Discurso durante a 156ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Registro do transcurso ocorrido em 23 de setembro, dos dez anos da sanção da Lei 9.307/96, que dispõe sobre a arbitragem no país, lei que representou um avanço muito grande na solução dos conflitos. Registro do artigo intitulado "Dez anos da Lei de Arbitragem", da autoria de Arnold Wald e Ives Gandra da Silva Martins, publicado no jornal Folha de S.Paulo, edição de 25 do corrente.

Autor
Marco Maciel (PFL - Partido da Frente Liberal/PE)
Nome completo: Marco Antônio de Oliveira Maciel
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA EXTERNA. JUDICIARIO.:
  • Registro do transcurso ocorrido em 23 de setembro, dos dez anos da sanção da Lei 9.307/96, que dispõe sobre a arbitragem no país, lei que representou um avanço muito grande na solução dos conflitos. Registro do artigo intitulado "Dez anos da Lei de Arbitragem", da autoria de Arnold Wald e Ives Gandra da Silva Martins, publicado no jornal Folha de S.Paulo, edição de 25 do corrente.
Publicação
Publicação no DSF de 27/09/2006 - Página 29502
Assunto
Outros > POLITICA EXTERNA. JUDICIARIO.
Indexação
  • COMEMORAÇÃO, ANIVERSARIO, CRIAÇÃO, LEGISLAÇÃO, ARBITRAGEM, AUTORIA, ORADOR, GARANTIA, CONCILIAÇÃO, CONFLITO, AMBITO INTERNACIONAL, ESPECIFICAÇÃO, BRASIL, PAIS ESTRANGEIRO, BOLIVIA, REFERENCIA, NACIONALIZAÇÃO, PETROLEO, GAS NATURAL.
  • LEITURA, TRECHO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), COMENTARIO, ACEITAÇÃO, SOCIEDADE CIVIL, LEGISLAÇÃO, ARBITRAGEM, BENEFICIO, DESENVOLVIMENTO NACIONAL.
  • REGISTRO, LANÇAMENTO, LIVRO, DETALHAMENTO, HISTORIA, LEGISLAÇÃO, ARBITRAGEM, BRASIL.
  • COMENTARIO, PARTICIPAÇÃO, ORADOR, SIMPOSIO, PROMOÇÃO, INSTITUTO NACIONAL, MEDIAÇÃO, ARBITRAGEM, DEBATE, ATO EXTRAJUDICIAL, INSTRUMENTO, SOLUÇÃO, CONFLITO.
  • REGISTRO, IMPORTANCIA, DECISÃO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), RECONHECIMENTO, CONSTITUCIONALIDADE, LEGISLAÇÃO, ARBITRARIEDADE, BENEFICIO, PARCERIA, SETOR PUBLICO, SETOR PRIVADO.
  • NECESSIDADE, DESENVOLVIMENTO, ARBITRAGEM, BRASIL, ADAPTAÇÃO, CONTEXTO, GLOBALIZAÇÃO, PEDIDO, ORADOR, SOCIEDADE CIVIL, FISCALIZAÇÃO, CUMPRIMENTO, LEGISLAÇÃO.

O SR. MARCO MACIEL (PFL - PE. Pronuncia o seguinte discurso. Com revisão do orador.) - Nobre Presidente desta sessão, ilustre representante do Estado do Espírito Santo no Senado Federal, Senador João Batista Motta, Srªs e Srs. Senadores, venho, nesta tarde de hoje, registrar um fato que não pode passar sem uma referência na memória do Senado Federal. Diz respeito ao transcurso ocorrido sábado passado, dia 23 de setembro, dos dez anos da sanção da Lei 9.307, que dispõe sobre a arbitragem em nosso País.

A referida lei representou um avanço muito grande na solução dos conflitos e contribuiu também e muito não somente para agilizar a tramitação e a solução de muitas demandas, mas também para que se gerasse no País uma consciência da conciliação, da mediação e da própria arbitragem.

São três institutos extremamente importantes.

Sabemos que um traço muito característico do brasileiro é a tendência à conciliação, ao entendimento. Somos um povo conciliador. É lógico que eu não usaria o termo de Sérgio Buarque de Hollanda, em “Raízes do Brasil”. Para ele, o brasileiro seria “um homem cordial”. O conceito que o livro “Raízes do Brasil” dá ao homem cordial é distinto da forma como usualmente definimos uma pessoa com a qual convivemos bem. Não podemos deixar de reconhecer, no entanto, o fato de o brasileiro busca sempre a conciliação em vários campos da atividade humana, inclusive no da política.

Se olharmos a história do País, vamos verificar que conseguimos resolver tensões agudas por meio do entendimento. Por exemplo, no Império houve o chamado Gabinete da Conciliação, que foi resultado de um trabalho muito bem feito de Honório Hermeto Carneiro Leão, Marquês de Paraná.

Poderia também citar, entre muitos outros exemplos na República, um episódio que está ainda bem presente em nossa memória. Falo de um grande acordo que se realizou entre 1984 e 1995, que Tancredo Neves denominou de “Nova República”.

Conseguimos retomar o Estado democrático de direito sem traumas, em grande movimento de entendimento de contrários, que permitiu a convocação de uma Constituinte que deu ao País a necessária estabilidade política.

A Lei de Arbitragem está recebendo grande adesão da sociedade, por ser uma norma que induz também à conciliação, à mediação. Por fim, embora a arbitragem já constasse da Constituição de 1824, nunca fora utilizada no País, por motivos processuais, inclusive pela inexistência da cláusula compromissória.

Mas, hoje, a lei sancionada em setembro de 1996 produziu muitos resultados positivos.

Não foi por outra razão que, no dia de ontem, a Folha de S.Paulo publicou, na pág. 3, um artigo assinado por dois grandes juristas, Arnold Wald e Ives Gandra da Silva Martins, cujo título era “10 anos da Lei de Arbitragem”. Diz o artigo logo no seu primeiro parágrafo:

O décimo aniversário da Lei nº 9.307, de 23 de setembro de 1996, comprova que uma lei bem feita e aceita pela sociedade civil pode transformar construtivamente setores importantes da vida nacional, tornando-se catalisadora do seu desenvolvimento.

Sr. Presidente, isso nos dá muita alegria, porque fui autor do projeto que se transformou na lei a que me referi e resultou de um prévio debate na sociedade brasileira. Não foi um projeto apresentado, sem que antes a sociedade dele participasse, por meio da Operação Arbiter.

Trago aqui um livro recentemente publicado, intitulado Operação Arbiter, que conta a história da lei sobre arbitragem em nosso País. Seu autor é um competente advogado pernambucano, Petronio Muniz. Na orelha do livro se afirma:

O livro ‘Operação Arbiter a História da Lei nº 9.307/96’ descreve e comprova, com documentos, a trajetória da ‘Lei Marco Maciel’ sobre arbitragem comercial no Brasil, de cujos passos fui testemunha direta.

Esse livro é uma peça indispensável para quem quiser aprofundar os estudos na área de arbitragem, porque não somente resgata a Operação Arbiter, mas também contém todas as informações sobre a tramitação do projeto, na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, tendo como Relator o saudoso ex-Senador e ex-Governador Antonio Mariz; depois, no Plenário do Senado; em seguida, na Câmara dos Deputados, onde houve um debate muito aceso sobre o tema, tendo aquela Casa concluído pela sua aprovação; e, logo após, no Senado, em caráter terminativo.

Todos esses fatos todos mostram como se deve considerar a importância de submeter idéias e propostas a prévio debate e, também, a uma maior participação da sociedade.

Sr. Presidente, penso que a lei, ao completar seus dez anos, está cumprindo, com êxito, seus objetivos. Hoje pela manhã, tive a oportunidade de participar de um evento que muito apreciei: o Simpósio Nacional “Os Instrumentos Extrajudiciais de Solução de Conflitos”, que se realizou em São Paulo, promovido pelo Inama.

A abertura, a que compareci, contou com a presença do ilustre amigo Governador de São Paulo, o Professor Cláudio Lembo, que na ocasião proferiu, como mestre de Direito que é, palavras muito adequadas ao tema, fazendo, inclusive, apreciação sobre seus efeitos na sociedade brasileira. Também estavam presentes o ex-Ministro do Supremo Tribunal Federal e ex-Ministro das Relações Exteriores Francisco Resek; o Dr. Fernando Tadeu Perez, Presidente do Banco Itaú; o Dr. Edmir Garcez, do Inama nacional; e o Dr. Norberto Legrazie, do Inama de São Paulo.

O Inama - Instituto Nacional de Mediação e Arbitragem - tem uma história de participação muito ativa na Lei da Arbitragem. É uma entidade privada, sem fins lucrativos, independente, neutra e imparcial, fundada em 1991, com o apoio, entre outras entidades, da American Arbitration Association. E, posteriormente, com a Lei da Arbitragem, ela expandiu as suas atividades.

Decisões ocorridas após a sanção da lei muito contribuíram para que a arbitragem se enraizasse em nosso País. O primeiro foi o fato de o Brasil haver subscrito a Convenção de Nova Iorque de 1958, o que foi um passo decisivo.

Nesse aspecto, trabalhei muito para que isso acontecesse. À época, Vice-Presidente da República, conversei com o Presidente Fernando Henrique Cardoso, que considerou que, de fato, devíamos tomar esse rumo. A matéria foi encaminhada para o Congresso Nacional, que a aprovou. A Convenção de Nova Iorque foi subscrita pelo Brasil, criando-se, assim, condições de melhor operacionalizar o instituto da arbitragem no País e, também, estabelecendo igualmente condições para um reconhecimento internacional da legislação brasileira.

O orador que me antecedeu, o ilustre Senador Eduardo Azeredo, fez referência inclusive ao contencioso Brasil/Bolívia; relativo à desapropriação de instalações da Petrobras em solo boliviano. Pois bem, gostaria de lembrar que no contrato Brasil/Bolívia, firmado entre a Petrobras, que é a estatal brasileira, e a Yacimientos Petroliferos Fiscales Bolivianos há uma cláusula que dispõe no caso de controvérsia, de questionamento se deva recorrer à arbitragem na Corte em Nova Iorque. Isso mostra a importância do instituto também na sua faceta externa, mesmo porque vivemos num mundo que se integra. A frase de McLuhan que o mundo iria virar uma aldeia global ocorreu. Vivemos tempos de mundialização que são estimulados por um grande desenvolvimento científico e tecnológico que se expressam, por exemplo, em mecanismos como Internet e comunicações cada vez mais intensas e, portanto, não podíamos deixar também de buscar subscrever a Convenção de Nova Iorque.

Um outro fato muito importante foi o Supremo Tribunal Federal reconhecer a Lei de Arbitragem e declará-la constitucional.

A propósito, gostaria de mencionar mais uma vez o artigo do Arnold Wald e do Ives Gandra, em que eles - no artigo da Folha - reconhecem que o papel do Supremo foi importante no reconhecimento da lei. Em certo momento diz o artigo:

O sucesso da arbitragem no Brasil também se deve em grande parte a posição dos juízes. O Supremo Tribunal Federal reconheceu a constitucionalidade da lei. Por sua vez - acrescentam os autores -, o Superior Tribunal de Justiça facilitou a homologação das decisões arbitrárias estrangeiras, aplicando, de imediato, a nova lei, admitindo a convenção de arbitragem tácita, definindo mais adequadamente a ordem pública e consagrando a arbitralidade dos conflitos nos quais uma das partes é sociedade de economia mista.

Essa decisão foi extremamente importante, mas a mesma coisa eu podia dizer que isso se verificou também nos tribunais de justiça dos Estados. Recentemente compareci a um evento em Goiás e nele estava presente o Desembargador Vitor Barbosa Lenza, do Tribunal de Justiça de Goiás, que proferiu uma excelente palestra sobre o tema. Ele foi muito além nas considerações que eu poderia fazer, elogiando a lei. Dizem que elogio em boca própria é vitupério. E eu jamais iria fazer uma exaltação e uma proposta que tive oportunidade de apresentar ao Senado. Mas ele o fez e fez com talento e brilho, mostrando o quanto isso é decisivo para o País e suas instituições.

Gostaria de voltar também ao tema para dizer que o evento aberto hoje em São Paulo prossegue até amanhã, com a presença, inclusive, de Congressistas como Walter Barelli, Deputado Federal; o ex-Ministro do Trabalho Almir Pazzianoto Pinto, além de especialistas interessados se constitui num momento de uma grande reflexão sobre a Lei de Arbitragem.

Também devo observar, Sr. Presidente, que é fundamental ainda salientar que a Lei nº 11.196 de 2005, a lei que estabeleceu as Parcerias Público-Privadas - as PPPs, como nós chamamos abreviadamente - ela fez o reconhecimento do Instituto da Arbitragem.

O art.11 da referida lei e o art.23 da Lei nº8.987 estabelecem que esses contratos “podem prever o emprego de mecanismos privados para a resolução de disputas decorrentes ou relacionadas ao contrato, inclusive arbitragem, a serem realizadas no Brasil, em língua portuguesa, nos termos da Lei nº 9.307”.

Desejo mencionar, Sr. Presidente, ao festejarmos os dez anos da lei, que urge, também, para fazer uma reflexão sobre a necessidade de desenvolver e aprofundar, no Brasil, a cultura da arbitragem, já que esse era um mecanismo que nós não o exercitávamos. Sabemos que a prestação jurisdicional por parte do Estado se faz cada vez com maior dificuldade.

É grande o número de feitos que demandam o Judiciário. São 58 milhões tramitando no País, segundo dados publicados recentemente. O mais grave é que como muitos feitos não são de grande relevância, isso faz com que as questões de maior relevância não sejam apreciadas tempestivamente. Com o instituto da arbitragem, muitas dessas demandas estão migrando para a utilização de câmaras arbitrais e de juízos arbitrais, em diferentes estados, o que está concorrendo para desafogar o Judiciário, que convive com uma pretória de feitos que não é possível julgar em tempo hábil.

Daí por que insisto que esse é o momento de fazermos uma reflexão. Essas datas paradigmáticas, como é o décimo aniversário da lei, é um momento para pensarmos conjuntamente. Quer dizer, as entidades interessadas na melhoria da prestação jurisdicional no País desejam aprofundar as instituições e este é o momento de fazer uma grande reflexão.

Sr. Presidente, cito um livro que deve sair nos próximos dias sobre o tema. Trata-se de um trabalho de uma grande especialista no assunto, que é a Professora Selma Lemes, intitulado “A Arbitragem na Administração Pública - Fundamentos Jurídicos e Eficiência Econômica”.

Convidado pela referida Professora, fiz um modesto prefácio sobre sua obra e salientei tratar-se “de contribuição que contempla a sociedade brasileira, com um livro cuja profundidade expurgou, de uma vez por todas, as dúvidas jurídicas a respeito da arbitragem, trabalho cuja lúcida disposição mostrou definitivamente que o instituto é, dentre os demais métodos alternativos, o mais eficiente para reduzir a pletora de feitos que assoberbam a Justiça e o mais vantajoso para a solução dos conflitos, não só os internos como sobremodo os internacionais, cujo julgamento dado ao mérito se acha imune de reconsideração pelo Judiciário, mesmo que tenha ocorrido erro de fato ou má interpretação do contrato”.

Mais adiante, acrescento:

(...) desnecessário salientar que este livro também concorre para que se difunda uma “cultura da arbitragem”. É essencial, a meu ver, adequar a exegese e a correta aplicação desse instrumento legal, o que propiciará a sua difusão entre nós.

Sr. Presidente, aproveito a ocasião para dizer que a Lei de Arbitragem permite fazer com que se desenvolva também, no Brasil, a mediação e a conciliação.

O Inama preparou um excelente folder sobre a lei e esses institutos irmãos, se assim posso dizer, a mediação e arbitragem. No folder, há uma definição de mediação que considero interessante:

A mediação é um meio alternativo de solução de controvérsias, litígios e impasses, onde um terceiro neutro, de confiança das partes (pessoas físicas e jurídicas), por elas livre e voluntariamente escolhido, intervém entre elas (partes) agindo como um “facilitador”, um “catalisador”, que, usando de habilidade, leva as partes a encontrarem a solução para suas pendências. Portanto, o Mediador não decide; utilizando habilidade e as técnicas da “arte de mediar”; leva as partes a decidirem, de forma harmoniosa e de acordo com os interesses das mesmas.

Diz o folder ainda:

Não há que se confundir Mediação e Conciliação, que são atividades semelhantes, porém não iguais, especialmente na cultura brasileira. A Conciliação entre nós, normalmente é exercida por força de lei e compulsoriamente por servidor público, que usa a autoridade de seu cargo para tentar promover a solução de controvérsias, muitas vezes pressionando ou induzindo as partes, diferentemente, portanto, da Mediação, à qual as partes se submetem livre e voluntariamente e da mesma forma escolhem a entidade e o profissional/mediador de sua confiança para ajudá-las a alcançar a solução para as suas pendências.

Por fim, Sr. Presidente, faço uma exortação, para que a sociedade brasileira continue a acompanhar o andamento da consolidação desse estudo, que tende a ser algo muito importante na medida em que vamos, cada vez mais, exercitá-lo não somente no campo interno, mas também no campo externo, inclusive no Mercosul. Como sabemos, o Acordo de Ouro Preto, de 1994 - ao tempo em que era Presidente da República o Presidente Itamar Franco -, estabeleceu que os membros do Mercosul recorreriam à arbitragem na solução de seus dissensos.

E a tendência é, cada vez mais, tendo em vista o processo de globalização, que o País se insira na sociedade internacional e venha a recorrer à utilização da arbitragem no campo externo. No campo interno, não tenho dúvida em afirmar que, na medida em que o instituto se consolidar, vamos ajudar em muito a fazer com que as demandas, os conflitos sejam resolvidos de forma mais célere.

Sabemos que a arbitragem tem essa vantagem. É uma decisão mais rápida, posto que menos sujeita a processos complexos de recursos, agravos, e múltiplas instâncias. A arbitragem tem duas outras grandes virtudes, porque o árbitro é um especialista no tema, tem muito mais facilidade em encontrar uma solução, por ser uma pessoa capaz de elucidar a questão.

Por fim, a arbitragem também faculta às partes, se desejarem, é óbvio, que a pendência ou dissídio seja resolvido de forma sigilosa, porque de fato há questões em que ele impõe no resguardo do interesse das partes. A Lei da Arbitragem tem essas vantagens.

Não quero deixar de aqui chamar a atenção para que não se deixe distorcer esse instituto. Há um ditado espanhol que diz: “hace la lei, hace la trampa”. Faz-se a lei, faz-se a fraude.

Não há nenhuma lei que fique imune a interpretações não corretas e a aplicações não devidas. Isso, obviamente, pode acontecer com a Lei da Arbitragem, mas, se a sociedade tiver interesse, como está tendo, em zelar pelo seu fiel cumprimento e sua boa execução, vamos avançar muito mais que podíamos esperar.

Faço um apelo à sociedade brasileira para que esse instituto continue a ser pensado e discutido para que se gere uma sólida cultura da arbitragem. Que ela se enraíze no tecido social de nosso País.

Concluo, lembrando palavras de Rui Barbosa. Eu não as tenho de cor, porém elas foram proferidas em um de seus textos referenciais, na “Oração aos Moços”, que reflete uma certa desesperança com relação ao futuro do País, mas que não deixa de advertir para o fato de que uma lei é boa ou má conforme a sua aplicação e a sua interpretação.

Espero que a Lei da Arbitragem possa cumprir esses objetivos tão válidos e importantes para a consolidação institucional do Brasil. O Brasil reclama instituições modernas e estáveis. Certamente, a Lei da Arbitragem é uma delas.

Encerrando minhas palavras, agradeço a V. Exª, Sr. Presidente, pelo tempo que me ofereceu. Peço a V.Exª, nobre Senador João Batista Motta, que permita que seja publicado, juntamente com meu discurso, o artigo dos Professores Arnoldo Wald e Ives Gandra da Silva Martins, a que já aludi, bem como o programa do Inama, cujo simpósio nacional hoje se instalou, bem assim o prefácio que fiz ao trabalho da Profª Selma Lemes, no qual teço algumas considerações sobre o instituto de arbitragem em nosso País e que ajudam a compreensão desse instituto tão importante para o País e seu desenvolvimento.

Muito obrigado a V. Exª.

 

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DOCUMENTOS A QUE SE REFERE O SR. SENADOR MARCO MACIEL EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inseridos nos termos do art. 210, inciso I e § 2º, do Regimento Interno.)

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Matérias referidas:

“Prefácio Livro Drª Selma Lemes”

“Dez anos da Lei de Arbitragem”, Folha de S.Paulo;

“Programa do Simpósio Nacional “Os Instrumentos Extrajudiciais de Solução de Conflitos”;

PREFÁCIO LIVRO DRª SELMA LEMES

Constitui para mim sumo prazer assentir ao convite da Drª SELMA MARIA FERREIRA LEMES para prefaciar seu livro ARBITRAGEM NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. FUNDAMENTOS JURÍDICOS E EFICIÊNCIA ECONÔMICA, título que substitui o original dado à sua defesa de tese, em 13 de março do corrente ano de 2006, perante eminentes professores doutores das Faculdades de Direito, de Economia e de Administração da Universidade de São Paulo (FEA/USP, PROLAM/USP e FADUSP), da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP) e da Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas (EDESP/SP) - tese tão competente quanto brilhante, “aprovada com recomendação para publicação”.

A Professora Selma Lemes é, no Brasil e fora dele, uma notável especialista em Arbitragem e teve destacada participação na elaboração do anteprojeto que tornou possível a prática da Arbitragem em nosso País. É, além de necessário, oportuno o lançamento deste livro por ocorrer no ano da graça de 2006, quando estamos inteirando dez anos da promulgação da Lei nº 9.307, de setembro de 1996, que ensejou a prática do referido instituto no solo pátrio. Aliás, a lei surge com grande retardo, pois o recurso à Arbitragem é consagrado de há muito na maioria dos países do mundo.

E com muita honra, por levar esta lei o meu nome, fruto que foi de árduas batalhas no Congresso, vitoriosas enfim, como narra o mentor da idéia salvadora, Dr. Petrônio R. G. Muniz, em seu livro Operação Arbiter. Dentro da moderna orientação das nações mais desenvolvidas, foi modelada nossa lei, mediante o auxílio de juristas da mais alta envergadura, pátrios e estrangeiros, ancorada, porém, desde o início, em três grandes Mestres: o ilustre Professor da USP Carlos Alberto Carmona, o eminente Civilista Pedro Batista Martins e - repito - a culta especialista na matéria, Drª Selma Maria Ferreira Lemes.

A essa tríade foi cometido o encargo de elaborar o anteprojeto, o qual foi debatido em convenção nacional na cidade de Curitiba, no dia 9 de dezembro de 1991, ocasião em que foram discutidos temas da mais alta relevância - qual a pretensa argüição de inconstitucionalidade por afronta ao inciso XXXV do art. 5º da Constituição Federal, bem como a natureza constitucional da função dos árbitros, e mesmo, a irrecorribilidade da sentença arbitral -, temas que haveriam de ser objeto de amplos debates encarados com profundidade e lógica aristotélicas.

Em carta, a autora confessa: “Foi um trabalho árduo de pesquisa no Brasil e no Chile e levei 11 meses elaborando o texto, após as pesquisas”. A presente obra exibe definitivamente a impressionante capacidade de trabalho, seriedade, bem como a estuante cultura da prefacianda. Quem perpassa seu curriculum vitae não pode deixar de se extasiar ante a pletora de seus cursos e títulos: afora o doutorado recém conquistado, a Drª Selma é Mestra em Direito Internacional pela USP e Doutora em Integração da América Latina (PhD - PROLAM/USP), um acréscimo substancial aos vários cursos de extensão universitária e pós-graduação lato sensu; é ainda Coordenadora e Professora do Curso de Arbitragem de várias entidades de renome (FGV, CEU e LLM, p. ex.); é Advogada, sócia e Consultora de grandes escritórios advocatícios e empresas de grande porte; e ainda encontra tempo para integrar 18 Instituições; é escritora de 2 livros anteriores, um deles em co-autoria com os juristas Carlos A. Carmona e Pedro B. Martins; e autora de 10 capítulos de livros; idem de mais de 41 artigos em revistas jurídicas e econômicas, 28 delas no Brasil, 2 na Argentina, 7 na Espanha, 2 nos Estados Unidos, 1 na França e 1 em Portugal; e são também de sua lavra mais de 50 outros artigos em revistas eletrônicas na WEB (Brasil, Chile, Espanha e Peru).

Não é de estranhar, assim, sua precisão conceitual, quando disserta sobre a natureza jurídica da arbitragem e seu histórico, exemplificado pelos contratos de concessão no Império; sobre a arbitragem na Administração Pública brasileira, em cuja historiografia “sempre foi instituto jurídico regulado na lei civil e processual civil”; sobre a arbitrariedade subjetiva consubstanciada em toda e qualquer pessoa, quer física quer jurídica de direito público ou não, bastando a capacidade para contratar (e não de transigir!), o que remonta às Ordenações Filipinas, nas lições de Mendes Pimentel e Rui Barbosa: não teria sentido, portanto, excluir o Estado dessa subjetividade; sobre a arbitrariedade objetiva, restrita aos direitos patrimoniais disponíveis e, para o Estado, também ao interesse público, que se define como um dever da boa administração (dos atos de gestão e não os de império) com eficiência e economicidade; sobre a competência do árbitro nos contratos administrativos; enfim, sobre “a arbitragem como instrumento jurídico [que] repercute favoravelmente na economia do contrato administrativo... e que gera eficiência para a contratante (Administração), para o contratado (agente privado) e para a sociedade ao propiciar a redução no custo de transação”.

Ademais, numa II Parte, a Drª Selma Lemes desdobra o alcance do livro ao fazer um “estudo de Direito Comparado, empreendendo análise da arbitragem nos contratos de concessão de obras públicas chilenas. Tem como meta orientadora demonstrar as premissas que respaldam a hipótese comum ao Direito Brasileiro e Chileno”.

Trata-se, portanto, de contribuição que contempla a sociedade brasileira com livro, cuja profundidade expurgou de uma vez por todas as dúvidas jurídicas a respeito da arbitragem; trabalho cuja lúcida exposição mostrou definitivamente que o instituto é, dentre os demais métodos alternativos, o mais eficiente para reduzir a pletora de feitos que assoberbam a Justiça e o mais vantajoso para a solução dos litígios, não só os internos como sobremodo os internacionais - cujo julgamento dado ao mérito se acha imune de reconsideração pelo Judiciário, mesmo que tenha ocorrido erro de fato ou má interpretação de um contrato -, qual decidiu a severa Suprema Corte dos Estados Unidos no caso Enterprise Wheel.

Desnecessário salientar que este livro também concorre para que se difunda uma “cultura da arbitragem”, essencial, a meu ver, à adequada exegese e à correta aplicação desse instrumento legal, o que propiciará a sua difusão entre nós.

Não se pode, assim, deixar de enaltecer o denodo da Drª Selma Lemes ao produzir obra-prima, tecida de leveza estilística, ao lado de contínua conexão lógica que soube oferecer não só entre períodos e parágrafos como entre os próprios capítulos, versando muito embora sobre temas de enorme complexidade não menor, de alta indagação jurídico-econômica.

Cabe, afinal, cumprimentar a lúcida e arguta autora pelas lições - inéditas algumas -, nas quais demonstra os seus títulos universitários e acadêmicos, expressam e, por conseqüência, nos levam à afirmar que trabalhos desta natureza ajudam buscar a entender o sentido da lei, confluindo para o alevantamento cultural do Brasil.

Senador MARCO MACIEL

Bsb, agosto de 2006


Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/09/2006 - Página 29502