Discurso durante a 147ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Preocupação com a tensão existente na fronteira Brasil/Bolívia.

Autor
Tião Viana (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Sebastião Afonso Viana Macedo Neves
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLATIVO. POLITICA EXTERNA.:
  • Preocupação com a tensão existente na fronteira Brasil/Bolívia.
Aparteantes
Sibá Machado.
Publicação
Publicação no DSF de 06/09/2006 - Página 28002
Assunto
Outros > LEGISLATIVO. POLITICA EXTERNA.
Indexação
  • EXPECTATIVA, APOIO, PRESIDENTE, COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO JUSTIÇA E CIDADANIA, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, AUTORIA, ORADOR, EXTINÇÃO, VOTO SECRETO, TRAMITAÇÃO, CASSAÇÃO, MANDATO PARLAMENTAR, MANUTENÇÃO, VOTAÇÃO, ESCOLHA, AUTORIDADE.
  • ANALISE, SITUAÇÃO, FRONTEIRA, ESTADO DO ACRE (AC), PAIS ESTRANGEIRO, BOLIVIA, TENSÃO SOCIAL, MOTIVO, EXIGENCIA, GOVERNO ESTRANGEIRO, LEGALIDADE, EMIGRANTE, BRASILEIROS, OBJETIVO, REFORMA AGRARIA, REGISTRO, GESTÃO, ITAMARATI (MRE), EXPECTATIVA, PACTO, PACIFICAÇÃO, DEFINIÇÃO, PRAZO, RECADASTRAMENTO, DESNECESSIDADE, CONFLITO.
  • COMENTARIO, SUPERIORIDADE, NUMERO, EMIGRANTE, PAIS ESTRANGEIRO, BOLIVIA, RESIDENCIA, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), IMPORTANCIA, RECIPROCIDADE, ELOGIO, GOVERNO BRASILEIRO, DECRETO EXECUTIVO, ANISTIA, ESTRANGEIRO, INCENTIVO, LEGALIDADE.
  • HOMENAGEM, DIA NACIONAL, REGIÃO AMAZONICA, SAUDAÇÃO, POPULAÇÃO, BUSCA, JUSTIÇA SOCIAL, DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL.

            O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, tratarei de uma matéria que diz respeito à tensão na fronteira Brasil/Bolívia. Nós temos sete mil brasileiros - a região do Acre, principalmente - vivendo em áreas bolivianas, e muitos bolivianos em áreas do Acre. Temos setenta mil bolivianos vivendo em São Paulo, Estado de V. Exª, com dúvida da legalidade apresentada, e o momento é de tensão.

            Mas, inicialmente, eu gostaria de abordar a manifestação que fez o Senador Antonio Carlos Magalhães em alerta de compreensão efetiva da responsabilidade que tem o Senado Federal em votar matérias delicadas que dizem respeito a normas constitucionais, escolhas de embaixadores, ministros dos Tribunais Superiores, autoridades monetárias, matérias que impõem o voto secreto.

            Tive o cuidado, quando apresentei a PEC 38, em 2002, de ressalvar esses aspectos. A Câmara dos Deputados mantém, lamentavelmente, esse muro com o Senado, não dialogou, e a matéria, necessariamente, será revisada no plenário do Senado Federal. Procurarei contribuir com esse tema, por ter sido o primeiro autor de matéria dessa natureza na Casa, já no ano de 2000, reapresentando-a ao Plenário do Senado Federal, para que ela possa seguir o trâmite legislativo na CCJ. Espero contar com a sensibilidade do Presidente da Comissão de Constituição e Justiça para tratar do assunto e que os deputados entendam que assim poderemos agilizar uma matéria que pode ter um trâmite rápido, atendendo ao pressuposto de que, em caso de cassação, a democracia brasileira imponha o voto aberto e direto do parlamentar. Espero dar contribuição nesse sentido, para facilitar o trâmite legislativo.

            Sr. Presidente, uma situação delicada envolve a fronteira Brasil/Bolívia, no Estado do Acre, onde centenas de quilômetros não têm barreira formal. Não há uma relação de guerra, não há uma relação de ódio, não há distância cultural entre brasileiros e bolivianos. Rios estreitos nos separam muitas vezes. Vamos de um lado a outro da fronteira. Somos amigos, convivemos numa história secular. Em 1902, houve um processo de luta e disputa pelo espaço geopolítico e pela identidade cultural de um povo migrante para a Amazônia, uma terra que não era reconhecida em sua importância, e isso redundou no Estado do Acre hoje, um Estado da Federação por opção, que honra a Nação brasileira, que cresce nos indicadores da China (hoje mais de 9% ao ano), e temos agora um momento de tensão porque o governo boliviano, numa justa reivindicação da sua reforma agrária, numa definição fundiária que exige seja feita junto ao seu povo, estabeleceu agora regras de que quem não esteja vivendo na legalidade, amparado nas normas constitucionais do Estado boliviano, deverá ser deslocado para outras áreas.

            É uma matéria delicada, porque traços de vizinhança nos unem. A cultura boliviana e a brasileira são culturas de irmãos latinos, sul-americanos. Veja V. Exª que o seu Estado, São Paulo, abriga 70 mil bolivianos clandestinos, que precisam de reconhecimento. São forças de trabalho e querem ter a sua dignidade. No caso do Acre, 7 mil brasileiros do meu Estado estão vivendo hoje na Bolívia. Então, em nada se ganharia na relação bilateral com um momento de tensão. Estamos preocupados, acompanhando esse movimento.

            O Presidente da República estabeleceu uma orientação ao Ministro das Relações Exteriores para que tratasse com muito cuidado, com muita serenidade e muita atenção esta matéria. O Ministro Celso Amorim esteve na Bolívia, em La Paz, estabeleceu um acordo com a diplomacia boliviana para um grupo de trabalho. No dia 7 de julho, houve a primeira reunião de um grupo de trabalho para discutir a relação de presença de bolivianos no Brasil e de brasileiros na Bolívia, nas áreas de fronteira. A tensão fundiária que estava havendo entre a fronteira da Bolívia com o Acre, especialmente na região do Departamento de Pando - Departamento vizinho equivalente a um Estado nosso - e temos avançado.

            Infelizmente, tem havido tensão crescente na região. Entendo que hoje está sendo realizada a segunda reunião desse grupo de trabalho do Brasil e da Bolívia em La Paz.

            Espero que o Itamaraty, reiterando a atenção e o cuidado tomado na reunião de julho, estabeleça um pacto imediato de pacificação das relações entre as autoridades do governo boliviano e os brasileiros que vivem ali e alcance um prazo suficiente para o recadastramento, a regularização em termos de identificação formal, para que a comunidade brasileira que ali vive não passe por constrangimentos, não passe por nenhum tipo de dificuldade em poder viver num país vizinho dentro das normas legais estabelecidas pelo país vizinho.

            Esse grupo de trabalho estabeleceu uma solidariedade institucional do Incra, o nosso Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária, e do Ministério da Reforma Agrária, para que possamos ajudar os irmãos bolivianos a que conciliem a presença brasileira com sua identidade fundiária, com suas perspectivas econômicas regionais. A relação de presença brasileira na Bolívia e da Bolívia no Acre é uma relação de irmãos, não temos nenhuma barreira cultural. Muito longe de nós qualquer semelhança com a relação dos palestinos com Israel. Não temos isso, não há necessidade de conflito.

            Sr. Presidente, Srs. Senadores, a ansiedade que tem o governo boliviano hoje deve se refletir numa maturidade política, em países que têm tradição de uma relação irmã, do ponto de vista bilateral, e que possamos conciliar esse resultado pelas normas da diplomacia e pelo respeito que devemos ter. Imagine se chegasse aqui cobrando do governo brasileiro que, de repente, adotasse restrições e constrangimentos aos irmãos bolivianos, que são 70 mil vivendo em São Paulo. Queremos é a oportunidade de colocá-los à luz da legalidade, amparados nas normas da diplomacia brasileira. 

            O SR. PRESIDENTE (Romeu Tuma. PFL - SP) - Recentemente, o Governo brasileiro baixou um decreto anistiando aqueles que aqui viviam para se legalizar em território brasileiro. 

            O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC) - Veja, V. Exª, como essa notícia é importante para o meu pronunciamento. Demonstra um gesto de grandeza para um país irmão nas tradições sul-americanas que o Brasil está procurando ter com seus vizinhos. A Bolívia deve observar o princípio da reciprocidade baseada no gesto de grandeza que V. Exª identificou.

            Em nada se ganha com tensão e acirramento de ânimos. São famílias humildes que estão vivendo da economia extrativista e que merecem e devem ser respeitadas.

            Tenho certeza de que o grupo de trabalho de hoje redundará numa calma para a região, numa redução da possibilidade de conflitos e na proteção da responsabilidade social para as famílias bolivianas que ali vivem.

            Senador Sibá Machado, concedo-lhe um aparte. Você é um “irmão-Senador”, preocupado, do mesmo modo, com essas questões de convivência nas regiões de fronteira da Amazônia.

            O Sr. Sibá Machado (Bloco/PT - AC) - Senador Tião Viana, só para complementar as informações de V. Exª. Acho que, por conta dos episódios das negociações sobre o gás que tomou conta do noticiário brasileiro, isso talvez inquiete muito mais as pessoas, pois acham que não está havendo nenhuma iniciativa da parte tanto do Governo do Estado do Acre quanto do Governo Federal. No entanto, temos que lembrar que esta Casa votou matéria de iniciativa do Governo Federal, no sentido de eliminar a necessidade de passaporte para que brasileiros possam ir à Bolívia e ao Peru e que bolivianos e peruanos possam vir ao Brasil. Isso é para configurar ainda mais o caminho que o Governo brasileiro tem buscado para se relacionar com aqueles dois países. Se há algum tipo de nova visão sobre a distribuição fundiária da Bolívia, claro que temos que respeitar isso, mas queremos, acima de tudo, garantir que haja uma negociação tranqüila e sadia, para que aquela população não fique assustada, como vimos nesses últimos dias. Quero parabenizar V. Exª por algo mais, aproveitando o momento.

            É quanto àquelas tristes notícias que tentaram imputar contra V. Exª no Estado do Acre. Quero dizer que, em nome de todas aquelas pessoas que subscreveram documentos e que participaram de atividades, e que vieram dar um abraço em V. Exª por confiar na sua história, em seu mandato de Senador, na contribuição que V. Exª tem prestado ao Estado e ao País. Que fique aqui reiterada a nossa solidariedade ao seu brilhante trabalho como Senador da República!

            O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC) - Agradeço a V. Exª, Senador Sibá Machado. Acolho o seu aparte.

            Encerrarei, Sr. Presidente, acreditando que a Bolívia só tem a ganhar com uma relação de país irmão com o Brasil. Imagine V. Exª a hidrovia do rio Paraguai, aquele rio que passa pelo Mato Grosso, que vem do Paraná, que nos leva ao Uruguai, que chega à Argentina. Imagine V. Exª 13 milhões de toneladas por ano passando por lá. A Bolívia é o país que mais necessidade tem dessa integração de cabotagem. Imagine V. Exª as centenas de carros, de veículos que passam, as ferrovias que nos unem. Se vivemos momentos de tensão, não...Temos que nos ajudar como países irmãos.

            Encerro, nos segundos que faltam, saudando a população do Amazonas. São vinte milhões de amazônidas. Hoje é o Dia da Amazônia. Há comemorações em todas as cidades daquela região. Vinte milhões de brasileiros que lá vivem esperam justiça social e a possibilidade de conviver com desenvolvimento e preservação ambiental. Tem sido uma regra dos Estados e do seu povo.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/09/2006 - Página 28002