Discurso durante a 142ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Preocupação com a grave crise por que passa o país e a apatia da população, cuja solução é a participação de todos na política, com a renovação das práticas políticas.

Autor
Íris de Araújo (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/GO)
Nome completo: Íris de Araújo Rezende Machado
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ELEIÇÕES.:
  • Preocupação com a grave crise por que passa o país e a apatia da população, cuja solução é a participação de todos na política, com a renovação das práticas políticas.
Aparteantes
Almeida Lima, Flexa Ribeiro, Paulo Paim.
Publicação
Publicação no DSF de 30/08/2006 - Página 27575
Assunto
Outros > ELEIÇÕES.
Indexação
  • COMENTARIO, PESQUISA, OPINIÃO PUBLICA, DIVULGAÇÃO, IMPRENSA, FALTA, INTERESSE, CAMPANHA ELEITORAL, CRISE, POLITICA NACIONAL, NECESSIDADE, REFORMULAÇÃO, MODELO POLITICO, RETOMADA, ETICA, COMBATE, CORRUPÇÃO, IMPUNIDADE, PROPINA, DEPENDENCIA, EXECUTIVO, CONCENTRAÇÃO, RECURSOS, UNIÃO FEDERAL.
  • ANALISE, DADOS, PESQUISA, ELEITOR, AUMENTO, VOTO NULO, PREVISÃO, SUPERIORIDADE, RENOVAÇÃO, CAMARA DOS DEPUTADOS, PERDA, REPUTAÇÃO, CLASSE POLITICA, IMPORTANCIA, CONSCIENTIZAÇÃO, POPULAÇÃO, EXISTENCIA, IDEOLOGIA, DEFESA, BEM ESTAR SOCIAL, ALTERAÇÃO, CAMPANHA ELEITORAL, APRESENTAÇÃO, PROPOSTA, CANDIDATO, COMPARAÇÃO, VOTO, EFEITO, REFORMA POLITICA, BENEFICIO, DEMOCRACIA.

A SRª IRIS DE ARAÚJO (PMDB - GO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Senador Renan Calheiros; Srªs e Srs. Senadores, as diversas pesquisas de opinião divulgadas nos últimos dias só fazem reforçar o que, com insistência, nós temos repetido: há necessidade de se repensar o País para valer por meio de uma completa renovação das práticas políticas, sob pena de, perigosamente, fragilizar o coração do processo democrático brasileiro.

Podemos constatar que, neste momento, o Brasil caminha para a consolidação de duas alternativas quanto à grave crise que ele atravessa, Senador Paulo Paim: uma que desenha a necessidade de reformas apenas em aspectos do funcionamento das instituições políticas e a outra que prega abertamente uma atitude muito mais profunda, que caminhe para uma completa mudança na essência do sistema atual, abdicando dessa seqüência interminável de remendos nas leis - o que só faz adiar as providências estruturais tão reclamadas pela sociedade.

Essas recentes pesquisas reforçam, sim, e em todos os aspectos, a necessidade implacável de refundar o sistema político e de, a partir do próximo ano, escrever uma nova página em nossa História, tendo a ética como princípio irrevogável. A pesquisa Ibope exclusiva, divulgada pela revista Veja, mostra que o Brasil exibe a campanha mais desanimada desde a redemocratização. Os dados são devastadores, Sr. Presidente: seis em cada dez eleitores, não votariam se não fossem obrigados. A grande maioria, cerca de 68%, afirma estar “mais ou menos”, “pouco” ou “nada” interessada nas eleições. No pleito de 2000, esse percentual não passava dos 51%, e pior: o estudo apontou que, para 52% dos ouvidos, o principal motivo para este pouco interesse nas urnas são as denúncias de corrupção.

Os índices revelam outra realidade dramática no plano institucional, algo que pode comprometer, de maneira irreversível, o futuro do País: 90% dos eleitores dizem não confiar nos políticos, segundo pesquisa realizada pela Veja.

Ainda mais preocupante é a pesquisa Datafolha publicada no jornal Folha de S.Paulo, segundo a qual 18% dos eleitores ouvidos declararam ter a intenção de anular o voto para Deputado Federal - outro alerta que já havíamos feito desta tribuna. Em 2002, somente 3% dos eleitores votaram nulo no momento de escolher um representante para a Câmara dos Deputados, ou seja, se confirmado o resultado da pesquisa, haveria um aumento de 500% no voto nulo.

Outro estudo, realizado pelo Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar - Diap, estima que a renovação da Câmara dos Deputados, após estas eleições, deve chegar a 62%. Em 2002, esse índice de renovação ficou em apenas 46%. O percentual terá forte aumento porque, segundo técnicos do Diap, os eleitores devem rechaçar nas urnas os candidatos suspeitos de envolvimento com denúncias, como a máfia das ambulâncias e o mensalão.

Este é o explosivo cenário do Brasil a um mês das urnas, Senador Paulo Paim, a quem concedo o aparte.

O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - Senadora Iris de Araújo, cumprimento V. Exª pela análise que faz, pelas suas preocupações com o processo eleitoral. Viajei durante vinte dias pelo Rio Grande, fui a mais de dois Estados, tratando, naturalmente, do processo eleitoral. Concordo com V. Exª quando diz que a população está decepcionada com a política. Ninguém entende uma Comissão de Orçamento que é para inglês ver. Eu digo o seguinte: eu não entro na sala da Comissão de Orçamento. Tem gente boa, mas tem muita gente lá que se envolve num esquema malandro. Não estou dizendo nenhuma novidade. Não entro em sala de CPI. Há muita gente boa, mas tem gente lá que acusa num dia e no outro dia está sendo acusada. Isso não quer dizer que não é importante a CPI. Até teve uma rádio que disse: “O Paim nunca foi” Nunca fui e não autorizei a minha Líder a me indicar. Ela, inclusive, retirou o meu nome. Então, eu não entro em sala de CPI e não entro, também, na sala do Orçamento. Aí, alguém me pergunta: Paim, mas a Comissão de Deputados e Senadores, que tem quinze dias para discutir a medida provisória, reúne-se? Não, não se reúne. Não me lembro, nos últimos dez anos, de uma única vez que a Comissão Mista, que tem de analisar uma medida provisória, tenha se reunido e deliberado. Vou às Comissões Mistas da Medida Provisória, quando sou indicado, mas não me lembro de que tenham deliberado. Nunca deliberam. Então, é uma coisa meio que faz-de-conta. E, com tantas CPIs acontecendo nesses últimos dois anos, e algumas delas - eu diria, na sua maioria - não dando o resultado que se criou como expectativa na população, dá-se a impressão, para grande parte da população, de que são todas iguais.

Isso gera um descrédito. Eu tenho uma relação muito carinhosa e respeitosa com o Diap, mas estou com uma dúvida sobre se vai haver essa renovação que se espera. Até vou conversar com o pessoal do Diap, com o qual me dou muito bem. Por quê? Devido à forma atual da campanha eleitoral, os novos são totalmente desconhecidos e têm, no horário da televisão, às vezes cinco ou dez segundos, digamos. Os novos, quem sabe, vinte segundos, no máximo trinta segundos. Se eles não têm verba, não têm como fazer a propaganda. Não há mais aquela forma de colar cartaz no poste. Eles são totalmente desconhecidos, diferentemente daqueles que estão dentro do sistema, bons ou ruins. Há muita gente boa. V. Exª, para mim, é o exemplo de gente boa. Estou usando essa expressão, Senadora, pois sei que será uma grande Deputada Federal. V. Exª tem como ser lembrada pelo seu nome, pois é conhecidíssima, mas muitos dos novos não serão lembrados. Haverá vários votos brancos e nulos. Não que eu seja a favor. Acho, inclusive, que é burrice votar branco ou nulo, é dizer para ficar tudo como está e, quem tiver força econômica e contratar mais cabos eleitorais, será eleito. Por isso, eu estou um pouco preocupado. Claro, eu gostaria muito que os envolvidos com sanguessuga, “mensalão”, bingo e o diabo a quatro, acusados comprovadamente em CPI, não voltassem. Gostaria muito que não voltassem. Agora, quero dizer que essa pesquisa retrata a decepção da população com a política e é um quadro que nos leva, todos, a refletir sobre o que queremos para o futuro deste País.

Temos ou não temos de mudar a forma de elaborar, por exemplo, a peça orçamentária? Por que a peça orçamentária não é discutida no Estado e nós, aqui, defendemos a demanda do Estado, acabando com emenda individual e emendas coletivas? A tal de emenda de bancada coletiva nós todos sabemos como funciona: vai à bancada, e a corporação que jogar mais pesado acaba levando uma emenda de bancada. Por sua conseqüência, dá a impressão de que é efetivamente aquilo que o Estado quer, e, muitas vezes, não é. Tínhamos de discutir o Orçamento regionalmente, dividindo cada Estado em dez ou vinte regiões, passar pela assembléia legislativa, com a participação do Executivo, e nós, aqui, defender aquilo que cada Estado efetivamente quer, passando inclusive pelas Comissões temáticas, e não por uma comissão de iluminados que se reúne e resolve. Cidadão que nunca tratou da educação decide a verba da educação; cidadão que nunca tratou da segurança decide o que vai para a segurança. Por que não vai para as Comissões temáticas ou de Deputados e de Senadores que conhecem o tema e passam a discuti-lo? Peço desculpas a V. Exª, porque ultrapassei o tempo, mas o Presidente será tolerante, e o tempo que falei ele dará o devido desconto, já que são poucos Parlamentares que falarão hoje. Cumprimento V. Exª. Estou entendendo mesmo a revolta da população diante do processo eleitoral atual. Parabéns a V. Exª.

A SRª IRIS DE ARAÚJO (PMDB - GO) - Agradeço, Senador Paulo Paim. Considero que podemos discutir um pouco mais a respeito deste momento político que estamos vivendo, independente do tempo que possamos ter ou não - acho que vamos ter bastante tempo, não é, Presidente? Tenho uma visão um pouco diferente de V. Exª. Logicamente, há aquele candidato desconhecido que está começando agora e, também, aquele candidato que já tem um nome e está sendo suspeito de ter participado desses malfadados “mensalões” e “mensalinhos”, que eu considero a pior coisa que aconteceu para nós, políticos, nos últimos anos.

De certa forma, infelizmente, devendo ou não, nos misturou no mesmo caldeirão e o que percebemos é que, muitas vezes, as pessoas fazem um juízo generalizado do mundo político, achando que ninguém presta e está tudo acabado e diz que não vai votar. Isso tenho ouvido. Tenho-me valido, vamos dizer, da minha influência para mudar esse quadro, colocando que tudo isso aí pode ser mudado, independente até da chamada reforma política votada. Ela pode ser votada agora, na hora da eleição, na hora do voto. A grande reforma política que se pode fazer neste País é por meio da consciência do eleitor. Na hora em que ele for digitar o seu voto, que ele não vá, logicamente, alheio ao que está acontecendo.

Então, eu vejo um aspecto promissor dentro dessa circunstância infeliz que o País está vivendo, Senador Paulo Paim. Pelo menos lá no meu Estado, até eu mesma tenho-me valido de várias criatividades. A minha escola de fazer política foi gastando sola de sapato para valer, chegando perto do eleitor, conversando com ele. Hoje os candidatos estão sendo obrigados a mudar o comportamento em relação a isso, aproximando-se mais do eleitor, tentando convencê-lo das suas propostas.

O eleitor ia ao showmício muito mais para ver o artista do que para ver o candidato e, daí, não ouvia a sua proposta, não percebia o que estava acontecendo, votava sem perceber. E criou-se essa geração a que estamos assistindo, de políticos maus, sendo que sabemos, V. Exª sabe, os Senadores aqui presentes e eu também, que tem muita gente trabalhando, muita gente idealista aqui dentro, que busca, que trabalha e que não pode fazer parte dessa mesma cultura ou desse caldeirão que está misturando as pessoas.

Poderemos ter muitas surpresas. Poderemos ter surpresas desagradáveis, logicamente, se houver uma omissão grande em relação ao voto, o que é absolutamente pernicioso, porque os maus é que lucrarão com isso. Mas poderemos ter também, pelo voto, a grande reforma, que espero aconteça, para que tenhamos a oportunidade de sair dessas CPIs, Senador Paulo Paim, e o País comece a trilhar o caminho da normalidade e possamos aqui dentro - não estarei aqui mais, mas posso estar em outro espaço - lutar por aquilo que acreditamos, pelos nossos valores, discutir propostas, Senador Flexa Ribeiro, a quem concedo a palavra, e depois, novamente, ao Senador Paulo Paim.

O Sr. Flexa Ribeiro (PSDB - PA) - Senadora Íris de Araújo, seu pronunciamento é importante pela reflexão que V. Exª faz do quadro eleitoral que se avizinha. Acredito mesmo que V. Exª tem razão em relação às surpresas que podem vir dos resultados das urnas, em 1º de outubro, até porque parece que a sociedade brasileira está apática com relação ao processo eleitoral. Estamos fazendo uma sondagem, por meio de pesquisas, em que se verifica que grande parte da população ainda não se definiu e ainda se coloca numa posição de total apatia em relação a esse processo, talvez até pela ação do Poder Executivo em desacreditar o Poder Legislativo perante a sociedade brasileira. Evidentemente, temos de separar o joio do trigo, o que é uma função que deve ser levada a efeito por esta Casa. V. Exª tem razão, quando se refere a essa questão. Lembro uma frase de Martin Luther King, que dizia que a preocupação dele não era com o grito dos maus, mas com o silêncio dos bons. Isso é o que está acontecendo com o Brasil.

A nossa preocupação é, com certeza absoluta, com esse silêncio dos bons, a grande maioria dos brasileiros. Pelo voto, eles vão sair do silêncio e da apatia em que se encontram. Tenho absoluta certeza de que o resultado das urnas será bem diferente do que a pesquisa aponta neste instante. Temos andado bastante por todos os rincões do nosso Estado, o Pará, ao longo desses 60 dias, e, no corpo-a-corpo, temos visto uma realidade diferente da dos números. Espero que V. Exª tenha razão quanto à surpresa que a Nação brasileira terá no dia 1º de outubro.

A SRª IRIS DE ARAÚJO (PMDB - GO) - Obrigada, Senador Flexa Ribeiro. Agradeço a opinião de V. Exª. É importante que tenhamos esta oportunidade para discutirmos o momento.

V. Exª no Pará, o Senador Paulo Paim no Rio Grande do Sul e eu em Goiás fazemos essa pregação. Lutamos contra esse pensamento. Tenho feito isso praticamente todos os dias e procurado falar o máximo possível no sentido de conscientizar as pessoas de que, mais do que nunca, a política não é coisa somente para político, não. Política é para todos porque faz parte da nossa vida, Senador Paulo Paim.

Desde o preço do pão às escolas e à fila na saúde, tudo decorre de decisões tomadas dentro do espaço político.

Como disse o Senador, é o silêncio dos bons. Tenho ouvido muitos bons perguntarem a mim: “O que vamos fazer, Senadora, com isso que está acontecendo?”

Digo que não sou eu. Digo que lhes posso dar um caminho, mas é o posicionamento deles, é a atitude deles ao participar dessa movimentação que pode fazer a diferença e mudar tudo isso que aí está. 

Senador Paulo Paim, prosseguindo, eu gostaria muito de ouvi-lo.

O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - Serei muito rápido. Apenas quero dizer que não há discordâncias profundas entre o que V. Exª fala e o que eu falo. Apenas tenho a preocupação com a força do poder econômico. Vejo nos Estados pessoas que têm condições de contratar gente em todas as cidades - e sabemos que fazem isso - e de gastar três, quatro, cinco, seis milhões, conforme os dados, para uma campanha para deputado federal, distribuindo o programa - e o papel aceita tudo - com informações do que irá fazer como deputado, além dos carros de som ligados em todas as cidades, anunciando o mundo maravilhoso que vai acontecer com a chegada delas ao Congresso. Acho que é uma disputa desigual em relação aos idealistas, àqueles que gostariam muito de vir para o Congresso com a visão de efetivamente defender os mais pobres. Por isso, claro, temos de aprofundar o debate de financiamento de campanha. Particularmente, considero um equívoco não caminharmos para o financiamento público da campanha limitado. Para muitos, isso não pega bem, mas ele não sabe, como a Senadora mesmo disse, que quem paga a campanha do rico é ele. Na hora em que ele compra o pão e o leite e em que paga a água e a luz, ele está pagando a campanha. Não adianta. O dinheiro sai de algum lugar. Então, não querer enfrentar o debate do financiamento público de campanha, no meu entendimento, não é correto, não é adequado, porque o dinheiro sai do mesmo lugar. Só que os ricos têm dinheiro para fazer campanha, os pobres não têm. Tenho visto isso por todos os lugares por onde tenho andado. Não adianta achar que pobre pode chegar a Deputado Federal ou Senador. Que jeito? Como? É uma dificuldade enorme. Então, estou preocupado. Eu gostaria da renovação de que o povo fala. Mas como se fará a renovação, se os ditos idealistas não têm a mínima condição de fazer uma campanha para divulgar o seu nome, o seu trabalho, a sua história, o seu programa. Então, quero reafirmar que concordo em grande parte - e não é de hoje - com aquilo que a senhora fala. Neste momento, aproveito para dizer para o leitor: olhe para o passado do candidato, olhe quem ele foi ontem, olhe quem ele é hoje, para poder projetar quem poderá ele ser no futuro aqui no coração da democracia, que é o Congresso Nacional. Quero mais é cumprimentar V. Exª, porque dificilmente faço dois, três apartes ao mesmo orador, mas seu discurso é tão brilhante que tomei a liberdade e a ousadia de voltar a dialogar com V. Exª. Parabéns a V. Exª.

A SRª IRIS DE ARAÚJO (PMDB - GO) - Muito obrigada, Senador. V. Exª, como sempre, abrilhantando-nos com os apartes, abordando, de uma certa forma, aquilo que pensamos - e tenho estado sempre aqui discutindo com V. Exª -, ou seja, debatendo o bom debate, como V. Exª mesmo coloca, sobre essas nossas idéias, ou ideais.

Eu realmente procuro, dentro daquilo que posso fazer - e acredito que V. Exª também - conscientizar aquelas pessoas que nos cercam de que o grande remédio é a participação política. Não há outro. Não há como mudar, se as pessoas se distanciarem da política, dos partidos políticos, como se isso fosse uma peste: “É só para político”; “É só lá”; “Eu não entro nisso”. Depois descobrem que todos os caminhos levam às decisões políticas que devem ser tomadas.

Este momento envolve todos. Todos estão ligados, de uma maneira ou de outra: desprezando, aceitando, aplaudindo ou não aplaudindo. Hoje a atenção da opinião pública está voltada para o debate eleitoral. Talvez seja importante que neste momento todos façam uma reflexão sobre a atuação, a fim de que esta não se restrinja apenas às candidaturas propostas, mas, principalmente, às daqueles que vão nos delegar a representatividade nesta Casa.

Continuo dizendo que é pena que as análises de determinados setores chamados “formadores de opinião” ainda não tenham convergido para a gravidade desse ambiente entre os brasileiros, que apresenta simultaneamente apatia, descrença e desesperança. Esse conjunto de características psicológicas não é apenas um mal estar passageiro. Sintetiza, isso sim, o prenúncio de um período de grandes dificuldades, ao sinalizar para o desprezo às instituições - especialmente o Congresso Nacional, pulmão do regime democrático.

Então, é imprescindível começar, e desde já, a exigir um comportamento totalmente diferenciado por parte da próxima legislatura, tendo por base um discurso claro e determinado não no caminho de paliativos e remendos, mas de uma mudança séria, radical e profunda no sistema político.

Considero absolutamente precárias as propostas já amplamente difundidas de reformas dispersas em um ou outro ponto, por exemplo, das regras eleitorais. Para que o Congresso Nacional recupere a credibilidade, será necessário ir muito mais além: a resposta terá que ser na proporção do tamanho da crise. Não pode ser conivente com práticas abomináveis que ferem a dignidade. Não pode acobertar irregularidades. Não pode fazer vistas grossas para os crimes praticados. Tem que ser rigoroso. Autêntico. Justo. À altura das exigências do povo brasileiro.

Porque, na verdade, mesmo as personalidades mais esclarecidas que atuam no cenário político do País, parecem ainda não ter dimensionado o tamanho do buraco institucional brasileiro. É impossível retomar a confiança do povo com uma ou outra medida isolada.

O País requer uma transformação verdadeira na ação dos agentes públicos, refundando o sistema político - o que significa resgate dos valores éticos e redefinição de um arcabouço jurídico que, definitivamente, dê um basta a estes vícios que se tornaram rotina: a impunidade, a barganha, a compra de votos, as negociatas em troca de apoio, como V. Exª acabou de mencionar, a dependência odiosa em relação ao Executivo, a falta de independência dos partidos. 

É terrível um país que tem o grosso dos recursos concentrados na União, deixando ao deus-dará estados e municípios - fator primeiro a transformar seus representantes no Parlamento em presas fáceis desse sistema em que o Governo dá a obra ou o benefício em troca do alinhamento automático. É nessa raiz que brotam os malefícios, uma cadeia ininterrupta de desvios que distorce o sentido do Legislativo. É assim que se deforma a fiscalização, que os partidos perdem a sua autoridade e que avança este certo compadrio que deságua no mar de corrupção que infelicita nosso povo.

Na semana passada, fiquei particularmente sensibilizada pela idéia de uma campanha lançada pelo internauta Guilherme Fiúza, no portal IG. Ele defende, com muita propriedade, que os políticos dignos do País, que trabalham duro, quase sem descanso, lancem o manifesto “Acorda Eleitor” - movimento que teria objetivos muito claros: impedir que cresça a onda que responsabiliza todos os políticos pelos deslizes cometidos por alguns. O que, em outras palavras, redunda em não permitir que as instituições sejam atingidas em sua integridade. Isso se refere, especialmente, a determinados segmentos da intelectualidade, que, hoje, acabam prestando um desserviço ao País, ao pregar o voto nulo ou convocar protestos contra os políticos de maneira genérica, esquecendo-se que, antes de tudo, há um ideal democrático a defender - e, neste, o Congresso Nacional é pilastra e coluna central.

Ou seja, é extremamente perigosa esta tendência que busca hostilizar a política como a fonte de todos os males, por meio de expressões como “não agüentamos mais” ou “estamos enojados”. Tais atitudes podem ser fonte de tentações com conseqüências danosas e desastrosas, especialmente neste momento em que surgem na América Latina, determinadas lideranças que ousam passar por cima de tudo para levar adiante seus propósitos ideológicos.

O bom caminho segue sempre a via democrática, a que transforma o Parlamento por dentro, tendo por base atitudes nobres, ilesas a posições de intelectuais ou artistas que chegam a ponto de declarar “não estarem preocupados com o exercício da ética” - imaginem!

O Brasil está diante de uma encruzilhada: ou produz mudanças profundas dentro do regime aberto, justo e democrático que se deseja construir - dando resposta aos desafios das mudanças -, ou, inexoravelmente, verá os seus poderes rendidos ao descrédito e às incertezas.

Pois não, Senador. Concedo a palavra a V. Exª com o maior prazer.

O Sr. Almeida Lima (PMDB - SE) - Nobre Senadora Íris de Araújo, eu quero me congratular com o pronunciamento de V. Exª pela maneira firme e correta com que se pronuncia na tarde de hoje, buscando a defesa das instituições do País, mostrando à população a necessidade que ela tem de estabelecer a diferença entre aqueles que se comportam de forma indigna dos que se comportam de forma digna. Nós precisamos construir e fortalecer instituições neste País, para dar estabilidade ao nosso povo e à sociedade. Evidente que a população tem parcela considerável de responsabilidade neste processo. E acredito que serei o próximo... Daqui a pouco estarei me pronunciando e farei críticas, inclusive, a um seguimento que deveria - a exemplo do seguimento político - dar exemplos dignos à sociedade brasileira e não estão dando, ou seja, em uma demonstração de que a responsabilidade não é apenas da classe política. É preciso que se reconheça que nós temos problemas gravíssimos no Parlamento brasileiro, não apenas no Congresso Nacional; problemas gravíssimos no Poder Judiciário e problemas muito graves, gravíssimos, também, no Poder Executivo. E muitos dos problemas que nós temos no Congresso Nacional decorrem não apenas da participação exclusiva dos Srs. Congressistas, com as grandiosas e numerosas ressalvas, mas sobretudo da conivência com o Poder Executivo, com o Palácio do Planalto. E, também, por responsabilidade da sociedade, porque, no Congresso nacional, ninguém foi conduzido, neste momento de Estado de Direito Democrático, como Senador biônico ou Deputado biônico. Vieram para cá porque a sociedade os elegeu. Portanto, a sociedade tem parcela considerável de responsabilidade pela representação que tem. Minha solidariedade e meus parabéns ao pronunciamento de V. Exª.

A SRª IRIS DE ARAÚJO (PMDB - GO) - Agradeço a oportunidade do aparte de V. Exª, Senador Almeida Lima, que, como o dos outros Senadores que nos apartearam, contribuiu para que o nosso pronunciamento tivesse mais conteúdo por meio da opinião de V. Exªs.

A intensidade da crise política deve ser vista sob novo enfoque: a oportunidade ímpar de extrair lições e mobilizar a sociedade na busca de soluções duradouras. Um novo comportamento político é essencial para que as instituições não percam a legitimidade junto à opinião pública. Neste sentido, é preciso reconhecer que o sistema atual de representação partidária, eleitoral e parlamentar está superado.

Urge debater com a sociedade um projeto renovado de nação, centrado no fortalecimento dos partidos, no equilíbrio entre os poderes e na mais absoluta ética.

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.

Muito obrigada pela condescendência de V. Exª para que eu pudesse estender o meu pronunciamento.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 30/08/2006 - Página 27575