Discurso durante a 79ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Questionamentos sobre a teleconferência realizada entre o presidente Lula e integrantes da Seleção Brasileira.

Autor
Heráclito Fortes (PFL - Partido da Frente Liberal/PI)
Nome completo: Heráclito de Sousa Fortes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO.:
  • Questionamentos sobre a teleconferência realizada entre o presidente Lula e integrantes da Seleção Brasileira.
Aparteantes
Pedro Simon.
Publicação
Publicação no DSF de 13/06/2006 - Página 20015
Assunto
Outros > PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO.
Indexação
  • COMENTARIO, HISTORIA, FUTEBOL, BRASIL, VITORIA, CAMPEONATO MUNDIAL, COMPARAÇÃO, ATUAÇÃO, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, CRITICA, DECLARAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, DESVALORIZAÇÃO, ATLETA PROFISSIONAL, DESRESPEITO, FUNÇÃO, CHEFE DE ESTADO, TENTATIVA, FAVORECIMENTO, REELEIÇÃO.

O SR. HERÁCLITO FORTES (PFL - PI. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, eu vou falar hoje de Copa do Mundo, porque este é o clima que domina todos os brasileiros. Não podemos fugir ao sentimento nacional.

Em 1958, o Brasil sagrou-se campeão pela primeira vez. Foi um feito histórico.

Era Presidente da República Juscelino Kubitscheck. O seu envolvimento com a seleção brasileira limitou-se a de um torcedor comum que ficou vendo a ansiedade dos brasileiros e assistindo de maneira precária aos jogos realizados na Suécia por meio das transmissões limitadíssimas dos rádios da época. Após o Brasil se sagrar campeão, Senador Saturnino, Sua Excelência, como Chefe de Estado, recebeu no Rio de Janeiro a delegação brasileira para parabenizar os atletas por aquele grande feito.

Em 1962, o Presidente João Goulart repetiu o feito diante da vitória do Brasil no Chile.

Passamos alguns anos num jejum de vitórias, e, em 70, nos chamados anos de chumbo, o Brasil sagra-se tricampeão. Apesar de se viver então numa ditadura, não se tem notícia de nenhuma visita da seleção brasileira ao Presidente de então, Médici. A única anormalidade naquele episódio foi um palpite, Senador Simon, do então Presidente gaúcho, dizendo que gostaria de ver o Dadá, do Atlético Mineiro, o famoso Dadá Maravilha, como jogador da seleção.

Aquilo, na época, deu um qüiproquó danado, e quero crer até que isso tenha feito com que o jovem técnico Zagalo, para não aceitar interferências externas indevidas, evitasse ao máximo colocar em campo o Dadá Maravilha. E o Dadá ficou marcado como um candidato a centroavante do Palácio do Planalto.

O Sr. Pedro Simon (PMDB - RS) - Permite-me um aparte, Senador?

O SR. HERÁCLITO FORTES (PFL - PI) - Pois não, com o maior prazer.

O Sr. Pedro Simon (PMDB - RS) - Acho que estamos fazendo certo equívoco. O centroavante era esse, mas o técnico era o João Saldanha. O João Saldanha era o técnico, quando, lá no estádio do Internacional, no intervalo do primeiro para o segundo tempo, a imprensa conseguiu o milagre de chegar perto do Presidente - o que era uma coisa impossível, mas o Médici gostava de futebol - e perguntou: “Presidente, o que o senhor acha do time? “- Está bom.” “- O senhor faria alguma convocação diferente?” O Presidente, com certa elegância, disse: “Eu convocaria o Dadá”. Aí, os repórteres foram ao João Saldanha, o técnico, e disseram: “João Saldanha, o Presidente terminou de dizer que, se o técnico fosse ele, ele convocaria o Dada”. E João Saldanha respondeu: “Fiz um trato com o Presidente: eu não me meto no Ministério dele, e ele não se mete na escalação do Brasil”. Mas, logo, logo, demitiram-no.

O SR. HERÁCLITO FORTES (PFL - PI) - Exatamente. Nós estamos certos. Depois da crise da saída do João Saldanha, quem foi ao México, como técnico, foi o Zagalo. E Dadá Maravilha já estava estigmatizado por esse desejo do Presidente Médici, que até se respeita, pois gostava de futebol e popularizou o radinho de pilha no ouvido. O João Saldanha foi uma fase. Em um desvio de rota na sua brilhante carreira de comentarista, numa crise resolveram colocá-lo como técnico e, após esse episódio, ele resolveu dizer que o Pelé estava míope. O restante da história o Brasil todo conhece.

Em 1994, o Presidente era Itamar Franco, que, como V. Exª sabe, é um homem de temperamento, impulsivo. Mas não se sabe de nenhuma opinião ou posição de Itamar Franco para escalar jogadores - e ele faria uma média fantástica porque vários mineiros despontavam para o futebol naquela época; inclusive o próprio Ronaldo, hoje Fenômeno, que, para alguns, está gordo, jogava em um clube mineiro naquela época.

O Sr. Pedro Simon (PMDB - RS) - Faço questão de dizer que, em minha opinião, ele não está gordo, e o Presidente não bebe.

O SR. HERÁCLITO FORTES (PFL - PI) - Senador Pedro Simon, em 2002, o Presidente da República era Fernando Henrique Cardoso. Era ano de eleição, e o candidato do Presidente Fernando Henrique estava lançado. O Brasil foi para aquela Copa, que, pela primeira vez, teve sua sede dividida entre a Coréia e o Japão. O Brasil sagrou-se campeão. O Presidente também não escalou seleção, não deu pitaco. E, na volta, a seleção foi recebida.

O que vimos na semana passada, naquela teleconferência, foi o absurdo dos absurdos. Criou-se, inclusive, uma crise, que a imprensa está conseguindo, a muito custo, abafar. O que se sabe é que um grande atrito envolveu a comissão técnica. Algum prestador de serviço ao Governo de plantão - e isso acontece - quis punir Ronaldo Fenômeno, hoje dito gordo, por sua resposta. Mas outro jogador com liderança disse: “Nesse caso, temos que punir Zagalo, porque o Zagalo fez apologia ao número 13, número do Lula”.

Assim, vemos o que pode um Presidente sem ocupação, sem responsabilidade para com um País cheio de problemas, é capaz de fazer. Preocupou-se com os investimentos de Cafu lá fora, bem mais fáceis de justificar do que os de alguns de seus companheiros de equipe, que tiveram de ser demitidos porque não souberam como justificar as contas que possuem no exterior. O que o Presidente da República tem a ver - já que não é da sua competência - com os investimentos que Cafu ou quem quer que seja faz no exterior?

Nunca vi, na minha vida, mesmo que se diga que estamos no Brasil, o País do Futebol, um Presidente se dar ao luxo de, no horário em que deveria estar trabalhando pelo País, estar em uma roda de conversa de futilidade, usando da tecnologia da teleconferência e se expondo a esse ponto.

A comissão técnica é que tem capacidade suficiente de avaliar as condições de um jogador. O próprio diálogo mostrado pela televisão demonstra a perda de tempo que foi aquela teleconferência. Acho até, Senador Paim, que, se o Presidente, como torcedor, quisesse manter esse diálogo para dar conforto ou estimular os atletas, poderia tê-lo feito naquela teleconferência, sem necessidade de divulgação nacional. Ele quis, na realidade, tirar uma casquinha à custa da popularidade da seleção brasileira, o que é grave.

Quero até louvar a posição da atual namorada do Ronaldo, a modelo Raica, que disse que o que lhe causa espécie e estranheza é um Presidente de um País como o nosso, em que o povo passa fome, as estradas estão esburacadas e as dificuldades são grandes, preocupar-se com o peso de um jogador de futebol. É lamentável. Mas, de tropeço em tropeço, Sua Excelência vai levando a vida.

Acho que o Senhor Presidente, agora, está na obrigação de fazer teleconferências permanentes. Por exemplo, deveria fazer uma teleconferência com a família do João José, aquele engenheiro morto de maneira misteriosa no Iraque, desaparecido, para a Nação brasileira saber que ele se preocupa com um trabalhador que desapareceu; fazer uma teleconferência para o Brasil saber que ele está preocupado com o destino dos familiares daquele rapaz que foi assassinado no metrô de Londres. Assim poderia demonstrar que se preocupa com esse tipo de assunto. O Presidente da República deveria usar a tecnologia e a teleconferência para mostrar ao Brasil a sua sensibilidade, hoje, por exemplo, com as chuvas que abatem na cidade do Rio de Janeiro ou para confortar a mãe daquele guitarrista assassinado no trânsito daquela capital. Por que, na rebelião que aconteceu nos presídios de São Paulo, Sua Excelência não falou com os policiais, com os familiares dos policiais que foram mortos, para dizer que o Governo Federal, embora impotente diante da onda avassaladora de violência, era solidário e envidaria esforços ao seu alcance, pelo menos para confortar ou dar apoio moral aos que sofriam e aos que sofrem ainda hoje a dor dos entes perdidos? Não! Não dá voto, não dá popularidade.

Agora, pegar uma seleção brasileira, em cujo sucesso ele não tem nenhuma participação, pois é um esporte coletivo e que depende exatamente do esforço, da dedicação de cada um, e querer tirar casquinha, pensando que o brasileiro é trouxa, isso é um episódio inconcebível e lamentável.

A liturgia do cargo de Presidente da República não permite comportamento dessa natureza.

Não digo nem que o Ronaldinho está certo pela resposta que deu, mas quem diz o que quer ouve o que não quer. Aliás, o Ronaldinho correu um risco muito grande, pois um jornalista americano que tratou do assunto há três anos foi ameaçado de ser expulso do País, quando, na realidade, não cometia calúnia, estava praticando o exercício pleno da liberdade de imprensa, que, logo em seguida, por sinal, o PT, por meio de modificações legais, quis cercear ou limitar. 

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, eu disse aqui, na sexta-feira, que o meu medo nisso tudo é que o Brasil, para alegria dos brasileiros, avance e chegue às quartas-de-final e que o Presidente Lula destitua o técnico Parreira, forme sua comissão técnica, e chegue aqui...

(Interrupção do som.)

O SR. HERÁCLITO FORTES (PFL - PI) - ... com a taça na mão, dizendo que a Copa é nossa. O Presidente seria o técnico e Zé Dirceu, Delúbio e Silvinho Pereira estariam na comissão e trariam, no aerolula, os vitoriosos da Europa ao Brasil. Seria o fim da picada, mas não é impossível. Do jeito que as coisas estão e com o desrespeito com que se vem tratando a coisa pública, Senador Valdir Raupp, não podemos duvidar de nada, nem podemos nos espantar com nada.

Por fim, como torcedor brasileiro humilde e modesto, desejo que esta seleção tenha sucesso nos campos da Alemanha e que traga para o Brasil mais um título, para alegria de todos nós, principalmente dos que não têm pão e que vão se contentar com o circo.

Caso o Brasil vença, que, a cada partida, cada um comemore como o Ronaldinho disse ou como quiser, mas com compostura e, acima de tudo, de maneira ordeira, e que não se deixe inibir, nos seus sentimentos, por percalços dessa natureza. A vitória do Brasil não tem dono, a não ser esta Pátria, que se cobre de verde e amarelo, para esperar, mais uma vez, a consagração de seu futebol nos campos da Europa, para alegria dos brasileiros e o encantamento do mundo.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 13/06/2006 - Página 20015