Discurso durante a 120ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Comentários sobre recente pesquisa realizada pela CNT/Sensus, sobre a credibilidade da população nas instituições brasileiras. Apoio à proposta da Ordem dos Advogados do Brasil para a implantação de uma Assembléia Nacional Constituinte exclusiva para a votação das reformas necessárias ao País.

Autor
Íris de Araújo (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/GO)
Nome completo: Íris de Araújo Rezende Machado
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ELEIÇÕES. REFORMA CONSTITUCIONAL.:
  • Comentários sobre recente pesquisa realizada pela CNT/Sensus, sobre a credibilidade da população nas instituições brasileiras. Apoio à proposta da Ordem dos Advogados do Brasil para a implantação de uma Assembléia Nacional Constituinte exclusiva para a votação das reformas necessárias ao País.
Publicação
Publicação no DSF de 01/08/2006 - Página 25588
Assunto
Outros > ELEIÇÕES. REFORMA CONSTITUCIONAL.
Indexação
  • COMENTARIO, PESQUISA, OPINIÃO PUBLICA, COMPROVAÇÃO, OBSERVAÇÃO, ORADOR, FALTA, INTERESSE, POPULAÇÃO, ELEIÇÕES, ANALISE, DADOS, CRESCIMENTO, APROVAÇÃO, FORÇAS ARMADAS, BUSCA, SEGURANÇA PUBLICA, PERDA, CONFIANÇA, JUSTIÇA, MEIOS DE COMUNICAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, POLICIA, CONGRESSO NACIONAL, PREJUIZO, DEMOCRACIA.
  • NECESSIDADE, RESTAURAÇÃO, AUTORIDADE, INSTITUIÇÃO DEMOCRATICA, CONCLAMAÇÃO, MOBILIZAÇÃO, SOCIEDADE CIVIL, APOIO, PROPOSTA, ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL (OAB), CONVOCAÇÃO, ASSEMBLEIA CONSTITUINTE, EXCLUSIVIDADE, ELEIÇÃO, MEMBROS, DEBATE, REFORMULAÇÃO.

A SRª IRIS DE ARAÚJO (PMDB - GO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Agradeço, Senador Paulo Paim.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, andando por esse Estado de Goiás afora, tenho constatado com as pessoas com quem tenho conversado, e agora, mais recentemente, um detalhe de recente pesquisa da CNT/Sensus, que passou praticamente à margem do debate político: algumas revelações, que são de tal forma preocupantes, que eu não poderia deixar de difundi-las, no sentido da reflexão e análise. Estas evidências também servirão de suporte para a defesa de uma proposta que considero fundamental, tendo em vista o atual estágio da sociedade brasileira.

Segundo o constatado, grande parte da população não quer se envolver nas eleições. Eis os números: nada menos que 39,8% dos consultados não se interessam pela eleição presidencial; 44,3% não ligam para a escolha do Governador; e, pior ainda, 50,9% se omitem ante a escolher Senadores e Deputados.

O desinteresse pelo exercício democrático do voto é acompanhado de outra revelação igualmente importante na pesquisa: as Forças Armadas conseguiram aumentar de maneira significativa o seu prestígio nos últimos anos. Em 2003, somente 13,9% dos entrevistados destacavam a confiança no segmento - não que eu tenha nada contra a existência dessa confiança, acredito que tem que existir, só que essa pesquisa nos remete a uma outra leitura. Agora, o índice atingiu os 17% - crescimento substancial que, penso, sinaliza a tendência da busca por sistemas de poder que tenham como suporte a força e, portanto, transmitam a sensação de segurança.

A pesquisa também mostra que os programas sociais do Governo Federal influenciam o voto de 58,7% dos eleitores.

Já no momento de escolher um candidato, eis as propostas que mais atraem o eleitor: a promessa de combate à criminalidade; o compromisso com o desenvolvimento do País; a urgência na melhora da escola pública e da saúde; e a prioridade quanto à erradicação da corrupção e ao controle do custo de vida.

O capítulo mais contundente do levantamento mostra, de maneira cristalina, a perda sistemática da confiança da sociedade nas suas principais instituições: apenas 11,9% dos brasileiros confiariam na Justiça; somente 10,3% acreditam nos meios de comunicação; só 3,9% crêem no Governo Federal; enquanto que a polícia tem a confiança de apenas 3,4%.

E o que é ainda mais grave: a credibilidade do Congresso Nacional praticamente inexiste. Apenas o minguado percentual de 0,4% dos consultados acredita no Parlamento! Um dado devastador, que nos leva ao urgente exame de consciência sobre a gravidade dos últimos acontecimentos, que destruíram a imagem do Poder Legislativo - a grande pilastra da verdadeira democracia.

O sentimento captado pela pesquisa CNT/Sensus revela o que pode ser qualificado como a dor na alma de um povo que se sente traído, ultrajado: quem deveria servir de exemplo expôs práticas completamente dissociadas das exigências de uma Nação que clama pelos princípios essenciais da ética e do amor às causas maiores da sociedade.

Não se trata, Srªs e Srs. Senadores, do desgaste de um partido ou de um conjunto de lideranças. O que está em jogo é, sobretudo, a sobrevivência de instituições completamente fragilizadas pela seqüência ininterrupta de escândalos - o que cria uma espécie de vazio do Poder. E esse vazio de Poder encoraja ainda mais as ações dos que sobrevivem na ilegalidade - essa legião de criminosos que semeia o pânico em nossas ruas.

Não adianta que tapem os ouvidos como se nada estivesse acontecendo! O brasileiro está atordoado: a intensidade dos acontecimentos é muito maior do que a que estava acostumado a suportar. Antes, era o domínio da inflação, da carestia, do apagão... Agora, são os mensalões, pizzas e sanguessugas, conjugados com o terror calculado para incutir no povo a sensação de que o Brasil já não mais nos pertence...

Desculpem se estou sendo muito dura nas minhas colocações, mas tenho que refletir aqui aquilo que estou ouvindo nas ruas e o que uma pesquisa séria feita há 15 dias nos mostra.

Restaurar o sentido da autoridade é o primeiro caminho para que possamos pensar na reforma institucional que resgate o emblema da paz. Só que, para isso, é imprescindível a disposição para o recomeço, para a recomposição verdadeira das práticas e condutas.

Percebe-se que um país não está seguro quanto à estrutura institucional quando se processam reformas sobre reformas - umas sobre as outras - sem que nenhuma seja suficiente ao menos para amenizar as distorções. Nos últimos anos, tem sido assim neste País, Srªs e Srs. Senadores... Usando o velho clichê, a Constituição brasileira realmente se transformou numa colcha de retalhos, completamente desfigurada - mostrengo maquiado e retocado, mas cuja alma permanece torta, porque assim foi originada.

Reconheçamos: o problema central do Brasil está muito mais nas pessoas, nos dirigentes, nos eleitos do que na parafernália das leis. E cabe a nós tentar alternativas: essa é a nossa obrigação.

A reforma política não solucionaria os problemas nacionais. As mudanças na previdência foram apenas arremedos. O sistema tributário é ineficiente e injusto. Nosso aparato de normas trabalhistas está superado. Todo esse estrangulamento chegou a um ponto de exaustão. É começar de novo ou sermos tragados pela barbárie.

Precisamos de transformações incisivas, o que penso só ser possível a partir da iniciativa da sociedade. Daí por que abraço, com entusiasmo, a causa lançada por um conjunto de importantes entidades nacionais -- em especial, a Ordem dos Advogados do Brasil --, para se convocar uma Assembléia Nacional Constituinte Exclusiva, especialmente para discutir e votar, com prazo determinado, as imprescindíveis reformas. Seria uma Constituinte exclusiva, justamente para que seus integrantes decidam de maneira imparcial, independente, sem o costumeiro jogo das pressões, sem o benefício a grupos -- de forma que unicamente prevaleçam os interesses maiores de um País que precisa ser passado a limpo urgentemente.

A eleição para esta Constituinte poderia ser realizada já em 2007, a partir de uma decisão soberana do novo Congresso. A meta: reunir, nesse fórum livre, mulheres e homens idealistas, pessoas sem ambições políticas, que concorreriam unicamente para produzir a Lei Maior e, cumprida a grande tarefa, voltariam às suas atividades.

Como muito bem disse o Presidente Nacional da OAB, Roberto Busato, este é o momento de buscar saídas mais agudas para uma “refundação” da República. Segundo ele, as experiências anteriores de Congresso-Constituinte se mostram nefastas: não fundam uma nova ordem, apenas remendam a anterior. Assim foi com as Constituintes de 1891, 1934, 1946 e 1988, que foram congressuais. Tanto que a atual Carta vem sendo seguidamente emendada, até chegar ao deprimente estágio atual. Existem hoje mais de 700 propostas de emendas tramitando no Congresso.

Um país digno e grande começa a construir a sua história de glórias quando se propõe verdadeiramente a uma ruptura longe dos interesses imediatos de suas elites, mas uma Assembléia Nacional Constituinte Exclusiva somente se tornará realidade se o povo, de fato, for às ruas para exigi-la. Diante do desastre moral e ético que atinge a Nação, é hora de dar fim aos privilégios dos poderosos por meio de um fórum que, inclusive, tenha liberdade para discutir a própria estrutura do Poder Legislativo.

Basta de mudanças superficiais, periféricas. Este é o momento para o verdadeiro debate que faça fluírem teses, princípios e compromissos voltados para o bem comum, para a construção do Brasil da paz, o Brasil da justiça, o Brasil do crescimento, o Brasil da esperança.

Era o que eu tinha a dizer.

Muito obrigada, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 01/08/2006 - Página 25588