Discurso durante a 122ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Preocupação com as campanhas pelo voto nulo que se alastram pelo país, principalmente através da Internet.

Autor
Íris de Araújo (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/GO)
Nome completo: Íris de Araújo Rezende Machado
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ELEIÇÕES. REFORMA CONSTITUCIONAL.:
  • Preocupação com as campanhas pelo voto nulo que se alastram pelo país, principalmente através da Internet.
Publicação
Publicação no DSF de 03/08/2006 - Página 25834
Assunto
Outros > ELEIÇÕES. REFORMA CONSTITUCIONAL.
Indexação
  • APRESENTAÇÃO, CRESCIMENTO, CAMPANHA, VOTO NULO, ELEIÇÕES, ANALISE, FRUSTRAÇÃO, ELEITOR, CORRUPÇÃO, IMPUNIDADE, PREJUIZO, DEMOCRACIA, IMPORTANCIA, CONSCIENTIZAÇÃO, RESPONSABILIDADE, POPULAÇÃO.
  • LEITURA, TRECHO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), ANALISE, CONGRESSO NACIONAL, PERDA, REPUTAÇÃO, PREJUIZO, EXERCICIO, GOVERNO.
  • DEFESA, EXTENSÃO, REFORMA POLITICA, REFORMA CONSTITUCIONAL, REFORÇO, INSTITUIÇÃO DEMOCRATICA, APOIO, CONVOCAÇÃO, ASSEMBLEIA CONSTITUINTE.

A SRª IRIS DE ARAÚJO (PMDB - GO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, preocupa-me o crescimento das campanhas pelo voto nulo que se alastram pelo País, principalmente por meio da Internet: proliferam-se correntes de e-mails. No Orkut, o número de comunidades com este tema já passa de 300. O assunto deve nos levar à reflexão, até porque os integrantes desses movimentos são reconhecidos como formadores de opinião, ou seja, brasileiros que acompanham o noticiário e fazem questão de repercuti-lo.

Nas origens do comportamento, a meu ver, está a decepção com os rumos da política, segmento que, além de revelar desvios e irregularidades jamais vistos em nossa História, ainda maximizou a trilha do descontentamento ao não punir, de maneira exemplar, os envolvidos. Lamentável sob todos os aspectos, Sr. Presidente!

Um sinal evidente da gravidade desses fatos é a última pesquisa Ibope, divulgada na semana passada, com a seguinte constatação, muito eloqüente: o número de votos nulos ou brancos ocupa a terceira posição entre as preferências do eleitor, atingindo 9%. Se evoluir continuadamente, essa tendência pode arranhar, de maneira dramática, o processo eleitoral, indicando uma nódoa na democracia - a mesma por que tanto lutamos.

As campanhas pelo voto nulo cumprem, portanto, terrível desserviço à Nação e estimulam o enfraquecimento das instituições. Com isso, fortalecem os que sonham com a volta dos regimes de força. Sobretudo, prejudicam os candidatos que dependem do voto consciente para se contrapor aos que se preocupam apenas em usar o poder para seus negócios ilícitos.

Na oposição ao voto nulo surgem campanhas - ainda bem que elas surgem -, originadas no mundo acadêmico, que exortam os descontentes a agir de maneira concreta para modificar a realidade. Neste sentido, o primeiro passo sempre será o voto responsável, arma insubstituível na busca de um País livre das injustiças e das desigualdades.

Resta-nos, Srªs e Srs. Senadores, encontrar mecanismos para intervir nos acontecimentos aqui relatados, num esforço firme que evite situação ainda mais grave: aquela que poderá levar a sociedade, ao completo desrespeito às instituições e, especialmente, ao sentido e importância do Poder Legislativo.

Crescemos nas lutas contra a ditadura, ressaltando o papel do Parlamento enquanto fortaleza dos sagrados ideais democráticos, e permaneceremos sempre nesta premissa essencial. Mas as coisas vão ter que mudar, de maneira profunda, com a nova legislatura que vem aí!

A gravidade é tanta que o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva e seu antecessor, Fernando Henrique Cardoso, convergiram num mesmo tema: a preocupação com o desgaste avassalador do Congresso, como revelou a jornalista Eliane Cantanhêde, no site da Folha de S.Paulo.

De acordo com a jornalista:

Se há algo que FHC e Lula aprenderam a duras penas é que governar com essa estrutura político-partidária é de amargar. Significa comprar votos de partidos e de parlamentares, engolir ministros do arco-da-velha, retalhar politicamente os cargos públicos e fatiar o Orçamento sabe-se lá para quem e para onde.

E continua:

Mas se há algo pior do que governar com esse Congresso é governar sem Congresso. Ou com um Congresso totalmente desmoralizado. E esse é justamente o risco, depois da descoberta de mensalão e mensaleiros e da impunidade de mais de 100 parlamentares envolvidos com o escândalo dos sanguessugas.

Imprescindível entender: a agudez do momento pode se tornar ainda mais dramática por meio da ampliação do voto nulo, ou mesmo pelo avanço da desesperança e da descrença, o que faria a Nação caminhar na contramão de seus sonhos, forjando condições para o nascimento de movimentos radicais que desestabilizem a ordem ou preguem uma nova ordem, moldada no nazifascismo.

É lamentável que nem todos queiram enxergar a dimensão da tragédia que se abate sobre um País quando seus representantes não são merecedores da confiança de seus próprios eleitores. Fatos absolutamente desagradáveis se sucedem desde a primeira eleição pós-ditadura até atingir o ápice atual, quando o corporativismo se apressa em salvar os envolvidos, plantando a mais profunda decepção nacional. E aqui é preciso que se alerte: este descontentamento permanece represado, mas vai desaguar, e aí as conseqüências serão imprevisíveis.

Sim, no passado, o Congresso saiu fortalecido ao punir exemplarmente Fernando Collor de Mello. Só que essa coragem e determinação não se repetiram agora, quando o suposto era o corte na própria carne.

Creio que o brasileiro se guia, sobretudo, pelo sentido de justiça e de bom-senso. Se, mesmo diante dos graves fatos, a sociedade sentisse que a Instituição, a partir da vontade de sua maioria, estava disposta a fazer as necessárias correções, esta sociedade se redimiria, com o Congresso, e aí poderíamos até alcançar um salto de qualidade. Só que o que se viu foi exatamente o oposto. Restaram, então, as dúvidas e interrogações que, inclusive, atormentam Lula, FHC e também, é claro, a nós: o que nos espera? Para onde iremos? O que será do Brasil?

Quando se rompe o elo de confiança entre o cidadão e o dirigente político; quando os interesses econômicos dos financiadores das campanhas falam mais alto que a própria autoridade pública; quando o cenário eleitoral acaba desfigurado pela ação das microssiglas que surgem apenas para comercializar o seu tempo na TV; quando os líderes das localidades só emprestam apoio mediante cifras; quando o próprio eleitor foge à consciência e barganha o seu voto, então o sentido de Nação não se sustenta. É que sua coluna, seu esteio serão sempre os valores irrevogáveis da ética, o que significa amor e apego às coisas puras e verdadeiras que produzem o Bem.

Estamos diante, Sr. Presidente, de uma bola de neve negativa, uma crise de representação que gera a desordem partidária, que desmonta a vontade eleitoral, que destrói a cidadania e que gera o desencanto. Esse modelo que aí está é devastador! É imprescindível desmontá-lo, aposentá-lo, antes que redunde em estragos maiores.

Precisamos de um novo sistema de partidos, que previna manipulações e distorções, que dê um basta à compra de votos, que ponha um ponto final a essas perigosas relações entre os Poderes da República.

Uma mera reforma política não é mais suficiente; será apenas um remendo nos males da República. Propostas como financiamento público de campanha, votação por listas, fidelidade partidária demoraram tanto que caducaram - agora, sozinhas, são incapazes de dar conta do recado.

As estruturas estão tão fragilizadas que já não bastam reformas, decretos, ou novas leis. Com bons ou maus dirigentes, a democracia, graças a Deus, sobrevive, mas, se as instituições são atingidas, ela também, ao longo do tempo, agonizará.

É preciso enfrentar a essência da crise. O modelo constitucional de 1988 faliu, se tornou colcha de retalhos e não tem mais como se sustentar, em face das tremendas contradições e disparidades que levaram ao império das medidas provisórias e dos orçamentos fictícios, e à anarquia partidária.

Nossos avós já diziam que “remendo novo em pano velho só contribui para sua maior ruptura”. Não temos mais fôlego para suportar uma nova leva de reformas. Façamos, então, as mudanças de uma só vez, por meio da convocação de uma Assembléia Nacional Constituinte Exclusiva, que trate, de maneira soberana e independente, a atual complexidade nacional.

Temos sede e fome de novos parâmetros!

Precisamos de uma nova estrutura tributária que acabe com essa montanha de impostos que penaliza os investimentos; de uma nova estrutura previdenciária que garanta aos nossos idosos a segurança para que possam viver em paz depois de tantos anos de serviços prestados à Nação; de uma nova estrutura trabalhista que valorize o empregado e garanta o crescimento das empresas que o acolhe; de uma nova estrutura política, alicerçada na valorização dos partidos como reunião de idéias e projetos e não como objeto de troca e barganhas econômicas.

O ano de 2007 está aí. É hora de reconstruir o Brasil.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.

Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/08/2006 - Página 25834