Discurso durante a 76ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Indignação em relação a violência do crime organizado. Cobrança responsabilidade das autoridades competentes.

Autor
Arthur Virgílio (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/AM)
Nome completo: Arthur Virgílio do Carmo Ribeiro Neto
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SEGURANÇA PUBLICA.:
  • Indignação em relação a violência do crime organizado. Cobrança responsabilidade das autoridades competentes.
Publicação
Publicação no DSF de 08/06/2006 - Página 19566
Assunto
Outros > SEGURANÇA PUBLICA.
Indexação
  • ANALISE, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, CRIME ORGANIZADO, PAIS, ESPECIFICAÇÃO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), ESTADO DO PARANA (PR), ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL (MS), QUESTIONAMENTO, IMUNIDADE, ADVOGADO, DEFESA, CRIMINOSO.
  • DEFESA, NECESSIDADE, PARCERIA, PREFEITURA, GOVERNO ESTADUAL, GARANTIA, APOIO, POPULAÇÃO CARENTE, PREVENÇÃO, VIOLENCIA.
  • CRITICA, EXECUTIVO, LEGISLATIVO, JUDICIARIO, GOVERNO ESTADUAL, RESPONSABILIDADE, VIOLENCIA, CRIME ORGANIZADO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), NECESSIDADE, REFORMA POLITICA, ATENÇÃO, SEGURANÇA PUBLICA.
  • COMENTARIO, OMISSÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, INTERESSE, CAMPANHA ELEITORAL, CRITICA, GESTÃO, PRESIDENCIA DA REPUBLICA, FALTA, PRIORIDADE, SEGURANÇA PUBLICA, NECESSIDADE, AUMENTO, FISCALIZAÇÃO, FRONTEIRA, IMPEDIMENTO, ATIVIDADE CLANDESTINA, IMPORTANCIA, UNIÃO, SOCIEDADE CIVIL, AUTORIDADE, COMBATE, CRIME ORGANIZADO.

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, como primeiro assunto, gostaria de dizer o seguinte:

O DIA EM QUE UM CIDADÃO DO POVO FALOU NO SENADO

6 Jun/2006

Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Senadores,

peço licença, Senhor Presidente, como Senador da República eleito pelo Amazonas, para, na tarde de hoje, ceder esta tribuna ao cidadão brasileiro. Aqui vai falar um homem comum, de qualquer ponto deste imenso País, que tanto pode ser das grandes capitais como das pequenas cidades e até de algum vilarejo Brasil adentro.

Um cidadão brasileiro, que não será Arthur, e que pode ser João. De Parintins ou de Itacoatiara, no Amazonas da Grande Floresta. Antonio, de Jacarezinho ou Curitiba, no Paraná do Sul, que é igual a todos. Ou de Quebrangúlo nas Alagoas do Nordeste e muito mais da Senadora Heloísa, de Teotônio e Tenório e do Senador Renan, que preside a Casa.Ou de Porangatu, na Belém-Brasília; ou ainda, de Treze Tílias ou Camboriú, em Santa Catarina. Ou, então de Uruguaiana, na fronteira gaúcha tão distante.

Se não os represento, asseguro que busco interpretar o pensamento de cada um, todos mais angustiados hoje do que ontem; hoje, inconformados, mais do que antes, por tudo que viram - e eu também - em São Paulo, principalmente, e em tom menor, no Paraná e em Mato Grosso do Sul.

Como cidadão simples, poderia dizer que este é um País capaz das mais notáveis realizações. Seria apenas uma questão de querer dizer. Mas não é isso que penso neste momento. Começo, afirmando que cada um dos brasileiros simples gostaria de poder transitar pelas ruas das nossas cidades, a qualquer momento, e não apenas quando o crime organizado permitisse o exercício de direito tão fundamental da pessoa humana.

Este é um país fantástico, que não termina, até porque começa nas formidãveis águas da Amazônia.

Se o Brasil consegue realizar obras do porte de Itaipu ou maravilhas como as instituições culturais de São Paulo, o trabalho artesanal das rendeiras do Nordeste ou o belíssimo Festival Folclórico de Parintins, por quê não abrir espaço e condições para que, qualquer um de nós possa simplesmente viver sem medo, saindo à rua na certeza de poder, normalmente, voltar a casa.

Vi e vejo os Presidentes, todos, falarem maravilhas, acenar com a felicidade. Ouço Senadores e Deputados em suas tribunas, uns criticando e outros aplaudindo, algumas vezes sem que os ataques sejam sinceros e sem que as críticas sejam merecidas, em sua maioria falando de uma Nação que acabo descobrindo não ser bem a nossa.

Quantas vezes não presenciei, pela televisão ou pela imprensa, a Ordem dos Advogados lutando e muito, primeiro, pelo restabelecimento da democracia, depois pela sua consolidação e pela ampliação de expressão. Só espero, agora, que essa mesma OAB faça clara distinção entre o advogado que tem o direito - e o dever - de defender até o mais bárbaro criminoso, e o advogado que se acumplicia com organizações criminosas e por exemplo, contrabandeia telefones celulares para dentro dos presídios.

Sei e sabemos todos que esses aparelhos servem, como agora em São Paulo, para as ordens de assassínios, seqüestros e outras ações delituosas, a começar pela ignominiosa ação de matar gente simples que passa pelas ruas pensando ter direito a caminhar, ir e vir, em plena segurança.

Não entendo a razão de essas prisões se transformarem em “escritórios” de onde partem as ordens para o crime. E onde bandidos mandam mais do que as autoridades constituídas.

Não entendo esse tipo de defesa, em nome de uma pretensa imunidade para os advogados, quando, nos aeroportos, a revista é uma rotina. Ao soar do apito, detector de metais, por quê resistir a uma ação assim, só aparentemente rotineira, mas que zela pelo bem-estar da sociedade? Eu mesmo, certa vez, exigi ser revistado, em nome da igualdade de todos perante a Lei.

Não entendo, ademais, por que não sufocar no nascedouro as manifestações estúpidas de violência, se sabemos que elas nascem ali mesmo, nessas prisões que até hoje, apesar da tecnologia disponível, muitas vezes apenas levam o nome de presídio de segurança máxima.

E, aí sim, ignoram a cidadania a que todos têm direito.

Como cidadão de alguma cidade bem longínqua, vejo que as nossas Prefeituras têm o dever de criar políticas públicas claras, em parceria com os governos dos estados, para assegurar aos deserdados, às favelas das periferias dos grandes centros vida efetivamente digna, para que não dependam do pior tipo de justiça que, aliás, se vai tornando único, a justiça torta determinada pelos traficantes, pelos chefetes, pelos sobas transtornados de crime organizado.

Vejo que temos leis diplomas modernos, como a Lei de Responsabilidade Fiscal, mas não compreendo a lógica pela qual elas não são cumpridas ou não produzem reais efeitos. Foram criadas para ensejar vida decente a todos... e a ninguém ensejam esse ideal.

Ouço falar que é necessária uma reforma política.

Mas já ouvi isso outras vezes e fico sem entender até quando iremos aguardar.

Também vejo como essencial o questionamento do Poder Judiciário. Volta e meia, ouço falar que, dos três, esse seria o Poder a merecer nova reforma urgentíssima. Não sei, pois, afinal, até hoje, não vi o Executivo funcionando a contento nem o Legislativo atuando adequadamente.

É verdade. Verdade, sim. Hoje mesmo, quando vinha para o Senado, ouvi numa rádio a notícia de certa pesquisa, segundo a qual “o Poder Judiciário tem bastante responsabilidade pelos ataques criminosos em São Paulo.”

Era, na verdade, um relatório do Datafolha, situando também o Presidente e o ex-Governador de S.Paulo em posições similares entre os que o povo considera que tiveram muita responsabilidade pelos traiçoeiros episódios do PCC.

Eu, cidadão das ruas, ouço falar em desvios éticos, ouço falar em palavras que ainda não constam dos dicionários, mas que são logo incorporadas ao dia-a-dia do povo, como mensalão, aparelhamento e tantas outras que se multiplicam. Lembro as fábulas de Esopo; não chego a repeti-las, mas gostaria! Ele situa o povo como o inocente cordeiro diante do poderoso Logo. Leio Cícero, que há dois mil anos foi ao Senado de Roma para discursar e, assim, destruir uma tentativa de golpe de Estado contra a República, na conspiração conduzida por Lúcio Sérgio Catilina, o então candidato vencido nas eleições de julho do ano 64 a.C.

Não consigo repeti-las, como também não consigo admitir que ainda dê para se dizer que não há responsabilidades dos governos estaduais. Há, sim, embora não apenas deles. Evidentemente que não apenas deles!

À época de Cícero havia uma conspiração. No Brasil de hoje também há, mas não é de partidos nem de políticos. É a conspiração do crime organizado, que se vai tomando poderosa e, daqui a pouco, poderá tornar-se invencível.

Como cidadão simples, decidi em vir ao Senado.

Não é meu pensamento repetir Marco Túlio Cícero, cônsul de Roma. Ele foi o grande tribuno do discurso contra Catilina, recitado no Templo de Júpíter.

O que me inquieta é que, até agora, nenhum Governo realmente pnonzou a questão da segurança pública no Brasil. Nem o atual Governo nem o anterior ou outros mais para trás na hierarquia do tempo.

Sou do povo e estou inquieto.

Quem sabe, neste Templo, que não é Júpiter, mas de Cristo e de Rui Barbosa, os Senadores possam ouvir a fala do povo?

Mas não só os Senadores. Todos, inclusive o Presidente da República, o pró-homem Luís Inácio Lula da Silva.

Menciono mais enfaticamente a atual gestão porque é a que está em curso e que, portanto, ainda tem responsabilidades a cumprir.

Ao Presidente Lula afirmo que, agora, como antes, percebo que a prioridade não é dirigida à questão da segurança pública.

E o fato é que, agora, como antes, eis aí área sensível e que merece o máximo de atenção. Exige prioridade, embora a segurança não esteja sendo prioridade neste País.

Não. Não é prioridade, Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Senadores. E todos sabemos que há até conflitos nas ruas, infelicítando a vida dos cidadãos.

Há conflitos e, não obstante, falsos amigos do Brasil, procuram manter o Presidente longe dos conflitos, certamente para que não se desgastem sua imagem pessoal, sua simpatia e mesmo suas possibilidades eleitorais.

Agora, aparecem ostensivamente os que matam polícias e atingem até escolas. Ou seja, ninguém mais pode omitir-se, sob pena de trair a História e postergar o futuro, em nome de um presente de flagelo e dor.

Também no Governo Fernando Henrique que deixou positivas contribuições para o futuro da Nação, o capítulo da segurança pública não foi devidamente enfatizado. Há justificativas? Pode ser, Mas não foi enfatizado. E ponto. E o mesmo se aplica a Sarney, Collor, Itamar e, obviamente, ao mandatário da hora, Sr. Lula da Silva.

Agora, como antes, Sr. Presidente nossas fronteiras continuam sendo caminhos abertos à passagem ilegal de drogas e armas, para não falar em outros itens do contrabando e da pirataria.

Agora, como àquela época, produtos contrabandeados são vendidos livremente, inclusive em Brasília, a poucos quilômetros, 10 ou 11, do Palácio do Planalto. Vejo, contristado, Sras e Srs. Senadores, milhares de pessoas atravessando livremente as fronteiras, com mercadorias de todo tipo, buscando o lucro fácil. Ou visando ao crime, premeditado, organizado planejado.

E, enquanto isso, comerciantes honestos não merecem nenhum tipo de apoio.

Leio sem entender que as forças que o Brasil mantém no Haiti custam R$560 milhões. Leio sem entender, mais ainda, que para o Fundo Nacional de Segurança o Governo destinou metade desse valor, ou seja, R$270 milhões.

Como cidadão simples, que não faz leis e apenas delas espera a proteção, não entendo porquê uma criança é livremente abordada à porta das escolas. Não aceito que bandidos impunes possam aproximar-se da pureza, possam sitiar a inocência e ferir o futuro.

Como cidadão comum, de alguma parte do Brasil, do norte ou do sul, do centro ou do litoral, das matas da Amazônia ou das grandes capitais, minha pergunta é igualmente simples, e, sem querer, beira o que indagavam as Catilinárias da antiguidade:

- Até quando?

Até quando? Como indagava Marco Túlio Cícero, até quando tantos abusarão da paciência nossa?

O que pressinto, sem identificar nenhum concreto avanço, é que o momento, mais do que qualquer outro, exige a união de todos os brasileiros de compromisso com a boa-fé.

Acho, como o brasileiro mais simples de todos os hemisférios - e presente em todos os instantes da vida nacional - que passa da hora de definir o que queremos!

Pretendemos um Brasil para os brasileiros dignos?

Ou uma Nação cabisbaixa, hoje prisioneira, em que o cidadão só transita pelas ruas quando o crime organizado assim concede?

Transmito meu inconformismo a todos os homens e mulheres de responsabilidade deste País. Aos que fazem as leis, aos que executam as leis e aos que vigiam o cumprimento das leis.

Mas também, e por igual, a todos os demais setores que conformam a Nação: a OAB, as organizações não-governamentais, as associações de classe como a ABI, os professores, os técnicos, os intelectuais, os operários, os ribeirinhos, os funcionários, a sociedade como um todo.

Não entendo como alguns desses setores não conseguem enxergar que o crime começa nas nossas fronteiras, lamentavelmente escancaradas ao contrabando de armas e drogas.

Já não é possível esperar!

A Nação se cansa. Os brasileiros vão ficando apáticos, desesperançados.

Será isso normal? Será isso aceitável?

Não posso crer. E apreciaria que os tão ilustres senadores tivessem a mesma certeza de que ainda existe espaço para a esperança.

Há sim. Os brasileiros ainda esperam ações como as que as populações simples do grande interior sempre reclamam, com uma indagação que deveria, ao menos, chamar aos brios:

O que fazem vocês em Brasília?

É pergunta dura, porém verdadeira.

E tem o mesmo peso da recriminação contra Catilina: Quos que tandem abutere, Catilina, patientia nostra?

Como brasileiro, ecôo desta tribuna essa mesma pergunta, já em forma de apelo. Primeiro, dizendo que todos chegamos ao limite em que devemos definir o tamanho de cada um. Definição sem retorno.

Os pequenos, saibam todos, ficarão menores. Os grandes se agigantarão! Maiores que todos, até mesmo do que os grandes, são os desafios da hora brasileira. E a hora brasileira chegou.

Encerro, agradecendo o privilégio de, como simples cidadão, ter-me sentido autorizado a, neste instante, ocupar a tribuna do Senado, sem invocar a condição de senador eleito pelo povo do Amazonas. Falei como imagino que o teria feito o cidadão das ruas, ao qual nunca dão voz.

Nunca dão voz ao brasileiro de rincões dispersos por uma Nação, que, por ser grande, perde grandeza aos que, cada um em sua trincheira, têm responsabilidades objetivas a encarar.

A grandeza, o trabalho e a honradez, são o único caminho capaz de evitar que, em definitivo, entreguemos o Brasil ao crime organizado.

Confio nos meus companheiros. Quero confiar nos meus adversários. Não posso deixar de acreditar no meu País.

Era o que tinha a dizer.

Muito obrigado.

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o segundo assunto é para fazer o registro do excelente artigo escrito por Rubem Azevedo Lima. “A fala de Marco Aurélio” foi publicado no jornal Correio Braziliense no último dia 19 de maio.

O texto lamenta que o discurso de posse do Ministro Marco Aurélio de Mello, ao assumir a presidência do Tribunal Superior Eleitoral, não tenha tido a repercussão que deveria. O ministro merece meus cumprimentos, disse o que tinha que ser dito e merecia maior destaque, pois a divulgação de seu discurso daria a melhor “visão da crise de valores éticos e morais que se consolida e abala a ordem social”.

“As tintas fortes de Marco Aurélio refletem o que procuradores, imprensa e polícia revelaram desse escândalo e outros, nos quais estão envolvidos políticos do governo, seus aliados e alguns nem tanto, mas muitos já absolvidos pelo corporativismo suprapartidário”.

Sr. Presidente, para concluir, requeiro que o referido artigo passe a integrar os Anais do Senado Federal.

DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR ARTHUR VIRGÍLIO EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inserido nos termos do art. 210, inciso I e § 2º, do Regimento Interno.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/06/2006 - Página 19566