Discurso durante a 165ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Homenagem póstuma a Fernando Gasparian, que foi um grande líder político, industrial, um grande empresário e editor do jornal Opinião.

Autor
Roberto Saturnino (PT - Partido dos Trabalhadores/RJ)
Nome completo: Roberto Saturnino Braga
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Homenagem póstuma a Fernando Gasparian, que foi um grande líder político, industrial, um grande empresário e editor do jornal Opinião.
Aparteantes
Marco Maciel.
Publicação
Publicação no DSF de 10/10/2006 - Página 30549
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM POSTUMA, FERNANDO GASPARIAN, LIDER, POLITICA, EMPRESARIO, EX PRESIDENTE, CONFEDERAÇÃO NACIONAL DA INDUSTRIA (CNI), EX-DEPUTADO, ASSEMBLEIA CONSTITUINTE, PROPRIETARIO, EDITORA, DIVULGAÇÃO, PENSAMENTO, NACIONALISMO, PUBLICAÇÃO, JORNAL, OPINIÃO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), SIMBOLO, OPOSIÇÃO, REGIME MILITAR.

O SR. ROBERTO SATURNINO (Bloco/PT - RJ. Para encaminhar a votação. Sem revisão do orador.) - Obrigado, Sr. Presidente.

Fernando Gasparian foi realmente um grande brasileiro. Faz muita falta às pessoas que mais de perto o conheciam, que privaram da sua amizade. Gasparian foi um grande líder político, industrial, um grande empresário.

Foi presidente da Confederação Nacional da Indústria. Foi proprietário de uma das maiores indústrias de tecido no Rio de Janeiro, a Nova América. Sempre foi um líder na expressão verdadeira da palavra, defendia o pensamento desenvolvimentista deste País, desenvolvia um pensamento nacionalista, valorizava extremamente as posições nacionalistas na política. Foi um deputado constituinte muito brilhante, que lutou pelo estabelecimento de limites para as taxas de juros e isso ficou indelével na história da Constituinte brasileira. Foi, enfim, um editor, proprietário da grande editora Paz e Terra, uma das maiores e mais prestigiosas do País, que publica livros importantíssimos sobre o pensamento brasileiro. É o editor de Celso Furtado, só para citar um exemplo, mas foi também o editor do jornal Opinião, que fez época no Brasil, no momento mais difícil de enfrentamento do regime militar.

Fernando Gasparian praticamente sustentava, prejudicando o seu patrimônio enormemente, o jornal Opinião, que era um ponto de referência de todos aqueles que lutavam pela democratização do País.

Enfim, Sr. Presidente, eu poderia aqui dar exemplos de brasilidade, de lucidez e de capacidade de liderança que tinha e, sendo paulista, viveu grande parte dos seus últimos anos no Rio de Janeiro.

Eu tive a oportunidade de privar proximamente da sua convivência, de forma que posso testemunhar, assim como outros colegas certamente o farão, o grande valor desse brasileiro que a Nação perdeu sábado último.

De forma que faço aqui a justificativa do requerimento que apresentei, juntamente com tantos outros, esperando que a família, a esposa Dalva e os filhos, recebam como um mínimo consolo essas palavras e essa homenagem que o Senado presta à grande figura de Fernando Gasparian.

O Sr. Marco Maciel (PFL - PE) - Nobre Senador...

O SR. ROBERTO SATURNINO (Bloco/PT - RJ) - Ouço o Senador Marco Maciel.

O Sr. Marco Maciel (PFL - PE. Com revisão do orador.) - Nobre Senador Roberto Saturnino, V. Exª faz bem em registrar à Casa o falecimento do amigo e político Fernando Gasparian. Ele era, rigorosamente, um homem múltiplo. Aliás, eu até poderia dizer dele o que Terêncio afirmou certa feita: “Nada que era humano lhe era estranho”. Nada. Era escritor, leitor e, como V. Exª lembrou muito bem, um editor também. Político em sua essência, preocupado com o País, com o seu desenvolvimento. Tinha uma enorme capacidade de relacionamento, e viveu convivendo - que é talvez a mais alta maneira de viver - em pleno intercâmbio com todos os segmentos: contrários e diferentes das posições dele. Era também uma pessoa estuante. Quando ele chegava, roubava a cena, como se diz.

O SR. ROBERTO SATURNINO (Bloco/PT - RJ) - É verdade.

O Sr. Marco Maciel (PFL - PE. Com revisão do orador.) - Porque tinha uma energia enorme e, portanto, a todos contagiava. Seu passamento nos deixa tristes.

A prova do que afirmo foi o fato de haver, ao lado do requerimento de V. Exª, outros requerimentos, como o de autoria do Senador Eduardo Suplicy, o meu e tantos, que, de alguma forma, visam ao mesmo objetivo, o de fazer com que o Senado Federal, como Casa da Federação, dê um testemunho do que foi Fernando Gasparian e também expresse que, em função do que foi sua vida, dos amigos que deixa e, sobretudo, das idéias que defendeu, ele é um nome que vai estar sempre inscrito na história do País. A ele, não faltou enorme provisão de brasilidade, de consciência cívica e de busca de construir uma Nação não somente democrática, mas, sobretudo, justa, que era a sua grande preocupação. Portanto, concluo meu aparte cumprimentando V. Exª ela iniciativa de registrar o falecimento do ex-Deputado Constituinte Fernando Gasparian. Estendo nossos sentimentos à família e às instituições às quais ele pertenceu. Muito obrigado a V. Exª.

O SR. ROBERTO SATURNINO (Bloco/PT - RJ) - Sou eu que agradeço. Senador Marco Maciel. V. Exª lembrou muito bem uma qualidade extraordinária de Fernando Gasparian, que era sua energia vital, sua energia espiritual, sua energia anímica, a energia com a qual ele enfrentava os problemas e com a qual ele se dedicava espiritual e materialmente às causas desta Nação brasileira e do povo brasileiro. Agradeço o aparte de V. Exª.

Concedo o aparte ao Senador Eduardo Suplicy.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Prezado Senador Roberto Saturnino, peço a gentileza do Presidente Mão Santa de considerar este aparte referente ao requerimento, para que depois V. Exª tenha o tempo necessário. Por isso, no meu aparte, gostaria de fazer a homenagem a Fernando Gasparian, tal como a preparei, comungando com V. Exª e com o Senador Marco Maciel o requerimento. “Para ser um bom brasileiro tem que gostar de democracia.” Essa frase, repetida por Fernando Gasparian, nos tempos duros da ditadura militar, era considerada altamente subversiva. Por isso, ele foi perseguido, perdeu sua fábrica, virou editor de jornal de resistência, fundou uma revista, que foi censurada; por isso tornou-se um dos mais importantes editores de livros do Brasil; por isso foi Deputado Constituinte e tornou-se figura inesquecível na história da política brasileira. No final dos anos de 1950 e no início dos anos 60, quando a palavra “desenvolvimento” era ouvida em todo lugar, Fernando Gasparian, ainda moço, chegou a ter cinco mil funcionários em sua fábrica de tecidos, a América Fabril, no Rio de Janeiro. Foi dali, aliás, que nasceu o time de futebol carioca, que ainda hoje tem uma boa torcida. Após o golpe militar de 1964, Fernando Gasparian, que era nacionalista, passou a ser perseguido. Seu filho Eduardo, em entrevista ao portal UOL, explica: “Meu pai teve de parar com a indústria porque o governo militar cortou o crédito do Banco do Brasil, que era o principal financiador.” Foram tantos problemas que teve de enfrentar, que, em 1970, auge das perseguições políticas, Gasparian decidiu ir para o exílio, para não ser preso. Escolheu a Inglaterra, mas não agüentou. Voltou ao Brasil um ano depois e fundou o jornal Opinião, declaradamente o veículo de resistência democrática aos militares. Ali escreviam Celso Furtado, Chico de Oliveira, Alceu Amoroso Lima, Dias Gomes, Érico Veríssimo, entre outros - também tive a honra de ser um de seus colaboradores, bem como, depois, do jornal Movimento, que Raimundo Pereira, o editor de Opinião, continuou. Na redação do jornal Opinião, tinha a colaboração de Raimundo Pereira e Tonico Ferreira. Fernando editou de 1971 a 1975, mas o jornal durou sete anos e teve vários de seus números censurados. Ao mesmo tempo em que editava o Opinião, Gasparian comprou a Editora Paz e Terra, de Ênio Silveira, seu amigo e outro grande democrata, que também era dono da Editora Civilização Brasileira - aliás, ela está voltando, tanto que a Editora Record resolveu adquiri-la e está editando um livro do Professor Philippe Van Parijs e Yannick Vanderborght: Renda básica de cidadania: argumentos éticos e econômicos. Devemos aos dois, Fernando Gasparian e Ênio Silveira, a manutenção de um pouco de cultura e de livros no Brasil, naqueles tempos em que ler era quase crime e ter livros em casa era prova material nos processos e nas auditorias militares de todo o País. A Paz e Terra deu preferência às áreas de filosofia, sociologia, ciência política e editou outros adversários do regime militar, como Paulo Freire - autor de Pedagogia do Oprimido, entre outras obras fundamentais -, que na época estava no exílio. Teve também a coragem de editar A luta de classes na União Soviética, de Charles Betthelheim, que tanta polêmica causou na esquerda. Mas isso não bastava a um democrata completo. Em 1973, fundou também a revista Argumento, que tinha uma abordagem criativa e crítica dos acontecimentos. Tratava de tudo. Política, Economia, Artes, Esporte... Seu editor na redação foi o lendário Barbosa Lima Sobrinho, eterno presidente da Associação Brasileira da Imprensa (ABI). A revista foi recolhida pela censura várias vezes. Não se deu por vencido. Amava os livros, amava a liberdade de pensamento. Fundou, então, a livraria Argumento, em São Paulo, em 1977, e mais tarde a transferiu para o Rio, onde ainda se dão os melhores lançamentos, com filial no Leblon - que V. Exª conhece tão bem -, em Copacabana e na Barra da Tijuca. 

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Senador Eduardo Suplicy, lamentamos informar a V. Exª que o aparte, segundo o Regimento, é de dois minutos, apesar de entendermos que V. Exª representa nove milhões de bocas.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Estou concluindo, então, Sr. Presidente. Hoje em dia, as livrarias são administradas pelos filhos Laura, Eduardo e Marcus. Helena é diplomata. Também me aproximei de Fernando Gasparian e de sua esposa, a querida Dalva Funaro Gasparian, por ser ela irmã de meu cunhado, o ex-Ministro Dilson Domingos Funaro, casado com minha irmã Ana Maria. Então, inúmeras vezes o vi, ele que era também estimado por Dilson. Deputado Federal por São Paulo, foi dos mais assíduos e combativos na Constituinte. Era amigo do ex-Presidente Fernando Henrique, mas não aceitava as privatizações. Opôs-se firmemente à da Companhia Vale do Rio Doce, uma das maiores mineradoras do mundo, porque a considerava patrimônio do povo brasileiro. Ele certamente, hoje, com sua voz, está chamando a atenção, construtivamente, do Governo do Presidente Lula, com respeito a uma de suas principais preocupações, o nível tão alto da taxa de juros.

O SR. ROBERTO SATURNINO (Bloco/PT - RJ) - É verdade.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Foi dele a iniciativa de se buscar o limite de 12%, na Constituinte, para as taxas de juros, algo que não se efetivou. Mas sua preocupação sempre tem estado presente. Era assim: “Amava loucamente minha mãe e o Brasil” - disse seu filho. Perdemos muito. Assim, externo a minha solidariedade e o meu abraço a todos, à querida Dalva e aos filhos, Helena, Laura, Eduardo e Marcus.

O SR. ROBERTO SATURNINO (Bloco/PT - RJ) - Obrigado.

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Senador Eduardo Suplicy, V. Exª acaba de ingressar no Guinness Book por dois motivos: maior votação do Senador na história e um aparte maior do que o pronunciamento de V. Exª.

O SR. ROBERTO SATURNINO (Bloco/PT - RJ) - Mas um aparte que só valorizou o meu pronunciamento, na medida em que S. Exª contribuiu com seu conhecimento histórico, por estarem ambos ligados até por vias indiretas de casamento e parentesco.

Agradeço muito o aparte do Senador Eduardo Suplicy, Sr. Presidente, e dou por encerrada a parte de encaminhamento do requerimento.

Passo, então, ao meu pronunciamento, que não será muito extenso.

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Senador Roberto Saturnino, antes, colocarei em votação os requerimentos que a Mesa recebeu dos três Senadores, Eduardo Suplicy, Roberto Saturnino e Marco Maciel, referente à inserção em Ata de voto de pesar e a outros procedimentos pela morte do ex-Deputado Federal Fernando Gasparian.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/10/2006 - Página 30549