Discurso durante a 103ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Destaque para a importância da conciliação entre o crescimento econômico e o desenvolvimento humanístico. O uso da ciência, tecnologia e inovação como contribuição para o desenvolvimento econômico do país.

Autor
Marco Maciel (PFL - Partido da Frente Liberal/PE)
Nome completo: Marco Antônio de Oliveira Maciel
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA.:
  • Destaque para a importância da conciliação entre o crescimento econômico e o desenvolvimento humanístico. O uso da ciência, tecnologia e inovação como contribuição para o desenvolvimento econômico do país.
Aparteantes
Roberto Saturnino.
Publicação
Publicação no DSF de 06/07/2006 - Página 22849
Assunto
Outros > POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA.
Indexação
  • COMPARAÇÃO, CONCEITO, DESENVOLVIMENTO, CRESCIMENTO, ANALISE, INFERIORIDADE, CRESCIMENTO ECONOMICO, BRASIL, AVALIAÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO, DEFESA, UTILIZAÇÃO, CIENCIA E TECNOLOGIA, MELHORIA, DESENVOLVIMENTO NACIONAL.
  • ANALISE, DESENVOLVIMENTO TECNOLOGICO, AMBITO, GLOBALIZAÇÃO, REGISTRO, AREA, QUALIDADE, TECNOLOGIA, BRASIL, AGREGAÇÃO, VALOR, EXPORTAÇÃO, ESPECIFICAÇÃO, PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS), EMPRESA BRASILEIRA DE AERONAUTICA (EMBRAER), ENGENHARIA, CONSTRUÇÃO, RODOVIA, USINA HIDROELETRICA, Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA).
  • DEFESA, ENSINO, INFORMATICA, AUXILIO, APRENDIZAGEM, MATEMATICA, PRE REQUISITO, DESENVOLVIMENTO CIENTIFICO, DESENVOLVIMENTO TECNOLOGICO, REGISTRO, GESTÃO, ORADOR, EX GOVERNADOR, ESTADO DE PERNAMBUCO (PE), EX MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA EDUCAÇÃO (MEC), CRIAÇÃO, CENTRO DE ESTUDO, APOIO, DEPARTAMENTO, SETOR, UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO (UFPE), IMPORTANCIA, INVESTIMENTO, PESQUISA.

O SR. MARCO MACIEL (PFL - PE. Pronuncia o seguinte discurso. Com revisão do orador.) - Sr. Presidente, ilustre Senador Marcos Guerra, da representação do Espírito Santo no Senado da República, Srª Senadora Lúcia Vânia, Srs. Senadores Jonas Pinheiro e Roberto Saturnino, nosso ex-Presidente Ramez Tebet, demais Senadores, desenvolvimento e crescimento, como se sabe, são palavras distintas e expressam conceitos diferentes, embora devam se completar.

O crescimento é, a meu ver, mera expansão de bens materiais; isto é, quantitativo, enquanto o desenvolvimento é qualitativo e mais abrangente. Aliás, Dag Hammarskjold, que foi Secretário-Geral da ONU há cerca de trinta anos e faleceu em acidente de avião, na África, quando se encontrava em missão da ONU, certa feita disse, com muita propriedade::

            “O desenvolvimento é um todo, é um processo cultural, integral, rico em valores: abarca o meio ambiente, as relações sociais, a educação, a produção, o consumo e o bem-estar. A diversidade de formas de desenvolvimento responde à especificidade de situações culturais ou naturais; não existe uma fórmula universal. O desenvolvimento é endógeno, brota das entranhas de cada sociedade, ao definir soberanamente a visão de seu futuro, em cooperação com sociedades que compartem problemas e aspirações”.

O desenvolvimento deve, portanto, a meu ver, permitir, consoante leciona a doutrina social da Igreja Católica, o desenvolvimento integral do homem todo e de todo o homem.

Faço tais observações, Sr. Presidente, por entender que o Brasil vive um momento em que suas taxas de desenvolvimento são extremamente baixas. Não gostaria aqui de repetir algo que está sendo dito nesta Casa e na Câmara dos Deputados, todos os dias, quando os Parlamentares se referem ao fato de o Brasil, no ano passado,ter crescido abaixo de todos os países da América Latina, salvo o Haiti, que, aliás, é o país mais pobre da América Latina, classificado pelo PNUD como não pertencente ao terceiro mundo sequer, mas, infelizmente, ao quarto mundo, ao lado da Eritréia, do Senegal e de outros países localizados na África.

Para superar essas dificuldades, Sr. Presidente, insisto na necessidade de termos, cada vez mais, a consciência de usarmos a ciência, a tecnologia e a inovação para melhorar o nosso desempenho.

A tecnologia está, na minha opinião, entre os elementos fundamentais do desenvolvimento, ao lado, entre outros, da promoção dos direitos humanos, da distribuição da renda e do meio ambiente. A tecnologia contribui de modo decisivo para o desenvolvimento. Podemos dizer que não existe progresso sem ciência e tecnologia. Aliás, houve um escritor americano, Walt W. Rostow, que foi assessor do Presidente Kennedy, por sinal, que demonstrou muito bem as correlações entre cada descoberta tecnológica e os avanços daí decorrentes, em seu livro, que foi muito apreciado, intitulado Etapas do Desenvolvimento Econômico. No livro, Rostow mostrou que, naturalmente, a questão ciência e tecnologia seria decisiva para o progresso dos países em desenvolvimento ou ainda subdesenvolvidos.

O Sr. Roberto Saturnino (Bloco/PT - RJ) - V. Exª me permite um aparte, Senador Marco Maciel?

O SR. MARCO MACIEL (PFL - PE) - Pois não, nobre Senador Roberto Saturnino.

O Sr. Roberto Saturnino (Bloco/PT - RJ) - Nobre Senador, lamento interromper o discurso de V. Exª, que é feito com uma precisão e com uma profundidade muito grande. Mas o tema é o mesmo de uma tese que li recentemente, porque amanhã farei parte da Banca Examinadora para a apresentação da tese de doutorado da professora Dora Henrique da Costa, que disserta sobre o repensar do desenvolvimento, o desenvolvimento como uma totalidade. E toca nesse ponto da ciência e tecnologia, mostrando que a ciência e a tecnologia estão muito pensadas e orientadas para o crescimento econômico, mas não para o desenvolvimento humanístico como um todo. E é preciso reconsiderar, também, as aplicações da ciência e da tecnologia a fim de que se possa atingir esse desenvolvimento que V. Exª muito bem define como uma totalidade de fundo humanístico, mais do que o crescimento puramente econômico. Parabéns a V. Exª. Eu não resisti à tentação de dar esse achega porque acabei de ler a tese, que muito me impressionou.

O SR. MARCO MACIEL (PFL - PE) - Agradeço, Senador Roberto Saturnino, a contribuição de V. Exª.

O Sr. Roberto Saturnino (Bloco/PT - RJ) - E eu até, se V. Exª me permite, vou oferecer um exemplar da mesma a V. Exª, pela oportunidade do pronunciamento que faz.

O SR. MARCO MACIEL (PFL - PE) - E eu gostaria muito de lê-la porque eu me preocupo com essas questões - e não é de agora - de como conciliar o progresso econômico com as demandas de um desenvolvimento que seja sinônimo de humanismo, enfim, de integração social.

Mas como eu me expressava, é bom ter consciência de que essa questão da ciência e da tecnologia é crucial e que não só os chamados grandes do Primeiro Mundo estão em papel destacado nesse quadro. Eu diria também que países de pequena dimensão territorial como a Holanda e a Suécia, entre outros, mostram que a tecnologia continua a ser o diferencial positivo. Anote-se, contudo, que mesmo os países afluentes não conseguem dispor de todas as tecnologias. Há sempre espaços de oportunidades a preencher, à medida que descobertas tecnológicas se multiplicam. Quem consegue prevê-las adianta-se e ocupa-as nas sucessivas etapas de desenvolvimento de um mundo cada vez mais globalizado.

O mesmo ocorre com o processo de inovação: os países procuram preencher o maior número de nichos possíveis, mas não conseguem ocupar todos eles diante da crescente diversificação da expansão tecnológica. Daí a tendência para a especialização por áreas de competência. Na realidade, não se pode falar em países e muito menos em grupos deles no contexto do desenvolvimento tecnológico e sim também em empreendimentos transnacionais mais que propriamente multinacionais.

O Brasil, nas últimas décadas, começou a alcançar um desenvolvimento auto-sustentado com a utilização de algumas importantes tecnologias. Não se pode esperar crescimento econômico em função apenas ou principalmente de exportações, durante altos ciclos da conjuntura global, se não houver - isso se aplica como uma luva ao País - aumento de valor agregado ao que se produz.

Apesar de tudo, o Brasil conseguiu alguns importantes nichos, algumas importantes áreas - por exemplo, na engenharia de construção de estradas, hidrelétricas - com empresas privadas competindo inclusive internacionalmente. O mesmo se pode dizer da engenharia em águas oceânicas profundas, graças à Petrobras, que firmou convênios com universidades públicas, inclusive, com uma das instituições da UFRJ, a Coope, que foram coroados de êxito após 50 anos de investimentos persistentes, resultantes de continuidade administrativa de vários governos.

Podemos estender o reconhecimento ao domínio da aviônica, que permitiu produzir aviões graças aos esforços desenvolvidos pela Força Aérea Brasileira - FAB -, o então Ministério da Aeronáutica, ao criar o ITA - Instituto Tecnológico de Aeronáutica -, que é uma escola modelo ainda hoje em nosso País; o CTA - Centro Tecnológico de Aeronáutica - que tanto tem impulsionado o nosso desenvolvimento tecnológico; e, finalmente, a Embraer, privatizada na década de 90, cujo êxito está ensejando ao País exportar produtos sofisticados que concorrem com empresas transnacionais. Hoje o Brasil se orgulha de ter aviões voando em céus de vários continentes e não apenas em céus da América do Sul.

Devemos pois insistir em planejamento estratégico, continuidade da execução de programas, parcerias quando for o caso até com empresas estrangeiras. Enfim, acima de partidos e ideologias está o interesse nacional.

Lembre-se ainda, nesse contexto, a existência da Embrapa, criada no Governo do Presidente Geisel. À época, eu era Deputado Federal e acompanhei a criação e o desenvolvimento da Embrapa, à qual se deve significativo avanço da atividade econômica primária, do chamado agro-negócio, tão importante nas exportações brasileiras, apesar de, atualmente, a Embrapa não dispor dos recursos necessários para as suas atividades e não haver também, no atual Governo, uma valorização do seu quadro técnico, na minha opinião. Não convém esquecer que a base mais profunda e mais ampla do êxito do desenvolvimento econômico e tecnológico está na educação desde o ensino básico, passando pelo técnico, inclusive profissionalizante, tão relegado pela atual Administração Federal, culminando no ensino superior. O aprendizado da matemática, presente direta ou indiretamente em todas as áreas do conhecimento, pode muito ser ajudado pelo domínio precoce da informática.

A Índia, pela sua tradição cultural milenar de priorizar a matemática, transformou-se em um dos maiores centros produtores de software do mundo. As principais universidades dos países mais ricos têm professores indianos, vários deles com prêmio Nobel. Isso prova a importância do aprendizado na adolescência e na juventude.

Sr. Presidente, em Pernambuco, na condição de Governador do Estado, criei, em 1981, o CLADI (Centro Latino Americano e Desenvolvimento da Informática).

Quatro objetivos fundamentais animaram o CLADI desde sua formação: realização de estudos e pesquisas visando ao desenvolvimento da informática nos países da América Latina; formação e aperfeiçoamento de recursos humanos e tecnológicos voltados à área de informática na América Latina; identificação dos padrões tecnológicos vigentes e das tendências tecnológicas regionais nos diversos países de atuação do CLADI; articulação com centros universitários ou de excelência buscando o desenvolvimento científico e tecnológico na área de informática.

Na Universidade Federal de Pernambuco surgiu em 1974 o Departamento de Informática. Quando Ministro da Educação, preocupei-me com esse assunto, ao tempo em que era Presidente da República o Senador José Sarney, e busquei fortalecer no Nordeste referido departamento. Criamos condições também para a contratação de novos professores, instalação dos seus primeiros laboratórios e demos apoio para o desenvolvimento das suas atividades.

É bom lembrar que há 30 anos dependíamos, em algumas áreas, de massa cinzenta estrangeira para resolver problemas tipicamente nacionais. À época, no Brasil, se preparavam os recursos humanos, em grande parte, no exterior - Estados Unidos, Canadá, Inglaterra e França.

Ainda no Recife, foi instalado o Centro Regional de Ciências Nucleares (CRCN), ao tempo em que exercia a Vice-Presidência da República. Com o apoio do Embaixador Ronaldo Sardenberg, que dirigia, à época, a Secretaria de Assuntos Estratégicos do Governo Federal e, posteriormente, o Ministério de Ciência e Tecnologia. Embora já esteja funcionando, o CRCN não pôde dar novos passos pela limitação na liberação de recursos pelo atual Governo Federal. Sua plena utilização vai permitir o manejo dos múltiplos meios que a energia nuclear oferece para o pólo médico do Recife e o emprego de radioisótropos para aplicação na agricultura, inclusive no semi-árido nordestino, e na indústria. De mais a mais, o CRCN prepara recursos humanos tão importantes e necessários para o Nordeste e o País.

Na administração do Governador Jarbas Vasconcelos, que teve como Vice-Governador Mendonça Filho, foi desenvolvido o Porto Digital do Recife. Nele atua o Centro de Estudos Avançados do Nordeste, conhecido pela sigla CESAR, sob a liderança do Professor Silvio Meira tornou-se um dos principais pólos de inovação e processamento das demandas do mercado, para inúmeras empresas de produção de programas de software de excelente nível, cujo conceito ultrapassou os limites do País.

Sr. Presidente, desejo, igualmente, lembrar a imprescindibilidade, no terreno da ciência e tecnologia, do enlace entre universidades e escolas - públicas e privadas - e as empresas, algo ainda muito incipiente no Brasil. Na América do Norte e Europa, regiões desenvolvidas, no Japão, na Índia e na China, a articulação escola-empresa está gerando excepcionais resultados no desenvolvimento da ciência e da tecnologia, e inovação. O Estado não pode prover a tudo; pode - e deve estimular e ajudar - conforme o recomenda o princípio da subsidiariedade.

Por fim, sr. Presidente, não somente é possível, mas de toda forma aconselhável associar ao processo educacional, que se prolonga muitas vezes na produção de ciência e tecnologia, o ensino técnico com o humanístico, através da parafernália que agora nos disponibiliza a informática, estimulando o conhecimento de idiomas, literatura, geografia, história e filosofia. Mesmo porque, como sentenciou o Papa João Paulo II, em discurso na Academia de Ciências da Áustria “a toda ciência deve corresponder a uma consciência e toda técnica deve corresponder a uma ética”.

Se assim não se compreender o desenvolvimento, não consolidaremos os valores que devem caracterizar a sociedade internacional: a paz, a liberdade, a justiça, a solidariedade, a igualdade de oportunidades para todos.

Era o que eu tinha a dizer.

Agradeço a V. Exª pelo tempo que me concedeu.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/07/2006 - Página 22849