Discurso durante a 154ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Justificação de encaminhamento do requerimento de voto de aplauso à população gaúcha pelo transcurso, no dia 20 de setembro, do centésimo septuagésimo primeiro aniversário da Revolução Farroupilha. O tratamento que o Rio Grande do Sul vem recebendo do governo federal. Considerações sobre os últimos acontecimentos ocorridos na área política.

Autor
Pedro Simon (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: Pedro Jorge Simon
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ELEIÇÕES.:
  • Justificação de encaminhamento do requerimento de voto de aplauso à população gaúcha pelo transcurso, no dia 20 de setembro, do centésimo septuagésimo primeiro aniversário da Revolução Farroupilha. O tratamento que o Rio Grande do Sul vem recebendo do governo federal. Considerações sobre os últimos acontecimentos ocorridos na área política.
Aparteantes
Eduardo Suplicy, Jefferson Peres.
Publicação
Publicação no DSF de 21/09/2006 - Página 29330
Assunto
Outros > ELEIÇÕES.
Indexação
  • HOMENAGEM, REVOLUÇÃO, ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), COMPARAÇÃO, TRADIÇÃO, ATUALIDADE, CRITICA, FALTA, ATENÇÃO, GOVERNO FEDERAL, GOVERNO ESTADUAL, REGISTRO, DIFICULDADE, INSTALAÇÃO, REFINARIA, PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS), POLO PETROQUIMICO, AÇOS FINOS PIRATINI SA (AFP), REGIÃO.
  • CRITICA, DEMORA, PRESIDENCIA DA REPUBLICA, LIBERAÇÃO, ACORDO, TRANSFERENCIA, DIVIDA, GOVERNO ESTADUAL, ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), BANCO MUNDIAL.
  • CRITICA, CAMPANHA ELEITORAL, CANDIDATO, GOVERNADOR, ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), MA-FE, DECLARAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, APROVAÇÃO, NEGOCIAÇÃO, DIVIDA, GOVERNO ESTADUAL, BANCO MUNDIAL, INJUSTIÇA, ACUSAÇÃO, NEGLIGENCIA, ATUAÇÃO PARLAMENTAR, ORADOR.
  • REPUDIO, FALTA, QUORUM, SENADO, VOTAÇÃO, CONSELHO, ETICA, CRITICA, CAMPANHA ELEITORAL, CORRUPÇÃO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), APREENSÃO, CONTINUAÇÃO, IRREGULARIDADE, POSSIBILIDADE, REELEIÇÃO, REGISTRO, CONVITE, PRESIDENTE DA REPUBLICA, DEPOIMENTO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF).

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Com revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Parlamentares, dois motivos me trazem à tribuna. O primeiro diz respeito ao requerimento que está na Mesa, na frente de V. Exª, assinado pelos três Senadores do Rio Grande do Sul - Senador Paulo Paim, Senador Sérgio Zambiasi e eu -, solicitando a esta Casa uma referência de homenagem ao 20 de setembro, data de mais um aniversário da Revolução Farroupilha.

O Presidente da Câmara dos Deputados, que é uma pessoa de grande cultura, muito conhecedora da história do Rio Grande do Sul e simpática a ela, por conta própria solicitou, hoje, na Câmara dos Deputados, também uma referência à Revolução Farroupilha.

Andando ontem à noite por aquele acampamento, foi impressionante ver como ali, na beira do rio, milhares e milhares de gaúchos de todo o Rio Grande do Sul acampam ou passeiam. Fico impressionado como um Estado pode conservar, por tanto tempo, uma tradição tão profunda e pode guardar dentro de si um sentimento tão arraigado de amor à terra, de amor aos seus princípios, de amor à sua história. É emocionante como o Rio Grande do Sul guarda na sua alma o carinho, o afeto e o respeito aos feitos da Revolução Farroupilha.

Não me lembro, no Brasil, de nenhuma outra tradição, de nenhuma outra história eminentemente regional que esteja tão apegada a uma gente como a epopéia Farroupilha ao povo do Rio Grande do Sul.

Na verdade, foi emocionante a história do Rio Grande do Sul e do Brasil. Um povo se levanta clamando por liberdade, clamando pelo direito de viver, de evoluir, de crescer, não aceitando a pressão esmagadora do poder central, querendo manifestar o seu pensamento, querendo que a sua economia, que estava florescendo, tivesse chance de avançar.

Um movimento empolgou o Estado inteiro. O Rio Grande viveu um momento de desafio, uma guerra contra o Império. Os farrapos, assim chamados, gente humilde, gente simples, ao lado dos grandes da época, chegaram a proclamar a República de Piratini, chegaram a ter o seu hino, a sua bandeira e a sua história, chegaram a lutar por dez anos contra as tropas federais em número infinitamente superior, em condições econômicas maciçamente maiores.

A história conta páginas fantásticas da Revolução Farroupilha. A história conta epopéias de glória, de luta, onde o nosso presidente nomeado e eleito, Bento Gonçalves, com tantos heróis, como Garibaldi, com tantas figuras geniais, com grande capacidade de luta, conseguiram, durante dez anos, viver o seu ideal e conseguiram, apesar da trégua feita por intermédio de Duque de Caxias - após o que foi, inclusive, eleito Senador pelo Rio Grande do Sul -, que os ideais da Revolução Farroupilha se mantivessem até hoje.

É interessante olhar o povo do Rio Grande e procurar uma explicação. Qual a diferença do gaúcho que o marca e o caracteriza tanto, que o faz tão diferente da média, da normalidade das criaturas? Nas suas qualidades, nos seus defeitos, na sua garra, na sua história, no amor ao seu cavalo, no amor à liberdade, no apego à terra, enfim, o gaúcho vive até hoje uma história que se chama amor à dignidade, amor à família, à sociedade, ao pampa e ao Brasil.

Que movimento tão fantástico é este? Derrotado, era para ter sido extinto, para ter desaparecido. No entanto, ninguém se lembra de nenhum dos outros movimentos vitoriosos na história deste País que tenham uma página tão magnífica escrita na alma da gente gaúcha como a Revolução Farroupilha. E ela tem servido de apanágio nas horas amargas, nas horas difíceis, nas horas conturbadas que vivem o Brasil e o Rio Grande. Sempre fomos buscar na alma, na luta campeira, as razões de ser da nossa ação. O Rio Grande vive hoje uma hora difícil. O Rio Grande recebe um tratamento hoje, de parte do Governo Federal, tão duro e tão mau quanto o que recebia do Império em relação às questões do charque e às questões da economia do Rio Grande, que, deliberadamente, não desejava ver avançando.

           Hoje vivemos uma hora muito dura no Rio Grande do Sul, uma hora difícil. Apesar de uma gestão excepcional, o nosso Governador Germano Rigotto vem enfrentando, por enquanto, com muita categoria, as dificuldades que temos pela frente. Com grandeza e com espírito público, ele vem melhorando - e melhorando muito - a economia do Rio Grande do Sul, apesar das dificuldades que encontra, muitas delas provenientes do Governo Federal.

Eu fico a imaginar se, naquela época, acontecessem as coisas que estão acontecendo agora. O que fariam os farrapos em defesa da sua terra? De um lado, o Rio Grande, há muito tempo, vem lutando para crescer. Foi uma guerra - e eu fui Presidente da Comissão - para conseguir que o Rio Grande do Sul conseguisse ter uma usina de aços planos, a Aços Finos Piratini, uma usina de aços especiais. Foi uma guerra para que o Rio Grande do Sul conseguisse ter uma unidade da Petrobras - a Refinaria Alberto Pasqualini. Foi uma luta tremenda para que o Rio Grande do Sul tivesse um pólo petroquímico.

Todos os investimentos destinados ao Rio Grande do Sul tinham o poder federal contra. E o argumento era que o Rio Grande do Sul estava muito longe, estava lá na fronteira com Argentina, e que o Rio Grande não tinha petróleo, não tinha gás, não tinha minério.

Lembro-me de que eu, Presidente das três Comissões Especiais - a da Usina de Aços Finos Piratini, a da Refinaria Alberto Pasqualini e a do 3º Pólo Petroquímico -, embora Líder e Presidente do MDB, partido de oposição, dizia aos Ministros da ditadura da época: pena que os senhores não são ministros no Japão, pena que os senhores não tenham nascido no Japão. Se vocês fossem japoneses e ministros no Japão, o Japão seria até hoje um conjunto de ilhas vulcânicas, e não esse país fantástico que cresce a cada dia. O Japão não tem minério, o Japão não tem petróleo, o Japão não tem matéria-prima e, no entanto, é essa economia fantástica. Os senhores querem nos reduzir a uma posição secundária de produtores de matéria-prima, o que nós não aceitamos. Luta difícil!

Hoje, o Rio Grande do Sul, como vários Estados, tem uma dívida com a União que federalizou, diga-se de passagem, no Governo anterior, todas as dívidas dos Estados. Só que essa dívida, hoje, tornou-se praticamente impagável, pois é uma importância que chega a ser de 18% do orçamento do Rio Grande do Sul.

Quando o Rigotto assumiu o Governo do Estado, negociou e, conversando com o Ministro da Fazenda e com autoridades brasileiras, foi ao exterior e conseguiu que o Banco Mundial assumisse essa dívida. O Rio Grande, em vez de pagar 18%, pagaria a metade disso, ganharia uma importância espetacular de cerca de R$600 milhões anuais que poderiam ser aplicados em sua economia.

Resolvida a questão - e já mostrei isso nesta Casa -, o Banco Mundial, por intermédio de uma carta de seu diretor, enviou à Secretaria do Tesouro a comunicação e o pedido para buscar a competente autorização, necessária para a realização do empréstimo. O Governador Rigotto, o Secretário Caçapava, os três Senadores, a Bancada insistiram junto ao Governo Lula e aos Ministros para que essa carta, essa autorização saísse e a questão fosse resolvida. Não houve jeito. O tempo passou, passou e não houve jeito.

Agora, às vésperas da campanha, alguém do PT, no Rio Grande do Sul, levanta a tese de que é um erro absurdo o Estado estar pagando essa importância de juros para a União e que deve tentar negociar com um banco de fora um juro inferior. E o Presidente Lula, em campanha política, estando no Rio Grande do Sul, respondeu que a tese era absolutamente viável e compreensível e que ele estava totalmente de acordo.

Escrevi uma carta ao Presidente Lula, li-a na tribuna e a enviei a Sua Excelência, dizendo que estava muito satisfeito em saber que Sua Excelência era favorável àquele desejo do Governo do Rio Grande do Sul de trocar a dívida do Estado pelo empréstimo com o Banco Mundial. E se Sua Excelência era favorável, era muito simples: bastava dar um telefonema à Secretaria do Tesouro e determinar: “Faça-se”.

É claro que não houve resposta. Mas no Rio Grande do Sul continuam a cobrar: “Não, vamos chegar lá; e, se o Olívio ganhar o Governo do Estado, vamos resolver o problema dessa dívida do Estado”.

Aí parece que se estabelece uma chantagem política. Aí fica uma situação muito difícil, principalmente porque o cidadão foi três anos e meio ministro e podia, como os outros ministros provenientes do Rio Grande do Sul, ter ajudado para que isso acontecesse. Pelo contrário, parece que a frase era “não mexa, deixe como está. Por que vamos permitir que o Governo do PMDB do Rio Grande do Sul tenha mais R$600 milhões para aplicar em investimento?”

Isso não é maneira de fazer política! Aprovamos o projeto nesta Casa. Aliás, recebi apoio das bancadas de praticamente todos os Estados quando mostrei o projeto em que o Rio Grande do Sul, tido como um Estado rico e poderoso, tinha algumas áreas que não poderiam continuar como estavam. Havia um empobrecimento dramático e cruel exatamente na zona mais linda, onde ocorreu a Revolução Farroupilha e nasceu o Rio Grande - a fronteira Oeste e a Zona Sul, Bagé, Pelotas, Rio Grande, São Borja, Uruguaiana, Alegrete, Livramento. Toda aquela região passa hoje por grandes dificuldades.

E nós nos encontramos numa posição difícil. Conseguimos aprovar no Senado um projeto de minha autoria, quando se tratou da matéria, permitindo que aquela região do Rio Grande do Sul fosse identificada à região do Nordeste no sentido de que pudesse receber empresas novas com estímulos do Governo Federal. O projeto foi recebido como um sopro de liberdade, de novidade e futuro de grandiosidade. Conseguimos aprová-lo no Senado e, mesmo sendo muito difícil, também na Câmara dos Deputados. No entanto, o Presidente Lula o vetou.

Tratava-se de um projeto singelo, cuja ação era por tempo determinado. Sempre disse que não queríamos que ele durasse o tempo todo, mas apenas o tempo necessário para reimpulsionar aquela região para que ela volte a ter condições de crescer e de se desenvolver.

O Rio Grande do Sul, repito, construiu a Aços Finos Piratini. O Governo Federal deixou, mas não foi ele que construiu a usina de aço; foi o Governo do Rio Grande do Sul, com seu dinheiro. O Rio Grande do Sul construiu o Pólo Petroquímico, mas, para que pudesse sair, porque havia uma discussão se saía ou não saía, o Governo do Estado gastou US$300 milhões nas obras de infra-estrutura, principalmente no tratamento dos poluentes, considerado até hoje o mais moderno do mundo. E o Dr. Fernando Henrique Cardoso resolveu privatizar o Pólo - num dos absurdos do Dr. Fernando Henrique, ele fez isso - e privatizou a Aços Finos Piratini.

Eu, em nome do Rio Grande do Sul, entrei com um projeto nesta Casa. O Governo do Estado construiu o início do Pólo, construiu a Aços Finos Piratini e entregou-os, de graça, para o Governo Federal levá-los adiante, sem nenhuma indenização, sem pedir nada. Mas no momento em que o Governo Federal privatizou-os, entramos com um projeto dizendo que o Rio Grande do Sul tinha o direito de receber de volta o dinheiro que havia aplicado.

O Senado aprovou o projeto por unanimidade, e o Governo vetou-o por inteiro.

No Governo Sarney, eu era Governador do Rio Grande do Sul. O Presidente Sarney viveu um governo difícil: a morte do Dr. Tancredo e inúmeros outros problemas. Para conseguir fazer alguma coisa em termos de obras federais no Estado, tive de aplicar o dinheiro do Governo do Rio Grande do Sul. Então, fiz um acordo com o Presidente Sarney e com o Ministro dos Transportes, por escrito, assinado em palácio: construiríamos centenas de quilômetros de estradas federais, com a autorização do Governo Federal, que se responsabilizaria a, no futuro, devolver-nos aquela quantia. Isso foi feito, as estradas foram construídas.

O tempo passou e, quando se concluiu o projeto e provado estava que se deveria receber o dinheiro, o Governo Lula disse que não; disse que não e não.

Quando eu era Governador, o PT promoveu praticamente uma convulsão social. Deputados novos, de primeiro mandato, queriam mostrar presença e fizeram uma rebelião. Estávamos às vésperas de ver, de um lado, os sem-terra invadirem grandes propriedades e, de outro, os proprietários se defenderem. Íamos para um caminho que eu não sabia aonde iria dar.

Falei com o Presidente Sarney, mas não havia dinheiro. Fui o único Governador no Brasil, que eu conheça, que, com o dinheiro do Governo, comprei terra a vista. É verdade que comprei terra a vista chorando no preço - um preço bastante razoável porque era pagamento a vista. E o fiz com o compromisso, assinado pelo Ministro da Reforma Agrária e pelo Presidente Sarney, de que aquele dinheiro não seria devolvido ao Rio Grande do Sul e que o Rio Grande do Sul, com aquele dinheiro, faria um fundo. Os recursos não voltariam para o Tesouro do Estado, mas passariam a constituiria um fundo pelo qual se continuaria a prover dinheiro para comprar terras.

O projeto, aprovado aqui no Congresso Nacional por unanimidade, foi vetado pelo Dr. Lula.

Esse é o tratamento que o Rio Grande do Sul tem tido deste Governo. Eu digo isso neste dia 20 de setembro, dia de homenagem aos farrapos da Revolução Farroupilha, para mostrar que, de certa forma, a nossa luta continua. A luta por um Estado independente, forte, autônomo continua e continuará pelo tempo que for necessário.

As agressões de alguns candidatos lá no Rio Grande, nessa campanha - estranho, porque tenho um carinho tão grande aqui no Congresso e um carinho tão grande do povo do Rio Grande do Sul -, eu não consigo entender. Do candidato do PT, por exemplo, não consigo entender. Ele não fala da situação brasileira, não fala em nada do que está acontecendo. “O que está acontecendo de mal no Brasil tem uma culpa. O Senador Pedro Simon, nesses anos todos, foi muito fraco, não fez nada pelo Rio Grande. É um Senador incompetente e incapaz. Diga uma coisa que ele fez pelo Rio Grande do Sul!” Essa é a campanha do meu adversário.

Eu disse, ontem, quando estivemos num debate que terminou à 1 hora da madrugada, que viria aqui hoje. Viria para lembrar a Revolução Farroupilha, mas viria também porque não poderia deixar de falar, neste momento e nesta hora, sobre o que está acontecendo. Como é fantástico a sociedade brasileira se manter da forma como se está mantendo!

Hoje de manhã, mesmo com o compromisso de ter quórum no Conselho de Ética para uma decisão importante, não houve quórum, e ficou por isso mesmo. O Senado deveria ter decidido se as votações de cassação seriam feitas em voto aberto e não secreto, como é agora... Ficou por isso mesmo. E, agora, quando menos se espera, vemos, primeiro, o caso do grampo no telefone do Presidente do Tribunal Superior Eleitoral e de mais alguns colegas seus. É claro que sabemos que o Presidente do Tribunal Superior Eleitoral é uma figura que não digo controvertida, porque para mim não é controvertida, é uma figura brilhante, extraordinária. É uma figura que tem voz, que tem autoridade, que fala, e às vezes fala coisas de que não gostamos, quando diz, por exemplo, que o Brasil é um País de faz-de-conta. É, parece que fazemos de conta. Mas abrir, como se abriu ontem, o levantamento de uma denúncia feita pelo PSDB e pelo PFL, para investigação do Presidente da República, que é convocado, e do Ministro da Justiça, a vinte dias das eleições! Meu Deus, aonde vamos chegar?

E é a Oposição que está fazendo isso, é a Oposição que criou esse fato? Ele veio ao jornal pela Polícia Federal, pela imprensa; ele veio ao jornal quando a revista Época disse que foi procurada por pessoas que queriam vender um dossiê contra líderes de oposição.

E, mais uma vez, o homem envolvido está no Palácio, é amigo do Presidente. Não sei, mas o Presidente Lula deveria fazer... Não sou dessas histórias, pelo amor de Deus, sou cristão, mas, mesmo no Cristianismo, às vezes, tem-se de expulsar o que há em volta de uma pessoa e que está fazendo mal.

Olha, Presidente, como Vossa Excelência andou mal-acompanhado esse tempo todo! E o pior é que as pessoas que lhe faziam boa companhia estão saindo, como o Frei Betto, que disse que não podia mais agüentar, que não dava para ficar.

Na reunião do grupo católico em que ele comunicou isso, eu lhe disse: “Mas você não podia sair, deveria ter ficado, porque num país onde as pessoas boas como V. Sª, que podem influenciar para o bem, saem, ficam as outras que influenciam para o mal”. E ele respondeu: “Mas há momento em que sabemos que não dá mais para ficar. Não havia mais ambiente para ficar”.

Ora, quantas pessoas... Eu gostaria que este grande nome, que é o nosso Suplicy, relembrasse aqui os grandes nomes da política, da economia, da cultura, que foram os heróis do PT e que, hoje, estão afastados. Quantos nomes que foram os que construíram a história do PT! Porque dessa turma de vigaristas que tem aparecido aí, de amigos do Lula que estão aí, nunca ouvimos falar, são pessoas que apareceram na campanha. Toda corrupção no Brasil começa na campanha - essa experiência nós temos. É na campanha que começa toda corrupção: a do Lula, a do Collor e qualquer uma outra.

Mas os homens, os outros, estão saindo. Tenho procurado telefonar, Presidente, para esses líderes do PT que se afastaram e que eram e que são meus amigos: “Escuta aqui, tu não achas que cometeu um erro em sair? Tu não achas que devias ter ficado lá?” Um agora é candidato a Governador de São Paulo. “Tu não achas que devias ficar lá?” “Não dava, Senador Simon, eu fiquei até o último momento que eu achei que dava para fazer alguma coisa. Em determinado momento, quando tu sabes que é mal recebido, que as tuas palavras não são nem interpretadas, nem analisadas, mas são recebidas com deboche por parte do Governo...”

Eu vim de Brasília a Porto Alegre, especificamente, para ouvir o parecer de V. Exª.

O Sr. Jefferson Péres (PDT - AM) - V. Exª está me concedendo um aparte?

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Pois não, o aparte é seu.

O Sr. Jefferson Péres (PDT - AM) - Senador Pedro Simon, como é bom e reconfortante ouvi-lo e vê-lo na tribuna deste Senado. Como V. Exª engrandece esta Casa, como V. Exª verbaliza a indignação sincera de grande parte do povo brasileiro, porque V. Exª está hoje na tribuna verberando o Governo e o Presidente Lula, como estaria se o Presidente fosse Fernando Henrique Cardoso, como estaria se o Presidente fosse do PMDB. E tenho certeza de que eu faria o mesmo se o Presidente fosse do PDT. V. Exª não é do país do faz-de-conta, V. Exª não faz de conta que é ético, V. Exª não finge indignação se a bandidagem for dos seus adversários e não silencia ou compactua se a bandidagem for dos seus correligionários. V. Exª é realmente uma figura excepcional. Meus parabéns! Tenho grande orgulho de ser seu colega neste Senado.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Muito obrigado a V. Exª.

A Folha de S.Paulo publicou uma foto enorme, em Belém do Pará, do Lula, do Jader e de mais quatro figuras, três do meu Partido, todas processadas no Supremo. O Sr. Jader está para ser julgado - não sei por que o Supremo não julga. A denúncia foi apresentada pelo Procurador-Geral e foi aceita no Supremo.

Outro dia, o Presidente Lula falou - o que é uma barbaridade! - que o Senado e o Congresso estão abusando das imunidades. Não, não estão abusando. O projeto teve origem em iniciativa de nossa autoria. Hoje, não precisamos mais dar autorização; não precisamos autorizar ninguém a processar Senador e Deputado. Podem fazer o que bem entenderem! Estão sendo processados? Mas o processo está na gaveta. Um é o Jader, o outro é um Senador também do Pará, também do PMDB; outro é um Deputado do PT que esteve envolvido com o mensalão; há também uma Senadora que está comprometida.

Diz a manchete, com palavras do nosso querido Presidente Lula: “Este palanque é uma aula de sociologia política para o Brasil”. Meu Deus do céu! Onde é que nós estamos, Dr. Lula? “Este palanque é uma aula de sociologia política para o Brasil.” Ele é o único que não está sendo processado. Agora, não está sendo processado, mas quem está sendo chamado para depor no Supremo Tribunal Federal é ele, Lula.

Hoje, são todas essas figuras. A aula de sociologia foi ampliada, porque até o Presidente Lula está sendo convocado pelo Supremo.

Não é possível!

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - V. Exª me concede um aparte?

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Já lhe darei.

Fui visitar o Senador Jefferson em seu gabinete e perguntei-lhe: “Eu vim aqui e cadê o negócio?” “Pois é! Garantiram-me que haveria quórum, mas não houve”. O Senador Jefferson tem uma pureza! Apesar de eu ser cristão, ser franciscano, não chego até ele. Perguntei: “Quer dizer que não apresentou o parecer?” “Não, não havia quorum”.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Sr. Presidente, vamos lá!

“Não, não havia quórum”. “Mas, Jefferson, não havia quórum? Mas, se tu apresentas o teu parecer, o Brasil inteiro vai ficar sabendo.” “Mas isso seria uma indelicadeza com os colegas.”

Vejam a beleza e a grandeza do espírito do Senador Jefferson: “Mas eu estaria cometendo uma indelicadeza”! Numa hora como essa, em que os Parlamentares não compareceram, e o assunto era da maior importância, ele seguiu as mínimas letras de um comportamento ético perfeito. Alguém podia condená-lo se ele dissesse: “Bom, não veio ninguém. Era para ser hoje. Entrego para a imprensa”.

Nem eu lhe pedi. Estive em seu gabinete, falei e não lhe pedi, nem toquei no assunto, até porque V. Exª, provavelmente, não teria dado. Mas não pedi.

Pois não, Senador. Concedo-lhe um aparte

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Senador Pedro Simon, primeiro, quero externar, mais uma vez, a minha afinidade com a sua história e com as suas atitudes.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Só quero dizer uma coisa a V. Exª: O Estadão fez uma matéria exagerada e injusta com relação a mim, mas, com relação a V. Exª, assino embaixo. Foi uma matéria linda e que espelha realmente o que é V. Exª. Sinceramente, meus cumprimentos. Não estava em boa companhia, mas V. Exª merece.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Senador Pedro Simon, V. Exª sabe que tenho estima e expresso meu apoio a um dos seus adversários, o candidato ao Senado Miguel Rossetto, que foi Ministro do Desenvolvimento Agrário. Mas ele sabe também da estima e do respeito que tenho por V. Exª. Há poucos dias, participei de dois debates com a candidata Alda Marco Antonio, do seu Partido, o PMDB, ao Senado.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Gosto dela, sabia?

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Ela, então, ressaltou o quão importante é que o povo de São Paulo eleja também uma mulher, como há aqui a Senadora Ideli Salvatti e outras que dignificam o povo da sua terra. No debate, eu lhe disse que também há homens que dignificam o Senado, como o Senador Pedro Simon. Senti-me bem ao seu lado, e houve, na oportunidade, a citação do Senador Jefferson Péres na matéria. Felizmente, há um reconhecimento no Rio Grande do Sul e em São Paulo do vigor da sua atuação, pela maneira como V. Exª aqui expressa seus sentimentos, os sentimentos de quem sempre deseja saber e dizer a verdade. V. Exª também solicita de cada pessoa, tanto do Poder Executivo quanto do Parlamento, que tenha procedimentos os mais éticos. Quando V. Exª recordava alguns diálogos que teve ora com o Presidente Lula, ora com amigos do Presidente Lula, como o Frei Betto, lembrei-me de uma citação que considero tão importante e que está contida no livro do Prêmio Nobel de Economia, Amartya Sen, que dei ao Presidente Lula no início do seu Governo. O livro se chama Desenvolvimento como Liberdade. Nesse livro, Senador Pedro Simon, há uma referência de como é importante para um governante, para um chefe de uma organização comportar-se para prevenir problemas. Ele menciona os autores do Hui-Nan Tzu, inscrito nas pedras da China antiga, em 122 a.C. Vou ler a citação, e V. Exª saberá muito bem por que ela é relevante para o que há pouco disse: “Se a linha medidora estiver certa, a madeira será reta, não porque se faz algum esforço especial, mas porque aquilo que dirige faz com que assim seja...

(Interrupção do som.)

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Para não perder o raciocínio, vou precisar repetir. Peço a sua atenção: “Se a linha medidora estiver certa, a madeira será reta, não porque se faz algum esforço especial, mas porque aquilo que dirige faz com que assim seja. Da mesma maneira, se o dirigente for sincero e íntegro, funcionários honestos servirão em seu governo, e os velhacos se esconderão. Mas se o dirigente não for íntegro, os perversos farão como querem, e os homens leais se afastarão”. Senador Pedro Simon, quero dizer com toda a amizade que tenho pelo Presidente Lula: em razão de fatos como os que ocorreram em alguns momentos - e, agora, de novo -, é muito importante que ele tenha uma atitude segundo o que disse em Nova Iorque: “Vamos procurar esclarecer inteiramente os episódios, com o maior rigor, doa em quem doer”. Vamos deixar claro isso e responsabilizar quem porventura agir de maneira a prejudicá-lo e a prejudicar, inclusive, o Senador Aloizio Mercadante, candidato em quem tenho a maior confiança, meu parceiro nas eleições em São Paulo. É importante que todos tomemos uma atitude a fim de colaborar para desvendar inteiramente esses tristes episódios. Muito obrigado.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Agradeço a V. Exª e digo o seguinte: houve apenas um momento, desde que esses fatos aconteceram, em que inclusive vim a esta tribuna prestar homenagens: foi quando o então Ministro da Educação Tarso Genro, que, diga-se de passagem, estava fazendo um trabalho muito bom no Ministério da Educação, renunciou a sua Pasta, assumiu a Presidência do PT e lançou a sua proposta para o Partido: “Temos de refundar o PT. Não nos interessa a decisão da Comissão de Ética, da CPI, da Polícia Federal, da Procuradoria-Geral da República ou do Supremo Tribunal Federal. Devemos ter a nossa comissão de ética. O problema é nosso, do PT. Precisamos nos reunir com o nosso Partido, com a nossa tradição, com a nossa história, com a nossa biografia, observar as coisas que aconteceram e ver o que vamos fazer, punindo quem tem que ser punido, doa em quem doer, nem que se tenha que renovar o PT”.

Vim a esta tribuna e o endeusei, mas o Lula cedeu àqueles que não queriam o Tarso com essas idéias. E ele não foi escolhido Presidente. O Presidente é esse que está aí, agora comprometido novamente.

A questão é esta: até quando o Lula vai permanecer nessa posição?

Tudo começou quando denunciamos o Waldomiro, que não foi demitido. Ele pediu demissão. Agora, no último caso, o cidadão que trabalhava com ele, no Palácio, também pediu demissão. Não foi demitido.

A pergunta é uma só: há uma palavra de esperança de que o Governo do Lula será diferente? Estando nos palanques, com a equipe do PT, o Sr. Jader, de um lado, e o Sr. Suassuna, de outro, o que vai ser o Governo do Lula no segundo mandato? No primeiro Governo, ele tinha o Brasil do seu lado e o respeito do Congresso. No segundo, em 1º de janeiro, terá que começar a prestar contas. É capaz de, nessa data, quando vier para cá, ele ainda estar respondendo, perante o Tribunal Superior Eleitoral, à investigação que começou agora, porque ele está sendo comunicado lá em Nova Iorque. Mas qual é o ato, qual é a ação, qual é a movimentação, qual é a expectativa que esse Governo dirá ter para essa sociedade que está aí, estarrecida, não sabendo o que vai fazer?

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Senador Pedro Simon, quero expressar a minha confiança de que o Presidente Ricardo Berzoini, que esteve com o Presidente no final da manhã de hoje, esclarecerá, ainda nesta tarde, todos os pontos, tornando claro tudo o que, efetivamente, aconteceu. Nós, do Partido dos Trabalhadores, precisamos contribuir para o esclarecimento desses episódios, assim como da questão do dossiê sobre os ex-Ministros José Serra e Barjas Negri. Essa é a minha expectativa, porque conheço bem o ex-Ministro José Serra, que foi nosso colega no Senado. Por tudo aquilo que ele sempre defendeu, acredito que será o primeiro interessado em contribuir para esclarecer por que houve aquilo durante o tempo em que era Ministro. Que ele explique por que aconteceram aquelas comemorações mostradas no dossiê e por que aqueles Deputados, hoje envolvidos no caso dos sanguessugas, estavam ali, como que fazendo uma festa. Como houve aquilo? Que grau de conhecimento ele tinha?

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Concordo.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Acredito que o Presidente Ricardo Berzoini, ainda hoje, esclarecerá inteiramente esses fatos. Também é próprio que a Nação brasileira espere que José Serra e o atual Prefeito de Piracicaba, Barjas Negri, com quem sempre tive uma relação de maior respeito e seriedade, manifestem-se a respeito. Sempre ouvi de José Serra e Barjas Negri palavras na defesa do interesse público, mas, numa situação como essa, eu me sentiria na responsabilidade de logo esclarecê-la. E que tudo seja esclarecido antes de 1º de outubro. Faltam 11 dias para as eleições e é importante que o povo brasileiro tenha essas coisas esclarecidas o quanto antes. Essa é a nossa responsabilidade. Que a Polícia Federal, a Justiça, a Justiça Eleitoral e o Ministério Público estejam averiguando os fatos, muito bem, mas o que é de responsabilidade nossa, eu, como candidato ao Senado envolvido nesses episódios, em São Paulo, sinto-me na responsabilidade de esclarecer. Conversei com o Senador Aloizio Mercadante e tenho plena confiança de que ele jamais teria admitido a compra de dossiê, da forma como foi descrita pela imprensa nestes dias.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Agradeço a V. Exª.

Encerro, Sr. Presidente. Ainda haverá tempo de voltar. Talvez, quando V. Exª estiver mais calmo ou outro Presidente mais tranqüilo, eu volte para continuar o debate dessa tese.

O Brasil está com uma interrogação, perguntando o que vai acontecer. A 12 dias de uma eleição, o Presidente da República, em Nova Iorque, é interpelado. O que vai acontecer?

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 21/09/2006 - Página 29330