Discurso durante a 190ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Reflexão sobre a insegurança no tráfego aéreo brasileiro.

Autor
Roberto Cavalcanti (PRB - REPUBLICANOS/PB)
Nome completo: Roberto Cavalcanti Ribeiro
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DE TRANSPORTES.:
  • Reflexão sobre a insegurança no tráfego aéreo brasileiro.
Aparteantes
Antonio Carlos Magalhães, Ney Suassuna.
Publicação
Publicação no DSF de 22/11/2006 - Página 34971
Assunto
Outros > POLITICA DE TRANSPORTES.
Indexação
  • ANALISE, CRISE, CONTROLE, ESPAÇO AEREO, AVIAÇÃO CIVIL, BRASIL, GRAVIDADE, RISCOS, FALTA, SEGURANÇA, USUARIO, TRANSPORTE AEREO, CRITICA, GOVERNO FEDERAL, INEXISTENCIA, SOLUÇÃO, PROBLEMA, VOO, COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, CORREIO BRAZILIENSE, DISTRITO FEDERAL (DF), DETALHAMENTO, POSSIBILIDADE, OCORRENCIA, ACIDENTE AERONAUTICO, REGISTRO, MANIFESTAÇÃO, AERONAUTICA, NEGAÇÃO, FATO.
  • REGISTRO, REALIZAÇÃO, AUDIENCIA PUBLICA, SENADO, PRESENÇA, AUTORIDADE, RESPONSABILIDADE, ESPAÇO AEREO, BRASIL, CRITICA, FALTA, SOLUÇÃO, CRISE.
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, PERIODICO, VEJA, ISTOE, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), EPOCA, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), CRITICA, INEFICACIA, GOVERNO FEDERAL, SOLUÇÃO, CRISE, TRANSPORTE AEREO, AUMENTO, DEMANDA, USUARIO, NECESSIDADE, AMPLIAÇÃO, INVESTIMENTO, SETOR, PROTESTO, FALTA, PLANEJAMENTO, MELHORIA, AVIAÇÃO CIVIL, REGISTRO, ANTERIORIDADE, ANUNCIO, POSSIBILIDADE, OCORRENCIA, PROBLEMA, CONTROLE, ESPAÇO AEREO, BRASIL.

O SR. ROBERTO CAVALCANTI (Bloco/PRB - PB. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, trago hoje um tema que já foi exaustivamente mencionado neste plenário, tendo sido abordado inclusive no pronunciamento do nobre colega que me antecedeu e que se refere aos problemas de insegurança e atraso de vôos com os quais o nosso País está convivendo.

Venho hoje, como já disse, abordar um tema que tem tomado conta do noticiário nacional há quase dois meses e que foi objeto de audiência pública na Casa hoje, com a presença do Ministro da Defesa, Waldir Pires, e de autoridades aeronáuticas civis e militares.

Trata-se dos desdobramentos pós-acidente aéreo ocorrido em 29 de setembro último entre duas aeronaves de última geração, os jatos Boeing, da Gol, e Legacy, de uma empresa americana, adquirido da Embraer - Empresa Brasileira de Aeronáutica S.A.

Faço esta ressalva “de última geração” por se tratar de aviões que dispõem, em suas cabines de comando, da mais alta e precisa tecnologia de aviação no que se refere à navegação e comunicação, minimizando, sob os aspectos técnicos, as reais razões de tão grave acidente.

Nós, Parlamentares, como o resto da população brasileira, ficamos chocados! Nós, como tantos outros usuários da aviação comercial brasileira, temos sido vítimas dos graves transtornos que ocorrem rotineiramente nos aeroportos do nosso País nos últimos tempos.

Não bastassem os transtornos que têm inviabilizado a normalidade do tráfego aéreo, com graves e irreversíveis danos à economia, ao turismo, enfim, a todo o setor aeronáutico, surge agora, para conhecimento de todos, um fato da mais alta gravidade: o risco que todos os usuários do transporte aéreo no Brasil estavam e estão correndo com a insegurança da nossa aviação. Nos últimos dias, veio à tona algo que esteve escondido nas entranhas da tecnoburocracia do serviço público nacional.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, são inúmeros os relatos de casos concretos que demonstram o grave risco que todos nós estamos correndo. É espantoso ouvir a situação dramática narrada por um dos controladores de vôo do Cindacta I, em Brasília, que mostra a insegurança com que realizam seu trabalho. Ele cita: “Eu, hoje, não voaria. Não deixaria minha mulher e meus filhos viajarem de avião! Tem avião que some da tela do radar, como ocorreu com o Legacy que se chocou com o Boeing da Gol. O motivo é que os equipamentos funcionam ao sabor do vento.” E, segundo consta, está tudo registrado nos relatórios diários do Cindacta I.

Imagine, Sr. Presidente, ele não voaria, não deixaria sua família voar. E nós, pobres mortais brasileiros, a que estamos expostos?

Os relatos que toda a imprensa tem divulgado sobre a reação por parte das autoridades competentes mostram que sempre são adotados os mesmos caminhos: ou há omissão da verdade e dos fatos, ou há - o que é pior - o desconhecimento da gravidade desses fatos.

Com todo o respeito à trajetória pública e pessoal do Ministro da Defesa, Waldir Pires, é inaceitável assistir sempre a declarações do tipo: “Eu não sabia de nada disso”, “Por que não me falaram antes?”, “Não li o relatório, não tinha conhecimento do mesmo”. Se o Ministro da Defesa não é informado, então devemos admitir que o setor está um caos. Onde está a segurança de vôo no Brasil?

O jornal Correio Braziliense, na sua edição de 20 de novembro, relata um quase acidente aéreo, denominado “incidente” (no jargão do controle de tráfego aéreo), na última segunda-feira, entre dois aviões, um da Força Aérea Brasileira (FAB) e outro, comercial, da TAM. Ficaram próximos a uma colisão. Os controladores de vôo ouvidos pelo Correio Braziliense explicaram que o problema, no caso daquele incidente, foi que o avião da FAB estava sendo monitorado pelo Controle da Defesa Aérea, responsável apenas pelos aviões militares em missões, e o avião da TAM era monitorado pelo Controle do Espaço Aéreo, que cuida do restante do tráfego. “Dois aviões no mesmo espaço aéreo, cada um falando com um grupo de controladores. É partir para bater!”, diz um dos controladores de vôo, que atua em Brasília.

A Aeronáutica, por sua vez, divulgou uma nota, afirmando que não há registro de qualquer tipo de incidente envolvendo aeronaves civil e militar e o sistema de tráfego aéreo. O problema, segundo relato de operadores, é que muitos aviões militares, para se livrarem do controle de fluxo, feito desde o início da operação-padrão, intitulam-se “vôo de circulação-operação militar”, o chamado VO COM. Com isso, são monitorados por controladores da defesa aérea e ganham prioridade para “furar filas” de pouso e decolagem.

Onde está a verdade?

A Comissão de Serviços de Infra-Estrutura, a Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional e a Comissão de Meio Ambiente, Defesa do Consumidor e Fiscalização e Controle realizaram hoje uma reunião conjunta no Senado Federal, sob a forma de audiência pública, para ouvir o Ministro da Defesa, Waldir Pires, o comandante da Aeronáutica, Tenente-Brigadeiro-do-Ar Luiz Carlos da Silva Bueno, o Diretor-Geral da Agência Nacional de Aviação - Anac, Milton Zuanazzi, o Presidente da Infraero, Tenente-Brigadeiro José Carlos Pereira, o Presidente do Sindicato Nacional dos Trabalhadores de Proteção ao Vôo, Jorge Botelho, e o Presidente do Sindicato Nacional das Empresas Aeroviárias, Marco Antonio Bologna, enfim, todas as autoridades que, direta ou indiretamente, estão envolvidas no tráfego aéreo brasileiro.

A audiência pública, na minha opinião, foi extremamente decepcionante. Fiquei horrorizado com os relatos e com a falta de profissionalismo encontrada nessa comissão. Esperamos que algo de concreto surja no tocante à solução de pontualidade e segurança dos vôos no nosso País em um futuro próximo.

A revista Veja relata, na sua última edição, que o “apagão aéreo no País continua, e o Governo, atônito, não produz soluções”. Relata que, embora o movimento dos controladores de vôo não vise apenas à segurança dos vôos, ele é o sinal mais evidente do colapso do controle aéreo no Brasil. Havia tempo essa crise já se anunciava, sem que o Governo desse a devida atenção ao assunto. Desde 2004, o tráfego aéreo no Brasil cresce em ritmo mais acelerado que a média mundial! No ano passado, a demanda de passageiros cresceu 19%. Neste ano, a previsão é de crescimento de 15%, contra 5% no resto do mundo.

Os investimentos em infra-estrutura aeroportuária, equipamentos e mão-de-obra deveriam ter aumentado na mesma proporção do tráfego aéreo, porém nada aconteceu.

Agora, temos de enfrentar e resolver os problemas, com o agravante de que, para a formação de um controlador, leva-se, em média, três anos. Faltou planejamento ao setor!

No caso do acidente entre o Boeing da Gol e o Legacy, segundo a revista Veja, a Aeronáutica, em seu relatório, admite pela primeira vez que houve falha no sistema de radares entre Brasília e Manaus. Após passar por Brasília, o Legacy sumiu das telas por dois minutos. Voltou a aparecer durante seis minutos, mas desapareceu de vez ...

(Interrupção do som.)

O SR. ROBERTO CAVALCANTI (PRB - PB) - ...até a colisão. Só depois do choque com o Boeing da Gol, o Legacy reapareceu nos radares, desta vez, no Cindacta 4. Tudo isto nos leva a refletir sobre a alta periculosidade a que estamos expostos ao voar nos céus do Brasil.

A revista Época traz no seu último número uma matéria cuja manchete é a seguinte: “Voar está mais arriscado?”.

Daquela matéria, pinçamos alguns trechos que vale a pena mencionar:

“Há fortes indícios de que a atual crise levaria a um aumento de risco de desastres, como colisão entre aviões”. “Existe um grande gargalo aéreo no Brasil”. “Nova regra adotada em razão do aumento do número de vôos, cuja denominação é R.S.V.M (sigla, em inglês, para Redução da Separação Mínima Vertical), exigiria uma compensação nos investimentos em maior tecnologia e infra-estrutura, o que no Brasil não ocorreu.” “Pilotos e controladores de vôo relatam que as freqüências de transmissão são de péssima qualidade.” “O Brasil está longe de ter uma operação de classe mundial em infra-estrutura aeronáutica.” “Um documento do Conselho de Aviação Civil (Conar), assinado em 31 de outubro de 2003 pelo Ministro da Defesa, José Viegas, já anunciava o colapso do setor aéreo pela falta de aplicação de recursos.”

Nada aconteceu. A Aeronáutica nega. Mas os documentos internos do Comando da Aeronáutica, obtidos pelos repórteres da revista Época, revelam pelo menos dois incidentes críticos neste ano. Em todos os casos, houve falha no controle aéreo, e o desastre só foi evitado por outros mecanismos de segurança.

19 de maio de 2006:

Um Boeing da Gol pede ao controle de vôo para descer de nível. A torre autoriza a manobra, e o avião começa a descida. De repente, um avião que fazia exercícios de pára-quedismo cruza à frente do Boeing. O incidente foi considerado de “alto risco” de colisão.

30 de junho de 2006:

O piloto da Varig Augusto Nunes sobrevoava o espaço aéreo de Manaus. Após fazer uma curva à direita, a torre determina que ele mantenha o nível de vôo. Segundos depois, o susto. Diz ele: “Fui surpreendido por um vulto no pára-brisa”. O vulto era um avião passando a apenas 50 metros à sua frente!

Temos, ainda, nesta semana, a edição da revista IstoÉ e um relato mais comprometedor e que expõe o nível de risco em que se encontra a aviação brasileira.

É um relato detalhado do incidente já citado no Correio Braziliense e dois novos ocorridos em São Paulo. É o seguinte o precioso texto:

Revista IstoÉ, de 19 de novembro de 2006:

“Naquela mesma tarde, porém, durante o trajeto com partida no Rio de Janeiro e destino a Brasília, o jatinho Lear Jet da FAB que transportava o ministro envolveu-se no que, em linguagem aeronáutica, pode se interpretar como ‘um quase acidente’. No instante em que o aparelho estava a 180 quilômetros da capital federal, os controladores no Cidacta-1 perceberam que a aeronave entrara na mesma rota de um Airbus da TAM que acabara de decolar rumo a São Paulo. O jatinho com o Ministro a bordo estava sendo monitorado pelos militares que cuidam da defesa aérea, responsáveis por vôos militares. Já o avião da TAM voava sob os olhares dos controladores que operam a aviação civil, os vôos de carreira. Essas duas equipes usam monitores e ocupam salas diferentes na torre de controle do aeroporto de Brasília. Ao perceberem a situação de choque, os controladores dos vôos de carreira orientaram o piloto do avião da TAM a fazer o que no jargão técnico se conhece como manobra evasiva. Significa mudar inesperadamente de rota, o que foi feito. O episódio gerou um relatório reservado encaminhado de imediato aos superiores dos controladores de plantão naquela tarde. Waldir Pires, que ao desembarcar em Brasília afirmou que ‘não houve nada’, só soube do incidente horas depois.

Esse episódio não foi o único a demonstrar que as coisas não andam bem nas torres de controle do País. Dias antes da colisão entre o jatinho Legacy e o Boeing da Gol, no dia 29 de setembro, um grande susto tomou conta da sala de controle aéreo de São Paulo. O sistema estava congestionado. Dois aviões da mesma Gol se preparavam para pousar no aeroporto de Cumbica, em Guarulhos. Eles tinham números de identificação semelhantes: 7454 e 7464. O controlador responsável por orientar os pilotos das duas aeronaves disparou uma instrução para um deles. Só que foi o outro que cumpriu a ordem. O resultado foi que um avião virou justamente na direção do outro. A tensão se abateu sobre a equipe em terra. O controlador que deu a instrução errada, em meio a um surto nervoso, pediu para sair da sala. Houve gritaria. ‘Você me jogou para cima da outra aeronave’, reclamou um dos pilotos pelo rádio. Uma manobra rápida e um pouco de sorte evitaram o pior. No começo de outubro, porém, aconteceu um novo ‘quase acidente’. Um avião da Gol e outro da American Airlines se cruzaram no ar, no Estado de São Paulo, a uma distância de 100 pés, ou 33 metros - um décimo da separação vertical considerada minimamente ideal, de 330 metros. (...)

O Sr. Antonio Carlos Magalhães (PFL - BA) - V. Exª me permite um aparte?

O SR. ROBERTO CAVALCANTI (Bloco/PRB - PB) - Concedo o aparte, com a permissão da Presidência, ao Senador Antonio Carlos Magalhães.

O Sr. Antonio Carlos Magalhães (PFL - BA) - V. Exª faz um discurso extremamente importante para o Brasil, do qual o Presidente da República deveria tomar conhecimento dele. V. Exª interveio, hoje, na Comissão, com muita propriedade. Eu o assisti. E, agora, desta tribuna, V. Exª expõe detalhes da situação caótica em que se encontra a aviação brasileira. Hoje, toda aquela gente pareceu-nos bastante unida, mas, estavam, sim, todos desunidos em relação à solução dos problemas, que não serão solucionados da maneira como está. Peço a V. Exª que faça chegar, por meio da Liderança ou da Mesa, ao Senhor Presidente da República o equilibrado e importante discurso proferido por V. Exª.

O SR. ROBERTO CAVALCANTI (Bloco/PRB - PB) - Obrigado pelo aparte, Senador Antonio Carlos Magalhães, que nos fez companhia na audiência pública. Repito o que disse anteriormente: fiquei extremamente decepcionado com a ineficiência da burocracia aeronáutica brasileira.

Sr. Presidente, mais 30 segundos...

O Sr. Ney Suassuna (PMDB - PB) - V. Exª me permite um breve aparte? Senador Roberto Cavalcanti, na Comissão de Fiscalização Financeira e Controle, Senador Roberto Cavalcanti, pedimos que fosse solicitado à Aeronáutica o status de cada aeroporto, ou seja, que equipamento utilizam, se está obsoleto ou não. No nosso Estado, na cidade de Campina Grande, há anos, solicitamos a compra de dois equipamentos simples - um custa pouco mais de R$400 mil, e o outro perto de R$1 milhão -, e até hoje não fomos atendidos. No entanto, a falta desses equipamentos põe em risco a vida de centenas e centenas de pessoas que, todos os dias, ou são obrigadas a aterrissarem em outra cidade ou há atraso nos vôos quando da decolagem. Quando tomamos conhecimento dessas coisas, infelizmente, é com a notícia de desastres. Parabenizo V. Exª pela iniciativa, que tem a minha solidariedade. Precisamos ver o que pode ser feito para melhorar a segurança dos nossos aeroportos e a das nossas aeronaves em vôo.

O SR. ROBERTO CAVALCANTI (Bloco/PRB - PB) - Agradeço o aparte de V. Exª. Somos companheiros do sofrimento paraibano no tocante à infra-estrutura aeroportuária.

O apelo que faço hoje desta tribuna não visa a nossa pele especificamente, e sim a de milhões de brasileiros que utilizam a aviação comercial, e que hoje, lamentavelmente, não só estão expostos aos atrasos dos vôos, mas fundamentalmente, e mais gravemente, a risco de vida.

Sr. Presidente, finalizo com a matéria da IstoÉ:

(...) IstoÉ teve acesso a esses registros, o que não significa que outros episódios anormais não possam ter ocorrido nos últimos tempos.”

Até quando vamos continuar com a irresponsabilidade e a improvisação? Até quando o usuário da aviação comercial brasileira estará exposto aos atrasos e à insegurança dos vôos?

Temos de dar um basta! Temos de exigir competência no trato da coisa pública.

            Sr. Presidente, muito obrigado pela concessão do prazo, que foi extremamente dilatado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 22/11/2006 - Página 34971