Discurso durante a 128ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Críticas a forma dada pela imprensa a induzir a opinião pública a se colocar contrária ao investimento da Petrobrás de 2,7 bilhões de dólares na Venezuela.

Autor
Roberto Saturnino (PT - Partido dos Trabalhadores/RJ)
Nome completo: Roberto Saturnino Braga
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ENERGETICA.:
  • Críticas a forma dada pela imprensa a induzir a opinião pública a se colocar contrária ao investimento da Petrobrás de 2,7 bilhões de dólares na Venezuela.
Aparteantes
Marcos Guerra.
Publicação
Publicação no DSF de 09/08/2006 - Página 26280
Assunto
Outros > POLITICA ENERGETICA.
Indexação
  • CRITICA, NOTICIARIO, IMPRENSA, ANUNCIO, PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS), INVESTIMENTO, PAIS ESTRANGEIRO, VENEZUELA, OPINIÃO, ORADOR, TENTATIVA, MANIPULAÇÃO, OPINIÃO PUBLICA, OBJETIVO, AUSENCIA, APOIO, POPULAÇÃO, DECISÃO, EMPRESA ESTATAL, ALEGAÇÕES, PREJUIZO, BRASIL.
  • QUESTIONAMENTO, RECUSA, IMPRENSA, DIVULGAÇÃO, INVESTIMENTO, PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS), PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), ARGENTINA, MOTIVO, ATUAÇÃO, HUGO CHAVEZ, PRESIDENTE DA REPUBLICA, VENEZUELA, DEFESA, NACIONALISMO, COMBATE, CAPITALISMO.
  • DEFESA, DIVERSIFICAÇÃO, INVESTIMENTO, PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS), MOTIVO, EMPRESA MULTINACIONAL, EXPECTATIVA, EXECUÇÃO, PROJETO, APROVAÇÃO, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL), CONSTRUÇÃO, GASODUTO, AMERICA DO SUL.
  • ANALISE, SIMILARIDADE, SITUAÇÃO, NATUREZA POLITICA, PAIS, AMERICA LATINA.

O SR. ROBERTO SATURNINO (Bloco/PT - RJ. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a Petrobras resolveu investir US$2 bilhões na Venezuela. Aliás, não sei ainda se essa já é uma decisão final, porque, junto com a notícia, veio outra de que esse investimento não está ainda inscrito no plano de investimentos dos próximos cinco anos da Petrobras. Enfim, pelo menos a Petrobras cogitou fortemente ou tomou uma pré-decisão, algo parecido com uma decisão; se não foi uma decisão, foi o bastante para causar sensação. Apareceu nas manchetes de todos os jornais.

Entretanto, a Petrobras vai investir mais do que isso, US$2,7 bilhões, nos Estados Unidos e mais ainda na Argentina. Mas isso não causa nenhuma sensação. A sensação é a Petrobras investir na Venezuela.

A Venezuela é um país rico em petróleo, em gás. Sendo um país vizinho do Brasil, por conseguinte, haveria até certa lógica, certa explicação nesse investimento. Mas ainda não é isso que causa sensação. Isso tiraria a sensação, porque seria uma decisão normal de uma empresa. O que causa sensação é o fato de a Venezuela ser um país presidido por Hugo Chávez, que é o novo demônio do capitalismo internacional, porque é um presidente que tem uma retórica nacionalista muito forte. Enfim, é um presidente que procura desenvolver programas sociais para tentar tirar a Venezuela desse quadro de injustiça que caracteriza tanto a América do Sul.

A Venezuela é um país riquíssimo em petróleo - há muitos anos, exporta-o - e concentra a riqueza dessa atividade econômica numa elite endinheirada que nunca pensou na economia e na vida do povo. O Presidente Chávez, ao contrário, está pretendendo levar boa parte desses frutos da exploração de petróleo para a economia popular. Ele estabelece ligações com outros países da América do Sul e usa uma retórica fortemente nacionalista e antiamericana. É o bastante para ser o novo demônio. Já está passando, enfim, a fase de atividade vital mais intensa de Fidel Castro. Então, nada como escolher um novo alvo, que é o Presidente Hugo Chávez.

Sr. Presidente, preferiria que a Petrobras dedicasse toda a sua capacidade de investimento ao Brasil, mas é uma preferência de modo geral. Não ignoro que a Petrobras, como grande empresa internacional que é hoje, tenha uma estratégia que pode incluir investimentos fora do País, como tem feito. A Petrobras é uma empresa multinacional. Sendo a Venezuela uma das potências petrolíferas do mundo, com uma disponibilidade de gás muito grande, e tendo a Petrobras sofrido um revés nos seus investimentos na Bolívia, nada mais compreensível que esta procure diversificar com o investimento na Venezuela e com a cogitação de estudo do projeto do grande gasoduto sul-americano, que, aliás, foi objeto de apreciação por todos os países do Mercosul (Mercado Comum do Cone Sul) e da última reunião de Córdoba, que foi um êxito muito grande do Mercosul, pois resultou em uma declaração assinada por todos os Presidentes, e que se realizou concomitantemente a uma reunião também das representações da sociedade civil dos respectivos países. Trata-se de uma declaração enfática de que o Mercosul é o objetivo daqueles que lá estiveram e de outros que estão ainda como observadores, mas que se mostram interessados na associação plena.

Agora, é claro que o fato de ser um investimento na Venezuela e de seu Presidente ser Hugo Chávez gera todo esse sensacionalismo e essa preferência da nossa imprensa no noticiário para induzir, talvez, uma reação por parte da população: “Olha, a Petrobras, em vez de investir no Brasil, está investindo lá”. Mas, como eu disse, ela está investindo mais nos Estados Unidos e na Argentina. Como falei, gostaria que a Petrobras investisse mais no Brasil, mas compreendo sua estratégia.

Aliás, a própria capacidade de investimento da Petrobras poderia hoje ser maior, se não tivessem sido, em passado recente, vendidas 60% das suas ações na Bolsa de Nova Iorque. Com que finalidade não sei muito bem, não consegui entender, mas o fato é que lá ficam 60% dos dividendos que a Petrobras distribui a seus acionistas, que são muito grandes e que poderiam, se não houvesse essa distribuição na Bolsa de Nova Iorque, concentrar-se no Brasil e aumentar os investimentos da empresa, que são muito volumosos.

O fato, Sr. Presidente, é que esse tema da América do Sul está polarizado tanto no Brasil como em toda a América Latina, até no México, onde, na última eleição, o candidato do governo ganhou, mas por pouco mais de 50%. Quer dizer, a sociedade mexicana está dividida ao meio, mas não em torno de qualquer questão de corrupção. O tema da campanha não foi a corrupção, mas os benefícios para a classe trabalhadora, para as camadas mais modestas da população, que deveriam ter sido beneficiadas pelo ingresso do México no Nafta, mas que, na verdade, não o foram. Ao contrário, a situação de vida está deteriorada, por isso levanta-se a população contra esse esquema.

Atualmente seria muito mais difícil para o México romper os acordos com o Nafta, dada a profundidade da integração que se deu, mas, de fato, há indícios evidentes de um desgosto muito grande por parte de pelo menos metade da população mexicana.

O mesmo ocorre na Bolívia. O Equador terá eleições agora. O Peru teve eleições, e o candidato mais conservador ficou em terceiro lugar. Ganhou um candidato que era da antiga agremiação social democrata, partido de Haya de La Torre, que esteve praticamente expulso do país sob acusação de corrupção, mas voltou, o que significa que talvez o povo não tenha concordado muito, depois que os fatos apareceram, com aquelas acusações. O fato é que o concorrente dele foi o mais nacionalista, não foi o concorrente mais conservador e mais ligado ao consenso de Washington e às teses neoliberais.

Então, há esse movimento na América do Sul, sim, há esse movimento na América Latina toda. É importante observar isso e não se procurar qualificar de uma forma depreciativa...

O Sr. Marcos Guerra (PSDB - ES) - Senador, V. Exª me permite um aparte?

O SR. ROBERTO SATURNINO (Bloco/PT - RJ) - ... de uma forma que caracteriza como atraso, porque, ao contrário, é o que está despontando como caminho novo para a América Latina depois das experiências feitas com o neoliberalismo que resultaram num aprofundamento enorme das diferenças de classe, das diferenças sociais e econômicas dos respectivos povos. Então, é preciso ver com mais respeito essas experiências novas e essas eleições que estão levando à presidência líderes com essas características.

O Sr. Marcos Guerra (PSDB - ES) - V. Exª me concede um aparte, Senador?

O SR. ROBERTO SATURNINO (Bloco/PT - RJ) - Pois não, ouço com atenção seu aparte.

O Sr. Marcos Guerra (PSDB - ES) - Senador, também vejo com muita preocupação o fato de a Petrobras investir na Venezuela. No domingo, o Fantástico, numa reportagem, mostrou que, com menos de R$2,00, pode-se completar um tanque com gasolina na Venezuela. A Petrobras, no ano passado, teve um lucro de US$27 bilhões. Eu até a coloco, Senador Arthur Virgílio, entre as poucas empresas ricas do País, entre as poucas privilegiadas, por que é uma empresa que tem um produto cujo preço é imposto. Temos o petróleo mais caro da América Latina, proveniente de uma empresa que é auto-suficiente. Eu acredito que o investimento que o Governo faz na Venezuela é para trazer petróleo e baixar o preço do produto no Brasil, senão não há motivos para a Petrobras investir naquele país. Esse é o aparte que queria fazer ao discurso de V. EXª.

O SR. ROBERTO SATURNINO (Bloco/PT - RJ) - Senador Marcos Guerra, concordo com V. Exª. Imagino que esse seja o propósito; confesso que não conheço a natureza do investimento. Como disse, preferia até que a capacidade de investimento da Petrobras fosse toda aplicada no Brasil, por exemplo, na construção de navios, como está ocorrendo, ou de plataformas, que antes eram importadas e agora estão sendo feitas no País. Mas compreendo que é estratégia de uma empresa que é hoje multinacional, fato que a obriga a investimentos em outros países. De forma que imaginamos que sejam investimentos capazes de trazer para a empresa e, por conseguinte, para o Brasil uma situação melhor, mais poderosa ainda, sob o ponto de vista econômico, uma vez que a Petrobras é, efetivamente, uma empresa muito poderosa.

Mas eu queria era chamar a atenção para o teor do noticiário, a forma com que se apresenta, como se fosse para induzir a opinião pública a se colocar contra esses investimentos, porque é na Venezuela e porque se dá isso e aquilo na Venezuela.

Agora, o que é preciso observar é o que está se dando em toda a América do Sul e por que se está dando isso, por que esses presidentes, com essas conotações políticas, com essas proposições políticas, estão vencendo as eleições?

Isso é algo que nos está chamando a todos nós a uma observação e a uma reflexão, para procurar as causas, enfim, procurar atender, minimamente, a reclamos da população que estão levando a essas escolhas; o que é saudável, democraticamente é saudável a renovação de poder, a substituição de grupos e de partidos no poder, porque isso abre novos caminhos, abre novas idéias e abre novas possibilidades de realização, que é a característica final do sistema democrático que todos nós prezamos e queremos manter e cultivar em nosso País.

Era o que eu queria dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 09/08/2006 - Página 26280