Discurso durante a 193ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Importância da Segunda Semana de Valorização da Pessoa com Deficiência. Indignação diante da decisão de um juiz de São Paulo que permite a escolas particulares recusar matrícula de portadores da síndrome de down. Instituição do dia 20 de novembro como o Dia Nacional da Consciência Negra. Aprovação, pela Câmara dos Deputados, de projeto contra a homofobia.

Autor
Serys Slhessarenko (PT - Partido dos Trabalhadores/MT)
Nome completo: Serys Marly Slhessarenko
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL.:
  • Importância da Segunda Semana de Valorização da Pessoa com Deficiência. Indignação diante da decisão de um juiz de São Paulo que permite a escolas particulares recusar matrícula de portadores da síndrome de down. Instituição do dia 20 de novembro como o Dia Nacional da Consciência Negra. Aprovação, pela Câmara dos Deputados, de projeto contra a homofobia.
Aparteantes
Heráclito Fortes, Tião Viana.
Publicação
Publicação no DSF de 25/11/2006 - Página 35456
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • SAUDAÇÃO, PESSOA PORTADORA DE DEFICIENCIA, ELOGIO, MOBILIZAÇÃO, EVOLUÇÃO, COMBATE, DISCRIMINAÇÃO, IMPORTANCIA, REALIZAÇÃO, SENADO, SEMANA, VALORIZAÇÃO.
  • QUESTIONAMENTO, DECISÃO, JUIZ, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), AUTORIZAÇÃO, ESCOLA PARTICULAR, RECUSA, MATRICULA, CRIANÇA, DEFICIENTE MENTAL, DESCUMPRIMENTO, FUNÇÃO, ESTABELECIMENTO DE ENSINO, PREJUIZO, EDUCAÇÃO, TOLERANCIA, SOLIDARIEDADE.
  • ANUNCIO, ELABORAÇÃO, PROJETO DE LEI, DEFINIÇÃO, CRIME, REJEIÇÃO, ESTABELECIMENTO DE ENSINO, MATRICULA, PESSOA PORTADORA DE DEFICIENCIA, JUSTIFICAÇÃO, OBRIGATORIEDADE, PREPARAÇÃO, INCLUSÃO.
  • ELOGIO, EMISSORA, TELEVISÃO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), DEBATE, DISCRIMINAÇÃO, PESSOA PORTADORA DE DEFICIENCIA.
  • COMPROMISSO, LUTA, DISCRIMINAÇÃO, NEGRO, MULHER, HOMOSSEXUAL, IGUALDADE, DIREITOS, SAUDAÇÃO, APROVAÇÃO, CAMARA DOS DEPUTADOS, DEFINIÇÃO, CRIME, DISCRIMINAÇÃO SEXUAL.

A SRª SERYS SLHESSARENKO (Bloco/PT - MT. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o tema que o Senador Paim acaba de abordar é o mesmo de que vamos tratar hoje. Deveríamos ter feito isso antes - estava inscrita para fazer isso no dia da sessão especial de homenagem aos portadores de deficiência -, mas infelizmente não foi possível.

Eu diria que falar agora não faz diferença, talvez até seja melhor; é mais difícil, com certeza, falar depois do Senador Paulo Paim sobre a temática, mas, por outro lado, mais fácil, depois de ter assistido a vários eventos - não participei de todos, mas participei de uma parte significativa deles.

Gostaria de começar saudando todos os portadores de deficiência que participaram desse evento e que, com certeza, representaram todos os portadores de deficiência do Brasil. Tudo que o Senado fez ou vem fazendo e que culminou na Semana dos Portadores de Deficiência deveu-se à organização dessas pessoas pelo Brasil afora. Se elas estivessem encolhidas, cada uma no seu canto, sem participar, sem se organizar, sem se mobilizar junto à sociedade, com certeza estariam, apesar de todos os problemas que enfrentam, invisíveis e sofrendo todo tipo de discriminação. A sua organização e mobilização fazem com que elas estejam presentes e cada vez mais envolvidas na busca e na conquista do fim da discriminação.

Após a saudação aos portadores de deficiência, gostaria de saudar o Presidente Renan Calheiros, ele e sua esposa, Verônica - sei que, já na primeira semana, ela participou efetivamente, de forma determinada, e, a partir daí, as coisas começaram a acontecer e se concretizar aqui no Senado da República.

O Senado precisa realmente ter esse tipo de participação, porque a atenção que conseguiu despertar para o problema a partir dessa última semana foi extremamente significativa para os portadores de deficiência e para a sociedade de um modo geral.

Eu costumo dizer que o envolvimento dos deficientes em ações, em atitudes, de forma profissional ou educacional, talvez seja mais importante para os chamados “sem deficiência” do que para os próprios deficientes. Isso porque a tolerância, a solidariedade e a fraternidade são conceitos, são valores que têm de ser desenvolvidos na sociedade para que ela possa realmente se transformar, mudar a questão da competitividade e outras coisas mais. É preciso mudar para uma sociedade em que haja respeito, em que haja realmente a propagação do entusiasmo, em que haja sentimentos como os da tolerância, da solidariedade e da generosidade. É de suma importância o envolvimento da sociedade com os chamados diferentes - e aí entram os deficientes, os negros, os que tem orientação sexual diferenciada, os índios, as mulheres, enfim, todos aqueles que a sociedade, ao longo dos tempos, muito discriminou.

Hoje isso está mudando. Estão começando a entender que somos diferentes. Digo “somos”, porque sou mulher e sofro discriminação com certeza. Somos diferentes, mas exigimos direitos absolutamente iguais.

O que discutimos é a igualdade de direitos, respeitadas as diferenças.

Saúdo o Presidente Renan por ter iniciado esse processo dentro do Senado, processo que está sendo desenvolvido de forma grandiosa. Saúdo também o Dr. Agaciel, Diretor do Senado, que, como sempre, em todas as atividades, está sempre presente e, de forma determinada, contribui para fazer as coisas acontecerem. E é óbvio e é claro que o fazer acontecer se dá concretamente no Senado por meio de todos os trabalhadores desta Casa, do mais graduado ao mais simples, todos que, com certeza, deram, estão dando e darão sempre a sua contribuição no sentido de fazer com que todas as ações que aqui acontecem aconteçam da melhor forma.

Quero também saudar Marcos Frota e, ao fazê-lo, saúdo todos os outros que aqui estiveram - os outros de que falo são aqueles de fora do Senado - e que vêm fazendo a coisa acontecer na sociedade, no dia-a-dia. A grandiosidade dessas pessoas é tocante, porque não se manifesta em uma semana ou em alguns dias, mas em todos os dias de sua vida. Daí também a extensão de nossa saudação: queremos que ela seja muito grande para atingir todas essas pessoas que, citando Marcos Frota, agradeço e parabenizo pela participação e pelo envolvimento em questões como essa Brasil afora.

Falei que iniciaria, como iniciei, saudando os portadores de deficiência e dizendo que tivemos a participação do nosso grande companheiro Bob, cadeirante, representando o Mato Grosso, que, de forma ativa, alegre, entusiástica, participou dessa Semana, assim como participa de todos os trabalhos do nosso gabinete.

Como eu disse, nada mais justo e correto do que valorizar essas pessoas que diferem de nós em alguns aspectos, mas que não significa nada quando levamos em conta suas capacidades produtivas.

Falarei de um caso que me deixou atônita. Não tenho outra forma de me referir a isso, senão expressando o meu espanto e - por que não? - minha revolta, com a decisão do Juiz Gustavo Santini Teodoro, da 23ª Vara Cível de São Paulo, de que escolas particulares podem recusar a matrícula de alunos com síndrome de Down. Isso é um absurdo, uma decisão carregada de preconceito e de desconhecimento da Lei de Diretrizes e Bases e da Constituição Federal.

Senador Cristovam Buarque, V. Exª que é um educador nato na história do Brasil, que já deixou sua marca eterna na educação do nosso País, um juiz, ao decidir que uma escola pode rejeitar um portador de síndrome de Down, cometeu um absurdo.

Nada justifica tamanha falta de sensibilidade e, vou mais além, de responsabilidade do representante de um dos Poderes que mais tem amadurecido e evoluído, acompanhando o desenvolvimento natural de nossa sociedade, como o Poder Judiciário.

A família da pequena Lívia Roncon, de apenas sete anos, entrou na Justiça contra uma escola de São Paulo, que recusou a matrícula da menina, sem nem fazer um dia de adaptação para ver o comportamento dela junto aos possíveis coleguinhas e à estrutura pedagógica da escola. A criança foi rejeitada com a alegação de que a escola estava impossibilitada de atender às demandas da criança.

Eu lhes pergunto, Srªs e Srs. Senadores: quais demandas poderiam inviabilizar a matrícula de uma criança com síndrome de Down? Eu lhes respondo: nenhuma. Elas não precisam de tratamento tão diferenciado, tão especial. Só precisam ser aceitas, respeitadas e estimuladas.

O que há de extraordinário nessas demandas que uma escola não poderia disponibilizar? Atenção? Respeito? Desempenhar sua função social? Cumprir seu dever de ensinar e formar cidadãos capazes de respeitar as diferenças é uma das funções primordiais da escola, Sr. Presidente. Se ela não aceita uma criança por ela ser diferente, está deixando de cumprir sua função de escola.

Sou pedagoga de formação, com mestrado em educação, conheço bem o que é ensino, apesar de não ter trabalhado com educação infantil.

Sei que as necessidades pedagógicas de uma criança com síndrome de Down são semelhantes às de outras crianças, elas necessitam apenas de mais estímulo, o que qualquer profissional de qualidade e comprometido com a educação deve e sabe fazer.

O juiz entendeu que a escola tem o direito de recusar a matrícula de uma criança portadora da síndrome de Down. O esdrúxulo argumento do juiz foi o de que é dever do Estado, e não da rede particular, atender os estudantes portadores de necessidades especiais. Meu Deus, isso é um absurdo! Essas pessoas, cidadãos como qualquer outro, têm também o direito de escolher onde estudar.

Quando pensei neste discurso, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, fui em busca de informações sobre o assunto, falar com pessoas que trabalham diretamente com crianças portadoras da síndrome de Down e, assim, falamos com a pedagoga Andréa Moraes, de Petrópolis, no Rio de Janeiro, que me ajudou a entender melhor o absurdo que foi o entendimento do juiz, Senador Tião Viana.

Segundo a professora, o trabalho com crianças com Down é maravilhoso, elas são amorosas, inteligentes e com potencial enorme, precisando apenas de estímulos. E aí se encontra a única exigência para a escola: a existência de um corpo docente qualificado. Mas não é o que se espera de qualquer escola? Professores qualificados? Portanto, falar que não tem estrutura é uma falácia. Este é o testemunho de uma pessoa que conhece de perto a realidade de trabalhar com essas crianças, Senador Heráclito Fortes.

Ela me contou ainda que a convivência com crianças com síndrome de Down é muito mais enriquecedora para as crianças ditas “normais” do que para as crianças que têm a síndrome, porque estas têm muito mais a ensinar do que a aprender, ajudam as crianças a entenderem o que é diferença e a serem menos resistentes à diversidade.

Ensinar a tolerância, a fraternidade e a solidariedade não é tarefa fácil, e as crianças portadoras dessa síndrome, envolvidas, trabalhando, estudando e desempenhando tarefas junto com as crianças chamadas “normais”, contribuem muito mais para a mudança de mentalidade da nossa sociedade do que as crianças “normais” contribuem para com elas. E fiquei convencida disso.

Concedo um aparte ao Senador Tião Viana.

O Sr. Tião Viana (Bloco/PT - AC) - Senadora Serys Slhessarenko, estava ouvindo o pronunciamento de V. Exª, que vem do sentimento de uma figura pública muito sensível e socialmente muito preocupada com as questões de justiça para as minorias, para as pessoas que entendem e indicam, em suas expressões de vida, que é necessário viver em sociedades em que haja calor humano, solidariedade e sentimento de amor ao próximo. V. Exª faz um pronunciamento claríssimo sobre esses desafios humanistas que a sociedade brasileira tem de enfrentar e aperfeiçoar, como fez há pouco o eminente Senador Paulo Paim, que tem nisso uma causa de vida, assim como V. Exª.

Ouvi o aparte do Senador Heráclito Fortes, ilustrando um momento bonito de uma relação humana entre nós que achamos que somos absolutamente normais e alguém com dificuldade visual. Esse assunto tem tomado conta, de maneira mais positiva, da agenda política, da agenda de comunicação do Brasil, da imprensa brasileira, da vida institucional do País. Espero que possamos transformar todo esse sentimento de preocupação e solidariedade em resultados objetivos. O nome do resultado objetivo é política pública. Hoje, a riqueza da sociedade representa 60% dos gastos médios anuais do País. O Governo gasta 40% e a sociedade, 60%. A convergência de políticas entre sociedade e Governo, sem dúvida alguma, redundará em uma grande política para as pessoas portadoras de deficiência. Nós temos direito a apresentar emendas individuais ao Orçamento. No ano passado, apresentei uma emenda individual de R$3 milhões. Se cada Parlamentar apresentar uma emenda individual de R$3 milhões ao Orçamento da União, poderemos, só aí, destinar em torno de R$1,8 bilhão para um núcleo de investimento nas políticas públicas que venham assegurar melhoria da qualidade das escolas para os portadores de deficiência, para as Apaes do Brasil, para a manutenção de aparelhos de qualidade. As pessoas sentem dor quando olham um portador de deficiência numa cadeira de rodas, mas poucas sabem que, se ele não tem cadeira de rodas adequada, em dois ou três anos, ele perderá a vida, porque aquilo vai levá-lo a doenças graves, anomalias do aparelho osteoarticular graves, com comprometimento de órgãos vitais e, depois, a perda da vida. E nós não conseguimos executar políticas efetivas de proteção ao portador de deficiência. Fica uma lembrança do belo pronunciamento que V. Exª faz para que o Parlamento assim proceda. Fiz assim o ano passado e espero ver, até o mês de dezembro, minha emenda de R$3 milhões ser executada. Com ela poderemos atender 100% dos portadores de deficiência do Estado do Acre. Não quero que seja de minha autoria, mas do Governo Federal, do Governo do Estado, dos órgãos públicos. Creio que é mais importante. Sei que será um desafio para V. Exª e o Senador Paulo Paim construírem, no ano de 2007, um orçamento da União, nas emendas individuais, com esse tipo de responsabilidade. Muito obrigado.

A SRª SERYS SLHESSARENKO (Bloco/PT - MT) - Perfeito, Senador Tião Viana. Muito nos honra o seu aparte, que enriquece totalmente a nossa fala.

São sugestões bastante claras de políticas públicas. Chegaremos, até lá, à necessidade de definição, com clareza, de políticas públicas e de ações concretas. Diria que deixo esta parte, pelo seu aparte, anexada à minha fala, pois já está totalmente contemplada.

Como dizia, essas crianças nos ensinam muito mais do que aprendem. Por isso, não podemos aceitar qualquer forma de discriminação contra pessoas tão especiais, tão cheias de alegria. Desafio qualquer um a me apresentar uma pessoa com síndrome de Down que não lhe dê um sorriso gostoso, que não esteja pronta a dar-lhe carinho, que não seja feliz. São muito felizes e só querem ser aceitas e ter o direito de ter uma vida normal.

Elas são normais e precisam ter vidas normais, dentro de suas limitações, que, no entanto, não as tornam inferiores, apenas diferentes.

Temos de privilegiar a diversidade, estimular a convivência com o diferente. Se queremos uma sociedade mais fraterna, mais sensível, temos de incluir todas as pessoas com suas particularidades e aceitá-las dessa forma. E nós, legisladores, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, precisamos garantir que essa situação ocorra, mesmo que em um primeiro momento seja obrigatória. Eu chamo de disciplina, quer dizer, temos de disciplinar as pessoas a conviver com as diferenças, de modo que elas passem a aceitá-las e ver que essas diferenças não são importantes, pois somos todos iguais com nossas diferenças.

Em nossa Constituição Federal, a lei maior de nosso País, está bem claro no art. 5º que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza”... Logo, como podemos dizer que uma criança especial não tem o direito de estudar junto com as crianças da sua idade? A proibição fere o direito dela, resguardado pela Constituição.

Quando tomei conhecimento da decisão do juiz, resolvi, juntamente com a minha assessoria e a Consultoria Legislativa do Senado, elaborar um projeto para criminalizar situações como a ocorrida com a pequena Lívia. Refiro-me ao PLS 300, de 2006. A idéia do projeto é tornar obrigatória a preparação física e pedagógica de todas as escolas, sejam elas públicas ou particulares, para que toda criança possa ter acesso à educação, independentemente de qualquer coisa, muito menos por suas limitações físicas. Toda escola deve estar preparada para receber crianças especiais, aliás, elas devem receber todo aluno que quiser se matricular!

A escola deve estar preparada não só no campo pedagógico, mas também com estruturas adequadas para promover a acessibilidade e propiciar a inclusão social de crianças que já possuem a dificuldade imposta pela vida. Nós precisamos minorar, o máximo possível, essa dificuldade com nossas ações, para que tais crianças tenham uma vida absolutamente normal. Se muitas pessoas não possuem esse entendimento, usaremos o poder coercitivo para garantir que elas entendam. É uma lei educativa. Precisamos educar para que no nosso futuro tenhamos uma sociedade igualitária livre de qualquer tipo de preconceito.

A idéia desse discurso ganhou mais força com a bela reportagem mostrada pelo Fantástico, na Rede Globo, há duas ou três semanas, quando ficou clara a necessidade de fazer algo contra o preconceito e impedir que essas crianças continuem a ser discriminadas por sua condição.

Devo parabenizar a Rede Globo por abordar esse problema na novela Páginas da Vida, principalmente pela forma leve com que mostra a vida da pequena Clara, uma linda menininha com síndrome de Down. A Globo está prestando enorme serviço à população, ao mostrar que essas crianças são como todas as outras, apenas com algumas peculiaridades. Bato mais uma vez nessa tecla, mas não me canso. Enquanto o preconceito estiver presente em nossa vida cotidiana, utilizarei este espaço para contestar, levantar a voz contra as injustiças. Sei que o povo de Mato Grosso e o do Brasil querem uma sociedade justa, igualitária. Por isso, ponho à disposição, mais uma vez, o meu mandato para ser a voz, Senador Paulo Paim, daqueles que sofrem com o preconceito e a discriminação, sejam eles portadores de deficiência, negros, índios, mulheres, ou tenham feito opção sexual diferente e por isso são fortemente discriminados. Por isso, congratulo-me com a Rede Globo e com a família da pequena Lívia, que não se calou ante a justiça e está lutando pela felicidade de sua filha. Podem, com certeza, contar com a minha participação.

Depois de falar da discriminação contra a mulher, o negro, o índio, os que têm a sua opção sexual diferenciada, enfim, contra todos aqueles que sofrem preconceito da sociedade, quero aproveitar a oportunidade para conclamar, desta tribuna, a Câmara Federal a aprovar o projeto de nossa autoria, já aprovado no Senado, que institui o dia 20 de novembro o Dia Nacional da Consciência Negra. Que ele seja, realmente, dia nacional. Em alguns Estados, já é comemorado, mas desejo que também o seja em todo o país. Alguns dizem: um dia a mais um dia a menos... Não é apenas um dia a mais um dia a menos; é uma forma de combater o preconceito. É como o adágio: “água mole em pedra dura, tanto bate até que fura”. Que se use esse dia e tantos outros dias para o combate à discriminação contra o negro, porque ao lembrarmos a discriminação contra o negro nós estaremos dando visibilidade a essa discriminação e também a todo e qualquer tipo de preconceito que acontece na sociedade, como o existente contra nós mulheres.

Agora estamos nos dezesseis dias de ativismo pelo fim da violência contra a mulher. No dia 30 haverá uma sessão especial do Congresso Nacional, pelo Dia Internacional de Combate pela Eliminação da Violência Contra a Mulher.

Alguns dizem: “Isso já não existe tanto, Senadora; a senhora já é até Senadora”. Sim, sou Senadora. Entre quase 200 milhões de pessoas neste País, há nove Senadoras. E daí? Queremos mais poder político, sim. Queremos 50% do Senado, da Câmara, queremos 50% das governadorias, das prefeituras, das câmaras municipais, das assembléias legislativas, do Congresso Nacional. Queremos sim. Somos 52% da sociedade. Isso está andando muito lentamente, mas nós queremos, principalmente, o fim da violência contra a mulher na família, no trabalho, em todas as instâncias. Chega!

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, 274 mulheres foram assassinadas este ano no Estado de Pernambuco. Não é em todo o Brasil, não. Repito: 274 mulheres foram assassinadas em Pernambuco. Felizmente o Estado de Pernambuco está organizado e pode divulgar esses dados estatísticos para o Brasil e para o mundo tomar conhecimento deles. Em outros Estados, a situação não é muito diferente, mas os dados não são divulgados. Eles precisam ser conhecidos, sim, a fim de que possamos realmente fazer mudanças para valer na sociedade para alterar esse estado de coisas.

Somos iguais aos companheiros homens, absolutamente iguais em termos de direito, e nós não podemos permitir que esse tipo de coisa aconteça. Que os nossos filhos, porque todos os homens - não me canso de dizer isso aqui - são nossos filhos, é óbvio, não é Senador Paulo Paim? Todos os homens são filhos de uma mulher, e temos que ser respeitadas, sim. E a violência contra a mulher não é só assassinato; é lesão corporal, é a humilhação, é a questão psicológica, é a questão cultural, porque nossos filhos crescem dentro de nossas casas nos vendo ser humilhadas e continuam, dali para frente, achando que podem humilhar suas companheiras, suas namoradas, suas esposas, enfim, sua mãe, suas irmãs, as mulheres da sociedade de modo geral.

Conclamo todos os Senadores. Todos! Já convidei o Governador Eduardo Campos - porque muito nos honra ele ter sido eleito Governador de Pernambuco -, que prontamente se dispôs a fazer um grande pronunciamento, no dia 30, lá, na Câmara, contra a violência contra a mulher. Conclamamos aqui todos os Srs. Senadores para que escrevam artigos, que passem e-mails, que façam seus discursos aqui ou lá na Câmara, no dia 30, pelo fim da violência contra a mulher.

Mas o meu tempo está se esgotando e tenho outro assunto extremamente importante também sobre o qual quero falar rapidamente.

Aproveitando que estamos falando de aceitação, tolerância, respeito ao diferente, quero parabenizar a Câmara dos Deputados e em especial a nossa querida e tão comprometida Deputada Iara Bernardes, por ter aprovado o projeto que inclui no rol das práticas discriminatórias e puníveis pela lei a discriminação por orientação sexual, o chamado projeto contra a homofobia, de autoria desta brilhante Parlamentar, de quem vamos sentir muita falta na Câmara Federal. 

É muito oportuna a aprovação desse projeto da Deputada Iara, quando nós estamos iniciando a campanha dos dezesseis dias de ativismo pelo fim da violência contra a mulher. Nós, mulheres, os negros, os índios, os deficientes e os chamados LGBTs. Várias minorias sofrem muito com a violência baseada na discriminação. É preciso que todos se unam pelo fim de qualquer tipo de discriminação. LGBTs significa Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais. Esse é um assunto muito tabu. As pessoas não gostam de falar nisso, mas nós temos que respeitar a opção de cada um. Nós temos a nossa, mas temos que respeitar a dos outros. Qualquer desrespeito tem nome: é discriminação e intolerância, e nós não aceitamos discriminação e intolerância.

Infelizmente, o Brasil é um dos países que possuem posição destacada em um ranking pouco meritório: somos campeões do número de crimes homofóbicos, quando, em muitos casos, a violência resulta em mortes. Segundo dados levantados pelo Grupo Gay da Bahia, entre 1963 e 2004, 2.367 homossexuais foram brutalmente assassinados no Brasil. O combate à homofobia deve ser uma bandeira de todos nós, e de todas nós, independentemente de crença religiosa, coloração partidária e posicionamento com relação à união civil de pessoas do mesmo sexo. Esta é uma questão de direitos humanos, por isso não é possível que nenhum Parlamentar aceite a violência contra nenhum cidadão ou cidadã, principalmente por razões de sexualidade. Aceito a idéia de que não podemos obrigar ninguém a aceitar coisa alguma. Entretanto, respeito ao próximo, à diversidade, ao diferente, isso nós podemos exigir.

Senador Heráclito Fortes, um minuto só para seu aparte, para não deixá-lo sem falar, porque meu tempo já se esgotou. Desculpe-me, não vi que V. Exª estava pedindo um aparte.

O Sr. Heráclito Fortes (PFL - PI) - Senadora, meu aparte se fez desnecessário porque V. Exª terminou preenchendo todas as dúvidas e tudo aquilo que eu gostaria de acrescentar, mas não resisto participar de seu pronunciamento, principalmente hoje que V. Exª vem de Rayovac. Portanto, eu gostaria de parabenizá-la pela oportunidade do seu pronunciamento e dizer que acho que esse é um dos grandes papéis, talvez o maior de todos, que esta Casa possa realizar, Senador Paim, neste momento difícil da sociedade brasileira: chamar a atenção, com ações isoladas ou coletivas, mostrando que realmente é possível melhorar ou pelo menos confortar pessoas. V. Exª disse uma coisa fundamental: existem os filhos sadios e os não sadios. A primeira impressão que temos é de que quem tem um filho com problema, seja síndrome de Down ou qualquer outra deficiência, carrega uma cruz. Na maioria das vezes, até carrega um troféu, e a cruz está exatamente com o que tem o filho sadio, pelo descaminho que a vida lhe fez seguir. De forma que V. Exª tem razão. Temos de ter também, Senador Paim, a preocupação com a inclusão na sociedade dos que têm algum tipo de deficiência, assim como dos que são sadios, para que não tenham problemas por omissão, por esquecimento e, às vezes até, por excesso de mimo. Muito obrigado.

A SRª SERYS SLHESSARENKO (Bloco/PT - MT) - Concordo totalmente com a posição de V. Exª.

Tenho dito muitas vezes, Senador Paim, que, às vezes, as pessoas olham e falam: essa família tem um portador de deficiência, deve ser muito difícil. Talvez seja até mais difícil pelos cuidados que são exigidos, mas, de jeito nenhum, nenhuma família, eu diria, pode sofrer por isso. Basta que a sociedade tenha o entendimento diferenciado de que somos absolutamente todos iguais, apesar das diferenças. E, tratando da questão como direitos humanos, teremos a possibilidade e o potencial de fazer com que essas pessoas, todas, indistintamente, sejam muito felizes. O importante é ser feliz. Não importa o tipo de deficiência, a cor da pele, se é índio, se é mulher, se tem orientação sexual diferenciada daquela que é considerada normal dentro da sociedade, todos, indistintamente, temos o direito de ser felizes. E, para isso, nós, sociedade como um todo, temos de contribuir de forma decisiva e determinada.

E aí a origem do meu projeto, que novamente coloco aqui: a escola não pode discriminar de jeito algum. Essas crianças e esses adolescentes têm de ser tratados de forma absolutamente igual, porque iguais eles são e precisam ser respeitados. Repito aqui: eles nos ensinam muito mais do que nós a eles - pelo menos na minha concepção - porque nos ensinam a tolerância, a solidariedade, o entusiasmo e, com certeza, a alegria de viver.

Muito obrigada.

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 25/11/2006 - Página 35456