Discurso durante a 146ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Posicionamento de S.Exa. com relação às declarações do presidente do PT, Deputado Ricardo Berzoini.

Autor
Ideli Salvatti (PT - Partido dos Trabalhadores/SC)
Nome completo: Ideli Salvatti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SENADO. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • Posicionamento de S.Exa. com relação às declarações do presidente do PT, Deputado Ricardo Berzoini.
Aparteantes
Sergio Guerra.
Publicação
Publicação no DSF de 05/09/2006 - Página 27845
Assunto
Outros > SENADO. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • COMENTARIO, FALTA, ETICA, DEBATE, PLENARIO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), CAMPANHA ELEITORAL, ESPECIFICAÇÃO, DESRESPEITO, FAMILIA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, REGISTRO, REPUDIO, MAIORIA, POPULAÇÃO.
  • COMENTARIO, LEITURA, TRECHO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, VALOR ECONOMICO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), IMPORTANCIA, BOLSA FAMILIA, DISPENSA, INTERMEDIARIO, CLASSE POLITICA, BENEFICIO, POPULAÇÃO, ALTERAÇÃO, POLITICA NACIONAL, SEMELHANÇA, ATUAÇÃO, MINISTERIO DAS CIDADES, ATENDIMENTO, PREFEITO, EXTINÇÃO, MEDIAÇÃO, VERBA, DEPUTADOS, SENADOR.

A SRª IDELI SALVATTI (Bloco/PT - SC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs Senadores presentes ao plenário, não fiz apartes ao Senador Sérgio Guerra, mas não poderia deixar de me pronunciar sobre o assunto, porque as questões aqui mencionadas podem ter um viés de declarações a serem lamentadas ou a serem até repudiadas. Por isso, eu me abstive na votação do requerimento. Isso está dentro de um contexto. Não quero aqui fazer um julgamento da palavra do Presidente do meu Partido.

Agora, neste plenário, no último período - um ano e alguns meses -, houve manifestações de figuras públicas atacando familiares de pessoas públicas; houve revolvimento de mortos, de cadáveres. Não vou aqui reprisar meu sentimento ao ver, na CPI dos Bingos, a exposição lamentável, quase como um programa “mundo cão”, das fotos do nosso prefeito Celso Daniel.

Quero dizer que esse clima de vale-tudo, de colocar fogo no palheiro, como foi apregoado há poucos dias, leva aonde? Se existem declarações que têm de ser lamentadas, devo dizer que há grande elenco delas, de surra no Presidente, de, dia sim, outro também, familiares do Presidente serem achincalhados.

Tenho esse sentimento profundo, que é opinião pública. Acho que as pesquisas demonstram isso de forma inequívoca: quanto mais a baixaria come, no debate político, desqualificando o debate político, pior fica para a imagem de quem faz o ataque, senão os resultados das pesquisas não estariam aí a demonstrar - inclusive há reportagem no dia de hoje - que os principais críticos não estão tendo nas pesquisas o apoio ao volume e à contundência das críticas que fazem. Então, acho que vale a pena tudo isso, Sr. Presidente, para fazermos uma reflexão profunda a respeito do significado de não ter nível para fazer o debate político.

Eu gostaria que pudéssemos fazer efetivamente o debate desta eleição porque há fatos, há situações no processo eleitoral atual que mereceriam uma profunda discussão, que nem pude registrar, mas vou pedir que seja publicado na íntegra um artigo de Maria Inês Nassif, de 24 de agosto, publicado no Valor Econômico, cujo título é “Não só as traições abalam Alckmin”. No meio do artigo, ela traz elementos para que possamos avaliar determinadas situações. Hoje, pura e simplesmente, entendem o Bolsa-Família como um instrumento e alguns alegam que é um instrumento para compra de voto. O que significou o Bolsa-Família na desestruturação da política tradicional? Faço questão de ler um pequeno trecho desse artigo:

“Dois programas simples, implantados diretamente pelo governo Lula, no entanto, foram fundamentais para desestabilizar as bases da política tradicional - ela historicamente resiste: passou por momentos de crise e voltou para onde sempre esteve, mas agora vive outra crise, das grandes. Um dos programas, o Bolsa Família, claramente desintermediou o voto da população pobre, que antes passava pelo chefe local - processo, aliás, facilitado pela urna eletrônica. Mas não se pode desprezar também uma mudança nas relações entre o governo federal e os municípios.

Quando foi criado o Ministério das Cidades, a impressão que se tinha era a de que seria uma mera compensação política ao ex-governador Olívio Dutra, do PT do Rio Grande do Sul. Mas a relação direta estabelecida com os prefeitos quebrou uma das lógicas mais importantes da política tradicional. Os prefeitos precisavam da mediação dos deputados federais e senadores para conseguir verbas. Essas verbas eram moeda de troca do governo federal, para obter apoio parlamentar; e o vínculo do prefeito com o deputado federal ou senador. Não que isso tenha acabado: as emendas parlamentares ainda abrem muito espaço para isso, como mostra o escândalo das sanguessugas. Mas a mediação do político federal para obras de saneamento, habitação, regularização fundiária, planos diretores e transporte urbano, por exemplo, não é mais obrigatória. Isso ocorre num momento em que os governos estaduais não têm condições financeiras de atender demandas municipais, o que também torna mais tênues os vínculos entre os prefeitos e governadores.”

Ou seja, a Maria Inês Nassif, que não tem nada a ver com o PT, traz para este momento eleitoral reflexões importantes a respeito de mudanças estruturais na forma de relação entre os entes federados, entre a população e os seus governantes. Tudo isso mereceria de nós um tempo, um período, para debater. Mas, não. Ficamos remoendo, revolvendo cadáveres, ficamos com acusações envolvendo familiares, ficamos na baixaria política, sem fazer o bom debate de tudo o que precisa ser feito neste processo eleitoral que estamos vivendo.

Ouço, com muito prazer, o Senador Sérgio Guerra, por quem tenho profundo respeito.

O Sr. Sérgio Guerra (PSDB - PE) - Senadora Ideli, são duas questões, e, na minha opinião, elas não se confundem. A primeira, sobre a qual falamos, diz respeito à referência, à acusação de um presidente de um grande partido à memória de uma pessoa falecida, sem direito de defesa; portanto, num contexto absolutamente inexplicável e indefensável.

A SRª IDELI SALVATTI (Bloco/PT - SC) - Os mortos do PT também não têm direito à defesa.

O Sr. Sérgio Guerra (PSDB - PE) - Eu não estou falando dos mortos do PT, estou falando dos fatos. Os fatos têm de ser vistos enquanto têm começo, meio, fim, conteúdo, formato. Estou falando de um fato visível, publicado e claro do Presidente do Partido dos Trabalhadores sobre a memória de um homem honrado. Ponto. No caso do PT lá do Celso Daniel, a acusação partiu do irmão dele e não do Congresso Nacional. Não é tema. Não se pode comparar os acontecimentos que envolveram Celso Daniel e a sua morte com o Senador Carlos Jereissati.

A SRª IDELI SALVATTI (Bloco/PT - SC) - Que não deixou de ser usado à exaustão para a guerra política.

O Sr. Sérgio Guerra (PSDB - PE) - Não tem nada a ver uma coisa com a outra, a senhora não deveria nem confundir uma coisa com a outra, porque ninguém o faz. Nunca ninguém fez isso. Eu acho que é absolutamente inadequada a sua lembrança. Eu não defendo isso, nunca defendi, nem acho que truculência ... 

A SRª IDELI SALVATTI (Bloco/PT - SC) - Por isso eu disse que o respeito profundamente. 

O Sr. Sérgio Guerra (PSDB - PE) - Mas eu quero dizer que o Presidente do PT não poderia ter ido a um grande jornal brasileiro dizer o que disse de uma pessoa falecida, sem direito de defesa, e de forma injusta. Isso não ajuda o Brasil nem a democracia, nem faz sentido a um presidente de um partido com a responsabilidade do Partido dos Trabalhadores. Segundo, quanto à questão do Bolsa Família, quero dizer o seguinte: não mudou nada. Quando foi criada a Sudene, há muitos anos, as pessoas trocavam voto e não havia intermediação, era direto. O Governo Federal mandava água para quem tinha sede, e o voto era trocado por água. Era assim que as pessoas ficavam populares: dando água a quem estava com sede lá embaixo. Não tem nada de mal que haja intermediação entre prefeitos e deputados. Por quê? Qual é o aspecto negativo de um parlamentar fazer uma emenda e atender a uma população local? Qual é a criminalização que há nisso? Efetivamente, há democracia nisso. Não se trata de nenhuma atitude infame. Ora, se quero falar de coisa malfeita, posso lhe contar uma história de uma cidade de Pernambuco, Garanhuns. Nós ganhamos a eleição para prefeito lá. Parlamentares do seu Partido, com recursos federais, recursos abertos no Orçamento, do arbítrio do prefeito, compraram o voto do prefeito. Gente que nunca foi votada lá vai ser votada porque levou dinheiro do Governo Federal para dar água ao povo e construir algumas casas. As provas são evidentes, os caras nunca foram votados lá e serão votados agora. Enfim, não é por aí. O que quero dizer à senhora, com todo o respeito, é que não tenho nada contra o Bolsa Família. É correto dar comida a quem está com fome, mas não muda coisa nenhuma. Ao contrário, é um fator de acomodação. Os sindicatos de várias áreas de Pernambuco enfraqueceram como sindicatos porque viraram agências eleitorais. Então, essa esquerda a que se refere a minha companheira, amiga, Senadora Ideli, está morrendo, não existe mais. Aquela que fez a luta dos camponeses cessou, não existe mais, e as condições de vida do povo estão apenas niveladas por baixo. Eu não quero para o Nordeste uma população de indigentes. Eu quero uma população de gente que pode produzir, melhorar, desenvolver-se, ascender, democracia. É isso que defendo.

A SRª IDELI SALVATTI (Bloco PT - SC) - Senador Sérgio Guerra, eu não quis abrir aqui o debate a respeito do Bolsa Família, das reestruturações e modificações que determinados programas e mudanças na estruturação da máquina pública brasileira acabaram provocando nesse processo eleitoral.

Eu trouxe como exemplo um artigo da Maria Inês Nassif apenas para exemplificar que deveríamos estar discutindo outro tipo de questão no processo eleitoral. Não deveríamos estar aqui discutindo a surra que determinadas pessoas querem dar no Presidente ou acusações para familiares, pessoas que já estão mortas e não podem mais se defender. Efetivamente, o que precisaríamos estar aqui discutindo são as questões relacionadas aos temas que importam à população e que estão, efetivamente, em jogo no processo eleitoral. Até porque - volto a afirmar - as pesquisas, os dados, as reportagens que estão aí, inclusive nos jornais de hoje, relacionando os ataques mais contundentes, não têm produzido os mais contundentes números ou percentuais de intenção de voto. Então, acho que pelo menos isso deveria estar fazendo com que as pessoas refletissem a respeito do comportamento e do debate no processo eleitoral.

Era isso, Sr. Presidente. Agradeço ao Senador Ney Suassuna pela gentileza.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/09/2006 - Página 27845