlotação nas prisões e conhecer melhor a realidade penal de cada preso para evitar detenções desnecessárias por delitos que são muitas vezes de pouca gravidade.

Sem dúvida alguma, o Poder Público e o Congresso Nacional têm muito a fazer para combater a violência e mudar a imagem do nosso País. Entretanto, para conquistar esse objetivo, dois passos são decisivos. O primeiro deve ser dado no sentido de destinar grandes investimentos para promover a formação educacional de base de nossas crianças e dos nossos jovens. O segundo repensar imediatamente o modelo de segurança vigente no País e procurar corrigir os pontos mais sensíveis que acabei de destacar. Só assim o Brasil conseguirá reduzir a escalada do crime e se apresentar à comunidade internacional com estatísticas menos sinistras.

Era o que eu tinha a dizer.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 09/06/2006 - Página 19864