Discurso durante a 81ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

A necessidade de uma Força Naval capacitada para exercer suas funções constitucionais, na defesa do mar territorial brasileiro, o que não vem ocorrendo em razão da falta do repasse de royalties à Marinha.

Autor
Augusto Botelho (PDT - Partido Democrático Trabalhista/RR)
Nome completo: Augusto Affonso Botelho Neto
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
FORÇAS ARMADAS. SEGURANÇA NACIONAL.:
  • A necessidade de uma Força Naval capacitada para exercer suas funções constitucionais, na defesa do mar territorial brasileiro, o que não vem ocorrendo em razão da falta do repasse de royalties à Marinha.
Aparteantes
Antonio Carlos Magalhães, Marco Maciel.
Publicação
Publicação no DSF de 15/06/2006 - Página 20515
Assunto
Outros > FORÇAS ARMADAS. SEGURANÇA NACIONAL.
Indexação
  • IMPORTANCIA, MANUTENÇÃO, SOBERANIA NACIONAL, NECESSIDADE, DEFESA, PROTEÇÃO, TERRITORIO NACIONAL, RECURSOS NATURAIS, APREENSÃO, TENTATIVA, ROUBO, PETROLEO, MAR TERRITORIAL, BRASIL, REFORÇO, FORÇAS NAVAIS, FISCALIZAÇÃO, LITORAL BRASILEIRO.
  • REGISTRO, NEGAÇÃO, DIREITOS, MARINHA, RECEBIMENTO, RECURSOS, EXPLORAÇÃO, PETROLEO, GAS NATURAL, COMENTARIO, DEFASAGEM, FORÇAS NAVAIS, RISCOS, SEGURANÇA NACIONAL, POSSIBILIDADE, PREJUIZO, PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS), NECESSIDADE, DESENVOLVIMENTO, TECNOLOGIA, ENERGIA NUCLEAR, GARANTIA, ENERGIA, FUTURO.
  • SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, CORREIO BRAZILIENSE, DISTRITO FEDERAL (DF), REIVINDICAÇÃO, OBEDIENCIA, LEGISLAÇÃO, FAVORECIMENTO, INSTITUIÇÃO MILITAR.

O SR. AUGUSTO BOTELHO (PDT - RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidente Heloísa Helena, Srªs e Srs. Senadores, a soberania de um País se constrói, isto é certo, por seu progresso material e bem-estar humano. Nenhum Estado é soberano se é pobre e atrasado: de um lado incapaz de produzir internamente os bens e serviços necessários a uma sociedade moderna; de outro, desprovido.de poder de troca para obter, pelo comércio internacional, esses mesmos bens e serviços. Tampouco é soberano se não oferece condições de vida digna para os seus cidadãos. Para se afirmar a soberania faz-se necessário, portanto, um esforço nacional nos dois sentidos do desenvolvimento: o econômico e o humano.

Mais que desenvolvimento, entretanto, a soberania precisa ser assegurada pela capacidade de um país fazer respeitar seus interesses na área internacional, marcada, até mesmo em nosso tempo de paz globalizada, pelo conflito entre os diversos Estados-Nação, nem que seja por questões puramente comerciais. A afirmação dos interesses de um país no concerto das nações é tarefa, primordialmente, de seus serviços diplomáticos, mas não apenas destes; há que se ter uma capacidade mínima de dissuasão contra a tentativa de contestação pela força dessa soberania.

Refiro-me, naturalmente, à necessidade de uma efetiva capacidade de defesa nacional, sobretudo em país de extenso território, com uma vocação histórica para um papel importante no mundo, como é o nosso querido Brasil. As riquezas naturais do País já constitui por si um motivo de cobiça por parte de outros; à medida em que formos capitalizando mais realizações e conquistas materiais e humana, mais susceptíveis seremos de rivalidade e de inveja.

E é preciso considerar, nos dias de hoje, além dos países legitimamente reconhecidos, com os seus objetivos nacionais, os grupos de interesses que se articulam por meio do terrorismo internacional. Portanto precisaremos sempre, para a garantia de nossa soberania contra as ameaças de uns e de outros, de uma estrutura profissional de defesa e, para isso, temos as nossas Forças Armadas, com papel muito bem definido na Constituição.

Vejamos, agora, uma conquista da nacionalidade, como a da auto-suficiência do petróleo. Pouquíssimos países atingiram essa condição e o Brasil o conseguiu por sua própria capacidade de desenvolvimento tecnológico, na atuação competente da maior empresa nacional, a Petrobras. É bem devido o regozijo de todos os brasileiros por essa realização. Entretanto, cabe lembrar que a maior parte desse petróleo, que nos granjeou, afinal, a independência das importações, é retirada da plataforma continental, em pleno mar. Esse fato, que em muito engrandece o feito tecnológico, implica também certo grau de fragilidade, pois o mar sempre foi território de corso e de pirataria.

Thomas Hobbes sentenciou que um homem somente pode afirmar como seu aquilo que outro não vem e lhe toma. Quer dizer, só se é dono daquilo que se pode defender. O petróleo não é ou não será de fato nosso se não podermos protegê-lo do ataque de potências estrangeiras, ou de facções terroristas. Como a maior parte das regiões de produção se encontra no mar, precisamos de uma Força Naval em condições de patrulhar o nosso litoral, nossa zona econômica exclusiva e nosso mar territorial, para afastar os riscos de perda dessas riquezas tão duramente conquistadas. 

Infelizmente,.assim como as outras Forças Armadas, nossa Marinha de Guerra se encontra sem as mínimas condições de cumprir sua missão constitucional. Segundo matéria do Correio Braziliense, do dia 30 de maio, nossa Força Naval teria, nos últimos cinco anos, desativado 21 navios e 9 aeronaves. Relatório interno da Marinha apresenta dados mais graves: metade dos navios e submarinos se encontraria fora de operação e, no horizonte de 20 anos, se nada mais for feito, nossa esquadra simplesmente se extinguirá.

É bem compreensível que, no quadro atual de aperto orçamentário, ditado pela necessidade de contenção do gasto público, fonte do processo inflacionário que nos consumiu por muito tempo, as prioridades sociais prevaleçam sobre as necessidades de defesa nacional. Afinal, o Brasil não está envolvido em nenhum conflito bélico permanente ou potencial imediato com outros países e urge concentrar esforços na retomada do desenvolvimento e da redução das desigualdades regionais e sociais.

Contudo, Srª Presidente, não me parece sensato abandonar de todo as funções da defesa nacional, sucateando o equipamento das Forças Armadas e as impedindo de aprimorar o seu pessoal. Este precisa estar sempre capacitado para responder às ameaças externas, provavelmente executadas com uso de material moderno e sofisticado. No caso da necessidade de proteger as plataformas de produção ou perfuração de petróleo no mar, a Marinha tem de poder enfrentar eventuais piratas ou, pelo menos, dissuadir grande parte dos que intentarem qualquer agressão. Não pode continuar à mingua.

Há um fato agravante, ligado precisamente à questão do petróleo produzido na plataforma continental. Trata-se da existência de previsão legal do pagamento de royalties à Marinha, no caso desse tipo de lavra mineral. Previsão legal esta que não está sendo cumprida em decorrência do contingenciamento do Governo, dos repasses de verba. Isso quer dizer, Srªs e Srs. Senadores, vejam bem, que a Marinha tem direito a receber recursos que estão sendo sistematicamente negados pela administração econômica.

O fundamento legal desse direito começa já pela Constituição Federal, que inclui, em seu art. 20, inciso V, os recursos naturais da Plataforma Continental e da zona econômica exclusiva entre os bens da União. O §1º do mesmo artigo assegura à União, Estados e Municípios participação no resultado da exploração do petróleo, ou gás natural, nos respectivos territórios, incluindo explicitamente a Plataforma Continental e zona econômica exclusiva.

O Governo, portanto, ao reter verbas dos royalties da Marinha, não somente descumpre a lei como expõe um bem nacional a risco imenso de incidentes desagradáveis. O Comandante daquela Força, o Almirante-de-Esquadra Roberto Guimarães de Carvalho, em artigo publicado em diversos jornais de alcance nacional, dia 28 de maio último, expôs, com admirável serenidade, a situação de fato dramática que enfrenta, diante do problema de cumprir o seu dever constitucional em condições operacionais mínimas.

Com seu conhecimento técnico e sentido patriótico, compreendendo as restrições orçamentárias do Estado, o Almirante Carvalho apresenta uma solução de custo relativamente baixo, nada ambiciosa: a construção ou aquisição de navios- patrulha para a função de guardar o mar e defender as plataformas de petróleo.

Fontes da Petrobras citadas, mas não nomeadas na imprensa teriam relatado o desconforto daquela empresa com a situação, sobretudo porque a Petrobras paga integralmente o tributo à Agência Nacional de Petróleo e não recebe a proteção que o Estado deve a suas empresas e cidadãos.

O Sr. Marco Maciel (PFL - PE) - Nobre Senador Augusto Botelho, V. Exª me concede um aparte?

O SR. AUGUSTO BOTELHO (PDT - RR) - Com todo prazer, Senador Marco Maciel.

O Sr. Marco Maciel (PFL - PE) - Serei breve, nobre Senador Augusto Botelho. Não pretendo interromper o seu discurso. Aliás, um discurso não somente bem tecido, bem construído, mas igualmente muito oportuno. Quero dizer que não é por outra razão que V. Exª desfruta de grande conceito nesta Casa, embora seja este o primeiro mandato no plano federal, que lhe foi conferido pelo povo do Estado de Roraima. . O seu pai - Sylvio Botelho - foi Deputado Federal, aliás, um excelente Parlamentar. V. Exª citou duas questões muito importantes: primeiro, que não podemos descurar, em que pesem outras vicissitudes que o País atravesse, sobretudo no campo social, de alocarmos recursos para as Forças Armadas, que cumprem um papel, além do definido na Constituição Federal, também uma destacada ação no desenvolvimento científico e tecnológico do País, no campo de assistência social e, por que não dizer, na formação dos seus quadros. As Forças Armadas concorrem para a elevação da condição educacional do nosso povo por meio de excelentes escolas, escolas de bom nível, escolas de primeiro mundo. Não podemos deixar de reconhecer o papel das Forças Armadas e, em conseqüência, da necessidade de fornecer-lhes os recursos indispensáveis ao cumprimento da sua função constitucional. Em segundo lugar, V. Exª mencionou uma questão muito séria, do não-repasse dos recursos devidos. V. Exª situa o caso da Marinha, a força mais antiga do País, criada com a chegada da Família Real, há dois séculos, em 1808. Para que cumpra bem a sua tarefa, inclusive na defesa do mar territorial brasileiro, das ZEEs - Zoneamento Ecológico-Econômico e possa trazer a sua contribuição no campo do conhecimento da nossa plataforma continental e do mar territorial, onde, ainda, há muito a pesquisar e explorar, é bom lembrar que a Marinha, com mais recursos, certamente, poderia contribuir na alavancagem do seu projeto, que desenvolve em Aramar, com relação à construção de submarino nuclear e na busca de novas tecnologias no campo da energia nuclear. Ninguém pode deixar de reconhecer que o mundo do séc. XXI vai demandar cada vez mais energia, e o Brasil vai ter que pensar na utilização de outras fontes, posto que não podemos continuar dependendo exclusivamente da hidroeletricidade, da utilização de fontes não-renováveis, como é o caso do petróleo, e de outras tantas. Daí por que cumprimento V. Exª pelo discurso e faço votos para que a palavra de V. Exª, uma pessoa séria, competente, seja ouvida pelo Governo Federal e este adote as providências compatíveis com o apelo que V. Exª dirige. Enfim, essas manobras diretas ou indiretas de contingenciamento dos recursos devidos por força da Constituição e da lei certamente provocam uma descontinuidade de programas essenciais ao País. Recentemente, o Governo vetou, na íntegra, o projeto que descontingenciava em torno de apenas R$600 milhões para o desenvolvimento científico-tecnológico do País. E veja, esses recursos não oriundos do Orçamento da União são contingenciados a pretexto de manter o superávit primário. Os recursos advêm do recolhimento por empresas privadas que antes eram estatais e que, por ocasião da sua privatização se estabeleceu em diferentes leis aprovadas pelo Congresso Nacional, algumas até, se não estou equivocado, leis complementares que determinavam que um quantitativo das receitas auferidas pelas empresas que iriam operar área de energia, telefonia, etc., fosse aplicado no desenvolvimento científico-tecnológico. Daí por que surgiu o Fundo Verde-Amarelo e outros tantos que deviam estar cumprindo essa função. Não quero mais interrompê-lo, cumprimento-o e renovo-lhe os votos para que o Governo, enfim, ouça o apelo de V. Exª, posto que interpreta o sentimento da nação, não tenho dúvida em afirmá-lo.

O SR. AUGUSTO BOTELHO (PDT - RR) - Muito obrigado, Senador Marco Maciel.

Concedo um aparte ao Senador Antonio Carlos Magalhães.

O Sr. Antonio Carlos Magalhães (PFL - BA) - V. Exª está fazendo um discurso muito apropriado, mas dois pontos são relevantes. Não adianta haver 300 mil homens nas Forças Armadas se o Governo não dá condições para que elas possam atuar nos seus diversos campos. Tenho uma tese no sentido de que as Forças Armadas deveriam também atuar do ponto de vista público, sobretudo em relação à segurança interna do País, uma vez que dificilmente elas atuam do ponto de vista externo. Esse é um ponto. O segundo é que isso só existe porque aqui também somos lenientes e não aprovamos o Orçamento impositivo, porque, se o aprovássemos, estaríamos em outras condições e não estaríamos de pires na mão, inclusive as Forças Armadas, a pedir ao Senhor Lula que descontingencie recursos para que elas possam atuar. Eles são contingenciados justamente para que as Forças Armadas sejam cada vez mais dependentes, embora mais fracas. Ele gosta das Forças Armadas fracas! E só não vê quem não quer que as Forças Armadas, hoje, estão muito lenientes também - não quero dizer subservientes. Elas devem pregar a Constituição antes do próprio Presidente da República. E, em relação ao o contingenciamento? Ninguém luta por ele. Refiro-me ao projeto do ano 2000, do Orçamento impositivo, que eu fiz, que passei na Comissão e que não vejo sequer passar por outra instância. V. Exª tem absoluta razão, mas, na hora em que as Forças Armadas tiverem recursos para atuar e, ao mesmo tempo, um orçamento impositivo, a Nação será outra, e o Presidente não terá esse poder de cooptar Parlamentares e até militares.

O SR. AUGUSTO BOTELHO (PDT - RR) - Muito obrigado, Exª

Tenho certeza de que, quando o Orçamento for impositivo, não vai acontecer o que ocorreu com o Projeto Aramar. Nós o consideramos um projeto de submarino, mas, na verdade, lá está sendo desenvolvida a tecnologia para dominarmos o processo nuclear. Se não, nossos netos e bisnetos, quando acabar o petróleo, vão fazer o quê? Vão ter que entregar nosso urânio aos países que detêm tecnologia para comprar o próprio combustível. Ou seja, vão fazer como fazem com o nosso minério de ferro: mandamos para eles uma tonelada de ferro e compramos um relógio pelo preço de duas toneladas de ferro.

Isso não pode acontecer mais. Temos que desenvolver o conhecimento nuclear para que possamos, no futuro, usufruir de um bem que Deus colocou dentro do nosso País.

Agradeço muito o aparte de V. Exª.

Srª Presidente, falta pouco para eu encerrar.

Fontes da Petrobras citadas, mas não nomeadas pela imprensa, teriam relatado o desconforto daquela empresa com a sua situação, sobretudo porque a Petrobras paga integralmente o tributo à ANP e não recebe a proteção que o Estado deve às suas empresas e cidadãos. Somente quem já passou o período de duas semanas isolado numa plataforma perdida no meio do mar, sem possibilidade de avistar o litoral, pode perceber como é frágil uma unidade dessas e o temor que se sente das inconstâncias do mar e das ações dos homens mal intencionados.

Pelas razões aqui expostas, venho a esta tribuna insistir, Srª Presidente, que o Governo precisa cumprir a lei e repassar os royalties que pertencem por direito à Marinha do Brasil. Desejo também solicitar a transcrição nos Anais desta Casa do artigo do Comandante da Marinha do Brasil, Almirante-de-Esquadra Roberto de Guimarães Carvalho, para que fique registrada sua reivindicação equilibrada e serena pela obediência à legislação.

A saga da conquista da auto-suficiência em petróleo não pode ser desprezada nem pelos detratores, que a querem diminuir com os argumentos mais distorcidos, nem pelo desleixo dos dirigentes da Nação, que deixam vulnerável nossa riqueza à avidez estrangeira ou ao oportunismo terrorista.

De nada adiantará todo esse desenvolvimento, esse anúncio de tempos melhores para o País e para o povo, se não pudermos assegurar a soberania nacional sobre o mar. Que se passe a fazer imediatamente as transferências devidas.

Muito obrigado.

 

*************************************************************************

DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR AUGUSTO BOTELHO EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inserido nos termos do art. 210 do Regimento Interno.)

*************************************************************************

Matéria referida:

“Tendências e debates.”

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/06/2006 - Página 20515