Discurso durante a 181ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comemoração ao Dia Mundial da Ciência pela Paz e pelo Desenvolvimento.

Autor
Roberto Saturnino (PT - Partido dos Trabalhadores/RJ)
Nome completo: Roberto Saturnino Braga
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA. POLITICA SOCIO ECONOMICA.:
  • Comemoração ao Dia Mundial da Ciência pela Paz e pelo Desenvolvimento.
Publicação
Publicação no DSF de 09/11/2006 - Página 33917
Assunto
Outros > HOMENAGEM. POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA. POLITICA SOCIO ECONOMICA.
Indexação
  • HOMENAGEM, DIA INTERNACIONAL, CIENCIAS, IMPORTANCIA, DESENVOLVIMENTO CIENTIFICO, MELHORIA, QUALIDADE DE VIDA, POPULAÇÃO.
  • COMENTARIO, RESULTADO, DESENVOLVIMENTO CIENTIFICO, ABOLIÇÃO, MORAL, ETICA, AUMENTO, DESIGUALDADE SOCIAL, UTILIZAÇÃO, CIENCIA E TECNOLOGIA, DESTRUIÇÃO, POPULAÇÃO, GUERRA, AMPLIAÇÃO, PRODUTIVIDADE, REDUÇÃO, MÃO DE OBRA, CRESCIMENTO, DESEMPREGO.
  • REGISTRO, NECESSIDADE, CONCILIAÇÃO, CIENCIAS, MANUTENÇÃO, MORAL, TRANSFORMAÇÃO, MODELO ECONOMICO, REDUÇÃO, DESIGUALDADE SOCIAL, AMPLIAÇÃO, IGUALDADE, ACESSO, POPULAÇÃO, PRODUTO, CIENCIA E TECNOLOGIA, BUSCA, GOVERNO, CONSTRUÇÃO, PAZ.

O SR. ROBERTO SATURNINO (Bloco/PT - RJ. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Professor Candotti, Presidente da SBPC, Sr. representante da Unesco, Sr. Presidente da Academia de Ciências, Srªs e Srs. convidados, Srªs e Srs. Senadores, nada mais justo do que o Senado se incorporar a esta celebração, que é mundial, do Dia Mundial da Ciência pela Paz e pelo Desenvolvimento.

O nosso representante mais credenciado, que é o Presidente da Subcomissão de Ciência e Tecnologia, o Senador Flávio Arns, praticamente já disse o que o Senado tem a dizer, o que é importante. Essa Subcomissão, que é permanente, atesta o interesse do Senado, uma das Casas do Congresso, pelo tema da Ciência e da Tecnologia, que se transformou num sinônimo de desenvolvimento em todos os sentidos, econômico, social e cultural. Este assunto requer um esforço e uma atenção especial dos nossos representantes, dos Poderes Públicos de um modo geral, assim como da sociedade como um todo, e impõe-nos a obrigação de colaborar e todo o esforço de investimento nessa área no Brasil, acreditando nos resultados desse investimento, que não são apenas econômicos, mas sociais, culturais, e que podem ser cada vez mais sociais e culturais. De forma que estou cumprindo um dever de cidadão e de representante do povo ao participar desta homenagem ao desenvolvimento científico da humanidade e, por conseguinte, desta celebração do Dia da Ciência pela Paz e pelo Desenvolvimento.

Aproveito para dizer brevemente - também não quero estender-me no assunto - que é óbvio que a exaltação dos feitos da ciência ecoa em toda a humanidade. Os resultados do desenvolvimento científico e suas aplicações tecnológicas eram impensáveis e foram tão fantásticos que não se podia imaginar a maioria das coisas que se produzem hoje, há 100, 200 anos. O desenvolvimento científico tem sido a grande realização da humanidade nestes últimos séculos e as suas conseqüências, seus derivados sobre a qualidade de vida, sobre a dignidade da vida humana.

Ocorre que, paralelamente a esses feitos extraordinários, há alguns pontos em que o desenvolvimento da ciência trouxe resultados que não são os melhores. Por isso mesmo, na ocasião da celebração do Dia da Ciência nos obriga a tocarmos nesses pontos.

Escolhi três pontos para introduzir nesta minha fala de celebração, uma espécie de cobrança que é para nós mesmos, representantes do povo, mas é também para os cientistas e para os representantes da ciência brasileira e mundial.

O primeiro ponto em que eu gostaria de tocar é a questão dos valores morais e éticos que fundamentam a sociedade humana no Planeta, que era constituída por valores basicamente religiosos, valores que vinham da fé e da revelação, mas que a ciência começou abalar seriamente.

Muitos desses valores tiveram resultados inevitáveis e isso, de certa forma, levou a essa atitude científica geral, que é a atitude cartesiana da dúvida. Levou a um processo de relativização das crenças e dos valores, de um modo geral, que produziu resultados que, muitas vezes, não são os melhores, por conduzirem a uma certa relativização generalizada de valores da convivência e do comportamento do ser humano, que muitas vezes resvala para uma atitude perigosa do cinismo, isto é, da abolição dos valores de natureza ética. Quer dizer, com a abolição dos valores transcendentais, deu-se a abolição dos próprios valores morais e éticos, como se tudo fosse relativo e o que importasse fossem os resultados materiais do progresso, enfim, da melhoria da qualidade da vida humana.

Essa é uma conseqüência que é preciso enfrentar e combater. Claro que, no caso, não cabe tanto aos cientistas e à ciência, mas sobretudo aos líderes religiosos, mostrar que não há incompatibilidade entre a fé e a ciência e que é preciso exatamente encontrar o ponto em que ambos se complementam. E a Filosofia também é capaz de erigir valores humanísticos que se somem aos valores religiosos e recomponham uma base de sustentação ética, filosófica e humanística que, muitas vezes, a ciência, é claro, abalou, sem o objetivo de abalar, mas, sim, de construir a verdade, a verdade científica, mas que está sujeita sempre a dúvida. E essa interrogação permanente, a dúvida cartesiana é que leva, por sua vez, a humanidade e a sociedade humana, muitas vezes, a perder a sua base de valores transcendentais e valores de natureza moral também.

O segundo desses pontos em que eu gostaria de colocar o dedo é que a ciência e o seu derivado, a tecnologia, foram capazes de produzir um aumento inacreditável, impensável na produtividade do trabalho humano. Era impensável, há 100 anos, que a humanidade fosse capaz de produzir bens e serviços em quantidade muito maior com um quantitativo de mão-de-obra tão pequeno. Então, isso poderia ter produzido como resultado a emancipação da humanidade, o que era o grande alvo dos pensadores e dos filósofos de séculos atrás.

Hoje, o mundo inteiro poderia estar com uma jornada de trabalho reduzida à metade, possibilitando a utilização da outra metade para uma elevação cultural, filosófica e até religiosa de toda a humanidade. No entanto, ao contrário, manteve-se a mesma jornada de trabalho, às vezes até aumentando, jogando-se para fora do mercado de trabalho mais da metade da população trabalhadora, num nível de subsistência muito fraco, de exclusão, de desemprego, de todas as mazelas. Quer dizer, a ciência produziu um aumento de produtividade, mas ele foi utilizado não pela ciência, mas pela política. Foi utilizado para fazer com que uma parte menor da humanidade usufruísse 90% desses benefícios e que a maior parte ficasse relegada a essa situação de exclusão, produzindo essa desigualdade que nos incomoda sob o ponto de vista moral, principalmente, mas também, sob o ponto de vista social e até de segurança, de convivência.

Então, a continuidade do modelo de desenvolvimento econômico baseado nesse processo é completamente inviável. Especialmente no Brasil, estamos muito preocupados com isso e encetando um esforço que não tinha havido antes em nossa História, um esforço exatamente de correção desse modelo excludente, desse modelo que é uma perversão do trabalho da ciência, uma perversão dos resultados do trabalho conseguido pelos cientistas, pela ciência, de modo geral.

É claro que isso é uma responsabilidade política que assumimos perfeitamente. Não são os cientistas que vão fazer isso. Mas é claro que os cientistas, com seu prestígio, com tudo o que possuem em matéria de audiência pública e mídia, devem engajar-se nesse processo.

Tenho tido notícias da SBPC, por exemplo, de que há sempre um engajamento no sentido de tornar os feitos da ciência acessíveis a toda a humanidade e não a uma minoria, produzindo uma desigualdade absolutamente inviável. A continuidade dessa desigualdade é absolutamente inviável até sob o ponto de vista de segurança, mas principalmente do ponto de vista moral.

O terceiro ponto é óbvio, é a utilização que foi feita também pela política, não pela ciência, dos frutos do trabalho dos cientistas para a guerra, para a matança, para a destruição da população, da humanidade.

A nossa celebração é exatamente pelo Dia Mundial da Ciência pela Paz e pelo Desenvolvimento. Acredito que nesse conceito de desenvolvimento está incluído o conceito de igualdade, de acesso aos bens da ciência por parte de todos, e não esse processo de exclusão e de formação de desigualdades.

É importante, principalmente nestes dias de comemoração, chamar a atenção e cobrar da humanidade uma posição cada vez mais radical em busca da paz, da contestação, da não aceitação do uso da ciência para a produção da força militar capaz de subjugar povos e Nações mais fracos, utilizando o trabalho nobre, o trabalho humanístico da ciência, dos cientistas para fins absolutamente ignóbeis e inaceitáveis sob o ponto de vista político e moral.

Este é o Dia Mundial da Ciência pela Paz e pelo Desenvolvimento, e pelo desenvolvimento com social, razão pela qual estamos aqui a comemorar imbuídos desse sentimento. Nós brasileiros muito especialmente. Por quê? Porque o Brasil se encontra nessa encruzilhada por ter optado pela justiça social como meta prioritária política número um. E o Brasil também se encontra, neste momento, empenhado no desenvolvimento da sua vocação de paz.

O Brasil é uma Nação que nunca quis ser uma potência de guerra; sempre quis ser a potência da paz, desde Rui Barbosa, em Haia; Rio Branco, negociando as fronteiras; Affonso Arinos, afirmando isto: o Brasil tem a vocação da paz.

Estamos num esforço de reforma da Organização das Nações Unidas. Queremos entrar no Conselho de Segurança para exercer essa presença de potência de paz que o Brasil sempre quis ser, e agora mais do que nunca, tendo em vista o panorama mundial que muito ameaça a todos nós. Estamos aqui para celebrar o contrário da guerra, que é a paz; a ciência pela paz, a ciência pelo desenvolvimento. Estamos todos aqui irmanados nesse sentimento.

            Era isso que gostaria de dizer, Sr. Presidente, Senador Flávio Arns, que é a nossa figura, como disse, principal no que tange à preocupação do Senado com o desenvolvimento científico e tecnológico do Brasil.

Muito obrigado. (Palmas.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 09/11/2006 - Página 33917