Discurso durante a 117ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Registro do pleno êxito alcançado na realização da Reunião de Cúpula do Mercosul, na cidade argentina de Córdoba, com a participação de seu mais novo sócio, a Venezuela.

Autor
Roberto Saturnino (PT - Partido dos Trabalhadores/RJ)
Nome completo: Roberto Saturnino Braga
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA EXTERNA. MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL).:
  • Registro do pleno êxito alcançado na realização da Reunião de Cúpula do Mercosul, na cidade argentina de Córdoba, com a participação de seu mais novo sócio, a Venezuela.
Publicação
Publicação no DSF de 26/07/2006 - Página 25071
Assunto
Outros > POLITICA EXTERNA. MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL).
Indexação
  • REGISTRO, REUNIÃO, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL), REALIZAÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO, ARGENTINA, PARTICIPAÇÃO, CHEFE DE ESTADO, REPRESENTANTE, ESTADOS MEMBROS, SOCIEDADE CIVIL, OBJETIVO, REFORÇO, PROJETO, INTEGRAÇÃO, AMERICA LATINA, DESENVOLVIMENTO, PROGRAMA, SETOR, TRANSPORTE, ENERGIA ELETRICA, CONSTRUÇÃO, GASODUTO, ENTRADA, GOVERNO ESTRANGEIRO, VENEZUELA, ORGANISMO INTERNACIONAL.
  • CRITICA, IMPRENSA, ANUNCIO, DISSOLUÇÃO, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL), OBJETIVO, PROMOÇÃO, ENTRADA, ESTADOS MEMBROS, AREA DE LIVRE COMERCIO DAS AMERICAS (ALCA), REGISTRO, ARTIGO DE IMPRENSA, AUTORIA, ECONOMISTA, PAIS ESTRANGEIRO, ARGENTINA, COMENTARIO, AUSENCIA, CRISE.
  • ELOGIO, ATUAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, PROMOÇÃO, INTEGRAÇÃO, AMERICA LATINA, PAIS ESTRANGEIRO, AUMENTO, EXPORTAÇÃO, CONTINENTE, EUROPA, AMERICA DO NORTE.
  • CRITICA, NEGOCIAÇÃO, ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DO COMERCIO (OMC), PAGAMENTO, BRASIL, SUBSIDIOS, EXPORTAÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), FRANÇA, QUESTIONAMENTO, LIBERALISMO, ANTERIORIDADE, GOVERNO, ABERTURA, FRONTEIRA, PAIS, OCORRENCIA, FECHAMENTO, INDUSTRIA, AUMENTO, DESEMPREGO.

O SR. ROBERTO SATURNINO (Bloco/PT - RJ. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, realizou-se com pleno êxito, no último fim de semana, a reunião de cúpula do Mercosul na cidade argentina de Córdoba, contrariando tantas previsões que, quase diariamente, eram colocadas em nossa imprensa, na mídia brasileira em geral. Pleno êxito em termos de reafirmação, por parte dos chefes de Estado dos países-membros do Mercosul lá presentes, do empenho em levar avante esse projeto de integração, que começou com os quatro países do Cone Sul, mas já ganhou a adesão plena da Venezuela, o que é muito importante, e tem outros sócios que participam, como a Bolívia e o Chile. Enfim, reafirma-se o propósito de integração e de desenvolvimento de projetos extremamente importantes, projetos de integração física na área de transporte, especialmente na área de energia e com o grande projeto do gasoduto, que interessa a todos os países do nosso continente.

Foi uma reunião especialmente importante porque foi a primeira a ter a participação do novo sócio, a Venezuela, que ingressa no Mercosul como uma força integradora muito grande, na medida em que é um país altamente rico em energia, em petróleo, em gás, e é uma economia em expansão, com condições de oferecer auxílio a economias menores da associação do Mercosul, como é o caso do Paraguai e do Uruguai, que reclamam, com justiça, que Brasil e Argentina não têm sido ainda capazes de atender às expectativas desses países de menor porte que ingressaram no Mercosul.

Foi uma reunião importante que teve uma dimensão que reuniões anteriores não tiveram. É que essa reunião, além da presença dos chefes de Estado, dos representantes oficiais dos governos dos países-membros, dos parlamentares que cuidaram da implementação do Parlamento Sul-Americano - que escolheram para presidir a Comissão de Implementação o nosso colega ilustre, o Senador Sérgio Zambiasi, a quem todos nós prezamos e admiramos -, essa reunião contou com a presença de representantes da sociedade civil organizada desses países-membros, numa demonstração de que, também por parte da população, já há consciência da importância do Mercosul. Houve a demonstração da vontade política de desenvolver esse projeto e levá-lo às suas últimas conseqüências, que são não apenas comerciais, não apenas econômicas, mas transcendem isso: conseqüências políticas, culturais, conseqüências mesmo de irmanação entre os povos que têm proximidades tão grandes sob o ponto de vista histórico, sob o ponto de vista cultural e, naturalmente, geopolíticos.

Essa reunião, Sr. Presidente, teve tudo para marcar o êxito e a consolidação que se pode dizer definitiva desse projeto. Muito ao contrário de quase tudo o que sai na nossa imprensa, só criticando o Mercosul, anunciando a sua dissolução, anunciando uma crise, anunciando uma decadência, sempre provocando a desmoralização do projeto, com propósitos evidentes de, com a derrocada do Mercosul, promover a entrega de todos os países à grande potência do norte, por meio da Alca.

Esse é o projeto daqueles que querem tanto que o Mercosul fracasse para que possa valer a Alca. Então, usam argumentos sucessivos, mostrando que o Mercosul está-se politizando. É claro que o Mercosul tem uma dimensão política. É evidente que tem. Trata-se de uma transformação política do continente, normal e tradicionalmente voltado para a hegemonia do norte e submisso a ela. Trata-se de um continente que, agora, se está conscientizando e organizando politicamente. Por conseguinte, há uma dimensão política, pois se organiza politicamente para enfrentar a grande pressão econômica e política que vem do Hemisfério Norte. Portanto, é óbvio que há uma dimensão política. Não poderia deixar de haver.

Outras críticas insistem em mostrar que há descontentamento, mas todos sabem que há um certo descontentamento - que é justo e se reconhece como tal - por parte do Uruguai e do Paraguai, que se vêem postos à margem do processo de negociação, que quase sempre envolve Brasil e Argentina, as duas economias maiores, sem a consideração devida aos outros sócios, que são igualmente importantes - igualmente importantes - quando se encara o projeto como um todo.

Agora, com o ingresso da Venezuela, é claro que haverá mais possibilidades e probabilidades de se concretizarem ajudas efetivas a esses dois países menores e de se promover até uma preferência para a colocação de seus produtos e para o atendimento de suas necessidades energéticas, por exemplo.

Sr. Presidente, esse propósito e essa ênfase do Mercosul é uma nova linha política, sim, é uma linha política que caracteriza o Governo do Presidente Lula, dada a ênfase, a prioridade que o Presidente dá - e o Presidente faz questão de enfatizá-lo a todo momento. É uma das prioridades maiores do Governo do Presidente Lula o desenvolvimento da integração sul-americana, com especial atenção ao Mercosul.

Naturalmente, é uma linha política nova, mas não prejudica, em absoluto, ao contrário também do que freqüentemente se diz por toda a nossa imprensa, que prejudicaria nossas relações tradicionais, que sempre deram ao Brasil as oportunidades de crescimento econômico, nossas relações tradicionais com os Estados Unidos e com a Europa. Absolutamente! Nossas relações tanto políticas, quanto econômicas e comerciais, tanto com os Estados Unidos quanto com a Europa, não sofreram absolutamente prejuízo algum. Ao contrário, só melhoraram.

Do ponto de vista político, o Brasil hoje é reconhecido pelos grandes do Primeiro Mundo e chamado a todas as principais reuniões. Reconhecem a importância do Brasil exatamente em razão dessa ênfase na necessidade de uma integração mais forte com a América do Sul. O Brasil é reconhecido como o país que mais se empenha nisso. Por isso mesmo, as suas relações políticas melhoraram e ganharam um novo patamar, um novo nível de consideração por parte dos países grandes do mundo, assim como as relações comerciais.

As nossas exportações e o nosso comércio com os Estados Unidos e com a Europa só cresceram nestes últimos anos em que o Brasil se tem empenhado tanto na consolidação do Mercosul.

Sr. Presidente, não procedem absolutamente as críticas, que têm o propósito de desencadear toda uma derrocada do Mercosul e reascender o atrativo da Alca como única salvação, como único caminho. Não é o único caminho. Isso foi pregado durante décadas neste País pelas lideranças que hoje ainda continuam com seus afiliados a pretender prejudicar o Mercosul e dá-lo como condenado.

Sr. Presidente, solicito que conste do meu pronunciamento uma entrevista dada ao Jornal do Brasil, na última segunda-feira, pelo grande economista argentino Aldo Ferrer, que foi Ministro da Economia da Argentina, uma grande figura, respeitadíssima internacionalmente. Ele falou sobre a Alca nessa matéria que, curiosamente, é intitulada “Uma crise chamada Mercosul”. O título é esse, mas o conteúdo da matéria mostra justamente o contrário.

Segundo o economista Aldo Ferrer, o Mercosul não está em crise. O economista Aldo Ferrer, ex-Ministro da Economia e um dos mais importantes especialistas em globalização do seu país, acredita que “a entrada da Venezuela no bloco e os debates sobre os projetos transnacionais, a exemplo do Gasoduto do Sul, mostram a força do grupo e a capacidade de superar problemas políticos de seus integrantes”.

“É possível”, diz Aldo Ferrer, “pensar uma política de desenvolvimento comum a partir do encontro dos interesses de cada país.” “(...) Se as realidades políticas e sociais são distintas, existem questões convergentes em temas como a infra-estrutura, energia e tecnologia.”

“A chave do êxito”, diz adiante Aldo Ferrer, “é enfrentar a diversidade e o tamanho dos países e seus níveis de desenvolvimento”. “A cooperação das nações maiores às menores pode funcionar, mas dentro de certo limite, pois não há recursos disponíveis como existiram na integração européia.”

Ele chama a atenção para o fato de que os países europeus, como Alemanha, França, dispõem de mais recursos para concederem ajuda substancial a países como Portugal, Grécia, com nível econômico mais baixo, para chegarem a uma condição mínima de homogeneização em relação às condições de vida dos outros sócios. No nosso caso, é mais difícil.

Ninguém desconhece que há problemas a enfrentar. Mas as demonstrações sucessivas de vontade política dos governantes e dos respectivos povos, das sociedades civis que estavam em Córdoba representadas, era de implementar esse projeto e de superar as dificuldades. Na Europa, também houve muitas dificuldades e hostilidades seculares que impregnavam a memória e o espírito dos respectivos povos.

Vamos vencer essas dificuldades e vamos implementar o Mercosul. E vamos ampliá-lo para todos os países da América do Sul. É uma necessidade e uma fatalidade. Isso vai ocorrer. Mesmo países como Equador, como Chile, que têm mais dificuldade porque já fecharam acordos de livre comércio, haverão de retornar ao leito natural do seu desenvolvimento econômico, social, cultural e político com o ingresso pleno no Mercosul e a integração de todos os países do nosso continente.

Sr. Presidente, ao fazer essa referência sobre a reunião de Córdoba e sobre o sucesso do Mercosul, eu quero também ressaltar que o que não vai muito bem é exatamente o outro lado, o lado neoliberal, o lado da Organização Mundial do Comércio, que não avança nas negociações da chamada Rodada de Doha, o que também está dentro da lógica, se pensarmos um pouco mais cuidadosamente sobre os interesses e as economias que estão a defender cada uma o seu quinhão.

É perfeitamente compreensível que países ricos não queiram abrir setores de sua economia nos quais são mais fracos. É claro que, no setor agrícola, nós somos mais fortes do que a Europa, a França e mesmo os Estados Unidos. Então, os americanos não querem abrir mão dos subsídios que dão e os franceses não querem abrir mão da proteção que dão aos seus agricultores. Nada mais compreensível. Imaginem milhões de agricultores franceses, sem renda e sem ocupação, invadindo as grandes cidades e inchando Paris de todo tipo de excluídos e marginais da economia! Esse quadro muito ruim é evidente que os franceses e americanos querem evitar. Nós, brasileiros, é que não o evitamos.

Foi no Governo do Sr. Fernando Collor e nos governos subseqüentes que se abriram as fronteiras e as proteções deste País de uma forma indiscriminada, sem nenhuma compensação, de maneira absolutamente tola, vazia e subserviente, que levou ao desemprego centenas de milhares de trabalhadores brasileiros e fechou grandes setores da nossa indústria. Nós abrimos a nossa indústria, abrimos os setores onde eles são mais fortes e nós, mais fracos e deixamos que destruíssem grandes setores. Toda a indústria de autopeças brasileira, por exemplo, naufragou de um momento para o outro por essas decisões impensadas e tolas que os mais ricos e os mais fortes hoje não querem tomar em relação à sua agricultura. Temos de entender que eles têm suas razões fortes. É claro que temos de continuar pressionando, porque é a defesa do nosso interesse, mas é evidente que eles têm suas razões.

Nós é que não soubemos defender as nossas razões no início dos anos 90 e, depois, nos anos subseqüentes, até que chegou o Governo do Presidente Lula, que toma consciência disso e, então, promove uma reação exatamente de integração com os países sul-americanos, para formar uma defesa econômica mais confiável e eficaz contra esse assédio das economias fortes que destruíram grande parte da nossa indústria.

O Brasil aprendeu, finalmente, a resistir no momento em que a população, chamada a se pronunciar, rejeitou o neoliberalismo e vai rejeitar mais uma vez na eleição deste ano e mostrar que não quer essa linha política de desenvolvimento, que, no fundo, não nos dá nenhuma oportunidade senão a de nos integrarmos a uma economia maior, sempre na posição subserviente, sempre na posição de caudatário, que é a tradição histórica do nosso País.

É muito importante ressaltar a reunião de Córdoba, o ingresso da Venezuela, a presença popular, a presença de organizações da sociedade civil na reunião de cúpula, reafirmando a vontade política das nações sul-americanas em consolidar, de forma definitiva, e reafirmar sempre, cada vez mais enfaticamente, a vontade de construir o Mercosul.

         Sr. Presidente, era o que tinha a dizer no dia de hoje, deixando essa mensagem de absoluta confiança de que estamos no rumo certo. A população brasileira vai confirmar essa decisão política e o rumo certo na eleição próxima de outubro, e o Brasil tem um encontro marcado com o seu destino em outros termos que não aqueles antigos de subserviência às potências maiores.

 

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DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR ROBERTO SATURNINO EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inserido nos termos do art. 210, inciso I, §2º, do Regimento Interno.)

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Matéria referida:

“Uma crise chamada Mercosul”

(Jornal do Brasil, de 24 de julho de 2006)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 26/07/2006 - Página 25071